Acórdão nº 098/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução28 de Outubro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório -1 – A…, SA, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 15 de Setembro de 2008, que julgou improcedente a impugnação que deduzira contra a liquidação de emolumentos notariais no montante de ESC. 1.947.227$00, apresentando as seguintes conclusões: I – O Tribunal “a quo” considerou, na sentença dada nos presentes autos, que o acto impugnado não enfermava de nenhuma das ilegalidades que lhe foram apontadas, na medida em que o emolumento previsto no artigo 5.º da Tabela dos Emolumentos do Notariado, aprovada pela Portaria 996/98 de 25 de Novembro, era uma taxa e não um imposto.

II – Baseou-se no acórdão deste Venerando Tribunal de 28.3.2007, tirado sob o processo de recurso n.º 1047/05.

III – No entanto, tal Acórdão foi tirado sobre recurso com objecto distinto do que se discute nos presentes autos, pois aquele consistia apenas em saber se os emolumentos devidos em razão da celebração de uma escritura pública de cessão de quotas e alteração do pacto social, com base no artigo 5.º da já mencionada Tabela dos Emolumentos do Notariado, possuíam carácter remuneratório ou se, em suma, violavam ou não o artigo 10.º, alínea c), da Directiva 69/335/CEE: IV – Ademais, O Tribunal “a quo” apenas citou o referido Acórdão, sem proceder neste processo a qualquer das tarefas de julgamento que naquele Acórdão foram levadas a cabo.

V – Nomeadamente, não se debruçou o Tribunal recorrido sobre a concreta inexistência de sinalagmaticidade ou correspectividade entre o emolumento impugnado e o serviço notarial prestado em razão de manifesta desproporção entre ambos, conforme fora alegado.

VI – Como se depreende da leitura do Acórdão citado, o critério básico de diferenciação entre impostos e taxas é a estrutura unilateral ou bilateral do tributo, sendo forçoso que exista alguma correspectividade entre o tributo e o serviço prestado para que estejamos perante a sinalagmaticidade caracterizante das taxas.

VII – Sabemos que para que possamos afirmar que se encontra em falta o carácter sinalagmático entre o tributo e o serviço prestado “será necessário que essa desproporção seja manifesta e comprometa, de modo inequívoco, a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática” – Acórdão do Tribunal Constitucional 115/02, de 12.3.2002.

VIII – Ora tal desproporção ocorre no caso “sub judice”, pois a escritura pública celebrada pela Recorrente em 6.12.2001 limitava-se a alterar a sede e o objecto da sociedade, não se ocupando de qualquer alienação de imóvel ou transmissão de posição contratual.

IX – Escritura pública essa que, se celebrada a partir de 1.1.2002, custaria à ora Recorrente meros 225,94 € e não uns estratosféricos 9.647,88€.

X – O emolumento de 225,94 € é aquele que reflecte o custo efectivo do serviço prestado, tendo em consideração a natureza dos actos e a sua complexidade nos termos do artigo 3.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado.

XI – Assim, o valor emolumentar de 9.647,88€, cobrado de acordo com o artigo 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado, aprovada pela Portaria 996/98, ilustra cabalmente a inexistência da necessária correspectividade entre o emolumento e o serviço prestado para que possamos estar perante uma taxa.

XII – Os emolumentos devidos por actos notariais em razão do artigo 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado aprovada pela Portaria 996/98 “numa tal configuração, (esses emolumentos) eram função da capacidade contributiva revelada na solicitação desses serviços pelos respectivos requerentes. Tratava-se por isso de impostos e de impostos inconstitucionais, desde logo porque a definição da sua taxa não respeitava o princípio constitucional da legalidade fiscal.” – J. Casalta Nabais, Direito Fiscal, Coimbra, 2003.

XIII – Sem conceder, sempre se dirá que “é indiferente (…), que na fixação da tabela de imposições a cobrar tenha sido ponderada a globalidade dos custos de funcionamento e de investimento do serviço encarregado dessa operação, pois nessa hipótese, cada uma das liquidações de emolumentos calculada em função do valor do acto continuará a não estar conexionada com o custo do respectivo serviço (…).

XIV – Não altera esta conclusão sobre não natureza de taxa do tributo em causa, a eventualidade de lhe estar subjacente uma hipotética intenção de repartição proporcional do custo global dos serviços de notariado pelos utentes, pois, sendo essa repartição feita com base no valor dos actos e não na efectiva onerosidade do serviço prestado a cada um, tal seria o reconhecimento de que o exigido a cada um deles não tinha qualquer relação com o respectivo serviço.” – passagens ambas transcritas com a devida vénia do voto de vencido lançado no Acórdão do STA de 20.11.2006 (recurso 391/04).

XV – Assim, o que o tribunal “a quo”, de forma peremptória e liminar considerou ser uma taxa é, afinal, um imposto.

XVI – E com esse figurino deveria ter aquilatado da conformidade constitucional do tributo, confrontando a norma do artigo 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado com os pertinentes arrimos constitucionais.

XVII – Podendo, então, concluir, como devia, pela inconstitucionalidade da referida norma (art. 5.º da Tabela dos Emolumentos do Notariado) por violação do princípio da legalidade fiscal (artigos 103, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição da República Portuguesa) na medida em que prevê/cria um imposto mediante Portaria e não através da indispensável Lei ou Decreto-Lei autorizado, como é disposto na Lei Fundamental.

XVIII – Quer se considere que o emolumento “sub judice” é uma taxa ou um imposto, a interpretação e aplicação da norma do artigo 5.º da Tabela de Emolumentos do Notariado aprovada pela Portaria 996/98, na medida em que permite a cobrança de uma taxa nitidamente desproporcionada ao serviço prestado, permitindo também a cobrança de taxas substancialmente diferentes no seu valor a requerentes de igual serviço apenas em função do capital social destes ser distinto...

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