Acórdão nº 01414/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA MA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

I-RELATÓRIO 1. A Sociedade “A……, S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu reclamação do despacho proferido pelo Chefe de Finanças de Oeiras 2, que indeferiu o pedido de prestação de garantia por meio de apresentação de uma fiança, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que foi julgada totalmente procedente.

  1. Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso para este Supremo Tribunal, apresentando as alegações com as seguintes conclusões: “I. Pretende-se com o presente recurso reagir contra a douta sentença declaratória da procedência da Reclamação deduzida contra a decisão proferida em 18-05-2012, no processo de execução Fiscal n° 365420100201042033, pelo Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, que indeferiu o pedido de aceitação da garantia, constituída por uma fiança prestada pela empresa A……, S.A., accionista da executada.

    1. Com o devido respeito não se conforma a Fazenda Pública, já que considera que a douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento de facto e erro de julgamento de direito, como a seguir se argumentará e concluirá.

    2. Entende a Fazenda Pública de que não é de proceder a pretensão formulada na presente reclamação, porquanto não padece o acto controvertido de qualquer ilegalidade.

    3. O ad. 52° da LGT permite a suspensão da cobrança da prestação tributária efectuada no processo de execução fiscal nos casos de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução, que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da divida exequenda, desde que acompanhada da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.

    4. Tal suspensão da execução encontra-se, porém, condicionada pelo art. 169° do CPPT à constituição de garantia (em conformidade com o art. 195° do mesmo CPPT), à sua prestação (nos termos do art. 199° do mesmo diploma) ou quando a penhora efectuada nos autos incida sobre bens suficientes para garantir o pagamento da divida exequenda e respectivo acrescido.

    5. Especifica, este último preceito, que a garantia a prestar deverá ser idónea, consistindo em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos da Fazenda Pública.

    6. Reporta-se, assim, a idoneidade da garantia à sua susceptibilidade para determinar o pagamento da dívida a curto prazo (em tempo útil), após citação para o efeito (n°2 do art. 200º do CPPT), entendendo-se como pagamento da dívida a entrega do correspondente montante em dinheiro ou equivalente.

    7. A exigência de garantia, nos termos previstos no art. 199° do CPPT, visa assegurar a boa cobrança dos créditos tributários, pelo que lhe é intrínseca uma exigência de liquidez num período de tempo limitado.

    8. Os estritos termos e exigências reveladas pelo teor dos preceitos citados reflecte o principio da vinculação à lei na actividade administrativa tributária, a indisponibilidade dos créditos fiscais e a proibição da concessão de moratórias no seu pagamento, mormente se estiverem vencidos, assumindo que a suspensão tem um carácter verdadeiramente excepcional, sendo que é proibida nos casos não previstos da lei (cf. art. 56°, n°5 da LGT).

    9. A arrecadação da receita fiscal, já em fase de cobrança coerciva, implica a realização, no processo de execução fiscal, do princípio da efectividade da tutela judicial do direito do credor do imposto, que preside àquele processo judicial tributário, e necessariamente aos meios admissíveis de garantir a cobrança coerciva da divida tributária em vista da suspensão da execução.

    10. Como tal, com a utilização da expressão “garantia idónea”, pretende-se significar que nem todas as garantias serão sempre adequadas e que a indicação exemplificativa dos meios de garantia bancária, caução ou seguro-caução, antes da alternativa “qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”, tem de entender-se como uma restrição pretendida dos demais meios que poderão enquadrar-se no conceito de garantia idónea.

    11. O escopo do processo judicial tributário de execução é sempre de assegurar a efectiva cobrança da dívida, designadamente no que às garantias a prestar para suspensão da sua tramitação respeita, independentemente da qualidade do prestador.

    12. Isto é, a lei aponta preferencialmente para certos tipos de garantia, dos quais se evidencia a vinculação de um concreto bem ou valor à realização da divida exequenda, precavendo a indiferenciação ou depreciação inerente a outros modos de garantir e, dentre os valores concretos, aqueles que pela sua natureza financeira tenham imediata ou mais rápida conversão em receita, como a garantia bancária, caução ou seguro-caução.

    13. Por outro lado, a fiança representa uma garantia pessoal dada por um terceiro - o fiador - com o conteúdo da obrigação principal — cf. art.627° e seguintes do CC, sendo que, no plano cível, prevalece a noção de que a fiança não é prestada no interesse do devedor, mas sim no do credor, que tem a faculdade de aceitar as que lhe sejam oferecidas, nomeadamente segundo um juízo casuístico de conveniência (art. 767°, n°2 do CC).

    14. Por via da prestação da fiança é suposto o credor passar a ter como garantia de cumprimento da obrigação dois patrimónios — o do devedor que responde por uma divida própria e o do fiador que responde por uma dívida alheia (cf. art. 627° do CC), o credor tem de concorrer, porém, em relação a ambos os patrimónios, com os restantes credores, sem que, para segurança da mesma dívida, haja garantia real constituída.

    15. Pois, embora se trate de uma garantia especial das obrigações, a fiança, quando constituída, concede ao credor apenas uma garantia geral sobre o património de terceiro, sem qualquer situação de privilégio, o que, por si só, pode significar que a massa patrimonial do fiador é insuficiente para o cumprimento das sua obrigações, desconhecendo-se os restantes credores detentores de garantia geral sobre esse mesmo património.

    16. In casu, cumpre salientar que está em causa a segurança do pagamento de dívida tributária vencida, de avultado montante, legitimadora da actuação do órgão da execução fiscal, seguindo exigências maiores na assunção das soluções adequadas à salvaguarda do interesse público no recebimento das quantias que lhe são devidas, especialmente no tipo de garantia a aceitar.

    17. Deste modo, do disposto no art. 199º, n°2 do CPPT, decorre que a AT, expondo a falta de idoneidade da garantia concretamente apreciada, poderá recusá-la, uma vez que o critério pelo qual se há-de aferir da idoneidade, diante dos preceitos legais aplicáveis, é o de que, para funcionar como garantia, a lei sugere que o meio concretamente oferecido terá de incidir sobre bens ou valores suficientes para assegurar o pagamento da divida exequenda e respectivo acrescido em tempo útil, XIX. o que implicará sempre um acto de avaliação ou apuramento do valor da garantia concretamente oferecida ou dos bens sobre que esta incida, sempre numa perspectiva de adequação ao montante do crédito do exequente e de mais fácil realização do crédito (cf. por igualdade de razões, o art. 219°, n°1 do CPPT).

    18. Também por isso a exigência de idoneidade para garantia da dívida terá de ser encontrada na mais fácil e imediata realização do crédito e de ser directamente proporcional ao quantitativo em causa, afastando qualquer susceptibilidade de variação ou indefinição dos valores em que traduza.

    19. Com a fiança, é suposto o credor passar a ter como garantia de cumprimento da obrigação dois patrimónios e que nos termos do art. 169° do CPPT a suspensão do processo de execução fiscal se mantém até à decisão do contencioso tributário, a admissibilidade da garantia oferecida (fiança) implicaria um acompanhamento permanente da situação patrimonial do fiador, encargo que representaria um esforço administrativo irrazoável para o órgão da execução fiscal.

    20. O órgão de execução fiscal, usando da sua capacidade técnica, juízos de prognose e em conformidade com as regras de uma “boa administração”, a que está vinculada, ponderou se a garantia que lhe foi apresentada era adequada para garantir a divida exequenda e respectivo acrescido, tendo em conta a escolha da solução que melhor realizasse o interesse público, isto é, se a garantia apresentada era ou não idónea, concluindo pela falta de idoneidade da fiança prestada.

    21. E, saliente-se, a característica da liquidez em tempo útil é intrínseca à idoneidade da mesma.

    22. Ora, este facto serve de medida à maior ou menor segurança, certeza e celeridade que a garantia oferece para o credor.

    23. Aliás, para aferir da suficiência (ou não) da robustez económica do fiador para assegurar o cumprimento da divida, torna-se necessário analisar o valor da fiança.

    24. Acontece que, no que a tal avaliação diz respeito, decidiu o douto acórdão do TCAS, de 2000/06/20, processo n°2986/99, que “a idoneidade se reporta ou é aferida não pelos valores morais ou sociais do fiador mas pelo valor do seu património” e que, XXVII. “a avaliação da capacidade económica ou do valor do património do fiador constitui ónus do requerente”.

    25. Deve, pois, estar demonstrada a capacidade sustentada de pagar o montante a garantir.

    26. E, é o executado quem deve demonstrar a suficiência da garantia apresentada, designadamente pela demonstração do activo, do passivo e das obrigações entretanto assumidas pela sociedade garante.

    27. Porém, in casu, a reclamante não demonstrou oportunamente, para efeitos da decisão de aceitação da fiança, que esta constituía uma garantia susceptível de assegurar os créditos exequendos e que tinha subjacente um lastro patrimonial indiciador da sua idoneidade.

    28. Entende, pois a Fazenda Pública, com o devido respeito, que a douta sentença sob recurso enferma de erro de julgamento da matéria de facto, porquanto errou na selecção dos factos dados como provados, não considerando provados factos que deveriam ter sido devidamente apreciados e valorados, XXXII. Errando ainda no juízo sobre os mesmos, retirando conclusões sem que...

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