Acórdão nº 044757 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelANTÓNIO SAMAGAIO
Data da Resolução13 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NO PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO RELATÓRIO A..., concessionária da exploração de jogos de fortuna e azar na zona de jogo do Estoril, interpôs neste Supremo Tribunal recurso contencioso pedindo a anulação do despacho n.º 17/99/SET do Sr. Secretário de Estado do Turismo, de 12/1/99, que lhe indeferiu o recurso hierárquico da decisão do Sr. Inspector Coordenador da Inspecção que decidiu não confirmar o acto pelo qual a Recorrente recusara a emissão de cartão de acesso às salas de Jogos Tradicionais e à Sala de Máquinas a 76 frequentadores, imputando-lhe vício de violação de lei.

Por acórdão da 1ª Secção (3ª Subsecção) de 26/11/2003 (fls. 553 e segs.) foi negado provimento a tal recurso.

Inconformada com a referida decisão interpôs da mesma recurso para este Tribunal Pleno, tendo concluindo, desta forma, as suas alegações: "a) A recorrente é concessionária da exploração de jogos de fortuna e azar na zona de jogo do Estoril; b) Nessa qualidade e por decisão sua recusou o acesso às salas de jogos tradicionais e de máquinas a 76 jogadores, através da não emissão de cartões, por considerar inconveniente a sua presença; c) Tal decisão foi comunicada ao Serviço de Inspecção de Jogos junto do Casino do Estoril; d) Na sequência desta comunicação, o Senhor Coordenador da Equipa da Inspecção Geral de Jogos naquele Casino proferiu, em 30-12-1998, despacho em que decidia não confirmar a medida de recusa; e) Inconformada, a recorrente interpôs o competente recurso hierárquico para Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado do Turismo; f) Em 12/01/1999 o Senhor Secretário de Estado do Turismo, indeferiu o recurso interposto pela recorrente, confirmando o despacho da Inspecção-Geral de Jogos e aderindo na integra aos seus fundamentos; g) Notificada, a recorrente interpôs o competente recurso contencioso para o Supremo Tribunal Administrativo; h) O Tribunal negou provimento ao recurso com os seguintes fundamentos: - o entendimento defendido pela recorrente só aparentemente seria sustentável, numa análise mais profunda ao Decreto-Lei n.º 422/89, constata-se que tal entendimento tornava o diploma incongruente; isto porque, - o Inspector-Geral de Jogos encontra-se colocado, no âmbito do referido diploma, numa situação de supremacia, pelo que, não é congruente que o artigo 38º no n.º 3, do mesmo diploma, estabeleça que dos actos praticados pelo Inspector-Geral de Jogos ao abrigo do artigo 36º cabe recurso para o hierárquico e os mesmos actos praticados pelas concessionárias não se encontrem sujeitos a nenhum tipo de controle Administrativo; - a confirmar o entendimento supra exposto está o princípio geral sobre o âmbito dos poderes de inspecção enunciado no artigo 95º do referido diploma, que atribui expressamente à Inspecção Geral de Jogos competência fiscalizadora da actividade das concessionárias em matéria de aplicação de medidas preventivas e cautelares de inibição de acesso às salas de jogo, e que, portanto se incluem na matéria prevista no referido artigo 36º; - apenas existe uma lacuna relativamente à regulamentação do modo de exercício dessa tutela; - não existe qualquer obstáculo ao preenchimento dessa lacuna com recurso à analogia.

A recorrente não se conformou e interpôs o presente recurso jurisdicional; i) O Douto acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, seguindo a orientação do acórdão de 12/11/2003 do mesmo tribunal, salvo o devido respeito, não fez uma correcta interpretação e aplicação dos preceitos legais aplicáveis; j) Pese embora ter considerado, tal como a recorrente, que era manifesto que "(..) no artigo 36º se não prevê que a recusa de emissão de cartões de entrada ou de acesso às salas, determinada pelo director do serviço de jogos, isto é, pelo concessionário, seja sujeita a confirmação por outra entidade", considerou que só aparentemente se podia admitir essa solução; porque, k) O nº 3 do artigo 29º e no nº 2 deste 37º prevêem expressamente a necessidade de confirmação pelos serviços de inspecção das decisões das concessionárias; l) Daí ter concluído que, literalmente, a comparação dos artigos favorece a conclusão defendida pela recorrente de que a decisão do director do serviço de jogos, nas situações previstas neste artigo 36º não necessita de confirmação, pois não está ali expressamente prevista, ao contrário do que sucede naqueles artigos 29º e 37º; m) Mas, de imediato, vem concluir que da interpretação literal resultaria uma "incongruência na lei" uma vez que das decisões tomadas pelo inspector-geral de jogos cabe recurso para o membro do Governo, logo as decisões do director de serviço de Jogos têm de ter controle administrativo e este tem de ser exercido pela Inspecção Geral de Jogos por via de tutela; n) Ao concluir nestes termos, o Tribunal, sem suporte legal, partiu do princípio que o legislador pretendeu disciplinar o controlo das decisões do Inspector-Geral de Jogos nos mesmos termos em que pretendeu disciplinar as do director de serviço de Jogos;o) Não atendeu o facto do Inspector Geral de Jogos estar integrado na hierarquia da pessoa colectiva Estado e o Director do Serviço de Jogos ser um órgão de uma pessoa colectiva privada investida em poderes de autoridade por via da concessão; p) Não atendeu a que esta diferença de natureza não implicava igualdade de tratamento no que respeita ao controle dos actos que praticam; q) Não atendeu a que os destinatários dos actos do Inspector Geral de Jogos podem recorrer hierarquicamente e os destinatários dos actos do Director do Serviço de Jogos podem fazê-lo, desde logo, contenciosamente porque se consideram praticados pela concessionária, e em caso algum deixam de estar garantidos os meios de defesa; r) Assim, a previsão de recurso hierárquico fixada no nº 3 do artigo 38º, relativamente aos actos do Inspector Geral de Jogos, nada tem de incongruente, nem determina a necessidade de controle administrativo das decisões de não emissão de cartões, nos termos do artigo 36º, por parte do Director do Serviço de Jogos; logo, s) É ilegítimo e ilegal chamar à colação o artigo 95º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 422/89, quer pela desnecessidade, quer pelo facto do Tribunal considerar que ali se encontra um "princípio geral sobre o âmbito dos poderes de inspecção" ........ "atribuída(o) globalmente, para toda a matéria em que se enquadra a situação em apreço".

t) O Tribunal adultera o preciso sentido desta norma. Onde a norma diz que a Inspecção pode aplicar "medidas preventivas e cautelares de inibição de acesso às salas de jogo", o Tribunal interpreta que a Inspecção pode confirmar os actos do director de serviços do Casino em sede de medidas preventivas e cautelares de inibição de acesso às salas de jogo. O que, com o devido respeito, é ilegal.

u) O Tribunal, por esta via, pretendeu afastar uma pretensa lacuna de competência e a necessidade de recurso à analogia, sem atender a que o artigo 95º confere um poder inspectivo, enquanto o caso dos autos implicava um poder integrativo, ou, dado o caracter negativo do acto, revogatório ou substitutivo; v) A extensão dos poderes tutelares, preconizada pelo acórdão recorrido, contraria toda a jurisprudência e doutrina que defende que a tutela só existe nos casos e nos termos expressamente previstos na lei, "os actos de uma pessoa colectiva só estão sujeitos à tutela nos termos expressamente fixados na lei, isto é, apenas os actos que a lei dispuser, pela forma e para os efeitos nela estabelecidos e pelos órgãos aí designados" Marcello Caetano (Manual de Direito Administrativo, Vol. I, 10ª Edição, Livraria Almedina, pág. 232 e 233) ; w) Como facilmente se constata, a competência atribuída em termos genéricos pelo artigo 95º n.º 4 do Decreto-Lei n.º 422/89, é uma competência fiscalizadora, que conceitualmente se designa por tutela inspectiva, enquanto os actos praticados pela Inspecção-Geral de Jogos, à semelhança das competências estabelecidas pelos artigos 29º e 37º do referido diploma, consubstanciam uma tutela correctiva ou integrativa; x) A diferença entre estes dois tipos de tutela não meramente conceitual, é também substancial: a tutela inspectiva "consiste no poder de fiscalizar os órgãos e os serviços da pessoa colectiva, para o efeito de promover a aplicação de sanções contra ilegalidades ou má gestão" (Marcello Caetano, obra cit. Pág. 232); v) A tutela correctiva ou...

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