Acórdão nº 12868/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Junho de 2004

Magistrado ResponsávelCristina dos Santos
Data da Resolução09 de Junho de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

José ....., com os sinais nos autos, vem impugnar o despacho de Sua. Exa. o Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna datado de 04.07.03 que negou provimento ao recurso hierárquico por si interposto do despacho do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública datado de 31.01.03 que por sua vez confirmou o despacho do Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa, que confirmou o despacho de 07.03.02 do Comandante da Divisão da Polícia de Segurança Pública de Loures que lhe aplicou a pena de 20 dias de suspensão, concluindo como segue: A. O recorrente foi punido com a pena disciplinar de 20 dias de suspensão sem estar provado que a sua conduta fosse infractora do dever de aprumo da alínea f) do n°2 do artigo 16° do RD/PSP.

B. As versões dos factos apresentados pelo participante e recorrente não têm o apoio de nenhuma prova.

C. O recorrente e o participante são amigos de longa data e admitem-se mutuamente todos os tipos de brincadeiras.

D. Após um trato jocoso do colega Cardoso, que foi o participante, o recorrente tirou a arma do coldre, tirou-lhe o carregador, agarrou-a pelo cano e apontou a coronha àquele, que como é hábito, sorriu.

E. A atitude do recorrente não foi típica, nem ilícita, nem culposa, pois foi uma mera resposta a uma brincadeira iniciada pelo colega, pelo que não pode ser punível.

F. A acção do recorrente não era, nem foi idónea para provocar qualquer reacção negativa no colega por haver manifesta impossibilidade do objecto.

G. Já em despacho anterior do Director Nacional da PSP de 22 de Abril de 2003 foi admitido que não ficou provado que o recorrente tivesse agido como consta da participação.

H. Logo, como faltam provas devia ter sido accionado o princípio "in dúbio pró reo", como impõe o n°2 do artigo 32° da CRP, com referência ao n°10 da mesma norma, I. É "A Administração (que ) tem de provar os factos imputados ao arguido. Se o não fizer, terá de o considerar ilibado de todas as acusações ", já que "o arguido não tem de demonstrar a sua inocência em processo disciplinar: esta presume-se ..." (Par. No Processo n°76-DI-10, in Rei. Prov. Just, 1977, págs. 136 e 137).

J. Para a descoberta da verdade material, em sede de recurso hierárquico o recorrente requereu a acareação com o colega, pretensão essa indeferida por ser "desenquadrado do procedimento ".

K. Entende o recorrente que o indeferimento desse requerimento é violador do seu direito de audiência e defesa, consagrado no n°3 do artigo 269° do CRP.

L. Ao ser punido sem qualquer prova, o despacho recorrido ofende o conteúdo essencial de um direito fundamental do recorrente, conforme dispõe a alínea d) do n°2 do artigo 133° do CP A, por violação dos princípios "in dúbio pró reo", a presunção de inocência e de audiência e defesa, consagrados nos artigos 32°, n°2, por referência ao n°10, e 269°, n°3, ambos da CRP.

* A AD respondeu no sentido de ser negado provimento ao recurso.

* O EMMP junto deste TCA Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

* Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos Adjuntos, vem para decisão em conferência.

* Com base nos documentos juntos aos autos e no PA apenso, julga-se provada a seguinte factualidade: 1. Por despacho datado de 22.11.2000 do Comandante da Divisão da Polícia de Segurança Pública (=PSP) de Loures foi instaurado ao A o procedimento disciplinar nº 2000LSB00785DIS - fls. 2 e 5 PA apenso.

  1. Em sede de procedimento disciplinar nº 2000LSB00785DIS, contra o A foi formulada a acusação que se transcreve: "(..) = ACUSAÇÃO = Nos termos do Artigo 79°., n°. 2 e de harmonia com o disposto no Artigo 80°., ambos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n°. 7/90 de 20 de Fevereiro, deduzo a seguinte acusação ao Agente M/144749, JOSÉ ....., do efectivo da Divisão de Loures, do Comando Metropolitano de Lisboa, da Polícia de Segurança Publica, arguido no processo disciplinar NUP 2000LSB00785DIS.

  2. No dia 17NOV2000, pelas 01H35, na Praça do Município em Torres Vedras, ao passar pelo seu colega Cardoso, que se encontrava de sentinela à 74a. Esquadra, tocou-lhe com um dedo do boné, este em resposta chamou-lhe "Cepa Santos".

  3. O arguido entrou na Esquadra e aí esteve pouco tempo.

  4. Após sair da Esquadra e ao dirigir-se para o carro patrulha, retirou a arma de serviço do coldre e apontou-a ao seu colega Cardoso, causando-lhe medo.

  5. Com a conduta acima descrita, o arguido violou em acumulação, os deveres de: Zelo, previsto no artº 7º n°. 2 alínea b), conjugado com o art°. 9°., n°. l e 2 alínea f); Correcção, previsto no art°. 7°. n°. 2 alínea i), conjugado com o artigo 16°., n°.s l e 2 alínea m), todos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n°. 7/90 de 20 de Fevereiro.

  6. Não tem circunstâncias dirimentes, previstas no artigo 51°., tem como atenuantes as circunstâncias, previstas nas alíneas b), f) e h) do n°. l do artigo 52°. e tem como agravantes as circunstâncias previstas nas alíneas d), e f) do n°. l do artigo 53°., todos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n°. 7/90 de 20 de Fevereiro.

  7. À infracção cometida é aplicável a pena de suspensão, prevista no artigo 25°.n°.l, alínea d), face ao disposto no artigo 46°. conjugado com o artigo 43°., todos do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n°. 7/90 de 20 de Fevereiro.

    Lisboa, 11 de Outubro de 2001 (..)" - fls. 52 PA apenso.

  8. O A foi notificado pessoalmente da acusação em 23.10.01, conforme certidão assinada pelo seu punho a fls.72 PA apenso, nos seguintes termos: "(..) = NOTIFICAÇÃO DA ACUSAÇÃO = Nos termos do disposto no n°.l do Artigo 81°., do Regulamento Disciplinar da Polícia de Segurança Pública (RD/PSP), aprovado pela Lei n°.7/90, de 20 de Fevereiro, notifico o Agente M/144749, JOSÉ ....., do efectivo da Divisão de Loures, do Comando Metropolitano de Lisboa da Polícia de Segurança Pública (PSP), da Acusação que lhe deduzi no Processo Disciplinar n°.2000LSB00785DIS, cuja cópia lhe entrego, neste momento, em anexo à presente notificação.

    Marco-lhe o prazo de 10 (dez) dias úteis, para apresentar a sua defesa. Mais fica notificado que, nos termos do disposto no Artigo 83°., do mesmo RD/PSP, a sua defesa constitui a resposta à acusação, na qual deverá ser requerida toda a prova, designadamente a testemunhal, com indicação dos factos sobre os quais cada testemunha deve depor, que o número de testemunhas não pode exceder 20 e para cada facto não podem ser indicadas mais de 3 e que para elaboração da defesa escrita pode, por si ou seu representante, consultar o processo no Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, sito na Avenida António Augusto de Aguiar n°.20, 7°. Andar, 1050 Lisboa, das 09HOO às 12HOO e das 13H30 às 7HOO, em dias úteis.

    Notifico-o ainda de que, nos termos do disposto no n°.9 do Artigo 61°., do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e "Agentes da Ádtaimstráçlo Central, Regional è Local (EDFAACRL), aprovado pelo Decreto-Lei n°.24/84, de 16 de Janeiro, aplicável ao pessoal da PSP, por força do disposto no Artigo 66°., do referido RD/PSP, a falta de resposta dentro do prazo marcado, vale como a sua efectiva audiência, para todos os efeitos legais. (..) Declaro que, hoje, pelas 14 H 15, fui notificado da acusação que me foi deduzida, no Processo Disciplinar n°.2000LSB00785DIS, através do original da notificação que me foi entregue, bem como cópia da referida acusação, tendo ficado ciente de todo o seu conteúdo. (..)".

  9. O A apresentou defesa por escrito - fls.63/69 PA apenso.

  10. Em sede de procedimento disciplinar nº 2000LSB00785DIS, foi elaborado o Relatório Final que se transcreve: "(..) RELATÓRIO O presente processo disciplinar foi organizado com base na participação de folhas 3, dos autos, elaborada pelo Agente Principal n°. 4420/135698, Amilcar Manuel Nunes Cardoso, do efectivo da Divisão de Loures, na qual dá conhecimento que no dia 17NOV2001, cerca das 01H35, na Praça do Município, em Torres Vedras, quando o Agente 3787/144749, JOSÉ ....., da mesma Divisão, passou por si tocou-lhe no boné, em reposta chamou-lhe "Cepa Santos". O Agente Santos, ao dirigir-se para o Carro Patrulha, tirou a arma de serviço, do coldre, puxou a corrediça à retaguarda, introduziu uma munição na câmara e apontou-a na sua direcção, De seguida retirou a munição da câmara, entrou no veículo policial e seguiu o seu destino.

    ANALISADOS OS AUTOS APUROU-SE O SEGUINTE: 1. Ouvido o participante a folhas 13, dos autos, declarou que confirma a participação que elaborou. Disse ainda que em tom de brincadeira chamou "Cepa Santos" ao arguido, porque é usual assim ser chamado pelos colegas. O arguido apontou a arma na sua direcção, depois de a retirar do coldre e da municiar a uma distância de cerca de 4 a 5 metros. Nos dias posteriores, o arguido, mostrou-se arrependido pela atitude que tomara.

  11. Ouvida a testemunha policial a fls. 14 dos autos, declarou que não presenciou o arguido a apontar a arma ao seu colega Cardoso. No entanto viu que o arguido, quando entrou na viatura policial por si conduzida, trazia a arma na mão, segurando-a pelo cano, tendo-a colocado no coldre. Naquele momento, o Agente Cardoso aproxima-se do carro patrulha e perguntou ao arguido se aquilo se fazia, não tendo obtido qualquer resposta. Depois de terem abandonado o local o arguido disse-lhe que tinha apontado a arma ao colega empunhada pelo cano e em brincadeira por aquele lhe ter chamado "Cepa Santos".

  12. Ouvido o arguido a fls. 20 dos autos declarou que: 3.1. Depois de ter ido à Esquadra de Torres Vedras receber uma recomendação do graduado de serviço, quando passou pelo seu colega Cardoso, que se encontrava nas galerias do Largo do Município, muito próximo da Esquadra, chamou-lhe "Cepa Santos", o que ele arguido considerou uma brincadeira; ele arguido também na brincadeira, tirou a sua pistola do coldre, retirou-lhe o carregador...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT