Acórdão nº 042574 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2003

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução25 de Março de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno do Supremo Tribunal Administrativo.

  1. RELATÓRIO O Procurador-Geral Adjunto, junto deste Supremo Tribunal Administrativo interpôs, a 1 de Julho de 1997, recurso contencioso de anulação do despacho nº 122/97-XII, de 07 de Março de 1997 - A.C.I. -, do Ministro de Finança (MF), publicado no Diário da República, II Série, nº 77, de 02 de Abril de 1997, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 222ª nº 1, da Constituição de República Portuguesa (CRP), 1º da Lei n.º 47/86, de 15/10 (LOMP) e 28º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei nº 267/85, de 16/JUL (LPTA), tendo sido indicados (e admitidos) como contra-interessados, a UNIÃO GERAL dos TRABALHADORES (UGT) e a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS (CGD).

Por acórdão proferido a 15/02/00 (cf. fls. 920-941 dos autos), foi concedido provimento ao recurso e anulado o despacho recorrido.

Não se conformando com o teor daquela decisão, dela interpuseram recurso para este Pleno, o Ministro das Finanças, a UGT e a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS.

O processo foi redistribuído ao actual relator a 23.OUT.2002.

Alegando, concluíram os recorrentes do seguinte modo: 1 - Ministro das Finanças.

1ª) - O acórdão recorrido julgou contra legem quando decidiu que o acto por ele visado é recorrível, porque não sendo ele definitivo e executório nem lesivo, violou o artigo 25° nº 1 da Lei do Processo nos Tribunais Administrativos em articulação com o estabelecido no nº. 4 do artigo 268º. da Constituição (versão actual).

2ª) O Tribunal a quo julgou contra legem quando decidiu que a Base I da Lei 1/73 não caducou com a instituição do novo regime jurídico-constitucional decorrente da Revolução de 25 de Abril de 1974, porque, tal decorre da Lei n.º 2/74, de 14 de Maio, que extinguiu a Assembleia da República e o artigo 2.º da lei n.º 3/74 de 14 de Maio, que a propósito dos diversos órgãos de soberania, não refere sequer o Governo como sendo um órgão em funções.

3.ª) Se O Tribunal ad quem assim não o entender, então o acórdão sob recurso decidiu contra-legem quando não declarou a Base I da Lei 1/73 afectada de inconstitucionalidade superveniente, já que ela contradiz inquestionavelmente o artigo 164.º alínea h) da Constituição (versão de 1982) e artigo 161º. alínea h) da Constituição (versão actual).

4.ª) Quando o Tribunal ad quem também assim não entender, o que não se concede, então, o Tribunal a quo julgou contra legem quando decidiu que a Base I da Lei 1/73 não foi objecto de revogação tácita e global porque tal entendimento decorre claramente do estipulado no artigo 7º. da Lei nº 49/86, de 31 de Dezembro.

5.ª) O acórdão sob recurso julgou contra legem quando decidiu que a UGT, enquanto desenvolveu actividade de formação profissional, não é uma empresa para efeitos os do disposto na Base I da lei 1/73, porque como tal realidade jurídica e económica é encarada pelos artigos 2.º n.º 1 alínea c) do Despacho Normativo nº. 40/88, de 1 de Junho; artigo 3º. do Despacho Normativo 1/90, de 4 de Janeiro de 1990; artigo 11.º alínea c) do Decreto-Lei n.º 401/91, de 16 de Outubro; artlgo13º n.º 2 alínea a) do Dec. Reg. n.º 15/96, de 23 de Novembro; artigos 24º. e . 25º do Despacho Normativo nº 40/88, de 1 de Junho; artigos 16º e 17º. do Despacho Normativo nº. 94/89, de 13 de Outubro; artigos 19º. e 20º. da Portaria n.º 745-A/96, de 16 de Dezembro; artigo 19.º do Despacho Normativo nº.1/90, de 4 de Janeiro de 1990; artigos 20.º e 22.º do Despacho Normativo 61/91, de 25 de Março; artigo, 27.º do Dec. Regulamentar n.º 15/94, de 6 de Julho; artigo 13 n.º 2 alínea a) do Dec. Reg. n.º 15/96, de 23 de Novembro.

6.ª) O acórdão sob recurso contra legem julgou quando decidiu que o acto visado na sentença recorrida violou o princípio da independência das associações sindicais já que ele se mostra em total conformidade com o estabelecido nos artigos 55° n.º 4 da Constituição e artigo 6.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 215-B/75 de 30 de Abril (Lei Sindical).

INCONSTITUCIONALIDADE : A questão da inconstitucionalidade que vem suscitada enquadra-se no âmbito do artigo 70º alínea b) da Lei 28/82, de 15 de Novembro; e em conformidade com o entendimento estabelecido nesse Tribunal. (ac. do Pleno da Secção, de 02 de Maio de 1995, in acs. douts. n° 406).

2 - A União Geral dos Trabalhadores: 1.ª) O douto acórdão recorrido, em razão da metodologia seguida na análise das questões sub iudicio, errou na interpretação e aplicação das bases I e X da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, sendo que o primeiro erro constitui um dos dois fundamentos da decisão anulatória e o segundo está na base do outro fundamento daquela decisão - a pretensa violação do princípio da independência das associações sindicais; 2.ª) Quanto à citada base I, o acórdão recorrido limitou-se a confrontar a natureza jurídica da ora recorrente com o entendimento apriorístico dos conceitos utilizados na mesma base em vista de uma hipotética subsunção em vez de, partindo da norma aplicanda, indagar quais as respectivas exigências e verificar se as mesmas foram satisfeitas no caso concreto pela ora recorrente; 3.ª) Partir de um conceito abstracto e jurídico-formal de «empresa» enquanto empresa comercial e da natureza jurídico-formal da ora recorrente enquanto associação sindical significa pré-determinar o resultado - é óbvio que uma associação sindical não é uma empresa comercial - e conduzir a análise num plano puramente conceptual em tudo, contrário quer à vontade expressa do legislador histórico e à letra da lei, quer à sua própria teleologia e inserção sistemática; 4.ª) Tal metodologia, além de puramente conceitual e dissociada da realidade histórico-social, não tem em conta o actual enquadramento dogmático-jurídico da figura do aval do Estado entre as formas de auxílio público: em vez de partir da teleologia da lei para a determinação conceitual, aquele aresto fixou aprioristicamente o conteúdo dos conceitos legais sem atender aos fins político-legislativos subjacentes à mencionada lei; 5.ª) Com efeito, o acórdão recorrido não explica a razão por que, reconhecendo embora a inexistência de um conceito unitário de «empresa», se deve entender para efeitos da base I da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, que "empresa" implica possuir "por escopo principal desenvolver uma actividade produtiva ainda que de fim económico não lucrativo" (fls. 24, v.º); 6.ª) Cumpre, na verdade, começar por interpretar devidamente a Lei nº. 1/73, de 2 de Janeiro, em ordem a compreender o alcance da respectiva base I e, nomeadamente, o conceito de "empresa" aí consagrado para, seguidamente, aferir da susceptibilidade de subsunção da ora recorrente àquele conceito tendo em conta a actividade por ela concretamente exercida e objecto de apoio através, do acto recorrido contenciosamente; 7.ª) Aquela lei visou, no essencial, disciplinar a concessão de aval do Estado tendo em conta, por um lado, a necessidade de prestar apoio aos empreendimentos e projectos de interesse para a economia nacional e, por outro lado, no caso de tais projectos ou empreendimentos pertencerem a entidades qualificáveis como «empresas nacionais» que não sejam nem institutos públicos nem províncias ultramarinas, a necessidade de avaliar a capacidade de realização empresarial de tais entidades e, bem assim, considerando a natureza do apoio em causa, a necessidade de acautelar devidamente o risco de crédito do Estado; 8.ª) É a esta luz que deve ser interpretada a base I da mencionada Lei, nomeadamente a expressão «empresas nacionais» nela contida: a compreensão do conceito correspondente deverá permitir abranger todos os sujeitos de direito que, respeitando os limites do teor literal impostos pelo artigo 9°, n.º 2, do Código Civil, tenham capacidade jurídica para realizar "empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional" - um conceito jurídico-funcional de empresa que se traduza num projecto auto-sustentável do ponto de vista económico- financeiro ; 9.ª) As «empresas nacionais» para efeitos do disposto na base I da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, são, consequentemente, os sujeitos jurídicos que, desenvolvendo uma actividade produtiva de bens ou serviços destinados a outrem, se proponham um empreendimento ou projecto de manifesto interesse para a economia nacional, viável em termos económicos e financeiros, mas cujo financiamento "se verifique não poder (...) realizar-se satisfatoriamente sem o referido aval"; 10.ª) Esta interpretação tem a seu favor os elementos interpretativos de ordem teleológica, sistemática e histórica; 11.ª) A interpretação acolhida no acórdão recorrido determina que, ao arrepio da teleologia da lei, possa haver projectos ou empreendimentos de manifesto interesse para a economia nacional integrados em actividades empresariais auto-sustentáveis que, apenas por causa da natureza jurídica dos respectivos sujeitos, não possam ser objecto de aval do Estado; 12.ª) O n.º 2 da base II da Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, não permite qualquer delimitação dentro do universo das empresas, traduzindo antes a exigência formulada às empresas privadas de um requisito adicional de segurança por causa do risco de crédito para o Estado por elas representado; 13.ª) Por outro lado, o que a história da base I da Lei n.º 1/73, de 2 de Janeiro, em matéria de entidades elegíveis como beneficiárias de aval do Estado, evidencia é o propósito de, por um lado, alargar a possibilidade de concessão de avales do Estado a entidades públicas - designadamente, aos institutos públicos e às províncias ultramarinas - e, por outro lado, de desvincular o conceito de «empresa nacional», quer da titularidade exclusivamente jurídico-privada, quer de uma qualificação jurídico-comercial determinada - a intenção do legislador quanto à tipologia de potenciais beneficiários do aval do Estado é claramente ampliativa e não restritiva; 14.ª) Esta interpretação sai reforçada pela necessidade de considerar, quer os novos dados jurídico-positivos, nomeadamente os que se inferem do direito comunitário, quer o desenvolvimento...

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