Acórdão nº 01/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelPIMENTA DO VALE
Data da Resolução01 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam nesta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A… SL, melhor identificada nos autos e a Fazenda Pública, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que concedeu parcial provimento à impugnação que aquela deduziu contra o acto de liquidação de IRC e ISDA (Imposto sobre sucessões e doações por avença), relativo ao exercício de 2003, no valor global de € 1.622.871,60, dela vieram interpor os presentes recursos, formulando as seguintes conclusões:

  1. A IMPUGNANTE A… A). A ora recorrente é uma sociedade domiciliada em Espanha, sem qualquer estabelecimento estável em Portugal, titular, desde Dezembro de 2000, de uma participação no capital social da B…, adquirida pelo valor global de Euros 320.436.410,00 (trezentos e vinte milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, quatrocentos e dez euros); B). A 12 de Junho de 2003, a B… procedeu ao pagamento de dividendos no valor global de Euros 9.273.552,00, relativos ao lote de 57.959700 acções, então detidas pela recorrente no capital da B…; C). Sobre o valor bruto dos dividendos devidos pela B… à ora recorrente, incidiu uma retenção na fonte de IRC à taxa de 25%, e uma retenção na fonte de ISD, à taxa de 5%, no valor, respectivamente, de Euros 1.159.194,00 e de Euros 463.677,60; D). A retenção na fonte de IRC foi efectuada sobre metade do valor dos dividendos brutos distribuídos pela B… à ora recorrente, atentas as disposições conjugadas dos artigos 88º nº °1, alínea c) e nº 3 do Código do IRC e do artigo 59.° do EBF, na redacção deles vigentes em 2003. Tal retenção assumiu ainda, nos termos do disposto no n.° 3, alínea b) do artigo 88.° do Código do IRC, uma natureza definitiva; E). Contudo, se a ora recorrente fosse uma entidade domiciliada em Portugal - e não em Espanha -, os rendimentos de dividendos por esta recebidos da B…, no ano de 2003, não teriam sido já sujeitos, nem a qualquer retenção na fonte, nem a qualquer tributação em termos finais — cfr. artigo 46.°, n.° 1 e artigo 90.°, n° 1, alínea c) do Código do IRC; F). E, mesmo que a ora recorrente não preenchesse todas as condições previstas no n.° 1 do artigo 46.° do Código do IRC — o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio atento o disposto no 71.°, n.° 2, alínea a) do Código do IRS aplicável ex vi o n.° 4 do artigo 80º do Código do IRC e do n.° 7 do artigo 46.°, também do Código do IRC, a ora recorrente apenas tenha sofrido uma retenção na fonte de 15%, e, em termos finais, apenas, seria tributada sobre 25% dos rendimentos de dividendos incluído na base tributável; G). Com efeito, se compararmos os regimes de tributação dos dividendos em sede de IRS, aplicável em 2003, às sociedades residentes e às sociedades não residentes em Portugal, constatamos que existiam diferenças muito significativas entre o dispensado às primeiras e o dispensado às segundas, quer ao nível das taxas de retenção na fonte aplicáveis, quer ao nível da natureza de tal retenção, quer ainda ao nível dos requisitos exigidos para efeitos de não tributação dos rendimentos de dividendos; H). Assim - enquanto que, a taxa de retenção na fonte aplicável às sociedades residentes era, em 2003, de 15%, a aplicável às não residentes era já de 25%; - enquanto que a retenção na fonte aplicável às sociedades residentes assumia a natureza de pagamento por conta (podendo ser, assim, “recuperada” em termos finais), a retenção na fonte aplicável às sociedades não residentes assumia uma natureza definitiva, - enquanto que uma sociedade residente em Portugal não seria tributada sobre os rendimentos de dividendos que lhe fossem distribuídos por outras sociedades aqui residentes, desde que detivesse directamente uma participação no capital da sociedade distribuidora não inferior a 10% ou com um valor de aquisição não inferior a Euros 20.000.000 e esta tivesse permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros, uma sociedade não residente, seria sempre tributada sobre tais rendimentos; - em 2003, uma sociedade não residente, que se domiciliada noutro Estado-membro da União Europeia, apenas poderia não ser tributada em Portugal se detivesse uma participação directamente no capital da sociedade distribuidora não inferior a 25% e esta tivesse permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante os dois anos anterior à data da colocação à disposição dos lucros.

    I). Os residentes e os não residentes, a propósito do recebimento de dividendos, encontram-se em idêntica situação objectiva, J). A retenção efectuada à ora recorrente, no ano de 2003, referida nos presentes autos, ao consubstanciar uma discriminação injustificada entre residentes e não residentes fiscais em Portugal em matéria de tributação de rendimentos de dividendos de fonte interna (i.e, distribuídos por sociedades residentes em território nacional) violou os princípios constitucionais da igualdade e o princípio da tributação das empresas pelo lucro real, expressos, respectivamente, nos artigos 12.° e 13º e no artigo 104.° da Constituição da República Portuguesa, e, ainda, os princípios da não discriminação, da liberdade de estabelecimento e da livre circulação de capitais, em clara negação dos artigos 12.°, 43.°, 46 °, 56° e 58º nº 3 do Tratado CE; L). A existência in casu de uma discriminação arbitrária, em clara violação face ao direito comunitário decorre claramente da jurisprudência, particular dos acórdãos do TJCE Denkavit Internationaal BV, Denkavit França SARL contra o Ministre de l’Économie, des Finances et de l’Industrie e, mais recentemente, do acórdão Amurta; K). O acórdão Amurta coloca, aliás, em evidência a discriminação que foi vítima a ora recorrente, quando, a propósito de uma situação em tudo idêntica à dos autos, sublinha que a incompatibilidade dos regimes fiscais nacionais, em matéria de tributação de dividendos, face ao direito comunitário, não se afere apenas face ao disposto na Directiva Mães-Filhas, mas também, e sobretudo, à face dos princípios comunitários da igualdade fiscal e da não discriminação e da livre circulação de capitais; M). A sentença recorrida, acolhendo apenas parte da argumentação de direito apresentada pela ora recorrente, limitou-se a julgar parcialmente procedente a impugnação deduzida pela ora recorrente, fundamentando tal decisão no facto de a liquidação de imposto impugnada consubstanciar “uma violação do Tratado Internacional celebrado entre Portugal e a Espanha, dado que a taxa de retenção a aplicar deveria ser de 15%, e não de 25%, incluindo a retenção no ISD.” N). Da sentença recorrida resulta, assim, uma devolução de imposto à ora recorrente apenas no valor de Euros 927.355,20, resultante da anulação de parte da retenção na fonte de IRC no montante de Euros 463.677,60 (correspondente ao diferencial entre a aplicação de uma taxa de 25% e uma taxa de Euros 15%, sobre metade do valor dos dividendos — única “consentida” pelo Tratado internacional celebrado entre Portugal e Espanha) e da anulação da retenção efectuada a título de ISDA, no montante de Euros 463.677,60; O). A sentença recorrida, ao defender uma interpretação contrária à agora sustentada pela ora recorrente violou os princípios constitucionais da igualdade e o princípio da tributação das empresas pelo lucro real, expressos, respectivamente, nos artigos 12° e 13.° e no artigo 104.° da Constituição da República Portuguesa, e, ainda, os princípios da não discriminação, da liberdade de estabelecimento e da livre circulação de capitais, em clara negação dos artigos 12º, 43º, 46º, 56º e 58º nº 3 do Tratado CE; P). A sentença recorrida deverá, por isso, ser revogada na parte em que não concedeu provimento ao pedido principal deduzido pela ora recorrente nos autos de impugnação, e como tal, anulado totalmente o acto de retenção de IRC, na parte ainda não determinada pela sentença recorrida.

    A Fazenda Pública não...

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