Acórdão nº 0188/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelVALENTE TORRÃO
Data da Resolução07 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – A Fazenda Publica, veio recorrer da decisão da Mmª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente o recurso interposto por A………, com os sinais dos autos, contra a decisão do Director de Finanças do Porto que determinou a correcção da matéria colectável com o recurso a métodos indirectos, referente ao IRS do ano 2008, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: A). O presente recurso é deduzido contra a douta sentença que anulou a decisão de avaliação indirecta da matéria colectável efectuada ao abrigo do mecanismo previsto no artº. 89°-A da LGT por entender que a Administração Tributária incorreu em excesso de quantificação ao não considerar a justificação parcial da manifestação de fortuna evidenciada com a aquisição de um imóvel.

B). A ora recorrente aceita o julgamento da sentença ora recorrida quanto ao julgamento da matéria de facto, considerando assente que a contribuinte adquiriu em 2008 um imóvel pelo valor de € 415.000,00, apenas justificando a proveniência do montante de € 130.000,00, obtido com recurso a crédito bancário, o que consubstancia uma justificação parcial da manifestação de fortuna evidenciada.

C). A ora Recorrente insurge-se contra a sentença proferida na parte em que esta, em sede de julgamento da matéria de direito, acolhe uma interpretação do artº. 89°-A da LGT segundo a qual a justificação parcial da manifestação de fortuna deve ser considerada na determinação do rendimento sujeito a tributação como incremento patrimonial, concluindo pelo “excesso de quantificação, a acarretar a ilegalidade do acto recorrido”.

D). A ora Recorrente defende, com o devido respeito, que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à interpretação e aplicação do disposto no artº. 89°-A da LGT, opondo-se, assim, à jurisprudência contida no acórdão deste Venerando Tribunal, de 19/05/2010, no processo n° 0734/09, que lhe serviu de referência e fundamento, E). Mais defendendo, sem prescindir do entendimento que advoga, que a sentença sob recurso não retirou daquele acórdão as devidas consequências legais, pois a justificação parcial comprovada nos autos deveria conduzir a uma procedência parcial do recurso, anulando a decisão da Administração Tributária apenas na parte em que esta não reflecte aquela justificação, verificando-se, assim, uma incoerência entre a decisão do Tribunal, quanto à procedência total do recurso, e o entendimento exposto quanto à interpretação da lei.

F). A interpretação contida na sentença sob recurso, que ora se impugna, consubstancia, necessariamente, uma interpretação correctiva da norma de incidência tributária, contrária ao princípio constitucional da legalidade.

G). Assim, não se vislumbra que a letra da lei, especificamente o previsto no artº. 4° do artº. 89°-A da LGT, contemple a faculdade de a Administração Tributária, para efeitos de quantificação da matéria tributável sujeita a IRS, aplicar a taxa de 20% a outro valor que não seja o valor da aquisição do imóvel, estando vedada a possibilidade de fixar um rendimento inferior, mediante a aplicação daquela taxa de 20% ao valor de aquisição do imóvel deduzido da importância justificada parcialmente.

H). O método de tributação indirecta, previsto no artº. 89°-A da LGT, pressupõe, por definição, a tributação de um rendimento cuja existência é fortemente indiciada, a partir de factos típicos como as manifestações de fortuna, mas cuja fonte ou natureza, assim como a sua quantidade são desconhecidos.

I). Justamente, importa salientar que as manifestações de fortuna não são factos tributários, ou estaríamos perante uma tributação directa da despesa, o que não é o caso da norma em apreço.

J). As manifestações de fortuna são, isso sim, factos indiciadores de fraude ou evasão fiscais quando se verifica a desproporção com o rendimento declarado nos termos expressamente previstos na lei.

K). Ao justificar parte das manifestações de fortuna, o contribuinte não está a justificar parte do rendimento que se presume a partir da referida tabela, pois muito embora o cálculo do rendimento padrão seja proporcional ao valor de aquisição daquelas, o objectivo daquele método indirecto de tributação é o de tributar ingressos de rendimento que tenham escapado à devida tributação, com vista a uma aproximação da realidade contributiva.

L). Na falta de outros indícios que, nos termos do artº. 90° da LGT, permitam à Administração Tributária apurar matéria colectável em montante superior, a situação tributária do contribuinte, no ano em que ocorre a manifestação de fortuna, é apurada exclusivamente com base no rendimento padrão resultante da referida tabela e nunca em montante inferior, ainda que o contribuinte justifique parte do valor de aquisição.

M). É que subjacente ao método de tributação previsto no artº. 89°-A da LGT está o desconhecimento da real capacidade contributiva do contribuinte, N). E uma justificação parcial da manifestação de fortuna implica o desconhecimento da realidade tributária global do contribuinte, para efeitos de IRS, não afastando, por isso, a presunção de fraude e evasão fiscal e a consequente aplicação do padrão de rendimento apurado a partir da tabela do n°4 do art. 89°-A da LGT, para a qual a lei não prevê qualquer redução.

O). A presunção de um rendimento padrão, contida no artº. 89°-A da LGT, é claramente uma presunção ilidível, através da prova da origem da totalidade dos fluxos financeiros que suportaram a totalidade do valor de aquisição da manifestação de fortuna evidenciada, nos termos consignados no nº 3 daquele normativo legal.

P). A tributação com recurso ao método indirecto do art. 89°-A da LGT é um regime de carácter excepcional, estando a Administração Tributária estritamente vinculada aos critérios tipificados pelo legislador, não sendo admissível que considere um rendimento inferior ao que resulta da aplicação da tabela quando a lei apenas prevê a hipótese da aplicação de um rendimento superior.

Q). O entendimento que se defende com o presente recurso quanto à interpretação do artº. 89°-A da LGT, mais concretamente sobre a quantificação da matéria colectável em face de uma justificação parcial da manifestação de fortuna, tem um relevante apoio quer na doutrina, quer na jurisprudência, conforme supra se transcreveu.

R). Por sua vez, a interpretação acolhida na sentença sob recurso afigura-se sem assento na letra ou no espírito da lei, incorrendo numa interpretação correctiva do disposto no art. 89°-A da LGT, atentatória do princípio da legalidade tributária.

S). Termos que e se conclui que a decisão da Administração Tributária em crise não incorreu em excesso na respectiva quantificação da matéria colectável a tributar a título de acréscimos patrimoniais não justificados.

T). Sem prescindir da tese que se defende com o presente recurso, entende-se a ora Recorrida que na hipótese, que se repugna, de prevalecer a tese que vem sufragada na sentença sob recurso, segundo a qual a Administração tributária incorreu em erro na quantificação da matéria tributável com recurso ao método indirecto do artº. 89°-A da LGT, impunha-se que a decisão em crise fosse anulada parcialmente e não na sua totalidade.

U). Ou seja, a sentença sob recurso não retirou daquele acórdão as devidas consequências legais, pois a justificação parcial comprovada nos autos deveria conduzir a uma procedência parcial do recurso, anulando a decisão da Administração Tributária apenas na parte em que esta não reflecte aquela justificação, verificando-se, assim, uma incoerência entre a decisão do Tribunal, quanto à procedência total do recurso, e o entendimento exposto quanto à interpretação da lei.

V). Segundo a tese preconizada na sentença sob recurso, ao valor de aquisição do imóvel será de deduzir aquele montante de € 130.000,00, considerando uma matéria colectável de 20% de € 285.000,00, por ser este o valor de aquisição cuja origem não foi comprovada pela Recorrente (€415.000,00 - €130.000,00), ou seja, um rendimento padrão de € 57.000,00.

W). Consequentemente, o recurso interposto pela contribuinte contra a decisão de avaliação indirecta da matéria colectável referente a IRS de 2008 que fixou um rendimento liquido no montante de € 83.000,00, deveria ter procedido parcialmente, anulando-se a decisão da Administração Tributária no montante de € 26.000,00, que excede aquele montante de € 57.000,00.

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a decisão do Tribunal a quo ser revogada, mantendo-se a decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto com todas as consequências legais.

II – Em contra alegações veio a recorrida, A………, concluir: Iª). Inconformada com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, vem a Fazenda Nacional interpor recurso per saltum contra a douta sentença que determinou a anulação da decisão de avaliação indirecta da matéria colectável efectuada ao abrigo do mecanismo previsto no art.º 89º-A da Lei Geral Tributária (LGT) por ter considerado que a Administração Tributária incorreu em excesso de quantificação ao não aceitar a justificação parcial da manifestação de fortuna evidenciada com a aquisição de um imóvel.

IIª). Considera a aqui Recorrida que o Tribunal a quo fez uma correcta interpretação e aplicação das normas ínsitas na Lei Geral Tributária relativas à tributação das manifestações de fortuna, na senda do que tem vindo a ser o entendimento do venerando Supremo Tribunal Administrativo.

IIIª). O objecto recurso da Ilustre Representante da Fazenda Pública impende sobre a decisão do tribunal a quo proferida nos presentes autos quanto à parte em que se considera a justificação parcial da manifestação de fortuna na determinação do rendimento sujeito a tributação como incremento patrimonial em sede de IRS, concluindo pelo “excesso de...

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