Acórdão nº 01017/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução01 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A… e outros, inconformados com a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que negou provimento ao RECURSO CONTENCIOSO que interpuseram do acto de indeferimento tácito do PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, que recaiu sobre requerimento por eles apresentado, recorreram para este Supremo Tribunal terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

  1. A sentença recorrida deu como assentes os factos em que os recorrentes fundaram a sua pretensão, ou seja, (i) expropriação por utilidade pública de prédio rústico, do qual parte significativa do mesmo não foi utilizada pela entidade expropriante no prazo legal e para os fins previstos no acto expropriativo; (ii) reconhecimento por acórdão do STA, do direito à reversão relativamente a parte do prédio em causa (iii) os recorrentes nunca lograram obter execução dessa decisão e satisfação da sua pretensão, a reversão de parte do prédio expropriado; (iv) a recorrida foi, entretanto, alienando a diversas entidades vários lotes de terreno destacados da parte do prédio expropriado, em desvio dos fins a que se destinava a expropriação; (v) a recorrida não se pronunciou no prazo legal sobre o pedido formulado pelos recorrentes.

  2. A sentença recorrida subscreveu o enquadramento legal dos factos apresentado pelos recorrentes (D.L. nº 28.797, de 01/07/1938 e Lei nº 2030, de 22/06/1948), reconhecendo que aos recorrentes assistia o direito de, em alternativa, obterem a reversão ou exigir e receber a mais-valia reconhecida por lei.

  3. A sentença recorrida não questiona que aos recorrentes assistiria o direito ao recebimento das mais valias, por estarem reunidos os pressupostos de facto e de direito, só que, esse exercício lhe estava vedado por já terem exercido o direito de reversão.

  4. O facto de serem direitos de exercício alternativo significa que tendo sido exercido o direito de reversão, isto é, tendo o bem expropriado regressado à propriedade do expropriado (ou seus herdeiros), não pode este exercer adicionalmente o direito ao recebimento das mais-valias; inversamente, se recebeu de volta o prédio expropriado não pode pretender receber também o valor indemnizatório que tem como pressuposto precisamente a privação da propriedade do prédio expropriado.

  5. Se tiver provimento a pretensão formulada pelos recorrentes a mesma não será incompatível com a manutenção da expropriação, com a continuação dos efeitos dela decorrentes, ou seja, a transferência da propriedade do prédio expropriado para a entidade expropriante.

  6. O que a lei não aceita é que, perante a não afectação pela entidade expropriante do bem expropriado aos fins a que se destinava, o expropriado obtenha a reversão do prédio e a mais-valia. Esse é o significado de exercício alternativo: ou obter a reversão e receber o prédio de volta ou receber a mais-valia.

  7. O entendimento que subjaz à sentença é um entendimento formal, abstracto e desligado da realidade dos factos, do conceito de exercício de direito, que não deve ser atendido, porque não se pode qualificar de exercício de direito à reversão, que afasta o exercício do direito alternativo, a mera formulação da pretensão, ainda que com reconhecimento por decisão judicial transitada em julgado, o que constituiria denegação do direito à tutela jurisdicional.

  8. Acresce que se a expropriação não se extinguiu ou caducou, significa que o direito não foi exercido, não foi efectivado.

  9. O direito à mais-valia nasce por efeito do acto expropriativo e o momento em que nasceu o direito à mais-valia, decorrente da qualidade de expropriado, é aquele em que a expropriação se efectivou. Por conseguinte, a decisão proferida em anterior processo judicial, no qual foi formulado o pedido de reversão não constituiu na esfera jurídica o direito à reversão, que emerge do facto expropriativo.

  10. Não se verifica caso julgado impeditivo do exercício pelos recorrentes do direito ao recebimento das mais-valias, por não estarem reunidos os respectivos requisitos, indicados no art. 498º do cód. proc. cv.: identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir, sendo estes requisitos cumulativos.

  11. No que diz respeito à identidade de sujeitos, é questionável que ela se verifique, porque no processo onde foi proferido o acórdão que reconheceu o direito à reversão, estava em causa o despacho do Senhor Ministro das Obras Públicas de 19.10.1962 que negara aquele direito, pugnando-se no recurso pela anulação desse despacho. No referido processo intervieram como interessadas na decisão a proferir diversas entidades, incluindo a Câmara Municipal de Lisboa.

    I) É também questionável que exista identidade quanto à causa de pedir, já que o facto jurídico do qual emerge a pretensão no processo onde foi proferido o acórdão transitado em julgado era a expropriação (incluindo a situação decorrente do prédio expropriado não ter tido a afectação a que se destinava), e nestes autos a causa de pedir é também a expropriação (com a amplitude referida), mas que integra também, enquanto causa de pedir complexa, o facto negativo de não ter sido operada a reversão, já que recebimento de mais-valia e reversão eram direitos alternativos.

  12. É inquestionável que não existe identidade de pedido: naquele processo o pedido formulado era o da reversão, neste o pedido é o de pagamento de mais-valias.

  13. Nos presentes autos o que os recorrentes vieram requerer foi um efeito diferente do seu direito, efeito esse que é o de receberem o pagamento de mais-valias, uma vez que se verificam os respectivos pressupostos de facto e legais.

  14. Sendo o pedido a enunciação da forma de tutela jurisdicional pretendida pelos recorrentes, nada impede que esse pedido tenha sido precedido de outra forma de tutela, com outro conteúdo e efeitos, mesmo não tendo executado a anterior decisão, sendo que a única limitação existente era a já referida circunstância de os direitos serem alternativos: ou os prédios regressavam à esfera jurídica dos expropriados ou recebiam a mais-valia.

  15. Ficou demonstrado nos autos (cfr. elenco dos factos provados) que os interessados não lograram obter a reversão, o que basta para lhes ser reconhecido o direito de obter a tutela jurisdicional do seu direito por outra forma, expressamente consignada na lei.

  16. Estão, por conseguinte, reunidos os requisitos de facto e de direito que conferem aos recorrentes o direito ao recebimento de mais-valias, determinadas segundo o critério previsto no diploma que vigorava à data em que a expropriação teve lugar, ou seja, a Lei nº 2030, de 22.06.48, disposições que a sentença recorrida violou, ao fazer errada interpretação e aplicação do direito.

    Terminam pedindo o provimento ao presente recurso a revogação da decisão recorrida, substituindo-se tal decisão por outra que julgue procedente e provado o recurso interposto pelos recorrentes do indeferimento tácito pela recorrida da sua pretensão, conforme peticionado.

    O Recorrido – PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA – contra-alegou sustentando a manutenção da decisão recorrida, alegando, para tanto, o seguinte: 1. A questão em discussão nos presentes autos circunscreve-se tão só à de saber se os Recorrentes, após terem peticionado e terem logrado obter o direito à reversão de parte do prédio expropriado em 1942, podem agora vir peticionar, nesta sede, o recebimento de mais valias relativamente a essa mesma parcela.

    1. E a resposta a esta questão é necessariamente apenas uma: Não! 3. Em 1957, a requerimento dos interessados, foram pagas mais valias relativamente a parte dos terrenos expropriados, entretanto alienados a terceiros pelo expropriante.

    2. Em 1961 os interessados requereram ao Presidente da CML a reversão dos prédios expropriados, com fundamento na aplicação dos bens a fins diversos daqueles que presidiram à expropriação, pedido este que veio a ser indeferido por decisão do Ministro das Obras Públicas.

    3. Por acórdão proferido pelo STA em 1971, foi reconhecido aos Recorrentes o direito à reversão em relação aos terrenos relativamente aos quais não haviam recebido mais valias.

    4. Os ora Recorrentes lograram obter judicialmente o reconhecimento do seu direito de exercer a reversão.

    5. Como é jurisprudência pacífica, o direito ao recebimento de quantias a título de mais valias, e o direito à reversão, constituem direitos alternativos em relação a um mesmo bem expropriado.

    6. Os ora Recorrentes, vêm pedir o recebimento de mais valias, refugiando-se no facto de não terem efectivado a reversão cujo direito lhes foi reconhecido.

    7. Tal pretensão é impossível, na medida em que o seu direito ao recebimento de mais valias se...

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