Acórdão nº 0815/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Maio de 2005

Magistrado ResponsávelROSENDO JOSÉ
Data da Resolução31 de Maio de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA: I - Relatório.

A… e mulher residentes em …, concelho de Vila Nova de Famalicão, intentaram recurso contencioso de anulação do despacho de 17 de Janeiro de 2003 que aprovou a localização e identificou o prédios abrangidos para a implantação do sub-lanço Barcelos-Braga Oeste da Auto-estrada A3 e declarou a utilidade pública da expropriação desses terrenos, da autoria do SECRETÁRIO DE ESTADO DAS OBRAS PÚBLICAS.

Foram indicados como interessados o - INSTITUTO DE ESTRADAS DE PORTUGAL e - B…, com sede em Braga.

Como fundamentos do recurso dizem, em resumo: - O acto declarativo da utilidade pública não foi notificado nos termos do artigo 17.º n.º 1 do CExp. aos recorrentes, como expropriados conhecidos da parcela 305 e 305S, do prédio "…" inscrito na matriz da freguesia de Sequeira, sob o art.º 563 e descrito na CRP de Braga sob o n.º 555/Sequeira.

- O Instituto de Estradas de Portugal notificou os recorrentes para o auto de posse administrativa a realizar em 27 de Fevereiro de 2003, pelas 10 horas, em virtude de se ter apresentado nessa qualidade, com procuração irrevogável dos beneficiários do registo predial, na reunião para a qual tinham sido convocados os proprietários, de 18 de Dezembro de 2002, pelas 14 horas, na Junta de freguesia.

- O acto não está fundamentado de modo expresso, como devia, em infracção aos artigos 123.º n.º 1 d) e 124 e 125.º do CPA.

- A competência para expropriar é do Ministro nos termos do art.º 14.º do CExp. pelo que o acto incorre em usurpação de poder.

- A não notificação da declaração de utilidade pública significa falta de fundamentação.

- Como os 1253 m2 que constituem a faixa sobrante do prédio a expropriar, serão em grande parte abrangidos por servidão "non aedificandi" os recorrentes vêem afastada a possibilidade de levantar no local a edificação que planeavam para sede da firma "…" de que o recorrente marido é único administrador.

- Tinha proposto ao IEP uma solução menos gravosa para os interesses que tem sobre o terreno, pela utilização de terreno agrícola contíguo que lhe vai ser adjudicado em inventário, mas foi surpreendido com a declaração de utilidade pública, em termos que lhe causam prejuízo incalculável, sem necessidade de a expropriação ser efectuada naqueles termos, pelo que é violado o princípio da proporcionalidade do artigo 2.º do CExp. bem como os princípios da justiça e da boa-fé.

Na resposta o Secretário de Estado das Obras Públicas sustentou a ilegitimidade activa do recorrente e sobre o fundo disse, em resumo: - O restabelecimento paralelo 17B foi projectado pelo IEP de acordo com as condicionantes que resultam da linha de água, cabina da EDP e encaixes no caminho interrompido pelo que a alteração obrigaria não só a novo projecto, mas também à expropriação de idêntica porção de terreno a outro particular.

- O acto recorrido está suficientemente fundamentado.

- Foi praticado no uso de poderes delegados devidamente invocados.

O IEP contestou, dizendo, em resumo: - Os recorrentes não tem legitimidade para o recurso, não sendo proprietários, apenas o recorrente marido detém uma procuração irrevogável para vender a propriedade.

- O acto foi praticado no uso de delegação de poderes devidamente invocada e do conhecimento dos recorrentes.

- A parcela é indispensável ao restabelecimento a construir, projectado de acordo com as circunstâncias da situação, não se justificando a respectiva modificação, com expropriação de outro particular.

- Quanto às afirmações relativas a violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, legalidade e boa-fé, tal como a falta de fundamentação do acto, os recorrentes não as fundamentam, pelo que não podem proceder.

A B… também contesta, dizendo em resumo: - Os recorrentes não possuem a propriedade nem direito real ou ónus sobre o bem a expropriar, alegam apenas o interesse derivado da procuração irrevogável para venda, que o recorrente marido detém, mas não tendo ocorrido a venda o prédio continua a ser dos proprietários e não dos recorrentes.

- Os recorrentes não são interessados nos termos do artigo 9.º do CPA porque não são titulares da propriedade nem de outro direito real, nem arrendatários, razão pela qual não tinham de ser notificados da declaração de utilidade pública da expropriação, pelo que o acto não sofre de ineficácia ou inconstitucionalidade, nem havia obrigação legal de levar ao conhecimento do recorrente a sua fundamentação, o seu conteúdo, nem invocação de delegação, nem existem os vícios que os recorrentes associam à falta de notificação.

- O dano alegado para fundar a violação do princípio da proporcionalidade não existe, por ser hipotético e, em qualquer caso não se verificar na esfera jurídica de um expropriado ou interessado.

- Não é possível discutir traçados nestes autos nem pedir ao Tribunal que se substitua ao Governo na definição dos traçados.

Pelo Acórdão de fls. 231, transitado em julgado, foi decidida a legitimidade activa dos recorrentes e ordenado o prosseguimento do recurso.

Nas alegações finais os recorrentes oferecem as seguintes conclusões úteis: - A declaração de utilidade pública nunca foi notificada aos recorrentes como impõe o art.º 17.º n.º 1 do C.Exp. pelo que não produz efeitos na sua esfera jurídica.

- A violação do direito constitucional à notificação afecta todo o consequente procedimento administrativo.

- Não tiveram conhecimento do conteúdo e da fundamentação do acto pelo que é nulo.

- O acto recorrido incorre em usurpação de poderes, porque o seu autor não possui competência própria e não tendo os recorrentes sido notificados, existe, na prática, falta de invocação de competência delegada.

- Em virtude da falta de notificação não lhe foi permitido a defesa e o contraditório.

- Foi também violado o princípio da audiência dos interessados determinando a anulabilidade do acto administrativo.

- E violado foi também o princípio da proporcionalidade, atento ter provado que tinham interesse fundamental para o sucesso comercial através da sociedade de que o recorrente marido é único sócio, na construção da sede da sociedade, naquele terreno, sem para o efeito possuir nenhum outro, e que a alteração de traçado por si proposta não teria desvantagens para o interesse público, antes incidiria sobre terreno agrícola que também pertence aos recorrentes, e não obtiveram resposta a esta proposta nem à insistência que dela fizeram.

- A violação atinge os três níveis em que opera este princípio, necessidade da expropriação; necessidade do bem e necessidade do dano.

- É também violado o princípio da justiça, na vertente da não adequação da conduta da Administração à realidade da situação concreta através do equilíbrio dos interesses em jogo.

- O princípio da boa fé foi violado pela intransigência na aceitação de quaisquer propostas dos interessados e com ele o princípio da audiência dos interessados que prevê a possibilidade de se pronunciarem sobre a legalidade e a oportunidade da expropriação.

A Estradas de Portugal, EPE, designada "EP", apresentou-se como sucessora legal do IEP a contra alegar, tendo mantido posição idêntica à da resposta (fls. 256-261).

O Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas também contra alegou concluindo que os recorrentes pretendem extrair os vícios que alegam da falta de notificação pessoal, que resultou de dúvidas sobre a sua legitimidade, mas acabaram por ter amplo conhecimento do acto e defender os seus direitos através deste recurso. Além disso as posições da Administração tiveram como base juízos técnicos.

A B… também contra alegou, afrontando especificadamente todos os pontos da alegação da recorrente, e formulou conclusões de conteúdo idêntico ao que se sumariou da respectiva contestação, concluindo pela improcedência do recurso.

O EMMP emitiu douto parecer final em que diz, em resumo: - Não se vê que prejuízo possa advir para a B… do provimento do recurso, pelo que é de considerar parte ilegítima.

- O acto recorrido não tinha de ser notificado aos recorrentes porque não eram os titulares do terreno inscritos no registo, mas tomaram conhecimento do decurso do processo expropriativo, o que lhes permitiu o direito do contraditório e desencadear os mecanismos contenciosos de impugnação.

- Não se verificam os vícios de falta de fundamentação nem de usurpação de poderes, porque o acto contém fundamentação e indica o uso de poderes delegados.

- Dada a natureza urgente da DUP estava dispensada a audiência prévia, por natureza.

Não vêem demonstrados factos que permitam concluir pela violação dos princípios que os recorrentes apontam como violados.

II - Matéria de Facto Provada e Relevante.

a) Os proprietários do prédio rústico "…", com a área de 2600m2, inscrito na matriz sob o n.º 563 e descrito na CRP de Braga sob o n.º 555/Sequeira … e … outorgaram em favor do recorrente marido a procuração irrevogável de 3 de Outubro de 2002, lavrada no 1.º Cartório...

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