Acórdão nº 0877/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução30 de Março de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, LDA, com os demais sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de improcedência da impugnação judicial que deduziu contra acto de liquidação de Imposto sobre Sucessões e Doações no montante de € 533.464,22.

A Recorrente terminou a sua alegação de recurso enunciando as seguintes conclusões: 1. Em face desta matéria de facto, e em primeiro lugar, está em causa a apreciação da caducidade da liquidação e dentro desta a apreciação da constitucionalidade do art. 4.º do Dec. Lei nº 154/91.

  1. Quanto a este ponto a aqui Recorrente alegou que, no caso em análise, a Administração Fiscal procedeu à liquidação de Imposto de Sucessões e Doações derivado de uma doação com usufruto tendo o usufrutuário falecido em 21 de Julho de 1998.

  2. Não há dúvidas que a transmissão (falecimento do usufrutuário e consolidação da nua propriedade) ocorrida em 21 de Julho de 1998 implica que é a partir desta data que nasceu a obrigação tributária de liquidação de imposto sobre sucessões e doações.

  3. Ora, nos termos do art.º 92º do CIMSISD «Só poderá ser liquidado imposto municipal de sisa ou imposto sobre as sucessões e doações nos 10 anos seguintes à transmissão…».

  4. Sucede que em 23 de Abril de 1991 foi publicado o Dec.Lei 154/91 (Código de Processo Tributário) que no seu art.º 33º n.º 1 dispõe que: «O direito à liquidação de impostos e outras prestações de natureza tributária caduca se não for exercido ou a liquidação não for notificada ao contribuinte no prazo de cinco anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo daquele em que se verificar o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu».

  5. Considerando que o CPT é de aplicação imediata o prazo de liquidação passou a ser de 5 anos.

  6. No entanto, a aqui Recorrente não desconhece a existência de um ofício circulado (n.º 2324, de 20-10-92, do N.J.T.) que limita-se a concretizar o disposto no art.º 4.º do DL 154/91, ou seja, «Os novos prazos de caducidade e prescrição e, consequentemente, a aplicação do art.º 297º do C. Civil não se aplicam à SISA e ao Imposto Sobre as Sucessões e Doações, senão a partir da adaptação do respectivo Código ao CPT, isto quer o facto tributário tenha ocorrido antes ou depois da entrada em vigor deste último diploma».

  7. E a aqui Recorrente alegou que «aquele art.º 4º do Dec.Lei 154/91, é ilegal porquanto na lei de autorização legislativa (Lei 37/90, de 10 de Agosto) não encontramos qualquer excepção expressamente prevista para a sisa e para o imposto sobre as sucessões e doações, e por outro lado, tal normativo seria sempre inconstitucional já que viola de forma expressa o disposto nos artigos 266º n.º 2 da CRP o que se invoca para todos os efeitos legais».

  8. Ora a sentença recorrida apenas apreciou a questão da inconstitucionalidade orgânica !! 10.Mas a recorrente alega igualmente que o art.° 4° do Dec. Lei 154/91 viola de forma expressa o disposto no art.° 266° n.° 2 da CRP (que remete para os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade previstos no art.° 13°da CRP).

  9. Ora e sobre esta questão a sentença recorrida é omissa o que implica que a sentença recorrida é nula nos termos do art.° 125° n.° 1 do CPPT, o que se invoca para todos os efeitos legais.

  10. E na verdade é manifesta a inconstitucionalidade da excepção prevista no art.° 4° do Dec Lei 154/91, já que limita e ofende de forma manifesta o princípio da igualdade plasmado no artigo 13° e 266° n.º 2 da CRP.

  11. Na verdade basta atentar que no preâmbulo do Dec.Lei 154/91 se refere expressamente: «Por isso ficaria inacabada uma reforma fiscal que não contemplasse o processo tributário. Se tal acontecesse, a inovação introduzida por aqueles Códigos na relação Fisco-contribuinte apenas abrangeria alguns impostos, quando não há razão para a não estender aos restantes e, por outro lado, os próprios direitos reconhecidos aos contribuintes pelos novos diplomas...

    » (sublinhado nosso).

  12. É manifesto que viola de forma gritante o princípio da igualdade a excepção prevista no art.° 4° do Dec. Lei 154/91, no sentido de não sujeitar o imposto de sucessões e doações do novo regime dos prazos de caducidade e de prescrição.

  13. Por outro lado, a sentença recorrida entendeu que à liquidação em causa não se aplicavam os prazos de caducidade previstos no art.° 45° da LGT.

  14. Ora o Dec. Lei 398/98 (Lei Geral Tributária) que revogou o Código de Processo Tributário, relativamente à caducidade da liquidação de impostos, referiu expressamente que o novo prazo de 4 anos só se aplica aos factos tributários ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998 (Vide art° 5° n.° 5 do Dec. Lei 398/98).

  15. Mas esta lei não contém nenhuma norma que excepcione a questão dos prazos de caducidade e de prescrição para a sisa e imposto de sucessões e doações!! 18.Aliás o art.° 1.º da LGT é claro ao considerar que esta «regula as relações jurídico tributárias, sem prejuízo do disposto no direito comunitário e noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna ou em legislação especial».

  16. Ou seja, o facto tributário objecto da liquidação que se impugna teria sempre, a partir da entrada em vigor desta lei - 1 de Janeiro de 1999 - que se coadunar com os princípios ínsitos na mesma.

  17. Em conclusão: a presente obrigação tributária nasceu em 21 de Julho de 1998, pelo que tendo nós um prazo de liquidação de quatro anos e socorrendo-nos do disposto no artº 297° do Código Civil, a presente liquidação está inquinada do vício de caducidade.

  18. Já que a liquidação em última análise teria que ter sido efectuada até 1 de Janeiro de 2003.

  19. É que o facto tributário, tendo nascido anteriormente à entrada em vigor da LGT, teria sempre que ser regulado, após a entrada em vigor da mesma, pela Lei Geral Tributária. É que sendo a liquidação do imposto de sucessões e doações, no caso vertente, efectuada anualmente nos termos do art.° 123° do CIMSISD, é manifesto que todas as liquidações após o dia 1 de Janeiro de 1999 estariam sujeitas aos novos prazos de caducidade previstos na LGT.

  20. No entender da recorrente a sentença violou o disposto no art.° 123° do CIMSISD e art.° 45° da LGT.

  21. Por outro lado, a Recorrente alegou na sua Impugnação que tinha existido a preterição de formalidades essenciais, nomeadamente a violação do princípio da audição prévia.

  22. A Lei Geral Tributária no seu artigo 60°, concretizando a injunção constitucional contida no art.° 267° n.º 5 da CRP, veio consagrar o princípio da participação, permitindo ao contribuinte participar nas decisões que lhe digam respeito.

  23. Ora a aqui Impugnante não foi ouvida pela Administração Fiscal no processo que conduziu à liquidação de Imposto sobre Sucessões e Doações.

  24. Pelo que dúvidas não há que houve a preterição de uma formalidade legal, atento o disposto no art.° 60° da LGT e art.° 100° do CPA.

  25. Em anotação ao artigo 60° da LGT diz António Lima Guerreiro na sua Lei Geral Tributária Anotada, 1ª Edição, pág. 276 «Do presente preceito resulta, igualmente, na linha do CPA, que o meio adequado de participação dos contribuintes na formação das decisões da administração tributária que lhes digam respeito – incluindo actos tributários «stricto sensu» ou em matéria tributária – é o direito de audição, que a administração tributária não pode unilateralmente, sem norma habilitadora ou acordo do contribuinte, substituir por outras formas de participação mesmo quando assegurem o mesmo objectivo».

  26. Sendo certo que nos termos do art.° 45° do CPPT «O procedimento tributário segue o princípio do contraditório, participando o contribuinte, nos termos da lei, na formação da decisão», o que implicava «... consoante o disposto no art.° 60º da LGT, a participação do contribuinte na formação da decisão que lhe dizia respeito, designadamente, com direito de audição antes da liquidação, a ser exercido no prazo a fixar pela AT em carta registada a enviar para tal efeito para o seu domicilio fiscal, comunicando-lhe o projecto da decisão e a sua fundamentação, sendo que os elementos novos suscitados na audição seriam obrigatoriamente tidos em conta na fundamentação da decisão, tudo como decorre do art.° 60° da LGT, conjugado com o disposto no art.° 36° nºs 1 e 2 do CPPT» - Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 3 de Junho de 2003, in Antologia de Acórdãos do STA e TCA, Ano VI, n.º 3, pág. 306 e segs.

  27. Seguindo o raciocínio explanado no acórdão acabado de citar, a presente liquidação é ilegal por preterição de formalidades legais, o que se invoca, e que terá forçosamente que levar à procedência da presente acção de impugnação.

  28. Já a sentença recorrida sobre esta questão entende, a nosso ver mal, que a audição prévia estaria dispensada já que se aplicaria o vertido no art.° 60° n.º 2 da LGT.

  29. Ora no caso em apreço a liquidação foi efectuada com base numa declaração de B…, que não é contribuinte e muito menos sujeito passivo do imposto aqui em causa !! 33.A sentença recorrida dá por adquirido que não foi a aqui Recorrente que efectuou a declaração !! 34.Logo não se aplica o vertido no n.º 2 do art.° 60° da LGT.

  30. Por outro lado, sempre a aqui Recorrente teria que ser ouvida sobre o projecto de decisão já que poderia e deveria instruir os autos com elementos que poderiam implicar uma diferente valoração e ou configuração da obrigação tributária.

  31. Violou assim a sentença recorrida o vertido no art.° 60° da LGT e no art.° 267° n.°5 da CRP.

  32. Por último, a aqui Recorrente, alegou que a liquidação foi erroneamente efectuada.

  33. A sentença recorrida entende que não é assim, já que a liquidação teria que ser efectuada com base nos artigos 22° n.° 2 e 123° do CIMSISD.

  34. Ora a recorrente entende que não é o caso dos presentes autos, em que com a renúncia ao usufruto existiu consolidação da nua propriedade, pelo que será na base da consolidação...

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