Acórdão nº 0628/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Novembro de 2011
Magistrado Responsável | JORGE DE SOUSA |
Data da Resolução | 22 de Novembro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A…… e B……, por si e em representação do menor C……, intentaram contra o INSTITUTO DE CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE VIÁRIA (ICERR), a que sucedeu o IEP – INSTITUTO DE ESTRADAS DE PORTUGAL e, depois, EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., a presente acção ordinária em que pedem indemnização por danos.
O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto condenou a Ré EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A. a pagar aos Autores a quantia global de € 180.000,00 a título de danos não patrimoniais, sendo € 50.000,00 para os dois primeiros Autores e € 80.000,00 para o menor C……, bem como a quantia de € 8.573,52 a título de danos patrimoniais (perdas salariais), além das quantias que se vierem a apurar em matéria de gastos em deslocações viagens, despesas médicas e incapacidade, absolvendo a Ré do demais peticionado.
A Ré interpôs recurso da sentença para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem por objecto duas questões fundamentais: a primeira consiste em determinar se há responsabilidade da recorrente e a segunda (prejudicada se for negativa a resposta à primeira), consiste em determinar o montante da indemnização.
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Na verdade, são estes os dois pontos que delimitam o âmbito do presente recurso, decididos pelo Tribunal a quo, e com os quais não se conforma a recorrente, imputando à sentença os vícios de falta de fundamentação, incorrecta aplicação do Direito e demais fundamentos que se expõem de seguida.
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Entende a recorrente que não foram avaliados/valorados, adequadamente o depoimento das testemunhas: a) Dos recorridos, por serem todos seus familiares próximos, cuja seriedade e imparcialidade, devia, no mínimo, ter sido ponderada, porquanto: - D…… é irmã da recorrida mulher; - E……, é primo directo da recorrida mulher; – F……, é irmão do recorrido marido e - G……, é igualmente irmão do recorrido marido.
Estes depoimentos ao que parece, até foram valorados em detrimento das testemunhas apresentadas pela recorrente: - H……; - I…… - J……; - L…….
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Os recorridos circulavam num veículo automóvel, conduzido por outra pessoa, sofrendo um acidente de viação em resultado da queda de uma árvore.
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Resulta da matéria provada que as árvores que existiam no local do acidente estavam secas e apodrecidas face à sua idade.
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Não foi considerado o excesso de velocidade com que a viatura circulava na altura do acidente.
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Não há, por outro lado, qualquer referência ao nevoeiro intenso que se fazia sentir naquela madrugada.
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Não foi devidamente valorizado o depoimento da principal testemunha do acidente, o soldado da GNR, J……, que presenciou as condições em que a viatura sinistrada se encontrava após a ocorrência do sinistro.
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No entender da recorrente, não restam quaisquer dúvidas que o acidente se ficou a dever a excesso de velocidade do condutor.
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Mesmo que assim não seja entendido, o condutor da viatura não se encontrava a respeitar a norma do artigo 27º do Código da Estrada, que estipula a velocidade de 50 km/h, para velocidade dentro de povoações.
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Não foi igualmente tido em conta a existência de nevoeiro intenso, a hora tardia a que o mesmo ocorreu, com provável e inevitável cansaço do condutor, para além da pouca experiência, já que tinha a carta de condução apenas há oito meses.
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O nevoeiro intenso tem que ser considerado como mau tempo, sendo que o excesso de velocidade contribuiu, ou, no mínimo, agravou as consequências do acidente.
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O excesso de velocidade parece mais que evidente, não só devido ao depoimento das testemunhas, mas também ao aparato e consequências extremamente gravosas do acidente.
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É que o excesso de velocidade é importante para qualquer das versões ou contornos do acidente, na medida em que: - se o condutor se despistou e embateu na árvore (versão dos recorridos), em consequência da queda acidental do galho, teria tido certamente mais possibilidades de controlar o veículo, acaso circulasse a velocidade não superior a 50 km/h, ou até inferior, como aconselhava o intenso nevoeiro, hora tardia e a pouca experiência e ainda o facto de levar cinco pessoas no veículo.
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A Resposta aos quesitos 1, 2 a 72º, deve ser alterada para "Apenas se provou que o veículo circulava a velocidade excessiva." 16. Mais se impõe a alteração da resposta aos quesitos 2º a 10º, 48º, 72º a 76º e 83º a 100º, ou no mínimo ponderadas, face a estas conclusões.
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A intervenção da recorrente no sentido de abater as árvores que ladeavam o local onde ocorreu o acidente, encontrava-se em curso.
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Não existindo assim facto ilícito, pelo que logo por aí falecia a alegada responsabilidade civil da recorrente.
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Tenha-se presente, pelas regras da experiência comum, que em Portugal há milhares de quilómetros de estradas ladeadas por um número indeterminado (na ordem dos milhares) de árvores, donde, só por absurdo de poderia acautelar todos os perigos que as mesmas, eventualmente representam.
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Quanto ao nexo de causalidade, provou-se que os danos se produziram pela queda de uma árvore. Mas não é essa a causalidade cujo nexo importa apurar. A montante importa saber porque é que a árvore caiu? 21. Não existe na matéria provada factos que nos respondam às causas de queda da árvore.
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Neste sentido, deve-se concluir que foi a existência de nevoeiro intenso, a hora tardia a que o mesmo ocorreu, o cansaço do condutor e a sua inexperiência, que o levou a embater na árvore e fez com que a mesma tombasse sobre a viatura, já que a viatura sinistrada encontrava-se no meio da faixa de rodagem.
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Identificadas que estão várias possíveis causas do acidente, o tribunal não cuidou de ponderar nenhuma delas, apenas a falta de cuidado da recorrente.
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O Tribunal a quo não determinou com justiça as quantias peticionadas pelos recorridos, a título de danos não patrimoniais.
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Assim, salvo o devido respeito, e como consequência do juízo crítico constante das presentes alegações, a sentença recorrida foi conduzida por um juízo que extravasa largamento os critérios dos artigos 564º, 566º e 496º, todos do Código Civil.
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E bem assim pela Jurisprudência dominante nos nossos tribunais.
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O Tribunal não revelou justa e equitativa ponderação dos factos ao condenar a recorrente, como condenou.
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A sentença recorrida condena a recorrente, num montante de € 180.000,00, a título de danos não patrimoniais, ora este montante, não se poderá deixar de ter como muito exagerado e injusto, a todos os níveis, na dimensão jurídica que cumpre apreciar.
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Em primeiro lugar, tratando-se a indemnização, numa parte substancial, de danos morais, danos de dor e outros de difícil quantificação, haveria que os ter quantificado e justificado, segundo critérios de ponderação, de equidade, que a lei determina e que os Tribunais têm vindo a forjar, em vez de divergir, como faz a douta sentença recorrida, de forma desconcertante, com a linha orientadora jurisprudencial nesta matéria.
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Em segundo lugar, não ponderou a sentença recorrida qualquer limitação da indemnização, em função de todas as circunstâncias do caso, que merecem — sem dúvidas — aplicação: o intenso nevoeiro que existia, a hora tardia a que o acidente ocorreu, a falta de experiência do condutor.
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Na aplicação do Direito, deveria o Tribunal a quo considerar a aplicação das disposições que admitem a limitação da responsabilidade (desde logo o artigo 494º e o artigo 496º, n.º 3, do Código Civil. Ora não o fazendo, há vício de aplicação de Direito.
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Para que se faça justiça é necessário ponderar as decisões de casos similares.
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A par da lei, dos usos e da doutrina, a Jurisprudência é uma verdadeira fonte de Direito, com um campo de aplicação privilegiado nesta matéria da fixação de valores indemnizatórios com recurso à equidade.
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Se assim, não for entendido o que só por mera hipótese de raciocínio se admite, que a douta sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que reconheça também a culpa do condutor por o acidente se ter verificado devido a excesso de velocidade, ao intenso nevoeiro, à hora tardia em que se verificou e à inexperiência do condutor, com repartição de responsabilidade e substancial redução da indemnização arbitrada.
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A sentença recorrida não ponderou qualquer limitação da indemnização, em função de todas as circunstâncias do caso, que merecem — sem dúvidas — aplicação, caso se entenda haver responsabilidade em indemniza e mulher estão a receber uma pensão provisória de Esc. 120.000,00 (cento e vinte mil escudos), desde 17/05/1999, por força do arbitramento de Reparação Provisória, que correu termos pelo Proc. 267/99, do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Santo Tirso, cuja certidão foi junta aos autos.
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Atendendo aos aspectos concretos do caso sub judice, deve o Tribunal entender que o montante arbitrado pelo Tribunal a quo, no que respeita aos danos não patrimoniais, é excessivo, reduzindo-o para metade por razões de justiça da decisão e por apelo à equidade.
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A douta Sentença recorrida deve ser revogada por outra que alterando, a resposta aos quesitos, aplique correctamente o Direito, declare uma justa indemnização ou até mesmo absolva a recorrente.
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Se assim não for entendido, o que só por mera hipótese de raciocínio se admite, que a douta sentença recorrida seja revogada por outra que reconheça também a culpa do condutor do veículo, por o acidente se ter verificado devido a excesso de velocidade, ao intenso nevoeiro que se fazia sentir, à hora tardia em que o mesmo ocorreu e à inexperiência do condutor.
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Neste sentido deverá haver condenação com repartição de responsabilidades e substancial redução da indemnização base arbitrada, devendo a indemnização ser reduzida para metade.
Termos em que e nos mais de direito, deve ser dado integral provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida ou quando assim não se entenda, fixar-se a indemnização nos termos supra expostos, fazendo assim V. Exas, como...
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