Acórdão nº 0284/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução03 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (ST

  1. I. RELATÓRIO A A… (A.), melhor identificada nos autos, intentou junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra (actual TAF), Acção Declarativa de Condenação na Forma Ordinária, contra o Município de Nazaré (R.), pedindo a sua condenação no pagamento da quantia global de 137.635,56 €, que posteriormente reduziu no que toca a lucros cessantes (de 84.795,64€ para 45.000,00€), a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros vencidos no montante de 24.821,40 €, bem como juros vincendos, a contabilizar, até integral pagamento.

O tribunal a quo julgou totalmente procedente a acção e, em consequência, condenou o R. no pagamento à Autora, de indemnização no montante global de 97.839,20 € (52.839,20 € a título de danos emergentes e, 45.000,00, a título de lucros cessantes).

Inconformado, o R. interpôs o presente recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal Administrativo.

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1 – A decisão recorrida é nula, nos termos do disposto no artigo 668.°, n.º 1, alínea c) do C.P.C.; 2 – A decisão recorrida contém ainda vícios que importam decisão diversa da que foi proferida; 3 – A Sentença em crise tem como fundamento de direito o quadro normativo constante dos artigos 132.°, 134.°, n.° 1, 136.°, n.° 2, 138.°, 139.°, n.° 1, 145.°, n.° 1 e 176.°, todos do Decreto-Lei n.° 405/93, de 10 de Dezembro.

4 – Da análise do n.° 2 do artigo 136.° não resulta o que foi decidido na Sentença recorrida, ou seja, a condenação do R. no pagamento, à A., do valor de € 5.761,12, dispendido com a concepção, preparação, organização e apresentação da sua proposta a concurso mas sim o contrário.

5 – É que a proposta de concurso não é uma consequência necessária do facto que deu origem ao retardamento da consignação; 6 – Em qualquer procedimento concursal o risco de sucesso, ou insucesso, da proposta apresentada sempre correrá por conta de cada concorrente; 7 – Quanto a este montante, por se encontrar fora do âmbito de aplicação do quadro normativo definido pela Senhora Juiz a quo como aplicável à situação, a decisão a tomar sempre seria a da absolvição do Recorrente.

8 – Ao decidir de forma diversa, a Senhora Juiz a quo feriu a decisão recorrida de vício que importa a nulidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 668.°, n.° 1, alínea c) do C.P.C..

9 – Ainda quanto ao valor peticionado pela A. como despesa com a proposta de concurso, o mesmo vício resulta da confrontação da fundamentação constante a fls. 16 da decisão recorrida, segundo parágrafo, com a decisão tomada a final.

10 – Considerando a decisão em crise que este valor estaria diluído na expectativa de lucro da A., então o valor dispendido com a concepção, preparação, organização e apresentação da sua proposta a concurso sempre deveria ter sido peticionado pela A. como lucros cessantes e não como danos emergentes.

11 – Não obstante tal fundamentação, a decisão consagrou solução diversa condenando o Recorrente a pagar, à A., este montante a título de danos emergentes.

12 – Também por esse motivo a decisão recorrida é nula, nos termos do disposto no artigo 668.°, n.° 1, alínea c) do C.P.C., o que se invoca, seguindo-se os demais termos legais.

13 – Igualmente quanto à condenação do Recorrente ao pagamento, à A., do valor de € 47.078,08 dispendido com a montagem do estaleiro se verifica existir clara contradição entre a fundamentação e a decisão.

14 – A A. nunca solicitou ao Recorrente a suspensão do acto de consignação.

15 – Faltando os elementos por ela, A., alegados no auto de consignação (vide quesito 3) dos factos provados), bem sabia a A. que o artigo 145.°, n.° 1, citado na fundamentação de direito da decisão em crise, estabelece que nenhum elemento da obra será começado sem tais elementos.

16 – A decisão de instalar o estaleiro foi da exclusiva responsabilidade da A..

17 – O Recorrente não pode ser responsabilizado por factos provocados pela A. (consciente ou negligentemente).

18 – Encontrando-se a Sentença recorrida fundamentada no que disposto vem no artigo 145.°, n.° 1 do Decreto-Lei n.° 405/93, de 10 de Dezembro, a decisão tomada a final está em clara oposição à fundamentação de direito invocada.

19 –A decisão recorrida é também por isso nula, de acordo com o disposto no artigo 668.°, n.° 1, alínea c) do C.P.C..

20 – O Recorrente foi condenado a pagar à A. o valor de € 45.000, a título de lucros cessantes, sem que a A. alegasse qualquer facto que permitisse provar e quantificar os lucros cessantes.

21 – A decisão recorrida substituiu-se à A., e considerou erradamente que os lucros cessantes peticionados pela A. se enquadravam no disposto no n.° 3 do artigo 566.° do Código Civil.

22 – Ao contrário do que consta a fls. 16 da decisão recorrida (parágrafo 8), é possível calcular a margem de lucro que a A. obteria com a execução da empreitada.

23 – A A. fez tais cálculos quando se apresentou a concurso.

24 – Pelo que, não se justifica a aplicação do disposto no n.° 3 do artigo 566.° do Código Civil.

25 – Sendo factos próprios da A., competia a esta, A., alegá-los, quantificá-los e prová-los o que não sucedeu.

26 – Inexistindo nos autos quaisquer factos provados que consubstanciem uma decisão de condenação do Recorrente, a decisão recorrida carece de sustentação factual.

A douta Sentença recorrida violou assim, designadamente, os artigos 132.°, 134.°, n.° 1, 136°, n.°2, 138.°, 139.°, n.° 1, 145.°, n.° 1 e 176.°, todos do Decreto-Lei n.° 405/93, de 10 de Dezembro, bem como o artigo 566.°, n.° 3 do Código Civil, e os artigos 264.°, n.° 2 do Código de Processo Civil, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que, dando razão à Recorrente, absolva o R. do pedido.” A Autora, aqui recorrida, contra-alegou e apresentou as conclusões seguintes: “1. Nulidade da sentença, nos termos do artigo 668°/1, alinea c), do CPC, é aquela que resulta da contradição lógica entre fundamentos e decisão, ou seja, de um vício real no raciocínio do julgador, como quando, na fundamentação da sentença, o tribunal aponta para uma determinada consequência ou solução jurídica e depois, inopinadamente, tira outra, oposta ou contrária. A nulidade da sentença “não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade” (Lebre de Freitas, CPC Anotado, vol. 2°, 2001, 670); 2. Não há nulidade da Sentença, nos termos do artigo 668°/1, alínea c), do CPC, mas – a seguir-se o entendimento do Recorrente – eventual erro de julgamento, no facto ela ter feito apelo ao art. 136°/2 do Decreto-Lei n° 405/93 para justificar a condenação pelo pagamento das despesas com a concepção, preparação e organização da proposta, se porventura o referido preceito não suportar tal decisão; 3. E por aqui se ficaria a Recorrida, pois não pode transformar-se uma arguição de nulidade da sentença numa arguição de erro de julgamento ou num recurso de apelação; 4. Acresce que, como resulta claro da Sentença recorrida, o direito ao pagamento dessas despesas não se fundou no art. 136°/2 do Decreto-Lei n° 405/93, mas, directa e expressamente, no regime do artigo 564°/1 e no artigo 563° do Código Civil (ver página 15 da Sentença) – raciocínio que está em linha com o regime do artigo 215° do REOP de 1993 (em caso de rescisão “pelo exercício de direito do empreiteiro, será este indemnizado dos danos emergentes e dos lucros cessantes que em consequência sofra”) e que está legitimado pelo disposto no artigo 236° do REOP; 5. Por outro lado – e a Sentença pronunciou-se especificadamente sobre o assunto (ver página 15, parte final) –, as despesas com concepção, preparação e organização da proposta não devem ser vistas, sem excepção, como resultantes de uma “candidatura a um procedimento concursal cujo risco de sucesso, ou insucesso, sempre correrá por conta de cada concorrente”, não acontecendo assim, por exemplo, quando haja exclusão ilegal de um concorrente e se demonstrar que o candidato excluído deve ter sido o adjudicatário, ou então quando a inutilização de todas as despesas suportadas para apresentar a proposta a concurso resulte de comportamentos ilícitos já em sede contratual, que determinem a impossibilidade absoluta de dar início à execução da obra, com a consequente rescisão do contrato; 6. Não se detectando aí qualquer contradição lógica, não há nulidade da Sentença pelo facto de nela se dizer que os custos com a concepção, preparação e organização da proposta “estariam diluídos na expectativa de lucro” da Recorrida, por então deverem tais despesas ser computadas a título de lucros cessantes, e não como danos emergentes, porque isso configuraria, a ser procedente, que não é, um erro de julgamento; 7. Sempre se dirá, de qualquer forma, que a referida afirmação constante da Sentença (do 2° parágrafo da sua página 16) foi tirado do seu contexto pelo Recorrente, pois o que o Tribunal quis foi demonstrar que esses custos não podiam ser imputados à margem de risco do empreiteiro, e que, como tal, eram danos indemnizáveis, correndo por conta do dono da obra. De resto, essa afirmação vem justamente na sequência da refutação, pelo Tribunal, da tese da Recorrente segundo a qual tais custos deveriam ser sempre suportados pelo empreiteiro (ver 2 últimos parágrafos da página 15 e 1° parágrafo da página 16); 8. Por outro lado, não se vê, sinceramente, a importância da qualificação dos danos em causa como danos emergentes ou como lucros cessantes. O que interessa decisivamente, neste caso (noutros, pode não ser assim, claro), é que se trate de um dano indemnizável. Se é, condene-se quem lhe deu causa ao respectivo pagamento; 9. Não se detectando aí...

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