Acórdão nº 01234/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Maio de 2004
Magistrado Responsável | ADÉRITO SANTOS |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: (Relatório) 1.
A..., melhor identificado nos autos, veio interpor recurso da sentença, de 23.10.01, do Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa, que julgou totalmente improcedente a acção declarativa com processo ordinário que intentou contra o Estado Português, B..., C... e ..., pedindo a condenação dos Réus no pagamento das seguintes quantias, acrescidas de juros de mora: 1º, 2º e 3º Réus, quantia de Esc. 95.000.000$00; 1º e 4º Réus, solidariamente, a quantia de Esc. 5.000.000$00, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual.
Apresentou alegação, com as seguintes conclusões:
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A sentença recorrida, ao julgar não verificados os pressupostos do nexo de causalidade e da culpa, fez errada apreciação dos factos e aplicação do direito.
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A sentença recorrida não atentou devidamente nos factos dados como provados. Na verdade, C) Na alínea s) da especificação deu-se como provado que "perante os factos descritos em r) não restou ao A. senão passar à clandestinidade".
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Não é isso, no entanto, o que consta da sentença.
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Nesta, ao alinharem-se os factos assentes por acordo, no ponto 19, correspondente à referida alínea s), fez-se constar que "perante os factos descritos em 18, o A. passou à clandestinidade" (o n° 18 da sentença corresponde à alínea s) da especificação).
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A versão do facto em causa apresentada na sentença desvirtua substancialmente o que na acção foi dado como provado, tendo-lhe sido retirada a carga de facto imperioso. Ora, a passagem do A. à clandestinidade, foi entendida na sentença, como elemento essencial na apreciação do nexo causa, apreciação essa que, afinal, assentou em erro sobre a matéria de facto dada como provada.
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No equacionar da relação entre a conduta da Administração e os danos sofridos pelo A. a sentença serviu-se de quatro factos alegados pelos RR. e de um único facto alegado pelo A. e ainda assim desinserido do respectivo contexto, conduzindo, por isso, a uma errada interpretação dos factos.
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A formulação apresentada na sentença como "cerne da questão" não pode conduzir a uma decisão acertada porque assenta em premissas ilegítimas.
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A sentença é contraditória porque, por um lado, reconhece expressamente a atribuição dos vencimentos ao A. como um direito deste mas, por outro, insiste na qualificação da conduta do A. como ausência injustificada e deserção.
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Contrariamente ao decidido todos os prejuízos sofridos pelo A. e dados como provados são consequência adequada da conduta dos 2°, 3° e 4° RR.
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Na apreciação do requisito da culpa, foram ignorados e desprezados todos os factos provados alegados pelo A. apesar de serem essenciais ao apuramento da culpa.
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Além disso, a sentença não se deteve na análise da culpa de cada um dos RR, ignorando completamente a culpa do 2° e 3° RR.
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O 2° R procedeu dolosamente, ao demitir o A. da Força Aérea.
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Do mesmo modo procedeu o 3° R..
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O 4° R, ao não proceder à reintegração do A., actuou também com dolo e em elevado grau, o que está bem patente no facto de ter feito distribuir, pelos órgãos de comunicação social uma nota na qual refere que entende "ser impossível de amnistiar o carácter de ladrão e de cobarde".
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A sentença concluiu pela não verificação do requisito da culpa, absolvendo todos os RR do pedido, sem nada referir acerca do R. Estado, em relação ao qual basta a mera culpa.
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Verificam-se todos os pressupostos da obrigação de indemnizar por parte dos RR. pelo que a sentença recorrida, ao decidir em contrário, incorreu em erro de julgamento, com violação do disposto nos art.ºs 659° n° 3 do Código do Processo Civil, art.ºs 2°, 3°, nºs 1 e 2 e n° 1 e 2, todos do DL n° 48.051, de 21 de Novembro, 342°, 486°, 487°, n° 2, 497° n° 1, 562° e 563° todos do Código Civil e 21 ° n° 1, 267° nºs 1 e 2 e 271 ° n° 1 da Constituição da República Portuguesa (versão 76).
O Ministério Público, em representação do Estado, apresentou contra-alegação, com as seguintes conclusões: 1. São pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos a verificação cumulativa do facto, da ilicitude, da culpa, do nexo de causalidade e dos prejuízos.
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Nos termos do artigo 342º do Código Civil e em face de responsabilidade civil subjectiva competia ao A. alegar e provar factos constitutivos do direito a que se arroga.
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De mais relevante para a presente questão ficou provado que: Surgido o golpe militar de 25 de Novembro de 1975, foi o A. acusado de estar nele envolvido e de ser mesmo um dos seus responsáveis ou cabecilhas.
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O A. desde 26 de Novembro de 1975 deixou de comparecer em qualquer unidade das Forças Armadas Portuguesas, sem qualquer licença ou autorização para se ausentar do serviço.
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Sem apresentar explicação ou justificação dessa falta de comparência à hierarquia militar ou qualquer outra.
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O A. ausentou-se de Portugal para Angola sem autorização de quaisquer autoridades portuguesas.
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O A. que estava destacado no COPCON, foi mandado apresentar-se no Estado Maior da Força Aérea, mas não levantou a guia de marcha e desapareceu.
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Constata-se assim que não existe nexo de causalidade entre os eventuais prejuízos e os factos dados como provados, tendo sido pelo contrário invertido tal nexo.
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A necessidade de fugir para o estrangeiro e o facto de não poder assegurar em Portugal a sua liberdade, devem-se apenas ao seu envolvimento no referido golpe militar, e à possibilidade de poder vir a ser preso.
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O STA apenas declarou nula a Portaria de 21 de Junho de 1979 do CEMFA pelo vício de usurpação de funções do seu autor, não tendo apreciado a questão de fundo, e a mesma é muito posterior à fuga do A. para o estrangeiro.
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Também não se verifica o pressuposto da culpa.
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Dos factos dados como provados e não provados resulta que o Réu ... se opôs a uma precipitada reintegração do A. nos quadros da Força Aérea, tendo em atenção a defesa da coesão e da disciplina das Forças Armadas.
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Os factos dados como provados e referidos pelo A. nas suas alegações de recurso apenas se referem a condutas dos Réus tendentes a puni-lo pelo motivo da sua deserção.
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Face a tudo o exposto deve a douta sentença ser mantida.
Os RR B..., C... e ... apresentaram também contra-alegação, na qual formularam as seguintes conclusões: 1 - Quando os RR., ora respondentes, foram citados para a acção - em 23 de Março de 1993 - já havia ocorrido o prazo de prescrição previsto no art.º 71°, nº 3 da LPTA; 2 - Com efeito, o A. intentou a acção em 10.07.92; 3 - Como os RR. não moravam, nem moram, na área da Comarca de Lisboa, a citação prévia só pode preceder a distribuição quando esta não deva efectuar-se fora da Comarca - art.º 478°, nº 2 do CPC - 4 - A citação dos RR., depois de decorrido o prazo de prescrição, só ao A. pode ser imputada - cfr. Ac. STJ, de 07.02.91, publicado na Revista Actualidade Jurídica, Ano 111, nº 15/16, de Março de 1991; 5 - Tanto mais que os RR. já não estavam no activo da Força Aérea; 6 - Assim, tendo o A. proposto a acção em 10.07.92, não poderia alcançar-se a citação dos RR. até ao dia 16 de Julho de 1992, tanto mais que o Tribunal tinha de expedir cartas precatórias, para as outras Comarcas (Oeiras, Sintra e Setúbal), para se cumprirem as diligências da citação; 7 - A qualidade dos RR. (militares) é irrelevante para a preclusão da prescrição já que os artºs 498°, nº 1 do CC., ex-vi, art.º 71° da LPTA; bem como as normas do processo civil, não distinguem os sujeitos em função das suas profissões, sob pena de violação do art.º 13° da Constituição; 8 - Assim sendo, e salvo o devido respeito, o Meritíssimo Juiz a quo deveria ter julgado prescrito o direito à indemnização do A., relativamente aos RR., ora respondentes, por prescrição, pelo que foram violados os art.ºs 71°, nº 3 da LPTA e art. 13° da CRP.; 9 - Sem prejuízo do ante-dito, sufragamos, todavia, a douta decisão recorrida e, outrossim, a mui douta resposta do ilustre magistrado do Ministério Público; 10 - Na verdade, não existe nexo de causalidade entre os danos alegadamente sofridos pelo A. e os actos praticados pelos RR.; 11 - o A. fugiu, logo após o 25 de Novembro de 1975, apesar do Presidente da República ter decretado o Estado de Sítio; 12 - Quando é decretado o Estado de Sítio deve o militar apresentar-se na unidade onde está colocado, comportamento que o A não adoptou...
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