Acórdão nº 020/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Janeiro de 2005

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução12 de Janeiro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. A…., interpôs, na 1ª Secção deste S.T.A., recurso contencioso de anulação "do despacho do Secretário de Estado da Administração Educativa, de 17 de Julho de 2002, que aplicou à Recorrente uma pena de multa de 15 salários mínimos nacionais, e ordenou a reposição de 175.145.15 €, a devolução ao Centro de Emprego de Figueiró dos Vinhos de 9.621,21 € e a devolução aos Encarregados de Educação dos Alunos do 5º ao 9º ano de 1.027,77 €" 1.2. A entidade recorrida respondeu, nos termos constantes de fls.200 e segs, sustentando o improvimento do recurso.

1.3. A Recorrente apresentou as alegações de fls. 314 e segs, as quais concluiu do seguinte modo: "I) Sendo a conduta assacada à recorrente conhecida do dirigente máximo do serviço (inspectora geral da educação) desde 10 de Fevereiro de 2001, e sendo o despacho que ordenou a instauração de processo disciplinar proferido em 1 de Junho de 2001, o procedimento disciplinar "sub judice" estava prescrito quando foi instaurado.

II) não colhe a argumentação da entidade recorrida, situando o dies a quo para determinação da prescrição após a análise do contraditório sobre o relatório de auditoria, pois a administração educativa nem sequer tinha que facultar à recorrente qualquer contraditório sobre tal documento. nessa medida, as pretensas faltas assacáveis à recorrente eram do conhecimento do dirigente máximo do serviço desde 10 de Fevereiro de 2001.

III) Caso se entenda que a administração educativa estava obrigada a cumprir o disposto no artigo 100º do CPA, relativamente ao relatório da acção de inspecção "contrato de associação 1998/99", a entidade recorrida, ao não ter informado a recorrente do sentido provável da decisão final do procedimento inspector qual fosse a de instaurar processo disciplinar não deu cabal cumprimento àquele preceito, com o que incorreu em violação de uma formalidade absolutamente essencial, o que constituiria nulidade insuprível, que tornaria ilegal o processo disciplinar e anulável a decisão punitiva.

IV) Mal se compreende a tese defendida pela entidade recorrida, quando noutro processo, com os mesmos contornos, mandou arquivar o procedimento disciplinar por considerar que o "dies a quo" para a contagem do prazo de prescrição do procedimento disciplinar era a data de conclusão do relatório de auditoria.

V) Nessa medida, a decisão recorrida violou os princípios da igualdade, justiça e imparcialidade, consagrados nos artigos 5°-1 e 6° do CPA, normas que foram violadas pelo despacho recorrido.

VI) E mesmo que não pudesse reconhecer-se a prescrição relativamente ao procedimento disciplinar no seu todo, sempre haveria que reconhecê-la, por aplicação do n° 1 do artigo 4° do. ED, quanto aos factos consignados nos artigos 15° e 16° da acusação, pois a acusação não data o momento em que a recorrente teria solicitado aos encarregados de educação o pagamento de 650$00 Pte/Aluno, o que ocorreu por alturas da renovação de matrícula efectuada antes do termo do ano lectivo anterior (1997/98), mais de três anos, portanto, antes da instauração do processo disciplinar.

VII) E mesmo que assim não fosse, é de acolher que a acusação e, portanto, a decisão não contêm os factos necessários para que se possa sustentar a condenação e obrigação de devolução da quantia de 1.027,77 €. é nulo o despacho recorrido, como nula era a acusação, por violação do artigo 283°-3 b) do Código de Processo Penal, ex vi do artigo 35º do ED, normas que foram violadas.

VII) A falta de notificação à recorrente das listagens de alunos por escolas e níveis de ensino de fls. 688 a 702, e das contas de gerência de fls. 876 a 1.461 dos autos de processo disciplinar, e a não obtenção, pelo instrutor, de contas de gerência de 37 escolas da área da DREC, cuja solicitação havia sido requerida e deferida, constitui omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade, geradora de nulidade insuprível do procedimento disciplinar.

IX) Sem dispor da totalidade das contas de gerência e sem poder correlacioná-las com as listagens de alunos por escolas e níveis de ensino, ficou a recorrente impedida de demonstrar que "o custo de manutenção e funcionamento por aluno das escolas públicas de nível e grau equivalente" é bastante superior ao custo/preço por aluno pago à recorrente, no ano lectivo 1998/99, pelo Ministério da Educação, conclusão donde decorreria que a recorrente, longe de ser devedora do estado, era sua credora, não tendo, consequentemente, qualquer obrigação de restituir verbas, conforme decretado na decisão recorrida. tal constitui limitação da defesa e da descoberta da verdade, geradora q de nulidade insuprível.

X- O relatório final do processo disciplinar - usado a par da informação da IGE n° 75/2002, na fundamentação da decisão recorrida - jamais foi entregue, na íntegra, à recorrente, havendo falsidade da certidão da notificação da decisão sub judice, junta com a P.I como documento n°1, que levou ao conhecimento da recorrente uma versão truncada de tal peça processual. Assim sendo, a fundamentação de facto levada ao conhecimento da recorrente é claramente deficiente, o que inevitavelmente conduz à anulação da decisão recorrida.

XI- Em face da total omissão de indicação das normas legais em que assenta a obrigação de devolução aos Cofres do Estado de 175.145,15 €, de devolução ao Centro de Emprego de Figueiró dos Vinhos de 9.621,21 € e de devolução aos encarregados de educação de 1.027,77 €, a decisão recorrida enferma ainda de vício de forma, por falta de fundamentação de direito, vício igualmente conducente à sua anulabilidade.

XII- A recorrente enviou à DREC os mapas informativos modelo DREC/EPC n° 1/96, DREC/EPC n° 3/98 e DREC EPC n° 4/98, mapas esses meramente previsionais, que uma vez analisados por aquela, deram origem a um mapa interno/DREC só comunicado ao instituto em Maio 99, no momento da assinatura do contrato de associação.

XIII- A drec manteve no mais profundo sigilo os critérios que norteiam a aplicação do disposto no ponto 3 do despacho 256-A/ME/96, que consequentemente não puderam ser contestados, e nem mesmo no decorrer do processo disciplinar foram revelados.

XIV- Há uma clara deficiência do processo instrutor ao juntar aos autos um mapa interno da DREC intitulado "grelha de aplicação de parâmetros", supostamente referente ao Instituto Vasco da Gama, mas na verdade referente ao Colégio de S. Mamede, donde constariam os critérios de aplicação do despacho 256-A/ME/96. Nem mesmo no processo disciplinar foram revelados os critérios de aplicação daquele despacho, resultando insuficiente para a punição a matéria de facto em que assenta a decisão sob recurso.

XV- Não existe norma legal ou cláusula contratual que obrigue a recorrente a dar às parcelas de valores contidas no "mapa interno" de fls. 207 e 573, uma aplicação "orçamentalmente vinculada".

XVI- A "DREC" jamais solicitou às Escolas Particulares que lhe apresentassem correcções, balancetes trimestrais, balanço de contas anuais, contas de gestão, orçamento de gestão para o ano seguinte, ou outros quaisquer elementos documentais, sendo certo que a estrutura do Ministério da Educação responsável pelo ensino particular e cooperativo afirmou expressamente ás entidades proprietárias de Escolas Particulares, que fizeram menção de entregar estes elementos de carácter financeiro, que não o fizessem até que lhes fosse expressamente solicitado.

XVII- Os pressupostos de facto e de direito em que assenta a decisão sob recurso revelam-se inexistentes. Padece assim a decisão sob recurso de vício de forma, por falta de fundamentação e de violação da lei, quer no que se refere à pena de multa aplicada, quer no que tange às reposições/ devoluções conexas.

XVIII- O estatuto disciplinar dos funcionários e agentes da administração, aprovado pelo Dec.Lei n.° 24/84, de 16 de Janeiro, é inaplicável às escolas particulares com contratos de associação, na parte respeitante à reposição de importâncias pecuniárias (artigo 65°), porque a aplicação do estatuto pressupõe a existência de uma relação hierárquica típica, que in casu não existe.

XIX- As escolas particulares, não estão abrangidos pela norma de incidência passiva do art.° 1° do ED, nem pelo conceito de funcionário previsto no art.° 386° do código penal.

XX- Não existindo uma relação hierárquica entre o ministério da educação e escolas privadas, mas antes uma relação de matriz contratual, o processo disciplinar tendente a fiscalizar a execução dos contratos de associação apenas poderia servir para confirmar ou infirmar os indícios da prática de infracções disciplinares previstas no Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, aprovado pelo Dec.-Lei n.° 553/80, de 21 de Novembro puni-las com as sanções previstas no art. 1° da Portaria 207/98, de 28 de Março, aplicadas com respeito do ali estipulado nos artigos 2° a 5°, e não já para impor, cumulativamente, a obrigação de restituir montantes integradores de prestações contratuais efectuadas.

XXI- A interpretação defendida pela entidade recorrida, qual seja a da obrigação de reposição de verbas decorrer do artigo 65° do ed, viola o princípio da legalidade ("nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege"), basilar no nosso ordenamento juspunitivo (art. 1° do cod. penal, ex vi do artigo 9º do ed), com foros de constitucionalidade (artigo 29°-3 da CRP).

XXII- O Ministério da Educação, que foi parte outorgante no contrato de associação, representado pela direcção regional de educação do centro, não pode arrogar-se no direito de decidir (julgar) que aquela parcela do preço dos serviços prestados não era devida e que em consequência devia ser restituída.

XXIII- E não pode fazer prevalecer, por acto administrativo, ou mera actuação do seu ius imperium, a sua interpretação do contrato, segundo a qual as verbas disponibilizadas ao abrigo do dito contrato de associação seriam verbas entregues para uso do contraente privado segundo uma estrita afectação ou...

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