Acórdão nº 04861/01 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Junho de 2003 (caso None)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução17 de Junho de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada "T..., Limited" (adiante Recorrente), na qualidade de compradora de um prédio vendido na execução fiscal com o n.º..., a correr termos pelo Serviço de Finanças do 3.º Bairro Fiscal de Lisboa (SF3.ºBFL) contra a sociedade denominada "L..., Lda." (adiante Recorrida ou Executada), recorreu para este Tribunal Central Administrativo (TCA) da decisão proferida pelo Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Lisboa (TT1.ªL) no processo acima identificado que, julgando procedente o recurso interposto pela Executada ao abrigo do disposto no art. 355.º do Código de Processo Tributário (CPT)(() Embora a petição tenha dado entrada em 18 de Fevereiro de 2000, data em que estava já em vigor o Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), uma vez que a execução fiscal foi instaurada em 1996, ao recurso judicial apresentado pela Executada aplicava-se o regime do art. 355.º do CPT, por força do disposto no art. 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, diploma que aprovou o CPPT. Só em 5 de Julho de 2001, com a entrada em vigor da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, os processos regulados pelo CPT passaram a reger-se pelo CPPT, «sem prejuízo do aproveitamento dos actos já realizados» (cfr. arts. 12.º e 12.º da referida Lei).

) contra os despachos do Chefe do SF3.ºBFL por que foi ordenada a venda do imóvel por negociação particular (a fls. 69) e por que foi aceite a proposta apresentada pela ora recorrente para a compra do mesmo (a fls. 92), decidiu nos seguintes termos: «anulo o despacho que ordenou a venda por negociação particular proferido a fls. 69 dos autos e, consequentemente, todos os actos subsequentes ao mesmo praticados na execução, designadamente a venda ao prédio inscrito na matriz predial da freguesia de S. Nicolau, Lisboa, sob o artº ...

[(() Trata-se de manifesto lapso de escrita pois o artigo matricial tem o n.º 96.

)], sito na Rua .... nºs ... a ..., tornejando para a Rua ..., nºs ... a ...

»(() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.

).

1.2 No referido recurso judicial interposto ao abrigo do disposto no art. 355.º do CPT(() Como bem salientou o Juiz da 1.ª instância no seu despacho de fls. 89, nada autorizava que o recurso judicial fosse autuado em separado, devendo antes ser incorporado no processo de execução fiscal e aí tramitado. No entanto, entendeu aquele Juiz no mesmo despacho que, dada a natureza urgente do processo, seria mais expedito o procedimento, que adoptou, de requisitar o processo de execução fiscal. Se bem que a natureza de processo urgente não estivesse prevista à data na lei (como veio a estar no art. 278.º, n.º 5, do CPPT, mas apenas para as situações previstas no n.º 3 do mesmo artigo), entendemos que bem andou o Juiz do Tribunal a quo ao obviar a demoras no processo.

), como causas de pedir do pedido de anulação dos despachos recorridos dirigido ao TT1.ªL, invocou a Executada, em síntese: - que não se verificavam os requisitos legais para que a venda se efectuasse por negociação particular e, muito menos, pelo valor por que o foi; - que o bem vendido não corresponde ao que foi penhorado nem ao que foi posto à venda por meio de propostas em carta fechada; - que não foi observado o disposto no art. 17.º, n.º 1, da Lei n.º 13/85 pois o prédio vendido integra a "Baixa Pombalina" e está classificado como imóvel de interesse público, motivo por que a sua venda não poderia ser efectuada sem prévia comunicação ao Ministro da Cultura, comunicação que não existiu no caso.

1.3 A Fazenda Pública, notificada para responder, veio fazê-lo nos termos constantes do articulado de fls. 109 a 111, apresentado pelo Representante da Fazenda Pública (RFP) junto do TT1.ªL, sustentado que o recurso deve ser julgado improcedente(() No entanto, ulteriormente, em 12 de Dezembro de 2000, o RFP veio, a fls. 167, requerer a junção aos autos de um parecer do Centro de Estudos e Apoio às Políticas Tributárias da Administração-Geral Tributária, no sentido de que a Administração tributária tem fundamento para pedir a anulação da venda, e dar conta de que é essa a «posição definitiva da Fazenda Pública relativamente à questionada venda». Por isso, abstemo-nos de referir, ainda que por resumo, a posição que assumiu na resposta. Em 13 de Dezembro de 2000 o RFP veio ao processo de execução fiscal pedir a anulação da venda (cfr. fls. 292/293 do processo de execução fiscal); por despacho do Juiz do TT1.ªL, a fls. 230, a apreciação do pedido de anulação de venda foi relegada para momento ulterior à resolução do recurso judicial, atenta a relação de prejudicialidade entre este e aquele.

).

1.4 Notificada para responder, a adquirente do bem veio dizer (cfr. fls. 123 a 124(() A adquirente solicitou a fls. 122 a substituição da primeira resposta apresentada, que se encontra de fls. 118 a 121.

)) que o recurso da Executada carece de fundamento. Isto, em síntese, com a seguinte argumentação: - é «terceiro de boa fé», «não podendo ser-lhe oposto qualquer efeito resultante do recurso interposto, e muito menos nos termos em que este vem formulado»; sem prescindir, «Por mera cautela e por dever de patrocínio» - porque a venda por negociação particular foi ordenada em consequência da não ter sido possível a venda por propostas em carta fechada, ou seja, de acordo com o disposto no art. 325.º, n.º 1, alínea a), do CPT, não é aplicável à situação o n.º 2 do mesmo artigo, «disposição cuja violação serve de fundamento à executada para o recurso»; em todo o caso, porque o despacho que aceitou a proposta apresentada em sede de negociação particular foi precedido de autorização do Director Adjunto da 1.ª Direcção de Finanças de Lisboa, mesmo que se considerasse aplicável o disposto no n.º 2 do art. 325.º do CPT, haveria de considerar-se respeitado o disposto neste preceito; - porque a venda do imóvel foi efectuada pela melhor oferta apresentada, «são absolutamente irrelevantes as considerações da executada sobre o eventual valor do prédio»; - «Não existem quaisquer dúvidas» que o bem vendido «constitui parte dos bens anunciados para a venda judicial marcada para 09/09/99»; - o despacho que ordenou a venda por negociação particular e o despacho que adjudicou o prédio «são actos de mero expediente, insusceptíveis de recurso (artº. 679º do CPC)».

- a venda do prédio foi devidamente autorizada pelo Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), nos termos do art. 17.º da Lei n.º 13/85, de 6 de Julho.

1.5 Foi entretanto(() Entre o despacho que ordenou a notificação do RFP e da adquirente para se pronunciarem sobre o recurso judicial e a apresentação das respostas.

) junta aos autos pela Executada cópia da sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa (TCL) pela qual foi declarada a falência da Executada (cfr. fls. 98 a 108).

1.6 O Representante do Ministério Público junto do TT1.ªL emitiu parecer (de fls. 133 a 135(() A fls. 82v.º/83 já o Representante do Ministério Público junto do TT1.ªL emitira parecer, se bem que na sequência da vista que lhe foi dada para se pronunciar, querendo, sobre o pedido de apoio judiciário formulado pela Executada no recurso que interpôs ao abrigo do art. 355.º do CPT, ou seja, em momento processualmente inadequado (note-se que ainda não tinham sido ainda ordenadas as notificações a que alude o art. 355.º, n.º 4, do CPT).

)) no qual sustentou, em resumo, que a venda do imóvel por negociação particular foi efectuada sem que fosse precedida por tentativa de venda por propostas em carta fechada, violando-se assim o disposto nos arts. 322.º, n.º 1, e 325.º, n.º 1, alínea a), do CPT.

Mais sustentou, «em relação ao disposto no nº 2 do referido artº 325º», que «ainda que se entenda que a informação de fls. 88 (ofº 1500 da Direcção de Finanças de 18.1.2000) constitua a autorização ali prescrita para a referida venda sempre se dirá que a mesma não foi precedida de qualquer proposta fundamentada do recorrido [(() A referência a recorrido deverá entender-se como reportando-se ao Chefe do SF3.ªBFL.

)]» e que «se nos reportarmos à autorização de 3.11.99 pelo Ofº nº 27560, que nos parece ser a que deve ser considerada, a mesma define claramente que a venda por negociação particular abrange toda a unidade económica L... e não só o imóvel».

Assim, concluiu aquele Magistrado, porque as violações em causa, «na medida em que relevam substancialmente na decisão da causa», integram a nulidade a que se refere o art. 201.º, n.º 1, do CPC, «a venda deve ficar sem efeito, declarando-se nulos os despachos que a determinaram (art. 909º nº 1 al. c. do CPC)».

Requereu a junção aos autos do parecer referido na nota de rodapé com o n.º 4.

1.7 O Juiz do TT1.ªL começou por rebater a alegação da adquirente do prédio no sentido da irrecorribilidade dos despachos por serem de mero expediente, argumentando que tais despachos «têm consequências directas quanto ao fundo da causa - a satisfação dos créditos exequendos e de eventuais credores com garantia real». Para a eventualidade de assim não se considerar, sempre adiantou que, então, haveria que considerar que o acto posto em causa era a venda e, ao abrigo do princípio previsto no art. 97.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária (LGT), haveria que ordenar a convolação do meio processual para anulação de venda.

Depois, em síntese, considerou que o despacho do Chefe do SF3.ºBFL que ordenou a venda por negociação particular, porque foi proferido depois de gorada a venda por propostas em carta fechada, e «sem discutir agora o que é que estava em venda», não carecia da autorização prévia do Director de Finanças, motivo por que tal despacho, contrariamente ao que sustenta a Executada, não viola o disposto no art. 325.º, n.º 2, do CPT, pois integra a previsão da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo.

No entanto, considerou que o referido despacho padece de nulidade, pois «só pode ser ordenada a venda daquilo que foi penhorado e o que acontece é que foi posta à venda coisa diferente da...

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