Acórdão nº 0071203 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Outubro de 2000 (caso None)

Magistrado ResponsávelSANTOS MONTEIRO
Data da Resolução18 de Outubro de 2000
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal desta Relação:O Exmº Magistrado do M.º P.º, junto do DIAP, deduziu no inquérito nº 11366/98, acusação contra a Drª (A), advogada , imputando-lhe a prática de um crime de violação de segredo de justiça, p, e p. pelo artº 371º, nº 1, do C. P. de 1982, versão de 1995, requerendo a arguida a instrução, vindo M.º JIC, em sequência, a emitir despacho de não pronúncia, com o fundamento de que a conduta imputada à arguida na acusação se compreendia no âmbito do cumprimento dos deveres a que se achava adstrita na sua qualidade de mandatária de (B).

O Digno Magistrado do M.º P.º, inconformado com o decidido, interpôs recurso, apresentando, na motivação, as seguintes conclusões : A arguida foi acusada da prática de um crime de violação de segredo de justiça.

Em sede de instrução foi ,apenas, realizado o debate instrutório.

O M.º juiz entendeu que a factualidade descrita na acusação se achava plenamente indiciada, não sendo a sua veracidade posta em crise por qualquer dos sujeitos processuais.

O destinatário da missiva não estava vinculado ao dever de sigilo tal resulta do Estatuto da Ordem dos Médicos, bem como do seu Código Deontológico.

Igualmente não estava adstrito ao dever de sigilo porque este resulta da relação médico-doente, como resulta do Código Deontológico dos Médicos.

Esse médico era terceiro totalmente alheio ao processo e que nele é introduzido por força de uma liberdade que a arguida achou por bem, ter no caso vertente.

A divulgação de factos e actos cobertos pelo dever de segredo de justiça, a um terceiro, por parte da arguida, resulta de forma evidente dos autos, inexistindo razão de facto e de direito para concluir que a arguida agiu sem intenção criminosa, como o fez o M.º JIC.

À arguida não estava vedado, antes tendo legitimidade para tanto , requerer a terceiros exames, perícias, opiniões médicas, pareceres sobre os factos respeitantes aos autos em vista da defesa dos direitos da sua constituinte, o que lhe estava proibido era revelar a um terceiro factos ou actos recobertos do segredo de justiça.

Nada obstava a que a arguida, enquanto experiente e ilustre advogada que é, solicitasse autorização, ao abrigo do disposto no art. 86º nº 5, do CPP, à autoridade judiciária que presidia à fase processual respectiva, para dar conhecimento a determinadas pessoas do teor do acto beneficiando da tutela do segredo de justiça.

Não é de aceitar a opinião do M.º Juiz segundo o qual atenta a relatividade do segredo de justiça seja de admitir que o advogado opte por "pecar por excesso".

Deve, pois, o despacho em apreço ser revogado e pronunciada a acusada.

A arguida, em resposta e procedendo a uma síntese daquela, salientou a essencialidade da divulgação de actos processuais, que estavam a desenrolar-se como forma de obtenção mais fácil do parecer médico a solicitar , e prestado, inserindo-se no âmbito da estratégia da defesa dos direitos que lhe incumbia levar acabo no exercício do mandato forense. O parecer junto aos autos deve conformar-se aos elementos disponíveis neles, nos termos do art. 165º, do CPP, incluindo-se a descrição de factos que fez ao clínico que aquele elaborou no estrito âmbito da sua missão de advogada.

Nesta instância de recurso, o Exm.º Procurador Geral-Adjunto sufraga o entendimento de que o recurso merece provimento.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: A decisão do presente recurso partirá da consideração do seguinte quadro factual, assente nos autos, relativamente ao qual se não suscita a mais leve controvérsia: Neste Tribunal de Relação, sendo denunciado o aqui denunciante, Dr. (C), Magistrado do M.º P.º, correu inquérito movido por (B), à data sua esposa.

A queixosa era patrocinada pela acusada Drª (A) , que, no decurso da instrução requerida pelo arguido, juntou aos autos dois documentos, um deles sendo uma carta endereçada em seu nome pessoal ao Prof. Dr. (D) e outro um parecer da autoria daquele docente universitário e médico.

Na carta, por si assinada, cujo conteúdo parcialmente se transcreve com data de 16 de Abril de 1998; a arguida afirmou: "Dirijo-me a Vexa.ª na qualidade de advogada constituída por (B) para a patrocinar ( ...) numa acção de divórcio litigioso que se viu na necessidade premente de mover contra seu marido (C), Delegado do Procurador da República, junto dos Tribunais (K) de Lisboa .

Entre outros, constitui fundamento do pedido de dissolução do casamento de ambos por divórcio, o facto da minha constituinte, em 11 de Dezembro de 1996, ter sido agredida pelo marido, na presença de, apenas, o filho menor do casal, à data com 3 anos e meio de idade, na própria casa onde se situava a morada de família de ambos.

Tal agressão deu, além disso, também origem a uma queixa crime apresentada no próprio dia da agressão (...) que se encontra na fase de instrução, dirigida por um Ilustre Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa.

Sucede que, neste momento já foram ouvidas várias testemunhas de ambas as partes, designadamente o médico de família da minha cliente, Dr. (E), que a observou e medicou na própria tarde do dia em que ocorreu a agressão; mais exactamente na tarde do dia 11 de Dezembro de 96 e que, para efeitos de instrução do processo, passou atestado-Declaração de que junto cópia para um mais perfeito conhecimento de V. Ex.ª.

Acontece que...

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