Acórdão nº 0223/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelADÉRITO SANTOS
Data da Resolução05 de Julho de 2007
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A… e B…, com sede, respectivamente, na Avenida …, nº … e na Avenida …, nº …, em Lisboa, requereram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (TAFL) a intimação da Autoridade da Concorrência (AdC) para prestação de informações e passagem de certidões de documentos apresentados a esta entidade pela C…, no âmbito do procedimento de controlo de operações de concentração de empresas, regulado nos arts 31, ss., da Lei 18/2003, de 11.6 (Lei da Concorrência), e iniciado na sequência do anúncio, feito por esta C…, de oferta pública geral de aquisição das acções representativas do capital social daquelas requerentes.

Por sentença de 4.10.06 (fls. 1064, ss., dos autos), o TAFL decidiu pela absolvição da instância da entidade requerida e da interveniente C…, julgando procedente a excepção, por estas deduzida, de incompetência material do tribunal.

Inconformadas, as requerentes impugnaram tal decisão junto do Tribunal Central Administrativo-Sul (TCAS) que, por acórdão de fls. 1253, ss., dos autos, negou provimento ao recurso jurisdicional, mantendo, na íntegra, a sentença recorrida.

As requerentes interpuseram, então, recurso de revista, nos termos do art. 150 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), tendo apresentado alegação (fls. 1267, ss., dos autos), com as seguintes conclusões:

  1. O processo em que foi proferido o douto Acórdão recorrido respeita a uma intimação para a prestação de informações e consulta de processos instaurada pelas ora Recorrentes contra a Autoridade da Concorrência ("AdC"), tendo aquele decidido que a jurisdição administrativa não seria a materialmente competente para conhecer do pedido formulado, "por a pretensão deduzida configurar meio substancialmente impugnatório de acto procedimental, inserido em procedimento, cuja sindicância contenciosa é cometida ao Tribunal de Comércio de Lisboa, nos termos conjugados do nº 5 preambular, art. 38°/2 do DL 10/2003, 18-01 e art. 30º, 53º, 54º da Lei 18/2003, 11-06 e artigo 192º CPTA"; b) As Recorrente fundamentam a interposição do recurso de revista, neste caso, tanto no pressuposto da existência de uma "questão que, pela sua relevância jurídica (...), se [reveste] de importância fundamental", como também no segundo pressuposto contemplado no número 1 do artigo 150º do CPTA, de que a admissão do presente recurso é "claramente necessária para uma melhor aplicação do direito "; c) Em discussão no presente recurso está, desde logo, a questão de saber como configurar concretamente a natureza, impugnatória ou não, dos processos de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões, e quais os pressupostos de tal meio processual, isto é, em que situações poderão ou não os particulares dele lançar mão, questão esta que assume relevo jurídico fundamental, na medida em que - como sucedeu no caso em apreço - da concreta resposta que lhe seja dada dependerá, não apenas na situação dos autos, mas em toda e qualquer outra situação similar, a escolha do meio processual mais adequado para tutelar a posição de todos aqueles que sejam confrontados com uma recusa ou omissão de prestação de informações, consulta de processo ou passagem de certidões, por parte de uma entidade administrativa; d) Em termos mais concretos, mas com plena capacidade de expansão, a controvérsia em causa nestes autos respeita a saber se a jurisdição administrativa é ou não materialmente competente, à luz do disposto nos artigos 53º e 54º da Lei da Concorrência, para conhecer de um processo como o presente - de intimação da AdC para a prestação de informações, consulta de processo ou passagem de certidões, inserido no contexto de um procedimento de controlo de operações de concentração previsto na mencionada Lei, tratando-se aqui de uma questão jurídica complexa, atendendo aos diversos elementos que é necessário ponderar; e) Com efeito, pese embora a letra dos artigos 53º e 54º da Lei da Concorrência seja clara no sentido de afirmar que o Tribunal de Comércio de Lisboa é competente para conhecer das acções administrativas especiais em que se impugnem decisões da AdC tomadas em procedimentos administrativos previstos na Lei da Concorrência, o certo é que o douto Acórdão recorrido, partindo (i) do entendimento de que a recusa de prestação de informações pela AdC consubstanciava um verdadeiro acto administrativo procedimental - isto é, uma "decisão da AdC " - e (ii) da interpretação do disposto nas normas em causa e na lei que aprovou os Estatutos daquela Autoridade, considerou que aqueles artigos da Lei da Concorrência abrangeriam também a presente intimação para a prestação de informações e consulta do processo, pelo que o Tribunal competente para dela conhecer seria o Tribunal de Comércio de Lisboa e não a jurisdição administrativa; f) Na perspectiva das Recorrentes, as normas mencionadas não abrangem a recusa ou omissão de prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões pela AdC, a qual constitui um mero comportamento material negativo ou omissivo, para cujo conhecimento judicial é competente, nos termos gerais, a jurisdição administrativa, nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 4º do ETAF, através do meio processual da intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, previsto nos artigos 104º e seguintes do CPTA; g) Entendeu ainda o douto Acórdão recorrido - em oposição com o que foi e é sustentado pelas Recorrentes - que a situação sub iudice estaria também abrangida pelo regime do artigo 192º do CPTA, na medida em que se estaria perante uma "pretensão em procedimento cuja sindicância é cometida por norma de atribuição especial a tribunal diverso dos tribunais comuns para conhecer do meio utilizado", o que indicaria no sentido da competência do Tribunal de Comércio e não dos Tribunais Administrativos, pelo que aqui se suscita o problema de saber o âmbito concreto de aplicação desta norma do CPTA; h) Ao exposto acresce ainda que o presente processo destina-se a efectivar o direito fundamental à informação procedimental das ora Recorrentes previsto no art. 268º, número 1, da Constituição da República Portuguesa e cujo exercício obedece ao regime consignado nos arts. 61º a 63º do Código do Procedimento Administrativo, sendo que, nos termos do art. 4º, nº 1, alínea a), do ETAF, compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto a tutela de direitos fundamentais; i) A questão de saber se a jurisdição administrativa é ou não materialmente competente para conhecer de processos de intimação como o presente tem enorme relevância prática, na medida em que sempre que, no futuro, um particular for confrontado com uma recusa ou omissão de resposta a um pedido de informações, consulta de processo ou passagem de certidões, por parte da AdC no contexto de um procedimento administrativo regulado pela Lei da Concorrência, suscitar-se-á "a questão de saber se, perante o disposto nos artigos 53º e 54º da Lei da Concorrência, ele deverá pedir a intimação daquela Autoridade na jurisdição administrativa ou, pelo contrário, perante o Tribunal de Comércio de Lisboa, o que demonstra que existe aqui uma "capacidade de expansão da controvérsia" que reforça a necessidade de admissão do presente recurso de revista; j) Para além de estarmos perante uma questão juridicamente relevante que se reveste de importância fundamental, a admissão do presente recurso de revista releva também por ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito, pela certeza de que a questão agora em discussão se colocará, seguramente, em inúmeros casos no futuro; k) A necessidade de admissão desta revista para uma melhor aplicação do direito decorre também da circunstância de já existir, presentemente, jurisprudência contraditória sobe a matéria, na medida em que num outro processo de intimação para a prestação de informações e consulta do processo intentado pelas Recorrentes contra a AdC, respeitante a uma outra recusa de prestação de informações por esta Autoridade no contexto do procedimento de controlo de operações de concentração sub iudice, foi proferida sentença em primeira instância que reconheceu a competência material da jurisdição administrativa para conhecer de tal intimação, tendo o Tribunal Central Administrativo Sul, em sede de recurso, considerado - por Acórdão datado de 08.02.2007, não transitado em julgado -, diversamente, que a competência pertenceria ao Tribunal de Comércio de Lisboa; l) O entendimento, sufragado no Acórdão recorrido, de reconduzir a intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, nos casos em que a causa de pedir não seja a pura e simples recusa não fundamentada ou a falta de resposta tout court, a uma acção administrativa de impugnação tendo por objecto uma pretensão impugnatória, enferma de erro de direito em virtude de não considerar a uniformidade de regime processual daquela intimação consignada no artigo 104º, número 1, do CPTA, violando, por conseguinte, o disposto nesta norma; m) Segundo este preceito, o regime processual para todos aqueles pedidos de intimação, seja qual for a sua causa de pedir, é sempre o mesmo, nomeadamente o que resulta dos artigos 104º e seguintes do CPTA; n) Tal uniformidade caracteriza a autonomia processual daquele meio e justifica-se em razão da sua instrumentalidade relativamente aos direitos fundamentais à informação procedimental e não procedimental; o) O Acórdão recorrido enferma igualmente do erro de direito de qualificar a recusa de informações com fundamento no carácter confidencial das mesmas como um acto administrativo e não como simples actuação material de não disponibilização de informação a cujo acesso as ora Recorrentes entendem ter direito; p) Não estando minimamente em causa a apreciação da validade de um acto...

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