Acórdão nº 0876/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

- Relatório - 1 – A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 29 de Junho de 2010, que julgou totalmente procedente a impugnação deduzida por A…, com os sinais dos autos, contra as liquidações de IRS e juros compensatórios n.ºs 2002 5530051853 e 2002 5530026886, referentes aos anos de 1997 e 1998, apresentando as seguintes conclusões: 1- Discute-se nos autos as liquidações do IRS dos anos de 1997 e 1998, na parte em que se encontram afectadas pelos rendimentos (da categoria A) obtidos pelo impugnante como trabalhador emigrante na Alemanha.

2 - Nesse período, o impugnante esteve ausente de Portugal durante mais de 183 dias mas manteve em território português a habitação, sua e do restante agregado familiar incluindo o seu cônjuge; 3 - Os rendimentos obtidos na Alemanha foram espontaneamente declarados na 1ª declaração familiar, onde consta expressamente que os sujeitos passivos não eram residentes no estrangeiro, sendo certo que o impugnante manteve o seu domicílio fiscal em Portugal; 4 - O art. 4° da Convenção para evitar a dupla tributação internacional entre Portugal e a Alemanha remete a definição de "residente" para a lei interna dos Estados contratantes; 5 - A lei portuguesa, nomeadamente o artº. 84° CC e os artigos 14°, 15° e 16° CIRS, com a redacção então em vigor, consideravam que os contribuintes, mesmo os emigrantes, eram "residentes em território português" se aqui mantivessem habitação em condições que fizessem supor a intenção de a habitar ou aqui mantivesse a residência do outro cônjuge; 6 - Nos termos do DL 463/79, de 30 de Novembro, os contribuintes portugueses devem possuir um "número de identificação fiscal" a que está obrigatoriamente associado um domicilio electivo, designado "domicilio fiscal", normalmente fixado na residência habitual ou, havendo várias, onde o contribuinte repute que se situa a sua estada principal ou o seu "centro de interesses vitais"; 7 - Ao optar por não comunicar a sua ausência do território português impugnante manteve o seu domicílio electivo e fiscal em Portugal, que é o primeiro dos critérios referidos no n° 1 do art. 4° da Convenção; 8 - Além disso, o n° 2 do mesmo art. 4° da CDT configura diversas conexões decisivas em caso de competência cumulativa de ambos os Estados contratantes, entre as quais a localização de habitações permanentes à disposição do trabalhador, a localização do centro de interesses pessoais e económicos, a nacionalidade, todos favoráveis à competência tributária de Portugal; 9 - Muito respeitosamente, parece que esta norma nega apoio à interpretação que serve de base à recente jurisprudência do STA que, por sua vez, fundamenta a decisão recorrida; 10 - Por tudo isso, a AT, através do seu oficio-circulado n.° 20.032, de 31/1/2001, a jurisprudência, nomeadamente, no Ac. STA 01211/05, de 15-3-2006, e a doutrina têm entendido que "basta a residência em Portugal, de um dos chefes do agregado familiar, aferido aos critérios do artº. 16° do CIRS, para que esta arraste, por um princípio da atracção da unidade familiar, a residência dos demais (residência por dependência). Assim, por exemplo, o emigrante português que reside efectivamente na Alemanha, mas cuja mulher permanece em Portugal, é aqui sujeito a tributação numa base universal, incluindo portanto os rendimentos obtidos na Alemanha", Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, Tributação das Operações Internacionais, p. 245 e ss; 11 - A conexão ao direito português, resultante do impugnante fazer parte do agregado familiar que tem residência em Portugal, é perfeitamente legítima e compreensível já que, de acordo com o CIRS o verdadeiro sujeito passivo do imposto é o agregado familiar, representado, em comum e sem distinção de quotas, pelas pessoas a quem incumbe a sua direcção e, objectivamente, pelo conjunto dos seus rendimentos.

12 - Na normalidade das situações de emigração, os rendimentos obtidos no estrangeiro justificam-se, como é presumível no presente caso, pelas necessidades do agregado familiar sedeado no território português, a que o impugnante os destina maioritariamente.

Isto é, o sacrifício da deslocação para o estrangeiro, mais ou menos prolongada, visa obter lá os meios que permitam ter uma vida melhor cá. Só não seria exactamente assim se todo o agregado, ou pelo menos as pessoas a quem incumbe a sua direcção, tivesse emigrado.

13 - Donde resulta a respeitosa discordância com o doutamente decidido na sentença recorrida, nomeadamente no que se refere à interpretação a fazer do artigo 15° da CDT e à decisão de anulação das liquidações na parte impugnada; 14 - Até porque, a liquidação (totalmente) anulada pela decisão recorrida inclui, para além dos rendimentos obtidos na Alemanha, outros rendimentos - perfeitamente identificados e quantificados - obtidos em Portugal que, em rigor não estão impugnados (e nessa parte não deveriam estar abrangidos pela condenação de "anulação") Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Exas, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue improcedente a presente IMPUGNAÇÃO, ou, subsidiariamente, ordene a anulação parcial das liquidações, limitada à parte em que estas estão afectadas pelos rendimentos obtidos no estrangeiro, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos: Nos presentes autos suscita-se, desde logo, a questão prévia da incompetência deste Tribunal em razão da hierarquia.

Com efeito e como se constata das conclusões das alegações de recurso de fls. 137 e segs. a Fazenda Pública, vem pôr em causa os juízos de apreciação da prova feitos pelo Tribunal recorrido, manifestando divergência nas ilações de facto retiradas do probatório e afirmando factos que o Tribunal recorrido não estabeleceu na sentença recorrida.

É o que se apura nomeadamente das conclusões 4ª e 12ª, em que a recorrente refere que no período a que se reportam as liquidações do IRS dos anos 1997 e 1998 «o impugnante esteve ausente de Portugal durante mais de 183 dias mas manteve em território português a habitação, sua e do restante agregado familiar incluindo o seu cônjuge» e que «na normalidade das situações de emigração, os rendimentos obtidos no estrangeiro justificam-se, como é presumível no presente caso, pelas necessidades do agregado familiar sedeado no território português, a que o impugnante os destina maioritariamente».

Ora o que sobre esta matéria se deu como provado na sentença recorrida foi tão somente que «o impugnante mantém uma segunda residência em território português, aonde apenas permanece durante o período de 30 dias ao ano, correspondentes ao período de férias (sic, ponto 4, a fls. 105). Note-se que a decisão recorrida procedeu à análise da situação do sujeito passivo numa perspectiva individual, considerando a determinação do país de residência fiscal independentemente da situação conjugal – cf. Decisão...

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