Acórdão nº 01108/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2011

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução07 de Junho de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO “A…, S.A”, já devidamente identificada nos autos, interpõe para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 150º/1 do CPTA, recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 10 de Setembro de 2009, proferido a fls. 697-703 vº, que, negando provimento a recurso jurisdicional, manteve sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que havia julgado improcedente a acção administrativa de contencioso pré-contratual intentada pela ora recorrente contra o Município de Sintra.

A recorrente apresenta alegações com as seguintes conclusões: 1ª A A… recorreu à capacidade financeira da sua sociedade-mãe B…, S.A. no Concurso Público Internacional para a aquisição de serviços de vigilância e segurança para instalações municipais para os anos de 2009 e 2010 lançado pela Câmara Municipal de Sintra, tendo instruído a sua proposta com o Relatório e Contas Consolidadas desta sociedade dos anos de 2005, 2006 e 2007 e com a carta de conforto subscrita pela B…, S.A. através da qual esta assume perante a Câmara Municipal de Sintra a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações que para a A… decorram do contrato (cfr.

alíneas F) e 1) da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra).

  1. A B…, S.A. cumpre o requisito de capacidade financeira exigido pelo Art.° 16° do Programa de Concurso (cfr. alínea J) da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra). 3ª O art.° 47° nº 2 da Directiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 31 de Março de 2004 estabelece que um operador económico pode, se necessário e para um contrato determinado, recorrer às capacidades de outras entidades, independentemente do vínculo jurídico que tenha com elas.

  2. Entende o Tribunal Administrativo Sul que esta disposição da Directiva não é aplicável ao Concurso Público Internacional em apreço porquanto resulta do disposto no art. 21° da referida Directiva que o seu art. 47° não se aplica aos contratos que tenham por objecto os serviços referidos no Anexo II B, entre os quais se encontram os serviços de segurança.

  3. Sustenta a Autora que a disposição do art. 21° da Directiva tem que ser interpretada em conformidade com o seu considerando (18) e que, como tal, apenas se refere às regras processuais constantes da Directiva e não às suas regras substantivas, como é o caso do art. 47° nº 2, as quais são, por isso, aplicáveis a todos os contratos de prestação de serviços.

  4. A questão que se coloca nos presentes autos é, pois, a de saber se o art. 47° nº 2 da Directiva 2004/18/CE é ou não aplicável aos contratos de prestação de serviços incluídos no Anexo II-B e, portanto, se é ou não aplicável ao Concurso Público Internacional em apreço o qual tem por objecto a prestação de serviços de segurança.

  5. Trata-se de uma questão de interpretação de um acto adoptado pelas instituições da Comunidade Europeia.

  6. Pelo que, e nos termos do disposto no art. 234° do Tratado que institui a Comunidade Europeia (versão consolidada publicada no JOUE nº C321E de 29/12/2006) o Supremo Tribunal Administrativo, julgando em última instância, deverá submeter esta questão prejudicial ao Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia se propender para o entendimento de que o art. 47° nº 2 da Directiva não se aplica ao Concurso Público Internacional entendimento que, segundo a Recorrente, configura uma violação pelo Estado Português do Direito Comunitário.

  7. A questão de saber se um concorrente pode, em procedimento destinado à formação de um qualquer tipo de contrato de prestação de serviços, recorrer à capacidade financeira de um terceiro é uma questão de interpretação de uma directiva comunitária que poderá ressurgir em futuros procedimentos de formação de contratos e que reclama por isso a apreciação do Supremo Tribunal Administrativo para uma melhor aplicação do direito.

  8. Até porque o novo Código dos Contratos Públicos, que procedeu à transposição da Directiva 2004/18/CE não é claro quanto à atribuição dessa faculdade com a extensão com que é admitida pela Directiva, podendo estar em causa uma transposição incorrecta dessa directiva.

  9. Trata-se de questão que se coloca quer no âmbito do Decreto-Lei nº 167/99 de 8/6, quer no âmbito do Código dos Contratos Públicos, podendo, pois, repetir-se em casos futuros.

  10. Termos porque é admissível a presente revista nos termos do disposto no art.

    150° do CPTA.

  11. Fazendo uma interpretação puramente literal e formal da Directiva, entende o tribunal a quo que, por força do disposto no artigo 21° da Directiva 2004/18/CE, o art.° 47 nº 2 não é aplicável ao presente Concurso Público Internacional por se destinar à formação de um contrato de prestação de serviços incluídos no Anexo II B (v.g. segurança).

  12. De acordo com considerando (18) da Directiva os contratos públicos de serviços são divididos em dois anexos consoante as regras processuais a que estão sujeitos.

  13. As normas dos arts.

    20º e 21º da directiva têm que ser interpretadas em conformidade com o seu considerando (18), pelo que das mesmas resulta apenas que aos contratos de serviços referidos no anexo II-A são aplicáveis as regras processuais previstas para os contratos públicos constantes do Título II e aos contratos de serviços referidos no anexo II-B são aplicáveis as regras processuais constantes dos artigos 23° e 35° nº 4.

  14. Porém, a directiva contém não apenas regras processuais mas também regras substantivas, as quais são aplicáveis a todos os contratos públicos.

  15. Ora, a regra do art. 47º nº 2 da directiva não é uma regra processual mas uma regra substantiva: consagra o direito do operador económico de recorrer à capacidade económico-financeira de outra entidade para concorrer.

  16. A ratio desta norma é permitir que os operadores económicos possam recorrer à capacidade económico-financeira de terceiros e assim atingir os requisitos económico-financeiros exigidos pelas entidades adjudicantes, escopo que, sozinhos, não conseguiriam atingir.

  17. O interesse público no cumprimento do contrato pelo adjudicatário fica sempre salvaguardado porquanto o terceiro garantirá esse cumprimento com a sua capacidade financeira.

  18. Ora, não faz qualquer sentido restringir este direito a determinado tipo de contratos públicos de serviços e, consequentemente, a determinados operadores económicos em detrimento de outros.

  19. Tal traduzir-se-ia numa violação dos princípios da igualdade de tratamento e de não discriminação consagrados no art. 2° da directiva.

  20. Razão porque ter-se-á de concluir que o art. 47° n.° 2 da Directiva 2004/18/CE é aplicável ao Concurso Público Internacional em apreço.

  21. O art. 47° nº 2 da Directiva 2004/18/CE produz efeito directo na ordem jurídica portuguesa, podendo consequentemente ser invocada pelos particulares perante as entidades públicas nacionais.

  22. Por se encontrar demonstrada a capacidade financeira da B…, A.A, a exclusão da A… encontra-se em clara violação do art. 47º, nº 2 da Directiva 2004/18/CE.

  23. Ao entender em sentido contrário, violou o Tribunal a quo a disposição do art. 47º, nº 2 da Directiva 2004/18/CE.

    Não foram apresentadas contra-alegações: 1.3. A formação prevista no nº 5 do artigo 150º do CPTA julgou verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista, pelo acórdão de fls. 753-755 que passamos a transcrever, na parte essencial: “ (…) No caso em análise, verificam-se os pressupostos de admissão do recurso de revista excepcional.

    Efectivamente, a questão que a Recorrente suscita no presente...

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