Acórdão nº 01108/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Abril de 2005

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução07 de Abril de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

1 - A CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA recorre, com fundamento em oposição de julgados, do Acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, de 8-10-2002, que negou provimento ao recurso jurisdicional que interpusera da decisão do 5.º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, que julgou procedente "...a pretensão deduzida por A..., S.A., declarando nula e de nenhum efeito a liquidação da compensação por aumento de área, no valor de 46.480.613$50...

".

A Recorrente indicou como fundamento do recurso o acórdão deste Plenário de 30-5-2001, proferido no recurso n.º 22251.

Por acórdão deste Plenário de 26-11-2003, que consta de fls. 393-395, foi decidido o prosseguimento do recurso jurisdicional, por se entender que se verifica a invocada oposição de julgados, nos termos da alínea a"), do artigo 22º do E.T.A.F. de 1984, por os Acórdãos em confronto (o Recorrido e o Fundamento) consagrarem soluções antagónicas sobre a mesma questão fundamental de direito, tendo partido de situações de facto idênticas.

Essa questão é a de «apurar qual a consequência jurídica de acto que, baseando-se em Despacho (nº 166/P/84) nulo, procedeu à liquidação das quantias devidas a título de compensação por aumento de área, sendo que no Acórdão recorrido se concluiu pela nulidade de tal acto de liquidação enquanto que no Acórdão fundamento se entendeu enfermar o dito acto de vício gerador de mera anulação».

A existência de oposição é manifesta, pelo que se confirma a verificação dos requisitos de que depende o presente recurso.

2 - Pelo despacho de fls. 398 verso foi decidido que são de considerar como alegações sobre a questão que é objecto do recurso as que a Recorrente apresentou, antecipadamente.

Nessas alegações, a Recorrente conclui da seguinte forma: 1ª - Os dois Acórdãos em causa decidiram de forma oposta a mesma a mesma questão fundamental de direito - saber se o acto de liquidação e cobrança de uma taxa que aplica uma norma ilegal, ou mesmo inconstitucional, é sancionado com a nulidade ou com a mera anulabilidade.

  1. - Enquanto o douto Acórdão recorrido considerou nulo e de nenhum efeito o acto de liquidação da compensação por aumento de área, por ter sido declarada a nulidade do Despacho nº. 166/P/84, que aplicou, o douto Acórdão que serve de fundamento ao presente recurso considerou que os actos que procederam à liquidação e cobrança dos tributos em causa, com fundamento no citado Despacho, são meramente anuláveis.

  2. - A presunção de legalidade dos actos administrativos tem como consequência também a obrigação da Administração aplicar as normas enquanto estas vigorarem na ordem jurídica.

  3. - A impugnação do acto tributário deve ter por fundamento os vícios desse acto e não aqueles que se prendem com a norma que aplicou.

  4. - O acto tributário que aplica norma ilegal padece de erro sobre os pressupostos de direito, tudo se passando como se não existisse base legal para a tributação.

  5. - O erro de direito entra no vício de violação de lei.

  6. - A sanção geral da invalidade do acto administrativo ferido de ilegalidade, por razões de certeza e de segurança da ordem jurídica, é a da anulabilidade 8ª - A aplicação da sanção da nulidade ao caso em apreço, com a possibilidade de impugnação a todo o tempo, no sentido de não se permitir a consolidação do acto de liquidação na ordem jurídica, implicaria um clima de insegurança e incerteza jurídica, incompatível com as necessidades da sociedade em geral.

  7. - Os actos de liquidação em causa não são nulos face ao disposto na d) do art. 133º, do Código do Procedimento Administrativo pois a liquidação e cobrança de um imposto ou taxa com fundamento num despacho nulo não ofende o conteúdo essencial de um direito fundamental e não eram, igualmente, nulos antes da entrada em vigor do C.P.A., pois não existia norma legal que fulminasse tais actos com a nulidade.

  8. - O que a lei considera nulo e de nenhum efeito é o Despacho nº 166/P/84 do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

  9. - Os actos impugnados contenciosamente nos presentes autos e que procederam à liquidação e cobrança dos tributos em causa, com fundamento no citado despacho nulo nº 166/P/84, do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, não são nulos mas meramente anuláveis.

  10. - A recorrente pugna, assim, pela manutenção da posição adoptada pelo douto Acórdão que serve de fundamento ao presente recurso.

    Nestes termos e nos demais de Direito, verificada que foi a existência de oposição de acórdãos, nos termos previstos na alínea a"), do artigo 22º, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e do artigo 103º, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, deverá a mesma ser julgada no sentido de considerar que o acto de liquidação e cobrança de uma taxa que aplica uma norma ilegal, ou mesmo inconstitucional, é sancionado com a mera anulabilidade.

    SÓ ASSIM DECIDINDO SE FARÁ A JÁ COSTUMADA JUSTIÇA.

    A Impugnante apresentou contra-alegação com as seguintes conclusões: 1ª - O acto sindicado no presente recurso contencioso é um acto consequente do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa 166/P/84; 2ª - Esse despacho 166/P/84 é nulo, como tal já antes foi incidentalmente julgado pelo Tribunal "ad quem" e pelas razões que constam da presente alegação; 3ª - Pede-se que essa nulidade seja declarada incidentalmente pelo Tribunal "ad quem", por ser questão cuja resolução é imprescindível para a solução justa do pleito; 4ª - Os actos consequentes de actos declarados nulos são nulos "ex lege".

  11. - Sendo o acto recorrido consequente do despacho 166/P/84, deve com esse fundamento ser mantida a decisão que concedeu provimento ao recurso contencioso da A...; 6ª - Estando pendente recurso contencioso interposto pela A..., com vista à declaração da nulidade do despacho 166/P/84, sempre se requer, por cautela, que no caso de o douto tribunal "ad quem" não entender dever julgar incidentalmente a nulidade do despacho-fundamento do acto sindicado, suspenda a instância até ao trânsito em julgado da decisão a proferir naqueles autos sobre a respectiva nulidade, visto tal ser imposto pelos princípios da justiça e da harmonização dos julgados, depois disso se julgando improcedente o presente recurso jurisdicional.

    Termos em que, com o muito douto suprimento, deve ser declarada incidentalmente a nulidade do despacho-fundamento (166/P/84) e, em consequência, ser negado provimento ao recurso, visto ser nulo o acto consequente sindicado nos presentes autos, ou, quando assim não se entenda, ser suspensa a instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida sobre o pedido de declaração de nulidade do mesmo despacho-fundamento, depois disso se julgando ser nulo o acto impugnado na espécie, enquanto acto consequente daquele acto nulo.

    Assim V. Ex.ªs. farão JUSTIÇA! O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos: O recurso, em meu parecer, não merece obter provimento.

    Com efeito, subscrevendo por inteiro as doutas considerações produzidas na declaração de voto de vencido constante do acórdão fundamento (fls. 379), sendo certo que nada de relevante se me oferece acrescentar, afigura-se-me estar ferido de nulidade, e não mera anulabilidade, o acto de liquidação de quantias devidas a título de compensação por aumento de volumetria de prédio urbano, uma vez que se baseia em Despacho (fls. 166/P/84) nulo.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    3 - No acórdão recorrido deu-se como assente a seguinte matéria de facto: A). Em 26/11/1988 a recorrente, "A..., SA", requereu, na C.M. Lisboa a aprovação de um projecto e o licenciamento da construção de obra nova que pretendia levar a efeito nos lotes de terreno de que é proprietária situados na ..., nº ... e ..., nºs .... a ..., em Lisboa - cfr. fls. 1 do proc. 5146/OB/88; B). Em 28/05/1989, por despacho do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), foi deferida a pretensão da recorrente, condicionada, para além do mais, ao pagamento de uma "compensação por aumento de área", nos termos da informação referida em C), que segue - cfr. fls. 1 e 90 do proc. 5146/OB/88; C). Através da informação nº 1311/7"/U, constante de fls. 90 do proc. 5146/OB/88, de 01/08/1989, foi efectuado o cálculo de encargo de compensação por aumento de área, de esc. 50.794.200$00 - cfr. proc. E/56/7"/U/89; D). Através do ofício nº 42/DP, datado de 06/03/1990, foi a recorrente informada que o processo de licenciamento referido em A). que antecede foi sujeito ao encargo, para além do mais, de compensação por aumento de volumetria, no valor de esc. 50.794.200$00 - cfr. fls. 13 destes autos e proc. E/56/7"/U/89; E). A recorrente não foi notificada do fundamento legal para a exigência do encargo referido em D). que antecede - cfr. processos administrativos juntos por linha; F). O valor total das quantias entregues pela recorrente à Câmara Municipal de Lisboa ascendeu a esc. 46.480.613$50, dos quais 7.300.000$00 foram pagos por doação à CML do prédio sito na ..., nº ..., em Lisboa, em 30/12/1989 e 39.180.613$50 foram pagos em seis prestações, a primeira das quais em 23/01/1990 - cfr. fls. 14 a 28 destes autos; G). Os serviços da CML informam que a quantia referida em D). que antecede foi liquidada com base no nº 4 do despacho nº 166/P/84, publicado no Diário Municipal nº14.524, de 30/11/1984 - cfr. fls. 192 a 194 destes autos; H). Em 11/02/1994 a ora recorrente interpôs, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, o presente recurso contencioso do despacho referido em B). que antecede, tendo sido proferida sentença decidindo ser aquele TAC incompetente, em razão da matéria, para conhecer do mesmo, decisão que veio a ser confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo por acórdão de 04/11/1998 - cfr. fls. 1, 114, 115 e 148 a 155.

    4 - O acto impugnado é o praticado pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que condicionou a concessão de uma licença de construção ao pagamento de uma «compensação por aumento de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT