Acórdão nº 0911/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução25 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, com sede na ..., ..., …, ..., concelho do Cartaxo, interpôs no Tribunal Administrativo do Circulo de Coimbra recurso contencioso de anulação da decisão do Presidente da Câmara Municipal do Cartaxo, de 11.10.02, que concedeu a B… licença de construção de uma estação de serviço de abastecimento de combustíveis líquidos, no lote … da Urbanização …, situada na referida …, naquele concelho do Cartaxo.

A fundamentar o recurso, alegou a recorrente que a decisão impugnada padece dos vícios de incompetência absoluta, de forma, designadamente, por falta de fundamentação, e, ainda, de violação dos princípios da igualdade, equilíbrio concorrencial, confiança proporcionalidade e boa fé.

A autoridade recorrida respondeu, tendo suscitado a questão prévia da extemporaneidade do recurso contencioso e defendido a legalidade do acto impugnado.

Os recorridos particulares, B… e …., apresentaram contestação, na qual defenderam que a recorrente carece de legitimidade para o recurso contencioso e que o mesmo deveria ser julgado improcedente.

Por sentença de fls. 384 e segts dos autos, foi julgada improcedente a questão prévia da ilegitimidade activa e procedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso, quanto aos vícios geradores de mera anulabilidade do acto impugnado (vícios de forma, falta de fundamentação e violação dos princípios da igualdade, equilíbrio concorrencial, tutela da confiança, proporcionalidade e boa fé).

Inconformados com essa decisão, dela interpuseram recurso quer os recorridos particulares B… e …, quer a recorrente.

Aqueles B… e …, no recurso que interpuseram da decisão de improcedência da questão prévia relativa à ilegitimidade activa, apresentaram alegação (fls. 446,ss.), na qual formularam as seguintes conclusões: 1ª - O despacho recorrido não está ferido de incompetência absoluta em razão da matéria.

  1. - Os documentos juntos aos autos principais e aos autos apensos, mostram que foi a entidade competente - a DROAT - que licenciou a utilização privativa do domínio hídrico, dando cumprimento ao disposto no D.L. 46/94, de 22/2.

  2. - A ora recorrida, A…, não é proprietária de quaisquer bombas de combustível na área do Concelho do Cartaxo, designadamente, não é titular das bombas de combustíveis instaladas na . …, concelho do Cartaxo.

  3. - Conforme mostram os autos, o alvará que licenciou a instalação das bombas de combustível referidas na cláusula 3ª foi concedido a … e a ... e não à A… 5ª - O terreno onde estão instaladas as referidas bombas de combustível é propriedade dos mesmos … e … 6ª - Não sendo a A… titular do posto de combustíveis, nem do terreno onde o mesmo está instalado, não tem interesse processual em agir e, consequentemente, não tem interesse que legitime o recurso ao Tribunal e daí a sua ilegitimidade nos presentes autos de recurso de anulação.

  4. - Nos termos do artigo 46°, n° 1, do R.S.T.A. os recursos podem ser interpostos pelos que tiverem interesse directo, pessoal e legítimo na anulação do acto administrativo.

  5. - A A… não tem qualquer interesse directo, pessoal e legítimo na anulação do acto, nem, sequer, qualquer interesse indirecto, mediato ou longínquo, não existindo, consequentemente, lesão de qualquer interesse, legitimante da tutela jurisdicional.

  6. - Os princípios consagrados no artigo 46° do R.S. T.A., foram consagrados no artigo 55°, n° 1, al. a) do actual C.P.T.A.

  7. - O Mº Juiz a quo ao declarar que a recorrente, aqui recorrida. A…, tem legitimidade activa, violou o artigo 46°, n° 1 do R.S.T.A., cujos princípios continuam consagrados no artigo 55°, n° 1, al. a) do actual C.P.T.A.

    Termos em que deverá a douta decisão que decidiu pela legitimidade activa da recorrente, ser revogada e, consequentemente, declarar-se que a mesma recorrente não tem legitimidade activa para pedir, quer a nulidade, quer a anulação do acto recorrido, fazendo-se deste modo inteira, JUSTIÇA.

    A recorrente A… apresentou contra-alegação (fls. 493, ss.), com as seguintes conclusões:

    1. Na perspectiva da argumentação adoptada neste recurso jurisdicional, também os próprios Recorrentes - recorridos particulares no recurso contencioso - veriam certamente comprometida a sua legitimidade processual, seja porque a licença controvertida nos autos não foi emitida a favor de ambos, seja porque o posto de abastecimento de combustíveis está licenciado a favor de uma terceira entidade, a … b) A contradição na posição da Recorrente … assenta em que, para a sua pessoa, aceita a livre transmissibilidade de licenças emitidas em nome de terceiras entidades, mas já não o aceita em relação à aqui Recorrente; e aceita que a simples detenção da propriedade do Lote … faz presumir a propriedade da estação de serviço que ali se está a construir, mas não aceita realidades análogas para o caso da aqui Recorrente.

    2. No entanto, tendo as licenças da Recorrente e dos Recorridos por objecto principal terrenos e/ou instalações a construir nos mesmos, presume-se a sua transmissão juntamente com a transmissão dos direitos reais ou obrigacionais que conferem aos transmissários o respectivo direito de uso ou gozo.

    3. Quer isto dizer, que traduzindo-se a licença na remoção de uma proibição ou obstáculo ao exercício de um direito, esta transmite-se com o direito.

    4. De qualquer forma, se assim não fosse, a … seria igualmente parte ilegítima, uma vez que a sua situação jurídica não difere, neste ponto, da posição da própria Recorrente.

    5. A conjugação dos artigos 26°, nº 3 do C PC, aplicável ao contencioso administrativo por força do artigo 1° da LPTA, e 46° do RSTA, impõe que o Tribunal atenda ao interesse directo, pessoal e legítimo tal como este foi configurado pelo recorrente na petição de recurso (neste sentido, veja-se um dos mais recentes Acórdãos do STA, proferido em 21/10/2004, no processo 1750/2003 - que se pode consultar em http://www.dgsi.pt/jsta/, com o nº de doc. SA12004102101750).

    6. A A… invocou a titularidade de um posto de abastecimento de combustíveis a uma distância próxima do posto licenciado através do acto administrativo impugnado, e fundou o seu interesse pessoal e legítimo na anulação daquele acto na esfera de protecção concorrencial da sua própria licença (princípios do equilíbrio concorrencial e da tutela da confiança).

    7. Invocou ainda a A… que o acto impugnado violou o princípio da igualdade, na medida em que tratou a aqui contra-interessada … de forma mais favorável, nomeadamente ao dispensá-la da exigência de contra partidas impostas no passado à A… para o mesmo fim (licenciamento no mesmo local).

    8. Ou seja, a A… invocou regras e princípios que são, inequivocamente, de direito público constituindo aliás manifestações legais do seu direito fundamental de livre empresa (artigo 61 ° da CRP).

    9. A impugnação da compressão ilegal do núcleo de direitos subjectivos fundados na licença (acto constitutivo de direitos) da Recorrente no recurso contencioso constitui um interesse directo, pessoal e legítimo na anulação do acto aqui recorrido - o benefício não é pois mediato, eventual ou meramente possível, mas actual, directo e imediato, correspondendo a uma satisfação imediata da Recorrente A… k) No caso em apreço, o benefício imediato e actual da Recorrente com a anulação reside na prevenção da ocorrência de um prejuízo grave - perda de clientela e manutenção das condições económicas mínimas para a continuidade do exercício da actividade - prejuízo potencial que, aliás, foi reconhecido e aceite pelo TCA...

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