Acórdão nº 0336/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução01 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO: O ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Ministério Público, veio interpor recurso para este STA da sentença do Mmo. juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida a fls. 360 e segs., na parte em que julgou parcialmente procedente a presente acção de indemnização instaurada pelos AA A…. e mulher B… e C…, com fundamento em violação do direito dos Autores a uma decisão em prazo razoável previsto nos artº20, nº4 da CRP e artº6º da CEDH e condenou o recorrente a pagar uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, no montante de € 10.000,00 (dez mil euros) aos primeiros dois AA e também no montante de € 10.000,00 (dez mil euros) à terceira A., julgando, no mais, a acção improcedente e absolvendo o R. do restante pedido.

O recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1. A responsabilidade civil extracontratual do Estado não pode revestir natureza objectiva, antes tem de se fundar na verificação dos respectivos elementos constituintes, a saber, o facto ou omissão, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade.

  1. No caso de se pretender a condenação do Estado por não ter implementado legislação, meios organizativos e de gestão a que, mesmo que os prazos processuais de um processo sejam todos observados ele tenha uma duração excessiva no seu todo, tal tem de vir devidamente alegado e ser provado, não podendo haver condenação com esse fundamento se não houve alegação prévia.

  2. Os atrasos provocados pela actividade processual das partes interessadas na indemnização não podem ser contabilizados como sendo da responsabilidade do Estado.

  3. A longa pendência do processo de inventário facultativo em causa deveu-se essencialmente a uma actividade processual conflituosa e aguerrida dos interessados, que provocaram numeroso incidentes e delongas, incluindo os AA.

  4. Não se pode assim falar em responsabilidade do Estado por tal exagerada pendência.

  5. A não ser pelas razões expostas no ponto 2 destas conclusões, mas aí não pode haver lugar a condenação do Estado, porque elas não vinham alegadas, nem foram provadas, sob pena de violação do direito à defesa, previsto no artº6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

  6. Na hipótese de se entender que é de atribuir uma indemnização a título de danos não patrimoniais aos AA, a mesma deve ter em conta as consequências que foram provadas do atraso alegado, que no caso se resumem a «forte ansiedade».

  7. O que nos reconduz a uma situação equiparável aquelas em que os lesados estão inclusivamente dispensados de demonstrar qualquer consequência porque, de acordo com a experiência comum, o atraso injustificado na resolução de uma lide em que alguém é interessado, provoca sempre algum desconforto e incerteza que são indemnizáveis de acordo com os critérios que têm vindo a ser seguidos pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

  8. Assim sendo, numa situação destas, tendo em consideração a jurisprudência que tem vindo a ser produzida pelo STA, a indemnização a atribuir a cada um dos AA não poderia exceder os €2.500.

  9. A sentença recorrida, ao condenar o Réu Estado por atrasos que, na sua parte significativa não lhe são imputáveis e ao atribuir duas indemnizações no valor de €10.000, incorreu na violação do disposto designadamente dos artº20º, nº4 da CRP e 6º§1º da Declaração Europeia dos Direitos do Homem.

*Contra-alegaram os AA propugnando pela manutenção da sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II- OS FACTOS A sentença recorrida deu por provados os seguintes factos, que se não mostram impugnados: A) Na sequência do óbito de D…, pai do A. marido, foi instaurada pelos primeiros AA A… e esposa D. B…, acção especial de inventário facultativo, que foi distribuída a 13 de Dezembro de 1981 ao 1º Juízo Cível de Vila Nova de Gaia, tendo-lhe sido atribuído o nº 1633/81, acção essa que a data da presente acção ainda se encontrava pendente.

B) Foram necessários cerca de cinco anos e meio para conseguir tomar declarações à cabeça de casal, demora esta motivada por sucessivos pedidos de escusa para exercer o cabeçalato, de prorrogações de prazo para identificação de interessados e apresentação de relações de bens, tudo isto aliado à necessidade de recurso a cartas precatórias, conforme resulta do doc.1 junto com a contestação do Réu Estado, de fls.53 a 106 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. também o artº3º da pi).

C) Prestadas as declarações pela cabeça de casal em 8 de Maio de 1987, foi pela mesma pedido prazo para a apresentação de bens, que lhe foi fixado em 60 dias, mas tendo, no entanto, a relação sido apenas apresentada em 13 de Junho de 1988, ou seja, treze meses mais tarde (cf. doc. nº2 junto com a contestação do R, a fls. 107-108 dos autos).

D) A relação de bens mereceu sucessivas reclamações pelos interessados, seguidas da realização de inúmeras diligências, algumas das quais através de deprecada, de forma que só em 20 de Fevereiro de 1990 foi possível mandar proceder à descrição de bens (cf. doc. nº3 junto com a contestação do R., de fls.109 a 139 dos autos).

E) Na sequência da conferência de interessados, realizada em 28 de Junho de 1990, foram expedidas em 3 de Outubro de 1990 (após férias judiciais do Verão) cartas precatórias para avaliação de bens (cfr. doc. 4 junto com a contestação do R., a fls.140 e 143 dos autos).

F) Ainda antes de devolvidas tais cartas, já a avaliação suscitava reclamações por parte de alguns interessados, que se mantiveram após conhecimento do resultado das avaliações (cfr. docs. 5 e 6 juntos com a contestação do R., a fls.144-147 e 148-153 dos autos).

G) A 7.10.91 foi dada como concluída a avaliação deprecada.

H) A 31.10.91, os primeiros AA deram entrada de requerimento, solicitando esclarecimentos aos peritos sobre os critérios de avaliação dos bens sitos em …, de igual teor ao doc. 2 junto com a p.i., a fls.10-11 dos autos (cf. também fls. 150-151), tendo sido aberta conclusão para apreciação deste e outros requerimentos em 25.03.1992, tendo sido proferido despacho somente em 21.12.93, ou seja, cerca de 18 meses depois, despacho esse de igual teor ao documento 3 junto com a p.i., a fls.12-13 dos autos, no qual se ordenou que as cartas fossem devolvidas às comarcas deprecadas para obtenção de esclarecimentos por parte dos peritos (cfr. também fls.154-155 dos autos- doc. 7 junto com a contestação do R.).

I) Do despacho de 21.12.93 anteriormente referido vieram os primeiros AA a ser notificados por carta com registo de 5 de Janeiro de 1994, ou seja, cerca de dois anos e dois meses depois do requerimento que lhe deu causa.

J) Entendendo...

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