Acórdão nº 01083/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Dezembro de 2004

Magistrado ResponsávelBAETA DE QUEIROZ
Data da Resolução15 de Dezembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1.1. A… e B…, residentes em Paivas, Amora, Seixal, recorrem do acórdão do Tribunal Central Administrativo (TCA) que confirmou a sentença da 1ª instância que julgara improcedente a impugnação da liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) relativo ao ano de 1989.

Formulam as seguintes conclusões:«A)Quanto ao tratamento fiscal dos proveitos ligados a escrituras públicas de 1991, mas objecto de contratos promessa celebrados em anos diversos1.

O Acórdão violou o princípio da especialização de exercícios (art. 18º, CIRC e arts. 6º e 22º, CCI): se a promessa com tradição (transmissão económica) preceder a escritura (transmissão jurídica), é naquele e não neste momento que se contabilizam os proveitos.

  1. Os recorrentes, em cumprimento do seu dever de colaboração, alegarem e demonstraram que contabilizaram os proveitos, antes de 1989, com a transmissão económica.

  2. Fizeram-no da melhor e única forma possível (exibição dos contratos promessa e inventário, alegação da tradição, demonstração que sempre a especialização lhe era aplicável na vigência do CCI).

  3. Nada mais se lhes podia exigir, porque na inspecção e liquidação (em 1994) já tinham passado mais do que 5 anos sobre os factos tributários, não havendo já a obrigação de guardar os comprovativos dos registos das transmissões económicas (cfr. art. 94º e 134º, do CCI).

  4. A AF não provou quaisquer factos que lhe competiam: a invocação de que os recorrentes em 1989 celebraram escrituras sem terem registado os proveitos é irrelevante e inócua, face às explicações fornecidas.

  5. Havendo fundada dúvida sobre a existência do facto tributário (se a transmissão económica ocorreu ou não antes de 1989), impõe-se a anulação do acto tributário (art. 121º do CPT e art. 100º do CPPT).

  6. Violou-se a presunção de verdade da contabilidade: art. 75º, LGT, art. 78º, CPT e já vigente na pendência do CCI para os contribuintes do Grupo A, como os recorrentes - pois esta presunção é a contraface do sistema de auto declaração e auto liquidação, sendo o imposto apurado com base na contabilidade.

  7. In casu, a contabilidade do ano de 1989 está correcta pois a transmissão económica precedeu a jurídica; a dos anos anteriores nunca foi posta em causa.

    1. Correcção de valores suportados em escrituras públicas9.

    O Acórdão violou o art. 32º, CPT: a AF para retirar as consequências fiscais da simulação de negócios constantes de escritura pública, não pode pura e simplesmente assumi-los como inválidos; tem antes de intentar uma específica acção nos tribunais cíveis.

  8. O art. 32º, CPT - preceito sem paralelo no direito anterior - passou a prever, entre outras coisas, a invalidade (nulo ou anulável) do negócio simulado quanto ao preço, com o intuito de prejudicar o Fisco e constante de documento autêntico.

  9. Seria aliás estranho que o art. 32º, CPT não se aplicasse à simulação relativa quanto ao preço no intuito de enganar o Fisco - a forma mais usual de simulação no domínio tributário.

  10. A tributação do negócio dissimulado implica a invalidade do negócio simulado (art. 32º, n.º 2, CPT).

  11. Só se prescinde da prévia declaração judicial cível, em "situações excepcionais, expressamente previstas nas leis tributárias" (art. 32, n.º 1, CPT).

  12. As situações excepcionais não se reconduzem às normais e gerais faculdades de correcção da AF (arts. 83º, 91º e 95º, CIRC), como sustentou o Acórdão, sob pena da excepção se converter em regra e a expressa determinação em geral previsão.

  13. As situações excepcionais englobam os casos em que exista de presunções legais a cargo do contribuinte e na utilização de critérios presuntivos.

  14. O Acórdão viola o princípio da reserva de jurisdição, ao permitir que um órgão administrativo pratique actos judiciais por natureza, quais sejam, assunção da simulação e definição do preço do negócio dissimulado.

  15. O Acórdão viola os arts. 40º, 121º do CPT e art. 8º do Código Civil: a aplicação do art. 121º do CPT não depende de alegação pelos recorrentes.

  16. O art. 121º do CPT não é mais um argumento factual ou jurídico. É antes uma indicação (obrigação) dirigida ao Juiz, quanto ao comportamento a tomar no final do seu iter cognoscitivo e avaliativo.

  17. Como está vedado o non liquet, caso subsistam fundadas dúvidas no se e quantum do facto tributário, mesmo com a intervenção do poder de investigação, impõe-se a anulação do acto tributário - in dubio contra fiscum.

  18. Se o Juiz pode decidir independentemente dos argumentos das partes - poder de investigação (art. 40º do CPT) - então, se com esses tópicos ficar com dúvidas, terá de anular o acto, mesmo que as partes nada tenham alegado quanto aos factos e argumentos eleitos pelo Juiz.

    TERMOS EM Que DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO E REVOGADO O ACÓRDÃO RECORRIDO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS».

    1.2. Não há contra-alegações.

    1.3. O Exmº. Procurador-Geral Adjunto junto Tribunal é de parecer que o recurso não merece provimento: os fundamentos das conclusões 1ª a 8ª «assentam em pressupostos de facto que não estão estabelecidos no acórdão recorrido»; no que respeita às demais conclusões, entende que o Tribunal recorrido «fez boa interpretação das regras do artº 32º do CPT, de resto na linha da jurisprudência deste STA que cita», e que a «fundada dúvida» «é matéria de facto que o tribunal "a quo" não estabeleceu».

    1.4. O processo tem os vistos dos Exmºs. Adjuntos.

  19. Vem fixada a factualidade seguinte:«1ºOs impugnantes são contribuintes de IRS, na qualidade de cônjuges, não separados nem de facto nem de direito, dedicando-se A…, enquanto empresário em nome individual às actividades de realização de empreendimentos urbanísticos, com e loteamento de imóveis e sua promoção e venda - vulgarmente designada por promoção e intermediação imobiliária - solicitação de alvarás na realização de projectos, exploração agrícola e agro-pecuária e promoção no ramo turístico, bem como a compra e revenda de terrenos em avos indivisos com vista à constituição de loteamentos para efeitos de construção.

    1. A escrita dos impugnantes do ano de 1989 foi objecto de uma acção de fiscalização.

    2. Em resultado dessa acção foi pela Inspecção tributária decidido corrigir o valor do IRS a pagar pelos impugnantes.

    3. Foi corrigido, nomeadamente, em primeiro lugar, na contabilidade do impugnante, para mais, esc: 14.749.978$00, que a administração fiscal não aceitou como custo fiscal legalmente dedutível ao lucro tributável.

    4. Tal valor refere-se a importâncias pagas pelos impugnantes a pessoas com quem tinham outorgado contratos-promessa de compra e venda de terrenos, em anos anteriores, os impugnantes na qualidade de promitentes-vendedores.

    5. (5º no original)Tais importâncias foram pagas para se conseguir que os referidos contratos-promessa deixassem de produzir efeitos jurídicos, deixando os...

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