Acórdão nº 0600/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Outubro de 2004

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução21 de Outubro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A... e B..., com melhor identificação nos autos, vêm recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo do Funchal (TAFC), de 24.11.03, que julgou improcedente a acção que intentaram contra a Região Autónoma da Madeira, visando o pagamento da indemnização de 52.447.544$00.

Terminaram a sua alegação formulando as seguintes conclusões: I- Agravada incorreu em responsabilidade civil com a sua conduta ilícita, rescindindo o contrato de concessão sem ter dado aos concessionários, ora Agravantes, a oportunidade para exercer o seu direito de defesa, aliás contratualmente previsto na cláusula 5 do contrato celebrado e, obviamente admitido por acordo. O M. Juiz ao ter julgado como julgou violou o disposto nos arts. 483° e 804 do CC.

II- A Agravada fez aumentar o seu património à custa do património dos Agravantes, sem causa justificativa, pela apropriação abusiva e ilegítima dos bens dos concessionários, constituindo um enriquecimento à custa alheia - Art. 473° do CC.

III- A Agravada, com a sua conduta, impôs duas sanções distintas aos Agravantes - rescisão e a apropriação dos seus bens, quando na verdade, esta última não estava prevista no contrato celebrado. Do contrato de concessão resulta que a apropriação dos bens só se verificaria nas situações contempladas no ponto 6 do mesmo contrato, ou seja tanto no termo da concessão como nos casos previstos nos números dois e três do mesmo contrato. O não pagamento das percentagens, quando muito, e só caso a Agravante não fizesse as correcções a que alude a cláusula 5, apenas daria à Agravada a possibilidade de rescindir o contrato e de accionar a cláusula penal também contratualmente prevista na cláusula 21. Não teve assim, em conta o M. Juiz a matéria fáctica produzida e admitida por acordo violando expressamente o que disposto vem no n° 3 do art. 659° do CPC.

IV- Não observou a Agravada os mais elementares princípios de justiça a que se encontra subordinada, nomeadamente o princípio da legalidade, da proporcionalidade e da boa-fé, pelo que o M. Juiz ao decidir como decidiu violou o disposto nos arts. 3°, 5°, 6° e 6° A do CPA.

V- Os factos dados como provados e em que o M. Juiz fundamenta também a sua decisão constantes em 8, 9 e 10 da matéria fáctica são contraditórios VI- A sentença recorrida é deficiente na fundamentação contida no facto provado em 12, uma vez que tal implica despesas efectuadas pelos Agravantes e que inexplicavelmente não foram dadas como provadas.

VII- A factualidade constante do processo impõe decisão diversa, da proferida pelo M. Juiz.

VIII- Interpretando o M. Juiz o disposto no art. 483° do CC, no sentido de que não há ilicitude sempre que a lei permite a revogação unilateral dum contrato, sua rescisão, não havendo consequentemente responsabilidade civil, viola com essa interpretação os arts. 2° e 22° da CRP. Do mesmo modo, interpretando o art. 473° do CC no sentido de que, não há enriquecimento sem causa e, consequentemente não há lugar à restituição do enriquecimento, quando há violação contratual, viola com essa interpretação o n° 2 do art. 266° da CRP.

A recorrida sustentou a manutenção do julgado.

A Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer defendendo o improvimento do recurso jurisdicional.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

II Factos Matéria de facto dada como assente no TAFC: 1.

Aos AA, através da Resolução n° 1607/87 de 29-12 da Presidência do Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, publicada na I Série do JORAM, foi adjudicada a concessão de exploração do Parque de aves Exóticas (Louro Parque), localizado na parte Sul do Jardim Botânico.

  1. Os AA constituíram uma sociedade comercial por quotas, tendo como objecto social a exploração de um parque natural aberto ao público para exibição de pássaros e aves exóticas.

  2. Simultaneamente com a adjudicação, a Secretaria Regional da Economia da Região Autónoma da Madeira e o advogado dos AA aprovaram a minuta de um contrato escrito com os AA ou com sociedade comercial por estes a constituir, conforme consta do doc. 3 da petição inicial, que aqui dou por reproduzido (fls. 22 a 26), e donde consta que: -tal minuta foi feita em papel timbrado do Gabinete da Secretaria Regional da Economia da Região Autónoma da Madeira, -a concessão de exploração do Parque de Aves Exóticas (Louro Parque) localizado na parte Sul do Jardim Botânico é válida por 30 anos a contar da data da assinatura do contrato (clausula 3), -a SRE poderá revogar unilateralmente a presente concessão, quando se verifique por parte do concessionário infracção das leis criminais ou inobservância das condições contratuais; o concessionário terá o direito de fazer alguma correcção antes da revogação da concessão, -no caso de cessação do contrato, as aves e o equipamento do parque ficarão a pertencer à SRE da Região Autónoma da Madeira, -é da exclusiva responsabilidade dos AA tratar das formalidades relacionadas com importações, -o concessionário será responsável por todos os prejuízos causados no material causados por ele próprio ou por terceiros por sua conta, -se a SRE não tomar as medidas para reparação dentro de um prazo razoável, o concessionário tem o direito de as fazer e de debitar as despesas à SRE, -a Divisão do Jardim Botânico é responsável pela indicação de um local para o lixo, -o concessionário será responsável pela vigilância, segurança e bom funcionamento do jardim, -a SRE não será responsável pelo desaparecimento de pássaros e equipamento no local, -a SRE é responsável pela manutenção e reparação de canos, esgotos, casas de banho, água e electricidade, -o preço das entradas será submetido à aprovação da SRE, -todos os estudantes da Madeira terão entrada livre, -para garantir o cumprimento das obrigações do contrato, o concessionário depositará à ordem do Governo Regional da Madeira 1.000.000$00, -o concessionário pagará à SRE a renda mensal de 10.000$00, acrescida de 20% do valor das entradas cobradas no mês anterior 4.

    Esse contrato tem como objecto a construção e exploração de um Parque de Aves Exóticas (Louro Parque), localizado na parte Sul do Jardim Botânico, tudo e o mais como consta do doc. 3 da petição inicial, que aqui dou por reproduzido (fls. 22 a 26).

  3. Em 15-1-1988, advogado Dr. ..., advogado dos AA, dirigiu uma carta ao Secretário Regional da Economia, registando o compromisso verbal assumido pela R, ou seja, para a adequada instalação e bom funcionamento do parque eram necessárias obras complementares de infra-estruturas conforme consta do doc. 4 da petição inicial, que aqui dou por reproduzido.

  4. Nesse mês de Jan.-1988, com o nº de ref. 116/GR, respondeu o senhor Secretario Regional de Economia à carta antes referida, informando que as obras referidas seriam concluídas nos prazos indicados (doc. 5 da petição inicial).

  5. Em 11- 7 -1991 foi decidido em Conselho de Governo e através da Resolução 743/91 revogar a Resolução 1607/87, com fundamento em «incumprimento do contrato exclusivamente imputável aos concessionários» (v. doc. 11 da petição inicial, que aqui dou por reproduzido, donde consta, nomeadamente, que «os adjudicatários até á data não respeitaram, nem cumpriram, com as solicitações da assessoria jurídica da Presidência do Governo, no sentido da apresentação dos documentos necessários à formalização do contrato, o que impede a sua celebração; aqueles ...têm vindo a não pagar atempadamente a renda fixada e a percentagem do valor das entradas cobradas; foi publicitada a venda do Parque»).

  6. Os AA devem à Região Autónoma da Madeira 4.073.682$00 esc..

  7. Os AA reconhecem que, à data da recepção da Resolução 743/91, não estavam a satisfazer pontualmente as entregas das percentagens à Região Autónoma da Madeira.

  8. Deviam então à Região Autónoma da Madeira 5.000.000$00 esc., tendo sido notificada a empresa anteriormente para regularizar as...

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