Acórdão nº 01349/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2003

Magistrado ResponsávelVÍTOR GOMES
Data da Resolução25 de Setembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo (1ª Subsecção) do Supremo Tribunal Administrativo 1. A..., de 40 anos de idade, natural da República da Índia, residente em Camarate, interpõe recurso do despacho do Ministro da Administração Interna de 5 de Julho de 2002 que lhe indeferiu o pedido de autorização de residência, ao abrigo do regime de regularização extraordinária estabelecido pela Lei nº 17/96, de 24 de Maio.

Alega o seguinte: 1. O recorrente entrou em Portugal em data anterior a 25 de Março de 1995.

  1. O recorrente, no ano de 1996, formulou o competente pedido de concessão de autorização de residência, pedido que viria a ser admitido.

  2. Por deliberação da Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária de 15 de Março de 2000, foi recusada a admissão do processo de legalização do recorrente, relativamente à qual o recorrente apresentou recurso hierárquico junto de junto de Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, sobre o qual recaiu a decisão ora recorrida.

  3. O recorrente não se conforma com esta decisão de indeferimento, em virtude de considerar que reúne todos os requisitos legais para beneficiar da legalização da sua situação de permanência em Portugal ao abrigo da Lei n°. 17/96 de 24 de Maio.

  4. Com efeito, o recorrente, há largos anos, foi à Alemanha, onde permaneceu um curto período de tempo, tendo sido abordado por entidades policiais, tendo-lhe na altura sido indicada uma morada, para regularizar a sua situação em território alemão.

  5. No entanto, e uma vez que não pretendia ficar a residir em território alemão, abandonou voluntariamente esse País, não mais aí tendo regressado.

  6. Com efeito, a informação indicada pelo Estado Alemão prende-se com a permanência ilegal em território alemão e não com qualquer ilícito de índole criminal, o que terá de ser devidamente ponderado no âmbito do presente pedido de concessão de autorização de residência formulado pelo recorrente.

  7. Mais acresce que sobre os factos que originaram essa indicação já decorreram largos anos.

  8. Aliás, de qualquer forma, parece não se coadunar com a ratio do sistema a manutenção dessa situação de exclusão por um tão largo período de tempo.

  9. Com efeito, a ordem jurídica, mais precisamente o direito dos estrangeiros, não adopta soluções estanques perpetuadas no tempo, sob pena de determinadas situações se tornarem ad aeternum.

  10. Vejamos, a título de exemplo, a previsão normativa da alínea c) do artigo 3.° da Lei n.° 17/96, de 24 de Maio.

  11. Na verdade, não poderão beneficiar de regularização extraordinária os cidadãos estrangeiros, aos quais tenha sido aplicada uma decisão de expulsão durante o período decretado pela mesma para interdição em território nacional.

  12. Assim, se a um cidadão estrangeiro foi aplicada uma pena de expulsão do território nacional por um período de 3 anos, esse cidadão, apenas não poderá entrar em território nacional durante esses mesmos três anos, bem como, de acordo com o previsto na supracitada disposição legal, não poderá, durante três anos a contar da data da respectiva decisão, beneficiar de regularização.

  13. Assim, se a um cidadão estrangeiro foi aplicada uma pena de expulsão do território nacional por um período de três anos, esse cidadão, apenas poderá entrar em território nacional durante esses mesmo três anos, bem como, de acordo com o previsto na supracitada disposição legal, não poderá, durante três anos a contar da data da respectiva decisão, beneficiar de regularização extraordinária.

  14. Em suma, não se contesta o facto de não beneficiarem de regularização extraordinária, as pessoas que tenham sido indicados por qualquer das partes da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen para efeitos de não admissão, mas apenas o facto de essa situação permanecer sem qualquer limite temporal.

  15. É destituído de qualquer fundamento a presente decisão de indeferimento que viola o artigo 4° do C.P.A., pois não pode a Administração negar ao recorrente, que está radicado em Portugal, desde 1995, a trabalhar, tendo toda a sua vida aqui organizada e estabilizada, o direito de permanecer em território nacional.

  16. Com efeito, o nosso sistema jurídico, nomeadamente, o direito dos estrangeiros não se coaduna com soluções ad eternum.

  17. Não foi esta decerto a vontade do legislador, uma vez que toda a ratio do sistema aponta em sentido contrário, ao estabelecer limitações temporais para várias situações correlacionadas.

  18. Mais acresce que a decisão de indeferimento bule com os princípios previstos na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, nomeadamente com o artigo 8° que apela ao respeito por " um justo equilíbrio entre os interesses em confronto, a saber o direito do recorrente ao respeito da sua vida familiar e privada e a protecção da ordem pública e a prevenção de infracções penais ".

  19. Com efeito, a presente decisão recorrida é claramente violadora dos direitos reais e profissionais que cabem ao recorrente.

  20. Na realidade, a proposta de indeferimento apenas tem razão de ser se for necessária para acautelar a segurança nacional ou pública, o bem estar económico do País, a defesa da ordem e prevenção de infracções penais, a protecção da saúde e da moral ou a defesa dos direitos e liberdades de terceiros, cfr. o n.° 2 do artigo 8.° da CEDH.

  21. Mais se diga que a Administração, no exercício do poder discricionário, não se encontra à margem dos princípios gerais de Direito Administrativo, nomeadamente, do princípio da legalidade, o que proíbe a motivação da acto fundada em critérios subjectivos e casuísticos expressamente invocados em sede de fundamentação.

  22. Na decisão de indeferimento não existiu, uma adequada ponderação dos vários interesses em questão, pelo que, se revela inconveniente e inoportuna a conservação da decisão ora recorrida, em homenagem ao dever de boa administração.

  23. Por outro lado, a fundamentação do indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência constante do despacho recorrido não pode deixar de se equiparar a falta de fundamentação, nos termos do disposto no n.° 2 do artigo 125.° do C.P.A., uma vez que os fundamentos adoptados são obscuros, pois não esclarecem concretamente a motivação do acto, violando o preceituado no n.° 1 do artigo 125.° do C.P.A., no n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77 e n.° 3 do artigo 267.° da C.R.P.

    A autoridade recorrida conclui nos termos seguintes: I. O princípio "tempus regit actum" impõe que a legalidade do acto impugnado deva ser apreciada tendo em conta a situação fáctica e jurídica existente no momento da sua prolacção, sendo irrelevante o novo documento, com data posterior àquele, apresentado pelo Recorrente após a petição de recurso.

    1. O despacho impugnado contenciosamente, que indeferiu o pedido de regularização extraordinária do Recorrente, por se encontrar abrangido pela causa de exclusão prevista no artigo 3°, alínea d), da Lei n.° 17/96, de 24 de Maio - ter sido indicado pelas Autoridades do Estado Alemão, para efeitos de não admissão no Espaço Schengen - não ofende qualquer preceito constitucional ou legal.

    2. A decisão recorrida, através da...

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