Acórdão nº 01302/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução09 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I.

Relatório 1.

A……., SA, identificada nos autos e na qualidade de sociedade dominante de um grupo societário tributado pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), na sequência de indeferimento da reclamação graciosa referente à autoliquidação de IRC e derrama realizada ao exercício de 2009, deduziu impugnação judicial, no Tribunal Tributário de Lisboa, relativa à derrama apurada segundo orientação veiculada no Ofício-Circulado nº. 20.132 da Direcção de Serviços do IRC, no montante de € 7.201.394,34, que foi julgada procedente.

  1. Não se conformando, a representante da Fazenda Pública veio interpor recurso para este STA, formulando alegações, das quais se extraem as seguintes alegações: “I - Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela A……., SA na sequência do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a autoliquidação de IRC e derrama referente ao exercício de 2009; II — Conclui a douta sentença que o pedido formulado pela impugnante deve proceder, considerando que no âmbito de aplicação do RETGS, quando o n.° 1 do art.14° da Lei 2/2007 de 15 de Janeiro faz referência a “lucro tributável sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas”, apenas se poderá estar a referir ao lucro resultante da soma de lucros tributáveis e prejuízos fiscais individuais (resultado agregado), uma apenas este se encontra sujeito a IRC.(...)” III — A Derrama surge como corolário do ditame constitucional que determina a necessidade das autarquias locais — enquanto instrumento principal para a descentralização administrativa - serem dotadas dos meios necessários à sua tendencial e desejada autonomia, no só administrativa, mas também financeira, consubstanciando um instrumento colocado à disposição dos municípios para a realização das suas tarefas no âmbito da sua autonomia local; IV- Com a entrada em vigor da Lei n.° 2/2007, de 15 de Janeiro (LFL), operou-se uma modificação de fundo no modo de cálculo da derrama, ao passar a ter como base o lucro tributável, e não já, a coleta; V- Esta alteração legislativa consubstanciou uma verdadeira mudança de paradigma no cálculo da derrama, tendo esta perdido o seu caráter de acessoriedade — que até aqui vinha mantendo do face ao IRC -, passando a tratar-se de um imposto autónomo; VI - A Derrama tem a natureza de Imposto geral, ordinário, direto, real, periódico e rio estadual, e, considerando-se impostos acessórios aqueles que existem ou dependem de outros — denominados principais — há que reconhecer que face à nova Lei das Finanças Locais, a derrama deixou de assumir natureza acessória, pois deixou claramente de atender, que à matéria coletável, quer à própria coleta de IRC enquanto pressupostos da sua aplicabilidade; VII - Relativamente aos Grupos de Sociedades e ao seu regime especial de tributação (RETGS), dado que a derrama passou a ter como base o lucro tributável, ou seja, uma incidência mais montante que anteriormente, deverão ser acolhidas as regras do CIRC até ao momento determinação do lucro tributável, porque, seguidamente, aplicar-se-ão as regras próprias da derrama (aplicação da taxa); VIII - No RETGS não se determina a coleta de cada uma das sociedades do perímetro, (pelo que a questão não se colocava antes à luz da lei anterior), todavia, tendo passado a base de cálculo da derrama a ser o lucro tributável (e não já a colecta), e existindo, e sendo necessária, determinação do lucro tributável de cada uma das sociedades do grupo, da aplicação do n° 1 do art.14 da LFL - que dispõe que a derrama é lançada “sobre o lucro tributável sujeito e não isento de imposto das pessoas coletivas (IRC), que corresponda à proporção do rendimento gerado na sua área geográfica…” - resultará a aplicação da taxa correspondente da derrama a cada um dos lucros tributáveis de cada uma das sociedades dominadas; IX - Uma vez que é determinado um lucro tributável, sujeito e não isento para efeitos de IRC, a liquidação da derrama, passa a reger-se pelas regras próprias, nos termos do disposto no n.° do art. 14° da LFL, não existindo qualquer impossibilidade de liquidar a derrama individual de cada sociedade, uma vez que o “objeto” da sua incidência foi alterado da coleta do IRC para o lucro tributável sujeito a imposto, sendo que esse lucro tributável existe, o que não acontecia com a coleta; X - No caso concreto das sociedades abrangidas pelo RETGS, é inegável que cada uma das sociedades que integram o perímetro é sujeito passivo de IRC, sendo igualmente incontestável que todas elas geram rendimentos sujeitos a IRC, constituindo pois, situações patentes de sujeição pessoal e real, de cada uma daquelas sociedades, e respetivos rendimentos; XI — Sendo que em momento algum é consagrada qualquer situação de não sujeição, de isenção, ou de exclusão de tributação para estas sociedades ou os seus rendimentos.

    XII - A LFL, ao determinar a incidência da derrama sobre o lucro tributável dos sujeitos passivos para efeitos de IRC, não convocando as regras do RETGS, acolhe as regras do CIRC, mas apenas até ao momento da determinação do lucro tributável de cada sujeito passivo, antes do cálculo do lucro tributável do grupo; XIII — Será esta a forma mais direta de fazer corresponder a receita da derrama ao Município onde o correspondente rendimento é efetivamente gerado; XIV - No âmbito do RETGS, os lucros tributáveis de certas sociedades podem ser absolvidos pelos prejuízos de outras, sendo que, determinado município onde se instalou determinada sociedade que teve lucro tributável pode deixar de auferi-lo se o grupo, no seu conjunto, apresentar prejuízo; XV - Os superiores valores coletivos gerais que motivaram a introdução do RETGS, no coincidem com os valores subjacentes ao lançamento da derrama; XVI — Sendo que, os impostos estaduais têm por fundamento a existência de necessidades coletivas gerais e destinam-se à criação e aplicação de meios de satisfação de tais necessidades (devendo caber a todos os cidadãos o dever contributivo) enquanto que os impostos municipais baseiam-se em necessidades exclusivamente locais, cabendo o dever contributivo aos cidadãos a que tais necessidades respeitem; XVII — A consideração da derrama como um imposto autónomo, não obstante a partilha de alguns elementos com o IRC, ao nível da incidência e determinação do lucro tributável, acarretará, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a não consideração daquele especial regime de tributação de IRC para efeitos de derrama; XVIII - É esta a interpretação que melhor se coaduna com o espírito da lei, e a melhor forma de conferir exequibilidade ao instrumento de financiamento dos municípios que se consubstancia na derrama; XIX — Mais recentemente, o art.° 57.° da Lei-B/2011 de 30 de dezembro, procedeu à alteração do art.° 14.° da Lei n.° 2/2007 de 15 de janeiro, passando, o n.° 8 do referido normativo legal, a dispor que quando seja aplicável o RETGS, a derrama incidirá sobre o lucro tributável individual de cada uma das sociedades do grupo; XX - Considerando que a qualificação duma norma como interpretativa não se encontra dependente da atribuição de tal caráter pelo legislador (não sendo indispensável que o legislador o tivesse feito expressamente), é nossa opinião, que a norma supra, não assume caráter inovador; XXI - A posição agora (melhor) definida pelo legislador, visou apenas esclarecer a controvérsia jurídica existente quanto à matéria, dissipando eventuais incertezas, não se verificando uma verdadeira alteração da posição do...

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