Acórdão nº 0798/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MADUREIRA
Data da Resolução12 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO 1. 1. A…… e mulher B……, devidamente identificados nos autos, intentaram, no TAC de Coimbra, contra C……, médica, e o Hospital Distrital de Santarém, acção para efectivação da responsabilidade civil extracontratual destes por actos ilícitos de gestão pública – negligência médica relativa ao tratamento do seu filho D……, que veio a falecer –, pedindo a condenação solidária dos Réus no montante total de 20 000 000$00, sendo 5 000 000$00 pela perda do bem “vida” do seu filho, a título hereditário, 3 000 000$00, pelo padecimentos por ele sofridos até ao momento da sua morte e de 12 000 000$00 pelos danos morais sofridos por eles próprios com a essa morte.

Por requerimento de 22/11/2006, os Autores vieram requerer a ampliação do pedido relativo ao dano da perda do bem “vida” do seu filho para o montante de 50 000,00 euros (fls 637-638), ampliação essa que foi deferida por despacho de 3/2/2011 (fls 787).

Por sentença da mesma data (3/2/2011), a acção foi julgada improcedente relativamente à Ré C……, que foi absolvida do pedido, e procedente relativamente ao Réu Hospital, que foi condenado a pagar aos Autores, por danos não patrimoniais, o montante de 124 820,00 euros, sendo de 50 000,00 euros, pelo dano “morte” do D……, a título hereditário, 14.964,00 euros pelos sofrimentos e padecimentos dele até ao momento da sua morte, também a título hereditário, e 59.586,00 euros pelo sofrimento, dor, angústia, desespero e desgosto por eles sofridos com essa morte. Tudo acrescido de juros de mora, a contar da notificação da sentença (fls 788-836). O Hospital de Santarém não se conformou com o despacho que admitiu a ampliação do pedido nem com a sentença, tendo interposto recurso de ambos para este Supremo Tribunal.

  1. 2.

    Estão, assim, interpostos dois recursos pelo Hospital Distrital de Santarém: (i) um relativo ao despacho que admitiu a ampliação do pedido, que foi admitido a fls 920; (ii) outro da sentença, que foi admitido a fls 857.

    Nas suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: 1. 2. 1. Recurso do despacho que admitiu a ampliação do pedido (fls 787): 1.ª - A decisão recorrida fundamenta-se exclusivamente na suposição de que a falta de pronúncia por parte dos R.R. constitui acordo.

    1. - Acontece que tal não resulta da lei, sendo o acordo a que se refere o artigo 272° expresso e não presumido.

    2. - Quando o acordo pode ser tácito a lei processual assim se afirma expressamente (verbi gratia, aceitação de documentos).

    3. - Acontece ainda que aquela ampliação não se justifica na jurisprudência, entendendo esta como aplicação concreta do processo legislativo, nem a matéria foi objecto de apreciação de mérito, também com violação do artigo 273° C.P.C. .

    4. - Quanto ao tempo decorrido tem este elemento valor objectivo traduzido na taxa de inflação que foi de 4,4 (2001) 3,6 (2002) 3,3 (2003) 2,3 (2004) 2,3 (2005) e nos restantes de 3,1; 2,5; 2,6; - 0,9 e 1,4 (2010).

    5. - Pelo que nunca, objectivamente, se justificaria a deferida ampliação pelo dobro.

    Termos em que o despacho de fls 787 deve ser revogado, indeferindo-se a requerida ampliação.

  2. 2. 2. Recurso da sentença (fls 788-836): 1.ª - Integram os fundamentos da presente acção a matéria sumariada a folhas 805, nomeadamente: «O pequeno D…… apenas deu entrada no Serviço de Pediatria do R. Hospital cerca das 22:30 horas, tendo sido realizada a punção lombar às 24:00 horas, não obstante esta ter sido pedida às 16:15 horas. E, apesar dos primeiros resultados deste exame terem surgido cerca da 01:00 do dia 08/04/1991, a terapêutica só foi iniciada pelas 02:30 horas”.

    1. - E também integra fundamento da mesma matéria a folhas 806, nomeadamente: «Invocam que a administração da terapêutica específica apenas ocorreu cerca das 02:30 horas, muito embora fosse aconselhável a sua administração imediata perante a suspeita de meningite e mesmo antes de afastada a hipótese de fractura craneana, considerando as particulares características desta doença (como a sua evolução galopante e agressiva)”.

    2. - Sendo o ónus da autoria a matéria relativa a conduta da R. médica constante de folhas 806 e que é: ...

      “Ora, ao não actuar quando devia, a R. Médica conscientemente deixou passar a oportunidade e conveniência do tratamento, e com isto aumentou injustificadamente o perigo para a vida do menor, ou seja provocou um aumento sério e intolerável do risco de lesão do bem jurídico atingido - a vida do filho dos A”.

    3. - Sendo que em relação ao R. Hospital vem invocada responsabilidade funcional nos termos que se consignam: “Acrescidamente, os serviços do R. Hospital não funcionaram adequadamente, quer pelo tempo de espera quando se dirigiram ao serviço de urgência pela primeira vez, tendo aguardado cerca de uma hora sem que ninguém os tivesse chamado, pelo motivo de que os médicos não estavam disponíveis aquela hora por estarem a almoçar quer pela demora na realização de um exame, visto que, tendo a punção lombar sido solicitada cerca das 16:15 horas, a mesma foi efectuada às 24:00 horas.

      ”.

    4. - E ainda quanto ao R. Hospital a circunstância “do pequeno D…… ter de permanecer numa sala inadequada do serviço de urgência até às 20:30 horas, altura em que foi internado, bem como porque durante a noite, tendo o seu estado piorado consideravelmente, apenas foi assistido por enfermeiros, não recebendo assistência por parte dos médicos.” 6.ª - São estes os factos - fundamentos da acção e ónus da prova da autoria.

    5. - A matéria em discussão é relativa a suposto atraso de 8 horas na efectivação de punção lombar e na não administração terapêutica empírica.

    6. - Em 7/4/91 os AA deslocaram-se com o falecido D…… ao Centro de saúde do Cartaxo, onde lhe foi administrado Paracetamol + Brufen (folhas 786, n°2).

    7. - O D……. foi admitido no S.U. do Hospital Distrital de Santarém pelas 13.15H não tendo respondido a chamada às 14.15H e 14.45H(n°10, folhas 787).

    8. - No período compreendido entre as 13.45H e as 15.30H os pais redirigiram-se ao Hospital do Cartaxo (n°13, folhas 800).

    9. - O pequeno D…… foi atendido no S.U. do Hospital Distrital de Santarém pelas 15.30H (n°10 folhas 787).

    10. - Os pais e o pequeno D……, após regressarem do Cartaxo, entraram directamente na sala onde e R. médica estava a observar crianças e insistiram para que o seu filho fosse observado com urgência (n°16, folhas 801) .

    11. - Pelas 15.30 H o pequeno D…… foi atendido lançando-se na ficha de observação a matéria que consta a n° 10 de folhas 787, nomeadamente: “Observação e diagnóstico provisório: Febre e vómitos esta manhã após ingestão do leite, T. Rectal = 39.2. Fez Paracetamol + Brufen, às 12H” .

    12. - A matéria supra transcrita e a hora ali referida constituem um levantamento do diagnóstico de entrada resultante da terapêutica iniciada de manhã, no Cartaxo, sendo aquela hora (às 12H) retrospectiva.

    13. - Pelas 15.30H, 16.15H e 21H foi tomada a temperatura sendo que foi submetido a RX.

    14. - Sendo que igualmente se encontra provada a matéria do quesito 40 (folhas 804) quanto ao facto de o traumatismo craniano ser uma situação emergente.

    15. - Encontra-se igualmente provado que: “A doença que vitimou o D…… é de extrema gravidade e pode ter um processo galopante, o seu diagnóstico é difícil, por não resultar directo e imediato por mera observação clínica, sendo a febre, prostração e os vómitos manifestações de inúmeras doenças infantis” – (quesito 41).

    16. - Sendo relevante para a avaliação clínica, exames complementares de diagnóstico (cfr 42 de folhas 804).

    17. - No particular da punção lombar o resultado de alguns exames “ – A avaliação clínica de suspeita carece de ser complementada por exames complementares de diagnóstico” e “ – O resultado de alguns exames é muitas vezes tardio porque a caracterização bacteriana completa e definitiva só ocorre após antibiograma, que carece de cultura de cerca de 24 horas para desenvolvimento da bactéria a identificar com vista à identificação definitiva”.

    18. - Com interesse, encontra-se provado que “A R. C…… não administrou de imediato antibiótico por não estar confirmado, em absoluto, o diagnóstico de meningite e porque a sua administração prematura podia ser prejudicial”.

    19. - Resulta de fls. 789 que estando o D…… internado no serviço de Pediatria e “ao ser puncionada veia para colheita de sangue para análises teve agravamento da situação com fraca reacção e estímulos dolorosos, cianose dos lábios, polipneia e taquicardia”.

      22:ª - A colheita de sangue na veia é diferente de punção lombar, consistindo esta na introdução de agulha intercostal para retirar liquor da medula, o que se afirma pelo conhecimento comum.

    20. - Confunde a Sentença, transferência para o internamento (21 h), actos ali praticados (análise e rx.), com entrada em “isolamento” (22,30) e imputa atrasos que não resultam do teor de docs. 789 e 800 (quesito 11) .

    21. - Sendo que pelas 22 h30 m se encontrava em “isolamento” no Serviço de Pediatria, onde havia ingressado pelas 21 horas (cfr mesmos documentos).

    22. - E é em “isolamento” (do Serviço de Pediatria) que se efectua punção lombar, atenta a perigosidade infecciosa e todos os demais actos lançados a fls. 800 (22h.30m; 1,h00m; 2h30 m; 6h,15m :8,10).

    23. - Ora o único facto que sustenta a suspeita de meningite é a colocação em isolamento pelas 22.30, sendo todos os restantes factos em contrário mera hipótese diagnóstica – (quesitos 14, 15 e 22).

    24. - E no período entre as 22,30 e as 0,30 foram obtidos resultados analíticos (sangue) já referidos (cfr mesmos doc.s).

    25. - Pelo que a ficção de atraso da Sentença não se pode reportar a outro período que não o compreendido entre as 22h 30 m (isolamento) e as 0,30 h (punção lombar).

    26. - Os resultados analíticos da punção lombar são sempre provisórios até a concretização da análise e após cultura de 24H.

    27. - A infecção em causa pareceu ser pelo agente Neisserie, sendo que pelas 0.30H indicou probabilidade de Hemophilus...

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