Acórdão nº 0653/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução29 de Novembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1. O Estado, pelo digno magistrado do Ministério Público, invocando o disposto nos artigos 9º e seguintes da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, na redacção da Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril, e nos artigos 56º e seguintes do Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14 de Dezembro, veio instaurar acção de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa contra A…………, identificado nos autos, pedindo o provimento da oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, ordenando-se o arquivamento do processo conducente a esse registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais – por falta de ligação efectiva à comunidade nacional e exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico (artigo 9.º, alínea c), da Lei n.º 37/81 e artigos 56.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 237-A/2006).

1.2. O Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa julgou procedente a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, ordenando o arquivamento do processo conducente ao registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais.

1.3. Inconformado, recorre A………. para este Tribunal, per saltum, concluindo nas suas alegações: «A – Aos Juízes e Magistrados do MP, em Cabo Verde, cabe apenas aplicar a lei, com total independência do poder político. O mesmo sucede com as Magistraturas Portuguesas.

B – As suas funções são, portanto, “predominantemente técnicas”.

C – A decisão recorrida, aliás douta, interpretou e aplicou erradamente, a primeira parte da al. c) do art. 8.º da Lei da Nacionalidade.

D – Com o sentido que a esta disposição foi atribuído pela mesma decisão, a al. c) do art. 9.º seria inconstitucional, por violação da Lei Fundamental.

E – Por tudo o que vai exposto, deve ser concedida a revista, revogando-se a decisão recorrida, no sentido de entender que as funções de Magistrado que o R desempenhou em Cabo Verde, foram de carácter predominantemente técnico».

1.4. O Ministério Público contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: «1 - O recorrente exerceu as funções públicas de Procurador da República, Juiz do Conselho Nacional de Justiça, Juiz Conselheiro no Supremo Tribunal de Justiça, de Procurador-Geral da República e de Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, na República de Cabo Verde.

2 - O exercício de tais funções não se reveste de carácter predominantemente técnico.

3 - Antes essas funções implicam não só o comprometimento com as linhas de actuação do Estado de Cabo Verde, como um contributo efectivo para a definição das mesmas.

4 - Desse modo, detém um particular vínculo de ligação com Cabo Verde, caracterizado por uma forte ligação com o respectivo Estado, que torna inconveniente a aquisição da nacionalidade portuguesa.

5 - A alínea c) do artigo 9.º da Lei n.º 37/81, na interpretação realizada na sentença recorrida, não é inconstitucional, sendo certo que o recorrente não concretiza a alegada violação, ou sequer, indica a norma ou o princípio violado.

6 - Improcedem, consequentemente, todas as conclusões das alegações do recorrente.

7 - Devendo negar-se provimento ao recurso interposto por A………..

Nestes termos, deve a sentença recorrida, que julgou procedente a oposição deduzida à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte do recorrente, ser mantida na íntegra».

1.5. O recurso foi admitido por despacho do relator e dele não houve reclamação.

Cumpre apreciar e decidir.

  1. 2.1. A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: «A) – O Requerido, A………., é natural de ..., onde nasceu em …, concelho de Santa Cruz, no dia 26 de Fevereiro de 1943 – cfr. fls. 12 -13 dos autos; B) – O Requerido, A………. é filho de B……….., natural da ilha de … e de C……….., natural de … – conf. fls. 12 -13 dos autos; C) – O Requerido, A………., reside na Rua …, n.º…., Bairro do …, …, Cabo Verde – cfr. fls. 10-11 e 42 dos autos; D) – O Requerido contraiu casamento civil em 11 de Julho de 1974, em Angola, com D………., natural de …, Angola, conforme assento de casamento n.º 642-A, lavrado na Conservatória dos Registos Centrais (CRC) em 19 de Maio de 2006 – cfr. fls. 15-17 dos autos; E) – D………., natural de …, Angola, nasceu em 16 de Junho de 1950, tendo o respectivo assento de nascimento n.º 493-A, sido lavrado na CRC em 30 de Abril de 2004 – cfr. fls. 18-19 dos autos; F) – E………., filha de A……….. e de D………., natural de …, Angola, nasceu em 4 de Abril de 1976, foi-lhe atribuída a nacionalidade portuguesa, nos termos do art.º 1.º, n.º 1, alínea c) da Lei 37/81, de 3 de Outubro, tendo o respectivo assento de nascimento n.º 47001, do ano de 2009, sido lavrado na CRC em 19 de Maio de 2009 – cfr. fls. 61-62 dos autos; G) – F………., filho de A………. e de D………., natural de …, Cabo Verde, nasceu em 15 de Fevereiro de 1982, foi-lhe atribuída a nacionalidade portuguesa, nos termos do art.º 1.º, n.º 1, alínea c) da Lei 37/81, de 3 de Outubro, tendo o respectivo assento de nascimento n.º 75856, do ano de 2008, sido lavrado na CRC em 22 de Dezembro de 2008 – cfr. fls. 63-64 dos autos; H) – Em 6 de Julho de 2009, o Requerido declarou na EMBAIXADA DE PORTUGAL, PRAIA, SECÇÃO CONSULAR, pretender adquirir a nacionalidade portuguesa, nos termos do “AUTO DE DECLARAÇÕES DE AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE”, que aqui se considera integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte: (…) tendo o mesmo declarado que é casado com cidadã de nacionalidade portuguesa de nome D………., com quem contraiu casamento em 11-07-1974, e cujo registo integrado na Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa, sob o n.º 642-A de 2006, e que por esse motivo, pretende adquirir a nacionalidade portuguesa, como lhe faculta o disposto no artigo 3.º da Lei 37/81, de 3 de Outubro, alterada pela Lei orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril, pelo que requer se lavre o respectivo registo de aquisição de nacionalidade. Para fins do disposto no art.9.º, da mencionada lei, declara: a) Que tem ligação à comunidade portuguesa por ser casado com cidadã de nacionalidade portuguesa, conservando os hábitos e costumes da comunidade portuguesa, lendo, escrevendo e falando a língua portuguesa.

    b) Que não praticou qualquer acto punível com pena de prisão igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa.

    c) Que não exerceu funções públicas nem prestou serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro (…) – cfr. fls. 10-11 dos autos.

    I) – O Requerido A………. concluiu a licenciatura em direito, em 2 de Novembro de 1968 na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa – cfr. fls. 26 dos autos; J) – Pelo instrumento de fls. 67 dos autos, datado de 28 de Abril de 2010 o Requerido remeteu à CRC, o instrumento de fls. 70 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, que consiste em “declaração emitida pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial, em 27 de Abril de 2010, de Cabo Verde” e de que se extrai o seguinte: “ DeclaraçãoPara os devidos e subsequentes efeitos se declara que o Dr. A………., aposentado, foi magistrado judicial, tendo, no período de … de … a … de …, exercido o cargo de Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, cujo conteúdo não tem carácter ou natureza de confiança política. (…) – cfr. fls. 70 dos autos; K) – Com data de 27 de Abril de 2010 o Conselho Superior da Magistratura Judicial, de Cabo Verde, emitiu o instrumento de fls. 71-72 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e de que...

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