Acórdão nº 5655/2003-7 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Julho de 2003

Magistrado ResponsávelPIMENTEL MARCOS
Data da Resolução09 de Julho de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

B instaurou execução com processo ordinário Contra A e outros invocando como título executivo uma livrança, no montante de 24.140.000$00, subscrita pela 1ª executada em 30.11.95, avalizada pelos 2º, 3º, 4º, 5º e 6º executados, com vencimento em 30.06.96, e que não foi paga.

Os executados deduziram os presentes embargos, dizendo, em síntese: O pedido formulado nos presentes autos não pode ser formulado no âmbito de uma acção executiva, na medida em que tem por base uma livrança subscrita pela primeira embargante, que foi descontada pela embargada no exercício do seu comércio bancário.

Com efeito deverá necessariamente ter existido um contrato de desconto bancário entre as duas partes, e foi com base nesse contrato que o dinheiro foi disponibilizado à primeira embargante.

No entanto, "o desconto bancário tem natureza formal, para cuja prova é exigida a existência de um escrito que contenha a assinatura do descontário, embora tal escrito possa ter natureza de documento particular".

A embargada não faz prova da existência desse contrato, pelo que deverão os embargantes ser imediatamente absolvidos da instância.

Além disso, os juros de mora são devidos à taxa legal (10% - portaria 1171/95).

A embargada contestou, dizendo: A matéria alegada nos embargos é de direito e não pode por isso ser contestada.

Os embargantes litigam de má fé, pois não só reconhecem a dívida na sua carta de 19.12.96 como ainda subscrevem a proposta de empréstimo, pelo que devem ser condenados em multa e indemnização de acordo com o prudente arbítrio do tribunal.

Juntou documentos.

Por sentença de 28.12.2001 foram os embargos julgados improcedentes, excepto na parte relativa à taxa de juro, que foi fixada em 10% , conforme pedido pelos embargantes.

Dela recorreram os embargantes, que formularam as seguintes conclusões: 1- A execução tem por base uma livrança da qual não é apresentado qualquer contrato de desconto.

  1. nenhuma das assinaturas constante das livranças refere que o seu autor actue na qualidade de gerente da sociedade.

  2. Não houve interpelação dos avalistas para o pagamento da quantia agora pedida.

  3. A taxa de juros aplicável não pode ser superior à legal.

  4. A decisão recorrida ofende o disposto no artigo 50º da LULL, no artigo 260º, nº 1 do CSC e no artigo 4º do DL 262/83, de 16.06.

    Não foram feitas contra-alegações.

    Foram dispensados os vistos.

    Cumpre apreciar e decidir.

    Os factos a ter em conta são os referidos, ou seja: A exequente é portadora de uma livrança, no montante de 24.140.000$00, subscrita pela 1ª executada em 30.11.95, avalizada pelos 2º, 3º, 4º, 5º e 6º executados, com vencimento em 30.06.96.

    Esta livrança não foi paga.

    Os embargantes subscrevem a proposta de empréstimo (mais concretamente, a executada subscreveu a proposta de empréstimo e os restantes embargantes, na qualidade de avalistas, declararam tomar conhecimento da proposta e que aceitavam todas as obrigações dela decorrentes) e a sociedade executada reconheceu a dívida na sua carta de 19.12.96, ou seja, em data posterior ao vencimento (fls. 29 a 34).

    O DIREITO.

    I A apelada instaurou execução conta a subscritora da livrança e os seus avalistas.

    Uma livrança é um título executivo (artº 46º do CPC). E é um título à ordem pelo qual uma pessoa (emitente ou subscritor) se compromete para com outra a pagar-lhe uma determinada quantia em certa data, com os requisitos a que alude o artigo 75º da LULL (da qual serão as disposições legais que vierem a ser citadas sem indicação doutra proveniência).

    Nos termos do nº 1 do artigo 45º do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva. E, como estabelece o nº 1 do seu artº 55º, a execução tem de ser promovida contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.

    Os requisitos das livranças são os enumerados no artigo 75º. E todos eles constam da livrança dada à execução.

    Por força do artº 77º, são aplicáveis às livranças as disposições das letras de câmbio relativas ao aval (artºs. 30 a 32).

    O pagamento de uma livrança, pode, assim, ser garantido por aval (artº 32º).

    O aval é o acto pelo qual um terceiro ou um signatário da livrança garante o pagamento por parte de um dos seus subscritores. Portanto, pode ser prestado por um signatário da livrança, mas, em regra é prestado por um terceiro, isto é, por alguém que, não sendo ainda responsável pelo seu pagamento, vem garantir a obrigação de outro obrigado cambiário. A obrigação do avalista é uma obrigação de garantia, sendo esta a natureza jurídica do aval.

    E não há dúvida de que os apelantes pessoas singulares prestaram o seu aval à subscritora, pois constam do próprio título os dizeres referidos. E, aliás, estes não põe em causa este facto.

    O dador de aval é responsável da mesma maneia que a pessoa por ele afiançada. Na verdade, pela prestação do aval ele fica vinculado da mesma forma que a pessoa cuja obrigação garante (artº 32º I). Todavia a sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma (artº 32º).

    O aval representa uma garantia da obrigação cambiária; destina-se, portanto, a assegurar o seu pagamento. O conteúdo e a extensão da obrigação do avalista aferem-se pela obrigação do avalizado.

    E o subscritor da livrança é responsável da mesma forma que o aceitante de uma letra (artº 78º), pelo que se obriga a pagá-la à data do vencimento (artº 28º).

    Portanto, os apelantes obrigaram-se a pagar a livrança à data do seu vencimento, podendo o portador exigir-lhes o seu pagamento, accionando-os individual ou colectivamente, pois os obrigados cambiários são todos solidariamente responsáveis para com ele (artºs. 43º, 47º e 48º).

    IIMas os apelantes alegam que o pedido feito nos presentes autos não pode ser formulado no âmbito de uma acção executiva, na medida em que tem por base uma livrança subscrita pela primeira embargante, que foi descontada pela embargada no exercício do seu comércio bancário.

    Salvo o devido respeito não se entende esta afirmação.

    Uma coisa é a subscrição da livrança e outra, bem diferente, a causa debendi.

    A livrança é um título de crédito (um título executivo) e como tal vale por si mesmo. Da livrança consta uma obrigação de pagamento de uma determinada quantia líquida, em dia certo (obrigação pecuniária).

    A exequente não invoca a "causa debendi", mas sim o título de crédito.

    E acrescentam os apelantes que deverá (s/n) ter existido um contrato de desconto bancário entre as duas partes, e que foi com base nesse contrato que o dinheiro foi disponibilizado à primeira embargante e ainda que "o desconto bancário tem natureza formal, para cuja prova é exigida a existência de um escrito que contenha a assinatura do descontário, embora tal escrito possa ter natureza de documento particular".

    A verdade é que não foi junto qualquer "contrato de desconto bancário". E como é óbvio, competia aos embargantes juntar tal contrato, caso existisse (artº 342º, nº 1 do CC). Ninguém terá a menor dúvida (além dos apelantes?) de que a subscrição de uma livrança não pressupõe necessariamente a existência de um contrato de desconto. A "causa debendi" pode ter várias origens.

    O que se provou foi a existência de uma "proposta de empréstimo" assinada pelos embargantes, nos...

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