Acórdão nº 00295/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Janeiro de 2005 (caso None)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução11 de Janeiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 MARIA... (adiante Oponente, Executada ou Recorrente) deduziu oposição à execução fiscal que, instaurada pelo 2.º Serviço de Finanças da Covilhã (2.º SFC) contra a sociedade denominada "Txteis...." para cobrança coerciva de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares dos anos de 1995 e 1996, reverteu contra ela, na qualidade de sucessora de João..., que a Administração tributária (AT) considerou responsável subsidiário pelas dívidas exequendas.

1.2 A oposição foi julgada improcedente por sentença do Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Castelo Branco.

1.3 A Oponente recorreu da sentença para este Tribunal Central Administrativo e o recurso foi admitido, a subir imediatamente nos próprios autos e com efeito suspensivo.

1.4 A Recorrente apresentou alegações, que resumiu nas seguintes conclusões: « A. Ao decidir que a falta de alegação pelo órgão de execução fiscal de culpa da executada na situação de insuficiência patrimonial da devedora principal corresponde a falta de fundamentação, o Tribunal a quo não aplicou correctamente o direito, pois deveria ter anulado o despacho de reversão em lugar de considerar que é à Fazenda Pública e em sede de oposição, que cumpre alegar e provar a culpa do marido da ora recorrente na situação de insuficiência patrimonial da devedora principal.

B. A declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, constitui uma exigência legal expressa que não pode ser suprida posteriormente em sede de oposição à execução pelo representante da Fazenda Pública, termos em que se conclui pela ilegalidade do despacho de reversão e rectius, pela ilegalidade da sentença que, em lugar de anular o despacho de reversão, o manteve, violando assim o disposto no artigo 23.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária.

C. Por força do princípio da interpretação conforme à constituição, o artigo 29.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária deveria ter sido interpretado pelo Tribunal a quo de modo a abranger apenas aquelas situações em que a responsabilidade tributária subsidiária foi constituída em vida do de cuius, sob pena de violação grave das garantias de defesa do contribuinte e do exercício da função jurisdicional quando a responsabilidade tributária subsidiária dos herdeiros se funda numa presunção legal de culpa do de cuius.

D. Atentas as consequências dos artigos 20.º, n.º 1 e 202.º da Constituição, o órgão de execução e bem assim o Tribunal a quo, deveriam ter desaplicado o 29.º, n.º 2 da LGT no caso sub iudice, atenta a substancial redução das garantias de defesa inerentes à presunção legal de culpa, bem como a redução substancial do acesso à prova numa matéria em que está em causa a responsabilidade delitual ou extracontratual, o que se afigura incompatível com a garantia da proibição da «indefesa» (artigo 21.º, n.º 1 da Constituição) e impeditivo do exercício da função jurisdicional (artigo 202.º da Constituição).

E. Nesta conformidade, o despacho de reversão carece de base legal, o que importa violação de lei e constitui causa de anulação, e a sentença recorrida aplicou uma norma legal em termos incompatíveis com a Constituição, o que importa violação dos artigos 20.º e 202.º da Constituição.

F. Resulta da matéria de facto provada em audiência que o marido da ora recorrente exerceu o seu cargo observando todos os deveres de zelo e diligência que lhe são exigidos, nomeadamente pelo artigo 78.º do Código das Sociedades Comerciais, e que não teve culpa, nos termos em que tal pressuposto tem vindo a ser caracterizado pela jurisprudência do STA (vide Acórdão do STA de 12 de Abril de 2000, proferido no recurso n.º 24.769 e Acórdão do STA de 22 de Junho de 1999, proferido no recurso n.º 23.882), na insuficiência patrimonial verificada na pessoa da sociedade Têxteis Moura & Matos, SA.

G. Resulta da prova efectuada que foram circunstâncias de mercado alheias à vontade dos administradores que determinaram a situação patrimonial em que a devedora principal se veio a encontrar.

H. Em 1999 foram pagas todas as dívidas tributárias à excepção daquelas que se encontravam em regularização no âmbito do chamado "Plano Mateus", onde se inseria a dívida em causa nos presentes autos.

I. No termo do processo especial de recuperação de empresa, existiam fundos na empresa que permitiam pagar as dívidas fiscais abrangidas pelo chamado "Plano Mateus" J. Tais dívidas apenas não foram pagas devido ao regime especial de cumprimento a que estavam sujeitas, tendo aqueles fundos integrado, com os demais activos, o estabelecimento transmitido no âmbito do processo especial de recuperação de empresa.

K. Existiam, por isso, fundos na empresa capazes de responder pelas dívidas fiscais em causa nos presentes autos, o que exclui a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes.

L. Ao julgar a oposição improcedente dela absolvendo a Fazenda Pública por entender que não foi ilidida a presunção legal de culpa decorrente do artigo 13.º do CPT e que a empresa não tinha fundos capazes de responder pela dívida fiscal o Tribunal a quo procedeu a uma insuficiente valoração do material probatório, mormente do que resultou da prova testemunhal gravada em audiência.

M. Por essa razão, a sentença recorrida errou na apreciação dos factos e, consequente, na aplicação do direito, tendo violado o artigo 13.º do CPT e o artigo 350.º, n.º 2 do Código Civil, quer por considerar que a presunção legal de culpa não foi ilidida, quer por considerar que a empresa não tinha fundos capazes de responder pelas dívidas fiscais em causa nos presentes autos.

Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente por provado e, em consequência, anulada a decisão recorrida e declarada procedente a oposição apresentada, assim se fazenda a acostumada Justiça !» (1) 1.5 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.6 Entretanto, o 2.º SFC comunicou ao processo o pagamento integral da dívida exequenda e a consequente extinção da execução.

1.7 O Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Castelo Branco, considerando que a execução fiscal foi extinta pelo pagamento, o que tornava inútil o prosseguimento da oposição, julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

1.8 Inconformada com essa decisão, a Oponente dela recorreu para este Tribunal Central Administrativo, sendo o recurso admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo.

1.9 A Recorrente apresentou alegações, que resumiu nas seguintes conclusões: « A. Ao declarar extinta a instância com fundamento em «impossibilidade/inutilidade superveniente da lide», o Tribunal a quo violou o artigo 666.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, uma vez que, face à sentença proferida a fls. 133 a 143, e ao recurso tempestivamente apresentado e admitido por despachos de fls. 148 e 173, já se encontrava esgotado o poder jurisdicional da 1.ª instância.

B. Em consequência, caberia ao Tribunal Central Administrativo, para onde deveriam ter sido remetidos os autos, conforme despacho de fls. 173, decidir sobre uma eventual «impossibilidade/inutilidade superveniente da lide».

C. Ao declarar extinta a instância com fundamento em «impossibilidade/inutilidade superveniente da lide», o Tribunal a quo violou igualmente o artigo 287.º, alínea e) do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do artigo 2.º do CPPT, uma vez que a procedência do recurso sempre permitirá à oponente obter a restituição do indevido, não tendo havido no caso dos autos qualquer renúncia expressa ao direito de oposição à execução (artigo 9.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária), pelo que não ocorre impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.

D. Mais, se o pagamento voluntário extingue a execução (artigo 269.º do CPPT), tal não significa que seja inútil, na perspectiva da tutela dos direitos e interesses do executado e do controlo da legalidade das decisões da Administração, a decisão que sobre o mérito da oposição venha a recair, quer em sede de 1.a instância, quer em sede de tribunal de recurso, pois tal decisão gera na esfera do executado que pagou voluntariamente o direito à restituição do indevido, o que encontra apoio expresso no artigo 9.º, n.º 3 da LGT, o qual não pode deixar de se considerar aplicável, directamente ou por analogia, à oposição judicial em processo de execução fiscal.

E. A declaração judicial pelo Tribunal ad quem de que a presunção legal de culpa foi ilidida e de que a empresa tinha fundos capazes de responder pelas dívidas fiscais em causa nos presentes autos, terá como consequência a falta de verificação dos pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária da oponente, ora agravante, tomando sem objecto o pagamento realizado ao abrigo do regime fiscal excepcional de regularização de dívidas tributárias constante do Decreto-Lei n.º 248-A/2002, de 14 de Novembro, gerando, consequentemente, o direito da oponente a receber tudo quanto pagou na qualidade de responsável tributária subsidiária, pelo que se mantém a utilidade na procedência do recurso interposto da sentença de fls. 133 a 143, que julgou improcedente a oposição apresentada pela ora agravante.

Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente por provado e, em consequência, anulada a decisão recorrida e decidido o recurso de apelação tempestivamente apresentado, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA !».

1.10 Não foram apresentadas contra alegações.

1.11 Recebido o processo neste Tribunal, foi dada vista ao Ministério Público, tendo o Procurador-Geral Adjunto emitido parecer no sentido do provimento de ambos os recursos. Para tanto, expendeu os seguintes considerandos: - quanto ao recurso do despacho que julgou extinta a instância: «(...) atento o disposto no artº 9º nº3 , 95 e 96 da L.G.T., não poderá deixar de dar-se razão ao recorrente.

É que, se o pagamento voluntário extingue a execução, isso não significa que ocorra inutilidade superveniente da lide já que, para a oponente poder fazer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT