Acórdão nº 0667A/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução23 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A FAZENDA PÚBLICA interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que, nos autos de incidente de anulação de venda executiva que corre por apenso ao processo de execução fiscal nº 1759-2005/01004018 (em que figuram como executados, por reversão da execução, B……… e C………), decidiu julgar procedente o pedido de anulação da venda deduzido pelo credor com garantia real sobre o bem imóvel vendido, A………, anulando o acto de venda e todos os actos subsequentes que dela dependam absolutamente.

Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões: A) Nos autos em referência, a douta sentença concedeu provimento à acção de anulação de venda, por haver concluído, atentos os factos dados como provados, que o autor jamais foi notificado pessoalmente da modalidade de venda mediante negociação particular e do valor base pelo qual o bem seria vendido, constituindo nulidade susceptível de afectar o acto da venda e que acarreta a sua anulação nos termos do disposto nos art. 201º, nº 1 e 909º, nº 1 c) do CPC e do art. 57º°, nº 1 c) do CPPT.

B) Ressalvado o respeito devido, que é muito, não nos conformamos com esta decisão, discordando da aplicação do direito efectuada, com base em duas ordens de motivos: • na venda por negociação particular efectuada no processo de execução fiscal, a omissão da notificação ao executado não constitui nulidade com os efeitos determinados na douta sentença e, • a venda não foi em exclusivo benefício do exequente.

Analisando o primeiro aspecto C) A anulação da venda nos termos do art. 201º do CPC depende de ter ocorrido relativamente ao acto de venda ou aos actos preparatórios a ela respeitantes qualquer omissão de acto ou formalidade prescrita na lei, desde que a irregularidade possa ter influência na venda, só podendo ser decretada se, no circunstancialismo em que ocorreram as irregularidades, se puder afirmar a sua susceptibilidade para influenciar a venda, o que não acontece no presente caso.

D) Não pode dizer-se existir irregularidade na tramitação da venda pelo órgão de execução fiscal, uma vez que o artigo 2º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), estabelece que o CPC é “de aplicação supletiva ao procedimento e processo judicial tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos”.

E) O legislador fiscal preceituou integralmente no CPPT o regime da venda no processo de execução fiscal — a matéria da venda dos bens penhorados, encontra-se especialmente prevista na legislação fiscal — cfr. Secção IX (Da venda de bens penhorados) do capítulo II (Do processo) do título IV (Da execução fiscal) do CPPT - artigos 248º a 258º, onde se define todo o regime da venda dos bens penhorados, nomeadamente a publicidade e as formalidades a que esta está sujeita (artigos 249º e 256º), bem como o valor base dos bens e as modalidades de venda (artigos 248º, 250º, 252º e 255º).

F) No caso da venda por negociação particular, o legislador fiscal, ao contrário do legislador ordinário no CPC, não exigiu que o executado e demais credores aceitassem o comprador ou sequer o preço acordado, bastou-se com a publicação na internet, nos termos definidos pela Portaria nº 352/2002, de 3 de Abril, do nome ou firma do executado, do órgão onde corre o processo, da identificação sumária dos bens, do local, prazo e horas em que estes podem ser examinados, do valor base da venda e do nome ou firma do negociador, bem como da residência ou sede deste, como preceitua o art. 252º, nº 3, do CPPT.

G) Foi, portanto, opção do legislador excluir do processo de execução fiscal a audição do próprio executado, no caso da venda por negociação particular, sobre a decisão do valor base dos bens a vender e consequente notificação da decisão, não sendo assim de aplicação subsidiária o art. 886°-A do CPC (neste sentido, os Acórdãos do STA de 28.03.2007 - Rec. 026/07 e de 17.12.2003 - Rec. 01951/03, aqui seguidos de perto).

H) Face à questão de saber se a lei processual civil na parte que prevê que o credor hipotecário seja notificado do despacho que designa a venda por negociação particular é aqui aplicável e a omissão da notificação acarreta nulidade processual susceptível de abarcar a anulação da venda, o art. 252º do CPPT estabelece que as formalidades necessárias, e suficientes, de publicitação (conhecimento, notificação) da venda por negociação particular em processo de execução fiscal, são as previstas de modo especial no seu nº 3.

I) A jurisprudência deste Venerando Supremo Tribunal Administrativo tem sustentado que o CPPT regula de modo suficiente os termos da venda executiva, pelo menos no que respeita à fase de negociação particular, pelo que, as normas do CPC - designadamente as normas dos artigos 886º-A, nº 6 do CPC (anterior nº 4), 909º, nº 1, alínea e) e 201º do CPC, não serão aplicáveis no processo de execução fiscal, face ao preceituado no nº 3 do artigo 252º, nº 3 do CPPT (com a devida vénia permitimo-nos voltar a invocar, neste sentido, o Acórdão do STA de 28-03-2007, tirado no processo 026/07, sobre uma situação semelhante de venda por negociação particular).

J) Além do mais, sendo certo que o artigo 886º-A, do CPC, sob a epigrafe “determinação da modalidade de venda e do valor base dos bens”, estabelece, nos seus nºs 1 e 4, que o Juiz, após audição do exequente, executado e dos credores com garantia sobre os bens a vender, determina a modalidade da venda e o valor base dos bens a vender, através de despacho notificado ao exequente, executado e aos credores reclamantes de créditos com garantia real sobre os bens a vender, não deixa de ser verdade que se trata de uma disposição de carácter genérico, destinada a disciplinar o mecanismo da venda executiva, logo no início da fase do pagamento, mas que já se não aplica à venda por negociação particular que resulta da convolação da venda por meio de propostas em carta fechada, como aconteceu, atento o teor das disposições específicas que regem esta situação, em que apenas se impõe a obrigatoriedade de serem ouvidos os interessados presentes.

K) Por quanto se tem vindo a expender, alinhamos pelo entendimento de que o CPPT regula a questão, sem necessidade de recurso às normas supletivas do CPC, tal como, aliás, entende o Ilustre Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, no Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado e comentado, 2007, Volume II, nota 4 ao artigo 148º, pág. 540.

L) Relativamente à falta de notificação da venda judicial mediante propostas em carta fechada, regulam os arts. 248º e 249º, dedicando-se este último à publicidade da venda, ora, tendo em conta que o CPPT regula esta matéria de forma completa, não prevendo a notificação dos credores com garantia real, não ocorre qualquer violação do disposto no art. 886º-A do CPC, na medida em que a lei especial afasta a aplicação da regra geral aí prevista.

M) A este propósito, torna-se pertinente citar a anotação 4 ao art. 248º de Jorge Lopes de Sousa, no Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado, 3ª Edição, Vislis, 2003: “No art. 886º-A do C.P.C., impõe-se a prévia audição do executado e dos credores com garantia sobre os bens a vender, relativamente à determinação da modalidade de venda, do valor dos bens a vender e da eventual formação de lotes. No processo de execução fiscal não se prevê expressamente tal audição, o que estará em consonância com a maior celeridade que se pretende com o processo de execução fiscal”.

N) Pelo que, encontrando-se cumprido o formalismo prescrito no art. 249º do CPPT, não era de notificar o requerente, até porque este tinha sido tempestivamente citado nos termos do art. 239º, e, esta citação aos credores com garantia real tem por função “permitir-lhes acompanhar a praça, além de reclamarem os créditos respectivos, para poderem providenciar para que não ocorra uma degradação do preço da venda e, em consequência, a insolvabilidade do crédito (transcrição parcial da anotação 11 ao art. 239º do CPPT anotado).

O) No que concerne ao facto de o requerente não ter sido ouvido sobre a venda por negociação particular, a argumentação que a nosso ver refuta a sua posição é em tudo idêntica à acima exposta, sendo que o artigo do CPPT que em especial regula esta matéria é do 252º, cujo cumprimento foi integralmente observado, com a opção pela única modalidade pertinente para a alienação de bens imóveis: a negociação particular (dada a inexistência de quaisquer propostas), neste sentido se pronunciou o STA, no acórdão tirado no processo nº 0173/05, de 16-03-2005.

P) Foi efectuada a competente publicidade, nos termos do nº 3 do respectivo artigo, e cabia ao requerente, citado nos termos do 239º do CPPT, acompanhar a praça.

Q) Finalmente, no que se refere ao valor que serviu de base à venda por negociação particular, o art. 250º do CPPT prescreve uma regra própria para a determinação de tal valor, sendo que nos termos do douto aresto citado no ponto I. supra, cabia ao órgão de execução fiscal estabelecer o preço mínimo, ou mesmo não o estabelecer.

R) Concluindo, é insusceptível de ser enquadrada no art. 201º do...

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