Acórdão nº 026174 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Fevereiro de 2002

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 - A..., LDA, impugnou judicialmente no Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Aveiro uma liquidação adicional de I.V.A., relativa ao ano de 1986.

Este Tribunal Tributário de 1.ª Instância julgou improcedente a impugnação.

Inconformada, a impugnante interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo, que lhe negou provimento, remetendo para os fundamentos da sentença do Tribunal Tributário de 1.ª Instância.

Novamente inconformada, a impugnante interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1 - Ignorando factos articulados, ignorando provas apresentadas, ignorando argumentos aduzidos pela recorrente relativos a erros de julgamento imputados a Ex.mo Juiz de 1ª Instância, em suma ignorando toda a matéria alegada nos articulados 11º a 111º, o douto acordão-recorrido violou os artigos 82º e 84º do CIVA, os artigos 410º do C.P.T. e os artigos 659º, n.º 3, 515º e 265º n.º 3 do C.P.C.

2 - Ao não tomar em consideração, em sede de quantificação, os 60 artigos entretanto documentados - cuja documentação foi apresentada ainda em sede de Comissão Distrital de Revisão - o acórdão-recorrido violou as regras de apuramento do IVA e cometeu erro de julgamento. Violando, entre outros, os arts. 11º, 52º e 84º do CIVA e o art. 659º do C.P.C.

3 - No cálculo do IVA alegadamente em falta, a AF. só tomou em consideração o IVA imputável às vendas presumidamente omissas, omitindo por completo o IVA que a recorrente teria de suportar nas correspondentes compras.

4 - O Acordão-recorrido não pronúncia sobre esta questão (levantada nos arts. 108 a 111º das alegações recurso), pelo que cometeu uma nulidade. Conforme dispõe o art. 668º, n.º 1 alínea d) do C.P.C..

Nas suas contra-alegações, a Excelentíssima Representante da Fazenda Pública defende que a recorrente apenas põe em causa matéria de facto fixada na 1.ª instância, cuja apreciação está fora dos poderes de cognição do Supremo Tribunal Administrativo.

O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: 1 - Comecemos por apreciar a arguida nulidade do aresto recorrido com fundamento em omissão de pronúncia (artº 668º, nº 1, al. d) do CPC), por que prejudicial (cfr. artº 143º do CPT).

Alega a recorrente que o Tribunal "a quo" não se pronunciou sobre a questão vertida no item 3º da sua motivação do recurso, ou seja, que no cálculo do IVA alegadamente em falta, a AF apenas levou em consideração o imputável às vendas, omitindo o IVA que a recorrente teria de suportar nas correspondentes compras.

Salvo o devido respeito que sempre nos merece opinião contrária, não cremos que lhe assista qualquer razão.

Desde logo, importa referir que o aresto em causa, fazendo uso do disposto nos arts. 713º, nº 5, 749º e 762º, nº 1 do CPC, julgou improcedente o presente recurso, remetendo-se para o decisório e respectiva fundamentação da sentença recorrida proferida pelo TT de 1ª Instância.

Ora, da análise desta decisão ressalta à evidência que a questão agora suscitada pela recorrente não foi ali, efectivamente, tratada.

Todavia, também não o tinha que ser, pela razão peregrina de que a mesma não constituiu causa de pedir da presente impugnação judicial.

Sendo assim a uma vez que o Juiz apenas se deve debruçar sobre as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, com excepção das que são de conhecimento oficioso - o que não é o caso - (cfr. artº 660º, nº 2 do CPC), não podem deixar de improceder as conclusões 3ª e 4ª da sua motivação do recurso.

2 - Quanto às restantes conclusões, nelas sustenta a recorrente que nada justifica e é ilegal o recurso a métodos indiciários face à matéria de facto articulada e ao depoimento das testemunhas, discorda da quantificação da matéria tributável e considera haver erro de julgamento.

Ignora, porém, que nos processos inicialmente julgados nos tribunais de 1ª instância o STA funciona como tribunal de revista e, como tal, apenas conhece de matéria de direito, nos termos do disposto no artº 21º, nº 4 do ETAF, salvo nos casos previstos no artº 722º do CPC, que aqui não relevam.

Ora, as conclusões referidas limitam-se, tão só a nosso ver, a questionar os factos assentes nas instâncias e as conclusões de facto que deles foram retiradas pelo aresto recorrido.

Questões estas e como vimos, escapam ao conhecimento deste STA.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - O Tribunal Central Administrativo fixou a seguinte matéria de facto: a) no ano de 1986 a Contribuinte exerceu a actividade de "comércio a retalho de material eléctrico e electrónico" (CAE 620440) estando colectada pela 1ª RFA em contribuição industrial (Cl), grupo A, e sob o regime normal de periodicidade mensal para efeitos de IVA (identificação do Contribuinte nos diversos elementos juntos ao processo, designadamente a fls. 6); b) os Serviços de Fiscalização Tributária (SFT) efectuaram uma visita à Contribuinte, entre os dias 28 de Setembro e 21 de Dezembro de 1987, na sequência da qual elaboraram nesta última data uma informação na qual concluíram que esta, com referência ao exercício do ano de 1986 «omitiu às vendas (apuros diários) 14.274.498$00» e, consequentemente, não liquidou IVA do montante de 2.283.920$00 (cópia da informação de fls. 6 a 11); c) essa conclusão foi fundamentada nos seguintes termos: 5 - REGISTO DE COMPRAS E VENDAS a) - Durante o ano de 1986, o sujeito passivo, possuía um livro para o registo das facturas de Compra, sendo as Compras a Dinheiro levadas ao Diário de Caixa. Com vista a simplificar o sistema contabilístico, o mesmo entendeu a partir de 1987, dar tratamento igual às Facturas de Compra e às Compras a Dinheiro, passando a utilizar um único Diário de Caixa, por onde faz passar todo o movimento da firma.

É de salientar que os documentos constantes deste Diário de Caixa, não seguem qualquer numeração ou classificação.

  1. - Relativamente às vendas, verificamos que o sujeito passivo vem utilizando talões para o registo dos Apuros Diários, emitindo documento de venda somente a quem o solicita.

    6 - Da análise efectuada aos elementos de escrita de que dispõe, a qual é feita manualmente, constatamos ainda que: a) - Apresentando o sujeito passivo um saldo actual bastante elevado na conta de Fornecedores (27.480.737$00), não possui contas correntes.

  2. - Não há quaisquer documentos base nem justificação apresentada pelo contribuinte, da proveniência dos valores que figuram na conta de Suprimentos, sendo eles em 1986 - 7600.000$, e até Setembro de 1987 - 15.749.441$.

  3. - Analisados os elementos nomeadamente os documentos de Compras, Vendas e Existências Iniciais e Finais, do ano de 1986, a contabilidade revela uma percentagem de lucro sobre o Custo das Mercadorias Vendidas, na ordem dos 11%, o que se nos afigura estar um tanto aquém da considerada normal para o tipo de actividade exercida.

    7 - Face às diligências realizadas, houve necessidade de se proceder à elaboração do Inventário físico das existências, na sede do estabelecimento e no armazém que possui na Estrada de S. Bernardo, nº 363, reportado à data de 30/9/97, (folhas 1 a 23), donde se conclui que parte da mercadoria por nós inventariada, não se encontra devidamente documentada, conforme inventário (f. 13 a f. 23).

    Pelo exposto e dado que a firma embora possuindo contabilidade organizada, a mesma não está elaborada de molde a permitir uma eficiente análise dos seus documentos, não nos oferecendo qualquer crédito, propomos nesta data o exame à escrita.

    8 - Do resultado do Inventário referido no ponto anterior, obtivemos existências no valor de 21.761.439$, devidamente documentadas e respeitantes a 730 artigos, tendo ficado por valorizar 650 artigos por falta de apoio documental.

    Por isso e de acordo com o documento Anexo nº 1, foi notificado o sujeito passivo em 23/11/87, pedindo por escrito determinadas informações, nomeadamente os documentos comprovativos de aquisição dos referidos artigos, dado que os mesmos não tinham por nós sido devidamente identificados.

    Conforme resposta dada em documento Anexo nº 2, o sujeito passivo não apresentou quaisquer comprovativos das referidas aquisições, às quais atribuímos o valor de 19.376.623$, calculado proporcionalmente em relação aos valores contabilizados, tendo ainda em conta os preços marcados ao público (deduzidos do IVA e % de lucro).

    Assim as Existências Finais em 30/9/87, cifram-se em 41.138.062$.

    9 - Atendendo ao género de actividade exercida e face às existências inventariadas que não têm documento de aquisição (19.376.062$), somos levados a concluir que o sujeito passivo compra sem factura e muitas das vendas não são registadas como Apuros Diários.

    Considerando que nenhum sujeito passivo adquire mercadoria sem factura para manter em stock, somos levados a pensar que o comportamento do contribuinte, não terá sido só em relação a estes artigos, mas eventualmente a muitos outros, quer no ano em curso, quer em anos anteriores.

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