Acórdão nº 0141/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A………, Lda.” (a seguir Contribuinte, Impugnante ou Recorrente) recorre da sentença proferida pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra na parte em que nesta se julgou caducado o direito de impugnar as liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que lhe foram efectuadas com referência aos anos de 2001 e 2002.

    1.2 Com o requerimento de interposição de recurso a Impugnante apresentou as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A) A questão única relativa às liquidações referidas sob as alíneas a) e b) é a de saber se se verifica a presunção legal constante do art. 39.º n.º 5 do CPPT, vigente ao tempo dos factos, ou seja, se [a Impugnante pode ter-se como notificada,] apesar de não ter recebido a carta registada que o Serviço de Finanças de Cantanhede lhe enviou.

    B) Está provado que: 4. E assim o declararam (fazer cessar a actividade da sociedade) em 11 de Junho de 1996 à Administração Tributária, para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado; 8. Por via postal sob registo, em 5 de Junho de 2003, devolvida sob a notação postal de retirou desta morada, reiterada a 19 de Julho desse ano, igualmente devolvida sob a notação postal de encerrou, a Administração Tributária sucessivamente enviou para a sede da Impugnante, acima indicada, comunicação para que ela, no prazo de 15 dias, procedesse à correcção da referida declaração de 13 de Maio de 2002, … C) Os serviços postais confirmaram em 2003, que a ora impugnante já estava encerrada e já retirara do local, ou seja, já ali não tinha sua sede, pelo que qualquer tentativa de notificação estava condenada ao insucesso, situação aliás que estava de acordo com o que a ora impugnante já tinha comunicado em 1996.

    D) Como bem refere a sentença “Sem prejuízo de se entender, sem pejo, que em face do teor da devolução das sucessivas notificações postais, a par da inactividade da Impugnante, conhecidas ambas da Administração Tributária, melhor seria esta ter seguido um outro modo de a notificar – exequível, como resulta da matéria de facto gerente ou sócio da Impugnante até se dirigiu em certa altura, pessoalmente, à Administração Tributária, no âmbito de um processo executivo em que aquela era executada!, exibindo que não seria difícil de contactar/encontrar –, o certo é que o comportamento algo indiferente seguido pela Administração Tributária não dá azo a um resultado, assente na presunção legal de notificação estabelecida, constitucionalmente desconforme, na concomitante persistência da sede de direito da Impugnante e na paralela actividade declarativa desta indicando a mesma sede, que de resto de direito nunca alterou”.

    E) Isto depois de expressamente declarar que a Administração Tributária a sabia (à ora impugnante) havia muito inactiva.

    F) Existe um claro e nítido abuso de direito da parte da Administração Tributária no sentido de notificar a ora impugnante de uma liquidação que a Administração Tributária sabia ilegal e assim evitava... impugnações.

    G) Há aqui uma violação grave e flagrante do princípio do procedimento tributário, consagrado no art. 55.º da Lei Geral Tributária, ou seja, que “a administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.

    H) A questão que importa decidir nesta sede é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de direito ao ter considerado que o Recorrente foi validamente notificado da liquidação que originou a dívida exequenda.

    I) Resulta da norma do artigo 36.º n.º 1 do CPPT que a notificação dos actos em matéria tributária que afectem direitos e interesses legítimos é condição da sua eficácia em relação aos notificados e no que concerne ao modo de proceder à notificação dos referidos actos, determina o artigo 38.º n.º 1 do CPPT que “as notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em actos ou diligências”.

    J) Acrescenta o n.º 2 que “Para efeitos do disposto no número anterior a comunicação dos serviços postais para levantamento de carta registada remetida pela administração fiscal deve sempre conter de forma clara a identificação do remetente”, acrescentando o n.º 3 que “as notificações não abrangidas pelo n.º 1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada”, pelo que o aviso deixado pelos serviços postais deve conter as formalidades previstas no art. 38.º do CPPT atrás transcrito e todo o sistema assenta na ideia de “que foi feita qualquer comunicação ao destinatário para levantar a carta registada”.

    K) No caso concreto, o Serviço de Finanças já sabia que, face à retirada da ora impugnante morada que constava dos serviços de finanças, a carta com toda a segurança viria devolvida, pelo que, no sentido de aproximar o processo tributário do princípio consignado no art. 55.º, da Lei Geral Tributária, de modo a actuar com “respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”, face aos antecedentes, devia o Serviço de Finanças ter actuado como se refere na sentença recorrida, ou seja, notificar a ora impugnante na pessoa dos seus agentes, o que esse serviço já soube fazer para efeitos de processo executivo.

    L) Por isso, por manifesto erro de interpretação e aplicação das normas dos arts. 38.º e 39.º do CPPT e do art. 55.º da Lei Geral Tributária, deve ser revogada a sentença recorrida na parte em que considerou intempestiva a presente impugnação, relativamente à liquidação de IRC relativa ao ano de 2001, no montante de 935,74 Euros e à liquidação de IRC relativa ao ano de 2002 e juros compensatórios, no montante de 1.032,88 Euros, devendo ser julgada procedente e provada a presente impugnação quanto a essas liquidações, como é de lei e de JUSTIÇA!» (Porque usamos o itálico na transcrição, as partes que no original estavam em itálico surgem aqui em tipo normal, a fim de se respeitar o destaque que lhes foi concedido pela Recorrente.

    ).

    1.3 O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

    1.4 A Fazenda Pública não contra alegou.

    1.5 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público, que não emitiu parecer.

    1.6 Foi dada vista aos Juízes Conselheiros adjuntos.

    1.7 A questão que cumpre apreciar e decidir é a da saber se o Juiz do Tribunal a quo fez errado julgamento na parte em que considerou caducado o direito de impugnar as liquidações de IRC dos anos de 2001 e 2002. Para tal, há indagar se aqueles actos tributários foram, ou podem considerar-se como tendo sido, notificados à ora Recorrente, o que exige, designadamente, que se averigúe se pode considerar-se efectuada a notificação nos termos do n.º 5 do art. 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) quando as cartas remetidas ao contribuinte para esse efeito vêm devolvidas com as anotações encerrou e retirou desta morada apostas pelos serviços postais.

    * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «Da prova reunida, é a seguinte a matéria que resulta provada, com interesse para a decisão da causa: 1. A Impugnante, A………, L.da, constituiu-se em 30 de Outubro de 1995, tendo como objecto a comercialização de animais, produtos agroquímicos, rações, matérias-primas para o fabrico de alimentos compostos para animais, sementes, equipamentos para a pecuária e desinfectantes, tendo sede e domicílio fiscal na Rua ………, em ………, Cantanhede.

  2. A Impugnante declarou à Administração Tributária o seu início de actividade em 14 de Novembro de 1995 – sob o CAE 52488 –, sujeita a tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, a contabilidade organizada e sob o regime normal trimestral, em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado.

  3. Poucos meses volvidos, porém, ambos sócios da Impugnante concluíram pela inviabilidade do projecto que se propunham desenvolver no seu seio e resolveram fazê-la cessar a actividade.

  4. E assim o declararam em 11 de Junho de 1996 à Administração Tributária, para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado.

  5. Anos mais tarde, encerraram as contas respectivas, em 31 de Dezembro de 2000.

  6. E, mais tarde ainda, em 27 de Agosto de 2004, ambos sócios da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT