Acórdão nº 0689/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Junho de 2005
Magistrado Responsável | ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 29 de Junho de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em subsecção, na secção do contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
1.1.
A..., técnica de justiça principal dos serviços do Ministério Público, interpõe recurso contencioso do acórdão do Conselho Superior do Ministério Público - CSMP -, de 27.11.2002, que, em sede de processo disciplinar, lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva.
1.2.
Notificada, a autoridade recorrida não respondeu.
1.3.
Em alegações, continuando a apontar ao acto os vícios que indicara na petição de recurso, concluiu: "1ª Nos termos do n.º 3 do artº 218º da Constituição, é da competência exclusiva do Conselho Superior da Magistratura a apreciação do mérito profissional e o exercício da função disciplinar sobre os funcionários de justiça.
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A mesma norma constitucional apenas dá a possibilidade ao legislador que do Conselho Superior da Magistratura possam fazer parte funcionários de justiça, eleitos pelos seus pares, com intervenção restrita à discussão e votação das matérias relativas à apreciação do mérito profissional e ao exercício da função disciplinar sobre os funcionários de justiça.
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Ora, no caso sub - judice, foi o Conselho de Oficiais de Justiça - COJ - quem instruiu o processo disciplinar movido contra a recorrente e que, por acórdão de 27.6.2002, lhe aplicou a pena de demissão, o que é ilegal por afrontar a letra e o espírito do assinalado art° 218°, n° 3 do CRP; o que vicia, ab initio, todo o processo disciplinar por falta de atribuições do COJ sobre matéria que é da exclusiva competência do Conselho Superior da Magistratura - CSM -, o que precipita a nulidade do acto recorrido proferido em 27.11. 2002 pelo Conselho Superior do Ministério Público - CSMP - porquanto o art° 111°, n° 1, alínea a) do D.L. 343/99, com a redacção dada pelo D.L. n° 96/2002, de 12 de Abril, é inconstitucional, por violar o citado art° 218°, n° 3 da CRP.
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Acresce, aliás, que o acórdão de 27.11.2002, do CSMP, sob recurso, foi proferido ao abrigo dos artºs 111° n° 2 e 118 n° 2 Estatuto dos Oficiais de Justiça, nos termos do qual aquele órgão aplicou à ora recorrente a pena disciplinar de aposentação compulsiva, na sequência do recurso interposto da deliberação de 5.6.2001, do COJ, sendo certo que também o CSMP carece de atribuições para exercer a função disciplinar sobre os funcionários da justiça, porque tal matéria é da exclusiva competência do Conselho Superior da Magistratura. - art° 218° n° 3 da Constituição -.
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Assim sendo, o acórdão de 27.11.2002, do CSMP, é nulo, porque este Conselho agiu ao abrigo dos art°s 111° n° 2 e 118° n° 2 do Dec. - Lei 343/99, com a redacção dada pelo Dec. - Lei n° 96/2002, de 12 de Abril, normas que são inconstitucionais por violarem o art° 218° n° 3 da Constituição, que não consente que esse Conselho exerça a função disciplinar sobre os funcionários de justiça, matéria que é da exclusiva competência do Conselho Superior da Magistratura.
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Destarte, e por falta de atribuições da autoridade recorrida o acto é nulo, tal como decorre do art° 133° n° 2, alínea a) e b) do CPA.
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Por outro lado, todo o procedimento disciplinar está inquinado por nulidade que o fulmina, ab initio, porquanto foi o COJ que, após a declaração da nulidade proferida pela douta sentença de 31.5.2002, tirada no âmbito do Proc° n° 511/01, da 1ª Secção do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, apreciou a mesma matéria objecto destes autos.
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Ora, nos termos do art° 133° n° 1, alínea h) do CPA, o douto acórdão recorrido, proferido pelo CSMP, é nulo porque deliberou no âmbito de um recurso necessário interposto de uma deliberação do COJ que tinha o mesmo objecto de facto e de direito e que havia já sido apreciada pelo Tribunal Administrativo de Lisboa, ofendendo um caso julgado.
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Mesmo que neste particular tal não se entenda, por ter havido alteração legislativa, o certo, porém, é que, o D.L. 96/2002, de 12.4, é outrossim, organicamente inconstitucional na medida que versa sobre matéria de reserva relativa da competência da Assembleia da República, nos termos do disposto nas alíneas b), d) e p) do art° 165° da Constituição, normas que foram violadas porque o Governo não tinha credencial parlamentar para legislar sobre o regime geral de punição das infracções disciplinares; sobre a organização e competência dos tribunais e não podia retirar ao Conselho Superior da Magistratura a competência atribuída pelo art° 218° n° 3 da CRP.
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Assim sendo, e porque o acto recorrido se fundamenta em normas inconstitucionais, as constantes do D.L. 96/2002, maxime, na redacção que deu aos art°s 111° e 118° do Dec. - Lei 343/99, tal acto padece de vício de violação da lei por falta de fundamento legal e de atribuições, pelo que está ferido do vício de usurpação de poderes.
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Acresce, outrossim, que a redacção dada pelo Dec. Lei n° 96/2002, aos art°s 111° e 118° do Dec. Lei 343/99, de 26 de Agosto é inconstitucional porquanto as associações sindicais que representam os oficiais de justiça não participaram na sua elaboração o que viola o art° 56°, n° 2, alínea a) da Constituição, o que precipita a nulidade do acto recorrido que tem por base aquelas normas da lei ordinária.
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O CSMP, na sua deliberação punitiva, objecto do presente recurso, afirma que a ora recorrente beneficia da atenuante especial da alínea a) do art° 28° do E.D. aprovado pelo D.L. 24/84, de 16 de Janeiro; dá, outrossim, como provado que a recorrente " era pontual e assídua, trabalhando para além do horário normal de serviço... chegando mesmo a comparecer no serviço em dias de descanso, com prejuízo para a sua vida familiar, contribuindo assim para a descida da pendência processual"; 13ª Deu, outrossim, como provado o constante do relatório médico (cfr. art° 34° destas alegações) onde se inscreveu que a recorrente teve um esgotamento cerebral.
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Ora, a autoridade recorrida ao não atender às atenuantes gerais e ao não considerar a circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar, violou os art°s 28° e 32° alínea b) do E.D. aprovado pelo Dec. Lei 24/84, pelo que o acto padece do vício da violação da lei.
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Mesmo que assim não se entenda, foram violados os Princípios da Proporcionalidade e da Justiça porque face à matéria dada por provada a sanção disciplinar é excessiva, o que fere os art°s 5° e 6° do C.P.A. e, bem assim, o art° 266° n° 2 da Constituição já que não foram devidamente ponderadas as circunstâncias atenuantes que rodearam a actuação da recorrente - art°s 28° e 29°, alínea a) do D.L 24/84.
Nestes termos, e nos demais de direito, (...) deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser declarado nulo o acto recorrido, na medida em que sofre dos vícios de usurpação de poderes, falta de fundamento legal, e violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito".
1.4.
Não foram apresentadas contra-alegações.
1.5.
A EMMP emitiu o seguinte parecer: "Na petição inicial a recorrente coloca questões prévias que no seu entender obstam ao prosseguimento do recurso.
A meu ver, não assiste razão à recorrente pelas razões que sucintamente se expõem: - O TAC de Lisboa (Rec. 511/01) decidiu e passamos a citar"... nos termos do art° 218° n° 3 da C.R.P. na nova redacção, o órgão competente para apreciar o mérito profissional dos funcionários de Justiça é o Conselho Superior da Magistratura ..." e em consequência anulou a sanção de demissão, considerando que o acto recorrido era nulo por falta de atribuições da autoridade recorrida, nos termos do art° 133° n° 2, alínea b) do C.P.A. (vide acórdão de p. 48).
A ocorrência desta decisão, não significa, em meu entender, que se tenha verificado a excepção do caso julgado uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos previstos no art° 497° n° 1 do C.P.C.
O TAC de Lisboa não decidiu sobre o mérito do recurso, limitou-se a anular o acto com o fundamento de que o órgão que aplicou a sanção não era competente, o que não obsta a que o recorrente apresente novo recurso, desta vez ao órgão com competência para tal.
Assim, afigura-se-me de improceder tal questão.
A recorrente suscita outras questões que obstam ao prosseguimento do recurso, mas que a meu ver se prendem intrinsecamente com o mérito e como tal passarei a...
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