Acórdão nº 0327/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Outubro de 2005

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução06 de Outubro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: O Dr. A..., identificado nos autos, interpôs recurso jurisdicional do acórdão da Subsecção, constante de fls. 295 e ss., que, pronunciando-se sobre o recurso contencioso que ele deduzira da deliberação do CSTAF em que lhe fora aplicada a pena disciplinar de dez dias de multa, rejeitou esse recurso, por extemporaneidade, relativamente aos vícios denunciados causais da anulação do acto e negou-lhe provimento no tocante aos vícios arguidos que poderiam determinar a nulidade da mesma deliberação.

O recorrente terminou a sua alegação de recurso, formulando as conclusões seguintes: 1.ª- Devem considerar-se assentes os factos enumerados nos precedentes ns.º 4 e 5 [a) a ao)].

  1. - 1.ª questão prévia: a) Pelas razões constantes de supra ns.º 6 a 37, aqui dadas por reproduzidas, o presente processo não poderá ser decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo.

    1. Pois que, pela natureza da relação, funcional e não só, entre o recorrente, Juiz do STA (embora jubilado, mas em relação funcional no caso concreto), a entidade Recorrida, o CSTAF, seu Presidente comum e seus membros, e o Tribunal julgador, STA, não é possível, objectivamente (por si só, repete-se, sem necessidade de verificar os efeitos subjectivos, existentes nos diversos autos, que já são muitos), garantir ao recorrente um efectivo «acesso ao direito» e a uma decisão «mediante processo equitativo».

    2. Pelo que ocorre violação das garantias dos arts. 2° e 20°- 1 e 4 da Constituição e do art. 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, devendo reputar-se de inconstitucionais as normas dos arts. 26°-1-c) e 24°-a) e b) do ETAF (aprov. pelo DL n.º 129/84, de 27/04), na parte em que atribuem ao STA (Secção e Pleno de Secção) competência para ajuizar os actos do CSTAF e seu Presidente, pelos fundamentos que naqueles números destas alegações ficaram alinhados.

    3. É obrigação do Estado Português criar meios judiciais que permitam as aludidas garantias do cidadão, no caso o recorrente.

    4. Pelo que, se não ocorresse a existência de norma para solucionar esta questão, forçoso seria que ela fosse tida por criada, ainda que mais não fosse pelo uso do art. 10º, n.º 3, do CCiv.

    5. Embora, no caso, a situação e solução até estão previstas, pela conjugação das normas do art. 20°- 1 e 4 CRP, art. 2°-2 CPC com as do art. 4-1 -g), 2 e 3 do ETAF e 66° CPC.

    6. O que permite concluir que o julgamento da presente causa, como de outras questões que se prendem com a deliberação do CSTAF, pertence aos Tribunais Comuns e não ao STA.

    7. São, assim, nulas as decisões proferidas nos presentes autos.

      Sem prescindir: 3.ª - 2ª questão prévia:

    8. Pelas razões desenvolvidas nos ns.º 38 a 71 destas alegações, aqui dadas por reproduzidas, subsiste manifesta tempestividade do recurso.

    9. Sendo, como é, um recurso contencioso administrativo, ele foi interposto "nos termos dos arts. 24º e segs. da LPTA (DL n.º 267/85, de 16/6)" e não sob a forma de recurso especial do art. 169º, n.º 1, do EMJ.

    10. Se tivesse sido entendido aquilo que ora foi decidido, forçosa teria sido a decisão prévia de que ocorrera erro na forma do processo, que, como não ocorreu, ficou consolidada a forma do processo do recurso contencioso administrativo, e não a do recurso especial do art.º 169º, n.º 1, do EMJ.

    11. Quanto ao «regime estatutário», «os Juízes dos Tribunais Administrativos e Fiscais (...) regem-se pelo disposto na Constituição da República Portuguesa sobre a independência, a inamovibilidade, a irresponsabilidade e as incompatibilidades dos Juízes, por este Estatuto, e, com as necessárias adaptações, pelo Estatuto dos Magistrados Judiciais» (ETAF art. 77°).

    12. Pelo que não lhes é aplicável o art. 169°, n.º 1, do citado EMJ, norma de mero carácter processual, que nada tem a ver com o «regime estatutário», nem com «a independência, a inamovibilidade, a irresponsabilidade e as incompatibilidades dos Juízes», mas disciplina um meio processual próprio e privativo para recurso de actos do CSM., aí incluído o prazo de 30 dias para esse recurso, tal como aí referido.

    13. O Estatuto dos Juízes é diferente entre os dos Tribunais Administrativos e os da Jurisdição Comum, sendo para aqueles estabelecidas especificidades - precisamente na substância a que o art. 77° se reporta - nos arts. 78° a 97° do ETAF.

    14. A remissão do art. 77° apenas se quadra, e pode quadrar, para as normas substantivas estatutárias, nunca para as meramente processuais, pelo que uma remissão meramente adjectiva só seria lógica e possível se ocorresse no regime dos Juízes dos Tribunais Administrativos e dos actos do diferente CSTAF alguma lacuna, que não ocorre [cf. arts. 26°-1-c) ETAF e 1° e 24° LPTA].

    15. O regime legal excepcional criado para os recursos dos actos do CSM, com jurisdição e normas processuais privativas, só regula e pode regular as relações entre as deliberações do CSM e os seus destinatários, e mais nenhumas, sendo a norma do art. 169° EMJ manifestamente excepcional, inaplicável por analogia (CCiv. art. 11°).

    16. O acórdão violou, assim, as normas dos arts. 77° ETAF e 169° EMJ e os arts. 24° e segs. LPTA.

    17. E, sendo indiscutível que o processo típico dos autos é do recurso contencioso previsto nos arts. 24º e segs. LPTA, se viesse a entender-se que, não obstante, lhe era obrigatoriamente aplicável a citada norma do art. 169º por exigência do art. 77º ETAF, era manifesto que a interpretação desta norma no sentido de implicar a aplicação por remissão do prazo privativo de recurso típico, como é o dos actos do CSM, seria inconstitucional, por violação do princípio da igualdade garantido pelo art. 13º da CRP, pelas razões explicitadas em 63.1. a 63.3. destas alegações.

    18. Acresce que, face ao art. 6º do CCiv., e por imposição dos arts. 123°, al. a) e 118°, n.º1, EMJ., a notificação do acto recorrido deveria ter sido feita por carta registada com aviso de recepção, mas apenas o foi por mera carta registada.

    19. Um prazo de recurso é algo de objectivo e nunca de subjectivo, e a regra de comunicação dos actos é objectiva, não subjectiva, isto é, nem o prazo, nem o modo da sua contagem, podem ser supridos por um acto da parte.

    20. Não tendo sido feita a notificação do acto pela forma legal correcta, segue-se que se mantém em aberto, ainda hoje, o prazo para a interposição do recurso.

    21. Deverá, pois, o tribunal apreciar todas as questões inerentes aos vícios do acto suscitados que provocam a sua anulabilidade.

  2. - 3.ª questão prévia: a) Pelas razões desenvolvidas em supra 72. a 80., aqui dadas por reproduzidas, subsiste nulidade na apresentação da resposta, com violação dos arts. 201° CPC e 35°-1 do CPA, porquanto.

    1. Ela é assinada por quem invoca poderes delegados, sem serem invocada ou provada alguma das situações previstas para tanto; c) E o acto de delegação não vem acompanhado da especificação da lei habilitante.

      Posto isto: 5.ª - 1° vício:

    2. Pelas razões desenvolvidas em supra 84. a 97., aqui dadas por reproduzidas, é indiscutível que o recorrente vem condenado pela pretendida violação de um dever funcional que não possuía, pois que b) Uma infracção disciplinar define-se por uma relação funcional e não por uma pessoa concreta, ou antes, uma pessoa concreta visada por vítima de infracção disciplinar só interessa pela sua qualificação funcional, e não por qualquer outra função que exerça.

    3. O que não ocorre no caso concreto, como ali se demonstrou.

    4. Deste modo, condenando o acto pela pretendida violação pelo recorrente de um dever funcional que este não possuía, é seguro que o mesmo acto é nulo, porque estranho às atribuições do recorrido.

    5. Nulidade que se agrava à incompetência absoluta do recorrido para a prática do referido acto, como tal não produzindo este quaisquer efeitos e a declarar pelo Tribunal [CPADM. Arts. 133°-1 e 2-b) e 134°].

    6. E não tem razão o argumento do acórdão em apreço com a invocação da norma do art. 67°-2 EMJ, pois que as expressões daquele artigo de que «os Magistrados jubilados continuam vinculados aos deveres estatutários» e que continuam «ligados ao Tribunal de que faziam parte» só significam e podem significar os deveres estatutários e a ligação que sejam compatíveis com a sua situação.

  3. - 2° vício: a) Pelas razões desenvolvidas em supra 98. a 149. foram violadas as garantias constitucionais do art. 32°- 1, 2 e 5 CRP (que se aplicam prioritariamente e inspiram o cit. art. 117° EMJ.), pois que: b) Se «constituem infracção disciplinar os factos, ainda que meramente culposos, praticados pelos magistrados judiciais com violação dos deveres profissionais (...)» (EMJ., art. 82°), para apuramento decisório de infracção disciplinar forçosa é a abertura de processo disciplinar, mediante instauração do CSTAF [EMJ. art. 111º e ETAF. art. 98°-2-a)], e precedendo a dedução de acusação «articulando discriminadamente os factos constitutivos da infracção» (art. 117° EMJ).

    1. Mas não foi feita na acusação qualquer discriminação mínima dos factos que constituíssem a infracção pela qual o recorrente acabou por ser condenado, e aquela apenas fez imputações vagas e não concretizadas, colocando o recorrente numa insustentável posição de se defender sem essa concretização.

    2. Isto contra direito basilar de qualquer cidadão de não ter de se defender senão daquilo que concretizadamente seja acusado.

    3. O acto recorrido sancionou este tipo de "acusação", que era manifestamente nula por não permitir um verdadeiro direito de defesa e de audiência prévia do recorrente.

    4. Foram, assim, violados, também, os arts. 118° e 121° EMJ e 100° e segs. CPADM.

    5. Que afectam o mesmo acto, o qual passou a representar a própria acusação, prescindindo da que o deveria ter sido e que era nula.

    6. Deste modo, o acto está ferido de vícios de forma vários, como foram descritos, e de violação de lei, mais concretamente dos arts. 32°-1, 2 e 5 CRP, 283° CPPENAL («ex vi» do art. 131° EMJ.), 117° e 118° EMJ.

    7. Tudo reconduzido quer à ofensa de conteúdo essencial de direito fundamental...

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