Acórdão nº 058/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução02 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A..., identificada nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal da sentença proferida no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou improcedente o RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO por si interposto da deliberação do CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DO IEP (Instituto de Estradas de Portugal), formulando as seguintes conclusões: a) a sentença recorrida enferma de erro de direito na parte em que considerou que a nova redacção, introduzida pela Portaria n.o 1465/2002, de 14 de Novembro, do ponto n.o 19.3 do Programa - Tipo em anexo à Portaria n.o 104/2001, não podia ser aplicada no procedimento sub iudice, dado que não há qualquer obstáculo legal à sua aplicação aos procedimentos concursais iniciados antes da sua entrada em vigor; b) é que, como se demonstrou nos nºs 9 a 11 destas alegações - com o apoio da lição de um Ilustre Administrativista - em matéria de eficácia temporal das normas de direito administrativo, não há obstáculos lógicos a que uma norma administrativa se aplique também aos factos ou situações produzidas antes da sua entrada em vigor e que ainda não se consumaram em definitivo; c) Com efeito, como refere AFONSO QUEIRÓ, "factos produzidos depois da entrada em vigor de uma norma não são só aqueles que constituem uma situação factual temporalmente limitada a partir do início da vigência dessa norma, mas também aqueles que, tendo-se iniciado antes da entrada em vigor da norma nova, constituem uma situação que ainda subsiste nesta altura e projecta a sua existência no futuro, no domínio temporal de vigência da lei nova. Estas situações não são, pois, instantâneas, são situações de trato sucessivo. Tais situações caem no âmbito temporal de eficácia da norma sucessiva, sem haver, portanto, rigorosamente, motivo algum para se falar aqui de retroactividade da lei administrativa nova" (ob. cit. p. 519 e 520); d) a sentença recorrida padece, assim, de clara violação de lei por não aplicação de lei sucessiva de aplicação imediata a uma situação que, tendo-se iniciado no domínio da lei antiga, ainda subsistia na altura da entrada em vigor da lei nova; e) a sentença recorrida, como ficou demonstrado nos n° s 16 a 21 destas alegações, padece ainda nesta parte de erro de direito, ao dar por improcedente a arguição de violação, pelo acto recorrido, do princípio da igualdade; é que, em primeiro lugar, o Tribunal a quo não podia ter desconsiderado, como desconsiderou, os exemplos invocados pela Recorrente na p.i., de relatórios de qualificação emitidos em Novembro de 2002 em concursos do ICERR, nos quais foi aplicada a redacção da Portaria n° 1465/2002 considerando-se a ora Recorrente económico-financeiramente apta para a realização das obras em questão; g) sendo completamente absurdo e violador do princípio da igualdade que em Dezembro de 2002 o Conselho de Administração do IEP tenha entendido manter a decisão de exclusão da Recorrente no presente procedimento, quando em finais de Novembro e no decurso desse mesmo mês de noutros procedimentos, estava a considerá-la económico - financeiramente apta para a realização de outras obras da mesma dimensão; h) constitui essa actuação, portanto, uma clara violação do princípio da igualdade, dado que, num mesmo momento e em procedimentos da mesma natureza, a Autoridade Recorrida adoptou critérios diferentes para a mesma situação; i) e a sentença recorrida, ao dar por improcedente esta arguição, padece de novo erro de direito; j) mesmo que se entendesse que não estaríamos em presença de uma lei sucessiva de aplicação imediata, nem assim a sentença recorrida deixaria de enfermar de erro de direito e de violação de lei; l) é que (como se demonstrou nos nºs 25 a 36 destas alegações, para onde se remete), o conteúdo da nova redacção do ponto 19.3 do Programa Tipo em anexo à Portaria n° 104/2001, introduzida pela Portaria n° 1465/2002, tem natureza de lei interpretativa da redacção anterior desse ponto 19.3 entretanto por ela revogada; m) é isso que resulta, aliás, claramente do preâmbulo da Portaria n° 1465/2002 - como se reconhece na sentença a quo - e do confronto da sua redacção com a versão inicial do ponto 19.3 do Programa Tipo; n) ora, tendo a Portaria n° 1465/2002 conteúdo interpretativo, a mesma tem efeito retroactivo (é esse o sentido de se dizer, no art. 13°, n° 1 do Código Civil, que ela se integra na lei interpretada) e devia ter sido aplicada no caso sub iudice; o) ao não considerar assim, a sentença recorrida fez errónea interpretação do conteúdo da Portaria n° 1465/2002 e violou o art. 13°, n° 1 do Código Civil; q) caso assim não se entenda - o que aqui se admite por cautela - deverá a sentença recorrida ser revogada na parte em que deu por improcedentes as arguições de ilegalidade dos pontos 15.1, alíneas i) e j) e 19.3 do Programa do Concurso; r) desde logo - com se demonstrou nos n° s 40 a 42 e 44 a 45 destas alegações, para onde se remete - é ilegal por errónea interpretação dos art.s 69° e 70° do REOP; s) mas, mesmo admitindo que o dono da obra, gozando de um poder discricionário nesta matéria, pudesse exigir aos concorrentes detentores de certificado tais documentos, a verdade é que, no caso concreto, o ICERR, ao não indicar expressamente no regulamento do concurso qualquer interesse público especialmente relevante que justificasse ou determinasse essa exigência, auto vinculou-se ao que aí fixou; t) o que consubstancia uma renúncia ao exercício discricionário de um poder público conferido por lei como tal; u) com a consequência de serem nulos, nos termos do art° 29°, nºs 1 e 2, do CPA, todos os actos (normativos ou não) do ICERR que decidam por remissão vinculada para uma norma regulamentar supostamente vinculada - como acontece com a presente deliberação recorrida; v) Padecendo, portanto, a sentença recorrida de novo erro de direito nesta parte; x) a sentença recorrida, ao não se pronunciar sobre a arguição constante das alíneas Q) a T) das conclusões das alegações da Recorrente, padece de nulidade, nos termos da alínea d) do n° 1 do art. 668° do CPC y) a utilização da Portaria n° 1454/2001 é ilegal, dado que ela foi posta na lei única e exclusivamente para a avaliação, feita pelo IMOPPI aos empreiteiros, para efeitos de atribuição dos competentes certificados; z) ao não entender assim, a sentença recorrida fez errónea interpretação do conteúdo da Portaria n° 1454/2001 e do DL n° 61/99.

A entidade recorrida (IEP - Instituto de Estradas de Portugal), apresentou as suas contra alegações, onde concluiu:

  1. As alegações de recurso da A... foram apresentadas fora de prazo.

  2. Tratando-se de um recurso interposto de uma decisão proferida no âmbito do processo urgente previsto no Decreto-lei 134/98 de 15 de Maio, as alegações de recurso jurisdicional tem de respeitar o estatuído nos artigos 113° n.º 1 e 115° n.1 da L.P.T.A.

  3. O processo previsto no DL 134/98 de 15 de Maio é urgente, tanto na fase de recurso contencioso, como na fase de recurso jurisdicional, pelo que aos recursos jurisdicionais a que haja lugar naqueles processos aplicam-se, pois as normas dos artigos 115° nº 1 e 113° n.1 e 6 da L.P. T .A. Tudo nos termos do proferido nos Acórdãos do STA de 14-12-99 Proc. 045664; de 1-07-99 Proc.045 132; de 27-10- 98 Proc. 044164; de 09-05-2000 Proc. 045664. Pelo que se deve considerar deserto o recurso interposto por falta de apresentação de alegações em tempo.

  4. Quanto ao objecto do recurso, a concorrente agora recorrente foi excluída do concurso público 2/2000-COC para execução da Empreitada de conservação na zona norte do Distrito de Santarém, nos termos do Relatório da CAC por demonstrar neste concurso falta de capacidade financeira.

  5. Esta conclusão fundamenta-se na análise dos documentos de habilitação apresentados pelos concorrentes, de acordo com o exigido na al. i) do 15.1 do Programa de Concurso e face ao exigido no n.o 19.3 do mesmo documento, donde se infere que ambas as empresas apresentam os "valores da liquidez geral" e do grau de cobertura do imobilizado" inferior ao quartil mínimo.

  6. O Programa de Concurso constitui um verdadeiro regulamento como bem refere o Ilustre Professor Mário Esteves de Oliveira in "Concursos Públicos e Outros Procedimentos...", pág. 135 e segs, e o Parecer da Procuradoria Geral da República N.º 80/90 publicado no DR 11 Série de 11-7-90.

  7. O Concurso teve por base um projecto e um caderno de encargos e um programa de concurso elaborado pelo Dono da Obra de acordo com o modelo aprovado por portaria do ministro responsável pelo sector das obras públicas, tal como imposto no n.º 1 do artigo 62° do RJEOP.

  8. Nos termos do n. 5 do memorando para utilização do Programa de Concurso Tipo ao dono da obra apenas é concedida a faculdade de efectuar pequenos reajustamentos ao modelo tipo.

  9. Não podem os Programas de Concurso e os Cadernos de Encargos conter disposições que contrariem o tipo legal aprovado, neste sentido Jorge Andrade da Silva in Regime Jurídico das Empreitadas das Obras Públicas 78 Edição Almedina Pág. 167 e segs.

  10. Assim nos termos do previsto no ponto 19.3. do programa de concurso aprovado pela citada portaria, também de acordo com o artigo 70° do DL 59/99 de 2 de Março, estatuiu-se no que se refere à qualificação dos concorrentes no ponto 19.3 do Programa de concurso que " a fixação de critérios de avaliação da capacidade financeira e económica dos concorrentes, para a execução da obra posta a concurso, deverá ser feita com base no quadro de referência constante na e Portaria n° 1454/2001 de 28 de Dezembro, com as alterações efectuadas pela Portaria N.º 509/2002 de Abril, devendo os concorrentes no mínimo apresentar cumulativamente os valores do quartil inferior previstos na Portaria.

  11. Estipulando a al j) do mesmo ponto que os concorrentes devem ainda apresentar, para confirmação dos valores daqueles indicadores cópias das declarações anuais do IRC 1998, 1999,2000, acompanhadas do respectivo anexo A).

  12. O dono da obra...

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