Acórdão nº 3700/2003-2 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Julho de 2003
Magistrado Responsável | MARIA JOSÉ MOURO |
Data da Resolução | 03 de Julho de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa: * I - A e outros, intentaram o presente procedimento cautelar de ratificação de embargo de obra nova contra B.
Alegaram os requerentes, em resumo: Os requerentes são donos e possuidores das fracções autónomas denominadas «B» e «I», do prédio urbano em regime de propriedade horizontal designado «Y».
O construtor daquele prédio veio a adquirir e a anexar a este uma língua de terreno no sentido leste/oeste, com cerca de 185 m2, aí implantando parques de estacionamento bem como a área de depósito de contentores do lixo.
Tal trato de terreno tem sido utilizado e fruído, desde a data da construção do prédio «Y », exclusivamente pelos condóminos deste, para seu proveito, à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja, de boa fé, de forma pública e pacífica, actuando pela forma correspondente ao direito de propriedade. Já antes o construtor e os antecessores procederam em termos similares.
Contudo, a requerida, nas duas últimas semanas tem utilizado aquela faixa de terreno demolindo um muro que constituía a partilha sul do mesmo e edificando ali uma porta de acesso ao seu prédio.
Tais trabalhos prejudicam o direito de propriedade sobre aquela parte comum do prédio e a posse dos requerentes.
Nesta conformidade os requerentes, no dia 17-10-2002, deslocaram-se àquela parte comum do prédio, acompanhados de três testemunhas e verbalmente disseram á requerida que suspendesse tais trabalhos e a utilização daquele trato de terreno, procedendo ao embargo extrajudicial das ditas obras.
Requereram a ratificação do mencionado embargo.
A requerida deduziu oposição alegando, essencialmente que o pedaço de terreno em causa não integra a área do prédio de que os requerentes são condóminos, qualquer pessoa o podendo utilizar e sendo considerado espaço público.
O processo seguiu os seus termos, vindo a final a ser proferida decisão que julgou a providência improcedente.
Dessa decisão agravaram os requerentes, formulando as seguintes conclusões: 1 - Os agravantes invocaram no seu requerimento inicial a titularidade de direito de compropriedade sobre uma parcela de terreno e para tanto alegaram a posse dos próprios, dos demais condóminos do Edifício "Y ", do construtor deste e dos antecessores, os quais exerceriam os actos materiais alegados nos artigos 11° a 16°.
2 - E que, por essa via, tinham adquirido, por usucapião, o invocado direito real de gozo.
3 - No artigo 24º do requerimento inicial os agravantes identificaram o direito de propriedade sobre aquela parte comum e a posse como sendo os direitos prejudicados pelas obras da agravada.
4 - Estes direitos integravam as duas causas de pedir formuladas no requerimento inicial, tanto que o conhecimento da primeira exigia o conhecimento da segunda.
5 - Tais causas de pedir - direito de compropriedade e posse - foram em definitivo admitidas pelo Tribunal" a quo".
6 - Na sentença recorrida conheceu-se unicamente da causa de pedir relativa à titularidade do direito de compropriedade e fê-lo negando-lhes tal direito, porquanto a posse exercida pelos agravantes não conduzia à aquisição, por usucapião, desse direito.
7 - Contudo, do iter lógico plasmado na sentença sob recurso decorre que o Tribunal" a quo" teve por pressuposto da sua decisão uma reconhecida situação de posse por parte dos agravantes.
8 - Dado que na fundamentação de direito da sentença afirma-se que agravantes " utilizam a parcela em causa desde a construção do edifício, ou seja, há cerca de oito anos, sem oposição de ninguém e à vista de toda a gente", que trata-se de "...uma posse de boa fé, pacífica e pública" e que essa "posse (...) não é susceptível, por ora, de conduzir à aquisição de tal parcela por usucapião".
9 - O Tribunal, nesta parte, ateve-se à factualidade considerada provada em especial a transcrita nos pontos nos 6., 8. e 11. da fundamentação de facto da sentença, e aos factos considerados não provados, concretamente no constante nos pontos III) e IV) neste articulado transcritos.
10 - Do conjunto da factualidade tida por provada e por não provada e do seu exame crítico, resulta processualmente adquirido que os condóminos do edifício "Til Mar" - entre os quais os agravantes - têm utilizado a parcela de terreno, nomeadamente o estacionamento no sentido Leste-Oeste e a área de depósito de contentores do lixo, junto do seu extremo Leste.
11 - E que têm-no feito em seu proveito, à vista de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, de forma pública e pacífica.
12 - Os actos materiais notórios que corporizam a demonstrada utilização da parcela de terreno consubstanciam uma actuação dos agravantes em termos correspondentes e similares ao direito de compropriedade que invocaram.
13 - Os agravantes têm exercido, fáctica e materialmente, a posse da parcela de terreno identificada nos pontos 8. a 10. da fundamentação de facto da sentença, posse essa de boa-fé, pacífica e pública.
14 - A posse de um direito real de gozo pode ser acautelada por via do procedimento cautelar de ratificação de embargo extra judicial de obra nova.
15 - Assim, decidida a improcedência da primeira causa de pedir - o direito de compropriedade - devia o Tribunal" a quo" pronunciar-se se sobre a outra causa de pedir e questão invocada: a da posse dos agravantes.
16 - Nomeadamente, para julgar os agravantes titulares da posse e, por consequência, de um direito susceptível de ser acautelado pelo presente procedimento cautelar.
17 - Não tendo a mencionada questão sido conhecida, quando o devia ter sido, a sentença sob recurso é nula, nos termos do disposto no artigo 668°, n° 1 - al. d), do Código de Processo Civil.
18 - Se assim se não entender, seguro é que a fundamentação de facto e de direito da sentença, nomeadamente ao reconhecer a posse dos agravantes sobre a parcela de terreno, está em contradição lógica com a decisão.
19- A sentença sob recurso foi proferida no pressuposto de que os agravantes exerciam e exercem posse e a assunção dos factos e do direito a ela conducentes apontam no sentido de que os agravantes são titulares dessa mesma posse.
20 - Esta conclusão que se extrai da fundamentação da sentença não teve consequência na decisão, dado...
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