Acórdão nº 0185/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelLINO RIBEIRO
Data da Resolução07 de Março de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. A Fazenda Pública interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou procedente a reclamação que, nos termos do artigo 276º do CPPT, A……, devidamente identificado no autos, fez contra o despacho do Chefe de Finanças de Guimarães que lhe indeferiu o pedido de dispensa de garantia, para efeito de suspensão da execução fiscal nº 3476199201025589, que contra si reverteu.

Nas respectivas alegações, conclui o seguinte: 1. Na douta decisão ora recorrida o M.º Juiz julgou procedente a reclamação apresentada pelo contribuinte tendo, em consequência, determinado a anulação do despacho do órgão da execução fiscal que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pelo aqui recorrido, por entender ter o dito despacho sido proferido com preterição de formalidade legal, mais concretamente a prevista no art. 60º da Lei Geral Tributária (LGT). Salvo o devido respeito por opinião contrária, entende a Fazenda Pública que o citado normativo legal não é aplicável em sede de execução fiscal, designadamente antes da decisão que recaia sobre o pedido de dispensa da prestação de garantia formulado pelo executado.

  1. A questão essencial que incumbe apreciar reconduz-se a saber se no âmbito de um processo de execução fiscal - maxime antes da decisão do órgão da execução fiscal que recaia sobre um pedido de dispensa da prestação de garantia formulado pelo executado - é aplicável o direito de participação previsto no art. 60º da LGT.

  2. O referido normativo legal encontra-se previsto no Capítulo I do Título III da LGT referente às regras gerais do procedimento tributário.

  3. Como resulta do disposto na al. h) do n.º 1 do art. 54º da LGT "O procedimento tributário compreende toda a sucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários, designadamente ( ... ) a cobrança das obrigações tributárias, na parte que não tiver natureza judicial".

  4. Sendo que o mesmo diploma prescreve no art. 103º que "O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional".

  5. Em face do teor dos citados normativos legais revela-se imperioso concluir que o processo de execução fiscal não pode ser qualificado como um "procedimento", antes deve ser entendido como um "processo judicial", e, assim sendo, forçoso se torna concluir que o referido normativo legal não pode ser aplicado no âmbito processual.

  6. Por outro lado, é pacífico que - com excepção da situação prevista no art. 23º, n.º 4 da LGT - inexiste norma que determine, de forma geral, a aplicação de tal princípio no âmbito da execução fiscal.

  7. Aliás, a citada excepção vem, no nosso entender, confirmar a regra; a qual seja, a de que tal direito de audição prévia às decisões proferidas não é, salvo disposição expressa em contrário, aplicável no seio do processo de execução fiscal.

  8. Ainda que se entenda que, não obstante a natureza judicial do processo de execução fiscal, os actos praticados pelo órgão da execução fiscal têm natureza administrativa, as normas legais que lhe são aplicáveis são apenas as respeitantes a esse mesmo processo e não as previstas para todo e qualquer procedimento tributário, que, como se referiu, o próprio legislador teve o cuidado de, expressamente, excluir no art. 54º, n.º 1, al. h) da LGT.

  9. Ora, não sendo aplicável o dito normativo legal, nem existindo comando legal que imponha tal direito de participação previamente à decisão sobre a dispensa da prestação de garantia, é forçoso inferir que tal formalidade legal não foi preterida.

  10. Tendo na douta decisão ora recorrida se decidido de forma diversa é inevitável que se conclua que a mesma enferma de errada interpretação e aplicação do direito.

    1.2. Nas contra-alegações, o recorrido conclui o seguinte: 1. No âmbito de um processo de execução fiscal - maxime antes da decisão do órgão de execução fiscal que recaia sobre um pedido de dispensa da prestação de garantia formulado pelo executado -, é aplicável o direito de participação previsto no artigo 60.0 da LGT.

  11. A decisão de um órgão de execução fiscal que recaia sobre um pedido de dispensa da prestação de garantia, ainda que inserida num processo de execução fiscal, não tem de uma natureza judicial, mas sim administrativa.

  12. Com efeito, apesar do processo de execução fiscal ser um processo judicial tributário, os órgãos da administração tributária têm nele intervenção apenas para a prática de actos materialmente administrativos, isto é, actos que em si não comportam nenhuma resolução de natureza jurisdicional.

  13. São as seguintes as considerações que se podem extrair do sumário do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30.11.2011, processo 983/11: - direito de audiência prévia implica a existência de um procedimento prévio em que estejam principalmente em causa factos relevantes para a decisão; - Perante requerimentos em que é necessário desenvolver diligências instrutórias é obrigatória a audiência prévia.; - ao contrário do que sucede com um pedido de pagamento em prestações, num pedido de dispensa de prestação de garantia o órgão de execução fiscal não pode decidir com fundamento numa mera informação dos serviços em que nenhuma matéria de facto é avançada; - a falta de audição in casu prejudicou o interessado, uma vez que o mesmo poderia ter levado ao processo elementos que levariam a decisão diversa da proferida pelo órgão da execução fiscal.

  14. Tais considerações encontram-se plenamente cumpridas num processo decisório como o sub judice nos presentes autos, relativo a um pedido de dispensa de garantia.

  15. Para que a dispensa de prestação de garantia seja concedida é necessário que o executado prove alternativamente dois requisitos, a existência de prejuízo irreparável ou a manifesta falta de meios económicos.

  16. Constituindo a audiência prévia em si mesma um elemento probatório, a sua essencialidade advém da sua capacidade para, em abstracto, ser concedida ou não a referida dispensa.

  17. Assim, em sede de audiência prévia, sempre poderia o reclamante apresentar elementos ou documentos ou pronunciar-se quanto a uma eventual falta de prova quanto à insuficiência de bens penhoráveis ou quanto à existência de prejuízo considerável.

  18. Veja-se ainda que não podemos interpretar, como fez a recorrente, que no artigo 23º, n.º 4, da LGT se estabelece uma norma excepcional relativamente à inserção da audiência prévia no processo de execução fiscal.

  19. Essa excepcionalidade não se pode retirar da letra do artigo 23.°, n.º 4, da LGT uma vez que este, ao estabelecer a necessidade de dois procedimentos prévios à reversão - a audiência prévia e a declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão - lido a contrario, não permite inferir a excepcionalidade da audiência prévia por si só, mas apenas a excepcionalidade da cumulação desses dois procedimentos.

  20. Verifica-se assim que a douta sentença proferida pelo Tribunal ad quo julgou correctamente a reclamação apresentada, designadamente, o vício praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças no despacho proferido em 13.01.2011 e que se prendeu com a preterição de uma formalidade essencial como a audiência prévia.

  21. Por outro lado, tendo o órgão de execução fiscal apurado...

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