Acórdão nº 0363/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Novembro de 2011
Magistrado Responsável | VALENTE TORRÃO |
Data da Resolução | 16 de Novembro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A…, melhor identificada nos autos, veio recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação que deduziu contra a liquidação de taxas de assistência administrativa e de supervisão, relativas ao ano de 2000, no valor de 3.479,11 €, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: I) A decisão do Tribunal Tributário de Lisboa de 28.01.2011 que manteve a liquidação adicional de taxas de assistência administrativa e de supervisão relativas ao ano de 2000 no valor de 689.479$00 (€ 3.439,11) procedeu a uma incorrecta interpretação e aplicação das normas constantes dos artigos 6° e 16°, n.º 3 da Directiva 96/67/CE, aplicando normas violadoras do Direito Comunitário, o que se consubstancia numa inconstitucionalidade material por violação do artº. 8°, n°3 da CRP.
II) O âmbito do recurso circunscreve-se à apreciação da conformidade da taxa de assistência administrativa em terra e supervisão (prevista no artº. 10°, n° 1 do DR. n° 12/99, na redacção em vigor em 2000) com a Directiva 96/67/CE, tal como interpretada pelo TJCE no Acórdão C- 181/06, que fixou como princípio geral a incompatibilidade dessa taxa com o direito comunitário, a menos que seja demonstrado factualmente que tal taxa cumpre critérios de pertinência, objectividade, transparência e não discriminação.
III) A questão central suscitada pela impugnante é a de saber se a taxa de assistência em escala criada pelo DR 12/99, na redacção em vigor em 2000, tendo presente o enquadramento legal e demais disposições aplicáveis aos operadores de assistência em escala em matéria de encargos impostos, é ou não violadora das disposições da Directiva 96/67, questão essa que não foi correctamente enunciada e respondida pelo Tribunal a quo, que suspendeu o processo a aguardar a decisão proferido no TJCE e depois a ignorou por completo.
IV) A decisão do TJCE proferida no Processo C-181/06 tem o valor de um princípio comunitário abstracto que tem força vinculativa obrigatória e que cabe ao juiz nacional aplicar ao caso concreto.
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O TJCE, no Processo C-181/06, estabeleceu de forma clara o princípio e a excepção. O princípio é o de que o Direito Comunitário se opõe à regulamentação nacional com base na qual foi liquidado o tributo impugnado. A excepção será a “não oposição”, dependente da verificação de um conjunto de condições, cujo ónus de invocação e prova cabe à entidade Impugnada e que esta não logrou fazer (como se infere da ausência de factos provados com relevância para o efeito na matéria de facto provada), com as consequências daí advenientes em matéria de ónus de prova.
VI) Ao decidir nos termos em que o fez, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 74º/1 da LGT.
VII) Sem conceder quanto à conclusão precedente, ainda que tivessem sido alegados factos, nunca dos mesmos poderia resultar o preenchimento das várias condições e pressupostos cumulativos exigidos pelo TJCE.
VIII) A primeira condição exigida pelo TJCE era a de que a taxa de assistência administrativa em terra e supervisão fosse devida como contrapartida pela totalidade ou parte dos serviços definidos no ponto 1 do anexo da Directiva 96/67/CE do Conselho, de 15 de Outubro de 1996, relativa ao acesso ao mercado da assistência em escala nos aeroportos da Comunidade.
IX) Os serviços compreendidos no ponto 1 do anexo da Directiva (e também do anexo ao DL 275/99) são aqueles que qualquer operador licenciado se propõe prestar a si mesmo ou aos seus clientes (não são prestados pela B…), pelo qual são retribuídos através do preço pago pelos mesmos clientes. Não há qualquer ligação entre estes serviços e a taxa liquidada, como a própria B… reconhece.
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A taxa de assistência administrativa em terra e supervisão é liquidada exclusivamente aos prestadores de serviços de handling a terceiros, ou seja, a entidades que pretendam concorrer com a concessionária B…, S.A., aqui impugnada, ou com a prestadora de serviços por si detida (PORTWAY). Esta taxa não incide sobre os operadores económicos que realizem assistência em escala em regime de auto-assistência.
XI) Quer os prestadores de serviços a terceiros, quer os que fazem auto-assistência têm necessariamente acesso à infra-estrutura aeroportuária, porque se encontram licenciados para tal e porque já pagam taxas para ter esse acesso, como decorre de forma clara da lei nacional (cfr. DL 275/99 e Portaria 1340/2001).
XII) O artigo 16°, nº 3 da Directiva, em conjugação com o vigésimo quinto considerando do respectivo preâmbulo, na interpretação que lhe foi dada pelo TJCE (Sexta Secção), no Acórdão de 16 de Outubro de 2003, Processo C-363/01, estabelece um único caso em que a entidade gestora está autorizada a cobrar uma remuneração como contrapartida pelo acesso às instalações aeroportuárias.
XIII) Nos termos da decisão proferida no Caso Aeroporto de Hannover, a Directiva 96/67/CE do Conselho, de 15 de Outubro de 1996, não autoriza a entidade gestora de um aeroporto a sujeitar o acesso ao mercado da assistência em escala no aeroporto ao pagamento, por parte do prestador de serviços de assistência em escala ou do utilizador que pratica a auto-assistência, ao pagamento de uma taxa de acesso, a título de contrapartida da concessão de uma possibilidade de lucro, e que acresce à taxa paga pelo referido prestador ou utilizador pela colocação à disposição das instalações aeroportuárias (no caso nacional, as taxas cobradas pelo INAC nos termos do disposto no DL 275/99 e na Portaria 1340/2001).
XIV) A expressão “acesso às instalações aeroportuárias” constante da Directiva deve ser interpretada no sentido de acesso às instalações físicas e não de acesso a um determinado mercado, de acordo com a interpretação sustentada pelo TJCE.
XV) A taxa impugnada não preenche os requisitos impostos pelo TJCE e pela correcta interpretação da norma comunitária, quer no que toca à respectiva incidência, quer quanto ao valor (percentagem sobre o volume de negócios).
XVI) A norma de incidência da taxa impugnada – artº. 10°, nº 1 do DR. nº 12/99 - foi revogada e substituída pelo artº. 90 nº 1, alínea a) do DR. nº 24/2009, que eliminou a referência ao volume de negócios do prestador de serviços e passou a determinar a incidência da taxa de assistência administrativa em terra e supervisão por tipo de aeronave assistida, em claro reconhecimento da inadequação e ilegalidade da anterior redacção.
XVII) Em face do exposto nas conclusões 8 a 17 terá de concluir-se que a norma constante do artigo 10°, n.º 1 do DR 12/99 se opõe ao Direito Comunitário, por não se verificar a primeira condição exigida pelo TJCE.
XVIII) Sem conceder quanto ao exposto, também a segunda condição exigida pelo TJCE para passar no teste de conformidade - a de que a taxa objecto de impugnação não constitua uma segunda tributação de serviços já remunerados por outra taxa ou imposição - não se encontra verificada.
XIX) As explicações prestadas pela B… sobre a contrapartida para os alegados serviços que justificariam a cobrança desta taxa apenas a prestadores de serviços são difusas, incongruentes e até contraditórias...
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