Acórdão nº 0551/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução16 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1.

A… intentou acção administrativa especial contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO, impugnando a deliberação do seu Plenário de 3-2-2009, que lhe aplicou a sanção disciplinar de aposentação compulsiva e manteve a deliberação da Secção Disciplinar do mesmo Conselho de 16-12-2008.

1.2.

Pelo acórdão deste Tribunal, em subsecção, de fls. 310-342, a acção foi julgada improcedente e o Réu foi absolvido do pedido.

1.3.

Inconformado, o Autor interpõe o presente recurso, em cujas alegações conclui: “I. Ao negar provimento à acção administrativa especial, o acórdão impugnado incorreu em erro de julgamento devendo ser revogado e substituído por outro que determine a declaração de nulidade ou a anulação do acto impugnado na acção.

  1. O acórdão recorrido deve ser declarado nulo, por não ter confrontado a versão dos factos da entidade demandada e do autor, para determinar quais os factos que podem ser considerados demonstrados tendo em conta o conteúdo do acto sancionatório novo, tendo assim violado a alínea d) do n.º 1 do artigo 668º do Código do Processo Civil.

  2. O acórdão recorrido é inválido por em erro de julgamento, no sentido da alínea b) do n.º 1 do artigo 690º do Código do Processo Civil, devendo ser revogado, pelas razões de seguida sumariadas.

  3. Ao invés do que considera o acórdão apelado, o acto sancionatório não podia ser renovado (ou praticado um novo acto com pressupostos substancialmente idênticos), dado ter sido anulado por erro sobre os pressupostos de facto, reconduzindo o dever de execução da sentença à reconstituição da situação actual hipotética e salientando o efeito inibitório que proibia o Conselho Superior do Ministério Público de reincidir na prática de um acto sancionatório que assumisse pressupostos de facto e valorações substancialmente idênticas às do acto anulado.

  4. A afirmação de que os mandados de detenção obedeceram a um tratamento de favor é completamente afastada pela fundamentação dos próprios mandados de detenção que justifica amplamente a razão de ser da sua imediata prolação. A celeridade da actuação do recorrente tem cobertura legal, visava prosseguir o interesse público e encontrava-se suficientemente fundamentada.

  5. Os factos que conduziram à anulação da anterior sanção expulsiva são os mesmos que os que foram assumidos como justificação para aplicação da nova sanção disciplinar expulsiva. Ora, sendo os factos os mesmos, se o acórdão transitado em julgado sobre eles não se pronunciou foi porque a então entidade demandada não o suscitou atempadamente. Assim, se existiu alguma «omissão de pronúncia», quanto a tais factos, essa omissão já transitou em julgado com o respectivo acórdão.

  6. A interpretação do artigo 173º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos proposta pelo acórdão apelado viola o princípio ne bis in idem consagrado no nº 1 do artigo 14º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, então em vigor. Ora o acórdão recorrido admite é o dever de execução das sentenças anulatórias dos tribunais administrativos se compagina com a aplicação de uma segunda sanção tendo por fundamento os mesmos factos e a mesma alegada infracção. O que mudou foi, apenas, a valoração jurídica. Tal pressuposto viola o princípio ne bis in idem.

  7. Para além disso, a interpretação que o acórdão apelado faz do conteúdo do dever de execução das sentenças anulatórias dos tribunais administrativos, tal como constante do artigo 173º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, é inconstitucional por violação do princípio ne bis in idem consagrado no nº 5 do artigo 29º da Constituição.

  8. Nunca, em momento algum, o recorrente foi chamado no procedimento disciplinar a pronunciar-se sobre as valorações efectuadas pela entidade demandada no acto objecto da acção administrativa especial. Ou seja, o recorrente foi sancionado sem ter tido oportunidade no processo disciplinar de se pronunciar sobre valorações subjacentes à acusação. Na verdade, sem ter sido formulada verdadeiramente acusação, já que a anterior se consumiu com a prática de uma sanção anulada.

  9. Ao julgar que a exigência de reinstrução do procedimento disciplinar (pelo menos desde a acusação) estava dependente de consagração expressa na sentença anulatória, sem atender aos deveres gerais de execução decorrentes da lei, bem como à obrigação legal de dar ao recorrente a oportunidade de se defender no processo disciplinar, o acórdão apelado faz uma incorrecta aplicação da lei ao caso concreto, e deve ser revogado.

  10. Para tentar escapar à emulação pura e simples dos factos e valorações anteriores, o acórdão recorrido, na senda do acto impugnado, funda-se na consideração de que o recorrente emitiu mandados de detenção legais mas demasiado céleres e com isso violou o princípio da igualdade.

  11. Se os mandados de detenção obedeceram aos seus requisitos legais de emissão, como sustentar que houve violação do princípio da igualdade? A existir violação do princípio da igualdade essa violação teria de ser assacada à habilitação normativa e não ao comportamento legal que a concretizou.

  12. Não há violação do princípio da igualdade na legalidade.

  13. Para além disso, o desvalor do tratamento diferenciado teria sempre de assentar no seu carácter arbitrário ou desprovido de qualquer fundamento atendível. Ora, tal não sucedeu, até porque os despachos que o recorrente emitiu tiveram o cuidado de fundamentar a urgência da execução, tendo em conta as características do caso concreto e a necessidade de prossecução do interesse público.

  14. Deste modo, o acórdão recorrido errou ao considerar que os despachos emitidos pelo recorrente, apesar de legais, violaram o princípio da igualdade, razão pela qual deve ser revogado.

  15. Para além disso, o acórdão impugnado sustenta uma interpretação do nº 1 do artigo 5º do Código do Procedimento Administrativo que não se coaduna com o sentido do princípio da igualdade acolhido no artigo 13º da Constituição, assumindo uma interpretação inconstitucional e devendo ser revogado.

  16. A referência constante do acórdão impugnado ao princípio da imparcialidade reflecte as mesmas perplexidades. O princípio da imparcialidade implica sempre a decisão motivada pela beneficiação específica de um interesse que não devia ser considerado.

  17. A vertente preventiva do princípio da imparcialidade só se reflecte nos impedimentos e suspeições (artigos 44º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo), que têm requisitos específicos.

  18. A operatividade autónoma do princípio da imparcialidade implica necessariamente considerações de resultado, em função de aspectos que não foram ponderados ou o foram de acordo com um significado que não têm.

  19. Remetendo para as considerações já efectuadas nas alegações, reitera-se que não há violação da imparcialidade na legalidade: a existir seria uma questão de inconstitucionalidade da habilitação normativa! XXI. O recorrente entende ainda que o acórdão recorrido errou na aplicação do direito ao caso concreto porque a sanção impugnada viola o disposto na Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro.

  20. Como decorre do artigo 9º de tal regime jurídico, a ordem jurídica deixou de comportar a aplicação da sanção disciplinar de inactividade. Tal opção constitui um princípio geral do direito disciplinar público, aplicável enquanto tal aos magistrados do Ministério Público.

  21. Não se descortina, aliás, qualquer especialidade da sanção de aposentação compulsiva que justifique a sua manutenção para a magistratura do Ministério Público e o seu desaparecimento para a generalidade dos trabalhadores que exercem funções públicas.

  22. Consequentemente, o acórdão impugnado deve ser revogado.

  23. O acórdão recorrido errou ao manter a sanção aplicada ao recorrente, já que tal sanção se afigura manifestamente excessiva, em clara violação do princípio da proporcionalidade, não respeitando os requisitos estabelecidos no artigo 184º do Estatuto do Ministério Público.

  24. Aplicando os requisitos legais e constitucionais (pressupostos das sanções e proibição do excesso) nunca à suposta infracção poderia ser aplicada mais que uma repreensão escrita ou uma advertência.

  25. O acórdão impugnado sustenta uma interpretação do artigo 184º do Estatuto do Ministério Público que não se coaduna com o sentido do princípio da proporcionalidade acolhido no artigo 2º e no nº 2 do artigo 266º da Constituição, assumindo uma interpretação inconstitucional e devendo ser revogado.

    Termos em que deve o acórdão impugnado ser revogado e substituído por outro que declare nula ou anule a deliberação do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, datada de 3 de Fevereiro de 2009, que aplicou ao agora recorrente a sanção disciplinar de aposentação compulsiva, e que manteve a deliberação da Secção Disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público, de 16 de Dezembro de 2008, assim se fazendo a usual justiça”.

    1.4.

    O recorrido contra-alegou, concluindo: “1ª Nos termos do artigo 12.º, n.º 3 do ETAF o PLENO DA SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO SÓ CONHECE MATÉRIA DE DIREITO. Por isso, 2ª Irrelevam as razões com as quais o Recorrente pretende suportar a NULIDADE da decisão recorrida, por violação da alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPC.

    1. A ELIMINAÇÃO, por força das sentenças criminais proferidas pelos Tribunal da Relação de Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, do propósito de obter para si ou para terceiros vantagem patrimonial - propósito este que o CSMP deu como assente e constituiu, por isso, pressuposto da condenação disciplinar em pena de "DEMISSÃO" - NÃO IMPEDIA A PRÁTICA DE NOVO ACTO PUNITIVO. Na verdade, 4ª Toda a restante materialidade assente, que as decisões criminais e o Acórdão anulatório não puseram minimamente em crise, NÃO PODIA FICAR IMPUNE, dada a gravidade que encerra.

    2. A pronúncia anulatória apenas inibiria o CSMP de praticar novo acto com base naquele mesmo pressuposto, remetendo-O para a reapreciação da...

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