Acórdão nº 00081/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Outubro de 2004 (caso None)

Magistrado ResponsávelJosé Gomes Correia
Data da Resolução12 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo: 1. RELATÓRIO 1.1.- T... e outro, com os sinais identificadores dos autos, recorreram para o TCA da decisão do Mm° Juiz do Tribunal Tributário de 1a Instância de Lisboa que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal nº... do Serviço de Finanças de Odivelas, que contra eles pende após reversão, por dívidas da devedora originária S... - Sociedade de Prestação de Serviços à Indústria Gráfica, Lda., respeitante a liquidação oficiosa de IVA/1997, no montante de 19 371,41 euros (3 883 620$00) apresentando, para o efeito, alegações nas quais concluem: 1. - Decorre do Art.° 13°, n.° l, do C.P.T (na redacção ao tempo em vigor, resultante da Lei n.° 52-C/96, de 27.1) uma presunção de exercício da gerência de facto a partir da gerência de direito; 2.- Para ilidir tal presunção, não será necessário fazer a prova contrária ao facto presumido, bastando, por qualquer meio de prova, abalar a convicção a que ela conduz; 3.- No caso em sub judice, os recorrentes opuseram-se à execução fiscal contra si revertida, alegando factos consistentes no não exercício factual e material das funções de gerentes na referida sociedade, no período a que se reportava a dívida exequenda, vencida em Abril de 1999 e requerendo no seu articulado a produção de prova testemunhal que se consubstanciou nos depoimentos das testemunhas arroladas, documentados pela Acta de fls. 29 a 31; 4- Da referida Acta a fls. 29 a 31 dos autos consta, designadamente, que foi referido pelas testemunhas M... e A ... que os oponentes nunca deram quaisquer ordens aos empregados, nunca contactaram com os fornecedores da sociedade, nem tomaram decisões na Empresa, tendo ademais a segunda testemunha salientado que os oponentes não conheciam sequer os empregados, os colaboradores, nem os ditos fornecedores da sociedade, sendo que, raramente, se deslocavam à sede da sociedade e que, quando lá iam, era apenas para almoçar com os sobrinhos; Tal testemunha foi mesmo mais longe referindo que M..., seu marido, era quem exercia as funções de gerente na S..., Lda, acumulando-as com o emprego na A ..., LDA, A própria testemunha M..., afirmou que os oponentes eram pessoas idosas e doentes, que não exerciam qualquer profissão, e que nunca exerceram a gerência de facto da S..., LDA; Por último, a testemunha AMÉRICO ..., referindo-se às relações comerciais havidas entre a Empresa de que é sócio e a S..., LDA, afirmou que os assuntos foram sempre tratados com o Sr. M... e que das letras de câmbio por ele recebidas com aceites da referida S..., LDA., nunca constaram as assinatura dos oponentes, pessoas que, aliás, não conhece, nunca viu nas frequentes deslocações que fez àquela Empresa para receber prestações, nem nunca manteve qualquer contacto, nem pessoalmente, nem a título de negócios; 5- Tendo o Tribunal recorrido considerado como não provados todos os factos acima referidos, em que os oponentes haviam traduzido a alegação do seu não exercício material e factual da gerência na sociedade devedora originária, é manifesto que incorreu este num erro notório na apreciação da prova concretamente consubstanciada nos depoimentos das testemunhas arroladas pelos oponentes e documentados na Acta de fls. 29 a 31, o qual aqui expressamente se invoca e requer seja suprido nos termos e para os efeitos do Art.° 690°-A, n.° l, alíneas a) e b) do C.P.C.; 6- Razão pela qual, a sentença recorrida é ilegal, devendo ser substituída, na parte concretamente respeitante aos supra mencionados pontos de facto considerados como não provados e, por isso incorrectamente julgados, por decisão que necessariamente tenha em consideração os depoimentos consubstanciados na Acta de fls. 29 a 31.

NESTES TERMOS E LOUVANDO-SE QUANTO AO MAIS NOS FACTOS CONSTANTES NOS AUTOS, ENTENDEM QUE DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REFORMULADA A DECISÃO DA 1ª INSTÂNCIA, POR OUTRA QUE, NECESSARIAMENTE, RECONHEÇA O NÃO EXERCÍCIO MATERIAL E FACTUAL DAS FUNÇÕES DE GERENTES PÔR PARTE DOS OPONENTES NA SOCIEDADE DEVEDORA ORIGINÁRIA, CONSIDERANDO COMO PROVADOS OS FACTOS CONCRETOS PELOS QUAIS OS MESMOS TRADUZIRAM ESSE NÃO EXERCÍCIO DE FACTO DAS FUNÇÕES DE GERENTES, ATENTOS OS MEIOS DE PROVA CONSUBSTANCIADOS NAS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS E DOCUEMNTADOS NA ACTA DE FLS.29 A 31.

1.2.- Não houve contra - alegações.

1.3.- O EPGA emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

1.4.- Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir em conferência.

*II.- FUNDAMENTAÇÃO 2.1.- DOS FACTOS: Na sentença recorrida, em vista a prova produzida, deram-se como provados os seguintes factos: 1.- Corre termos no Serviço de Finanças de Odivelas o processo de execução fiscal n.° ..., com vista à cobrança de dívida de IVA do ano de 1997, cujo prazo de cobrança voluntária terminou em 99.04.15 (fls. 13), instaurado contra a devedora originária S...- Sociedade de Prestação de Serviços à Indústria Gráfica, Lda., no qual, pôr despacho do Chefe do Serviço, de 02.03.26, foi ordenada a reversão contra os ora oponentes, por em nome da sociedade executada não terem sido encontrados bens e ser desconhecida a sua sede actual, bem como se continua a exercer a actividade (fls. 11/12).

  1. - Em 96.02.07, por escritura pública, foi a S..., LDA constituída pelos ora oponentes, únicos sócios e nomeados ambos gerentes na mesma data (fls. 14/15).

  2. - A sociedade obrigava-se com a assinatura de um gerente (fls. 15).

  3. - Em 01.02.06, o oponente marido cedeu a sua quota de 997,60 euros (200 000$00) ao sobrinho, Sr. M..., data em que ambos os oponentes declararam renunciar à gerência da S..., Lda (fls.15).

  4. - Na mesma data foi nomeado gerente da sociedade executada o Sr. M... (cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial, a fls.14/15).

xCom interesse para a decisão da causa não se provaram outros factos, nomeadamente, não se provou que os oponentes não exerceram funções de gerência efectiva na executada originária, desde a data de constituição da sociedade até à data em que renunciaram ao cargo, em especial: a)- que nunca tomaram qualquer decisão naquela sociedade, não deram ou transmitiram ordens aos empregados, nem contactaram com quaisquer fornecedores; b)- que se limitaram a outorgar na respectiva escritura pública de constituição da sociedade; c)- que nenhum dos oponentes se deslocava, nem regular, nem esporadicamente, às instalações da sociedade, não conhecendo os seus empregados, os colaboradores nem os fornecedores; d)- que quem sempre tratou dos assuntos e negócios da S..., LDA foi o sobrinho dos oponentes, Sr. M....

xA fase instrutória do processo foi preenchida pela prova testemunhal, num total de três testemunhas: o sobrinho e respectiva mulher e um cliente da S..., Lda (cfr. Acta de fls. 29 a 31).

Das alegações apresentadas pelos oponentes (a fls. 33/36) decorre que consideram aqueles que, face aos depoimentos prestados pelas testemunhas, no sentido geral de os colocarem à margem de qualquer acto de gestão praticado na e pela S..., LDA e, até, longe das suas instalações, lograram cumprir o ónus de prova que sobre eles impendia.

Já a RFP, nas suas alegações (a fls. 37/40), salienta diversas contradições verificadas entre os testemunhos do sobrinho dos oponentes e a sua mulher, considerando que, mesmo que os oponentes tivessem passado procuração ao sobrinho para exercer as funções de gerente, tal facto não os isentava de responsabilidade, nos termos do C. Civil, concluindo não terem aqueles cumprido os ónus probatórios que sobre eles recaiam, quer afastando a gerência de facto, quer provando a ausência de culpa pela insuficiência do património societário.

Valorando a prova produzida e sujeita à livre apreciação do Tribunal, formou-se convicção no sentido de não considerar provados os factos supra referidos, porquanto, dos depoimentos prestados pelas testemunhas ressaltam claramente as contradições em que incorrem, alguma inverosimilhança, o que, aliado ao facto de ter sido o tribunal a presidir à diligência probatória, lhe permitiu apreender as reacções produzidas perante as questões colocadas, sendo algumas de um misto de estranheza e de surpresa (caso da segunda testemunha) e, também, de manifesta falta de convicção perante a razão de ciência do testemunho prestado (maxime, a terceira testemunha), senão vejamos: • A testemunha M..., sobrinho dos oponentes, disse que aqueles constituíram a S..., LDA para o ajudar, pois à data encontrava-se desempregado. Porém, a sua esposa, segunda a testemunhar, disse não saber da razão que levara os oponentes a constituir a sociedade e que o marido, M..., à data (1996) não estava desempregado, acumulando a gerência da S..., LDA com o emprego que tinha na A ...r, em Odivelas. Pôr sua vez, a terceira testemunha, cliente da S..., LDA e amigo de M... ha cerca de 20 anos, referiu não ter conhecimento de aquele alguma vez ter estado desempregado.

• A testemunha M... mais disse que, aquando da constituição da S..., LDA os tios, ora oponentes, lhe passaram procuração para exercer as funções de gerente daquela sociedade, sendo ele quem assinava os cheques. No entanto, também disse que não ficara como sócio da S..., LDA, na altura em que aquela fora constituída porque, à data, estava inibido do uso de cheques pelo Banco de Portugal, afirmação que a mulher, segunda testemunha, não corroborou, dizendo nada saber sobre o assunto e demonstrando estranheza perante a pergunta. Também a terceira testemunha, empregado bancário reformado (sendo, aliás, através dessa profissão que conheceu a testemunha M..., cfr. disse), afirmou desconhecer a referida inibição do uso de cheques. Procuração?! Para quem estava inibido do uso de cheques, como o próprio afirmou?! • Afirmou a testemunha M... a que enquanto durou a inibição do uso de cheques, era outrém quem assinava os cheques da sociedade, pessoa de que não recordava o nome e a quem os tios, ora...

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