Acórdão nº 0996/06 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução25 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1. A……., S.A., com sede na Rua …, …, .... em Lisboa, apresenta impugnação da revisão do PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro.

Pede a declaração de ilegalidade das normas resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15.º do REGULAMENTO DO PLANO DE ORDENAMENTO DO PARQUE NATURAL DE SINTRA-CASCAIS, com a Planta de Síntese 1D, ambos anexos àquela Resolução.

Cumula esse pedido com pedido de indemnização pelos danos resultantes da alegada ilegalidade.

Subsidiariamente, formula pedido de efectivação de responsabilidade civil por acto lícito.

1.2. Conforme se decidiu no despacho de fls. 1412, e de acordo com o artigo 5.º, n.º 1, do CPTA, a acção segue os termos da acção administrativa especial.

1.3.

Ainda no cumprimento desse despacho, a Autora apresentou nova petição na qual passou a figurar como Ré a Presidência do Conselho de Ministros, em vez do Estado.

Indicou como contra-interessado o Instituto da Conservação da Natureza 1.4.

A digna magistrada do Ministério Público emitiu parecer (fls. 2339 a 2351) pela improcedência da acção.

Notificado às partes, nada por elas foi dito.

1.5.

Foi proferido despacho saneador, não se suscitando questões quanto à personalidade, capacidade, legitimidade e representação quer da Autora quer da Ré e do interessado ICN.

Nesse despacho e nos termos do artigo 90.º, n.º 3 e n.º 4, do CPTA diferiu-se a instrução respeitante aos pedidos de indemnização.

1.6. A Autora produziu alegações em que concluiu (faltando uma folha de paginação nas alegações e passando as conclusões da conclusão 2 para a conclusão 5, a Autora foi notificada para esclarecer, tendo indicado – fls. 2715 - que se tratou de mero lapso de paginação e de numeração): «1. À data da aprovação do POPNSC de 2004, a Autora era titular do direito de urbanizar, com base nos seguintes títulos jurídicos: a) Contrato de Urbanização celebrado com a Câmara Municipal de Cascais, em 14 de dezembro de 1922; b) Novo Plano de Urbanização da Marinha, homologado por Despacho do Ministro das Obras Públicas, de 1 de julho de 1957; c) Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha, com Despacho favorável do Subsecretário das Obras Públicas, de 15 de junho de 1967. e aprovado por Deliberação da Câmara Municipal de Cascais, de 31 de outubro de 1968 (esta Câmara Municipal viria a confirmar a vigência deste Plano, em 1992); d) Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais, aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 9/94, de 11 de março; e) Plano Diretor Municipal de Cascais, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/97, de 19 de junho; f) Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sintra-Sado, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2003, de 13 de março.

2. O Contrato de Urbanização de 1922, estabeleceu as condições para a urbanização do prédio, bem como as condições a que ficaria vinculado o desenvolvimento dos loteamentos urbanos que concretizassem os planos de urbanização projetados.

[3. falta] [4. falta] 5. Em 11 de junho de 1957, o Conselho Superior de Obras Públicas emitiu parecer favorável à aprovação do Novo Plano de Urbanização da Marinha e do Novo Plano de Urbanização da Zona da Guia, consolidando-se, assim, o direito de concretizar a urbanização da Marinha, já contratualizado em 1922, de acordo e em conformidade com o previsto nos planos apresentados.

6. Em 31 de outubro de 1968, a Câmara Municipal de Cascais “deliberou por unanimidade aprovar o Estudo do Plano Turístico Hoteleiro para a Quinta da Marinha nas condições postas na informação do Senhor Director-Geral dos Serviços de Urbanização”.

7. Até à aprovação do POPNSC de 2004, os direitos urbanísticos permaneceram inalterados, na medida em que nenhum diploma legal ou instrumento de ordenamento do território determinou ou pretendeu determinar a extinção dos mesmos.

8. Com a aprovação do POPNSC de 2004, e, em especial, das normas contidas nos artigos 11.º a 15.° do seu Regulamento, verificou-se a extinção (ilícita) dos direitos urbanísticos da Autora.

9. Com efeito, as normas que regulam o uso do solo da propriedade da Autora, resultantes da conjugação dos artigos 11.° a 15.° do Regulamento, com a Planta de Síntese 1D, do POPNSC de 2004 - aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de janeiro - são inválidas, uma vez que violam, de forma clamorosa, o princípio da proteção da confiança, o princípio da proporcionalidade e o princípio da participação dos interessados nas decisões administrativas urbanísticas que lhes dizem respeito.

10. Por um lado, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição e concretizado no artigo 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo, bem como o princípio da estabilidade dos planos com eficácia plurisubjetiva, contido no artigo 25.º, n.º 2, da Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, na medida em que operaram uma rotura radical e surpreendente no ordenamento urbanístico aplicável à propriedade da Autora, cortando pela raiz o tipo de utilização do solo que se encontrava previsto há décadas e que foi e continua a ser o definido para a maioria das propriedades circundantes.

11. Rotura tão mais radical e surpreendente quanto se tem presente que: a) Não lhe subjaz qualquer mudança nas características físicas, geológicas, morfológicas, paisagísticas ou ambientais do terreno Autora, que se mantiveram inalteradas desde a elaboração do POPNSC de 1994; e b) Contraria a antiguidade (mais de 80 anos) do reconhecimento pelas autoridades públicas do direito subjetivo de aproveitamento urbanístico da Autora que, em face do Contrato de Urbanização de 1922, deve mesmo considerar-se um direito adquirido que se encontra definitivamente subjetivado na esfera jurídica desta.

12. Por outro lado, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 266°, n.º 2, da Constituição e concretizado no artigo 5°, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo, não sendo normas adequadas, necessárias ou equilibradas (proporcionalidade em sentido estrito), na medida em que (i) partem de um erro manifesto sobres as características do terreno da Autora, (ii) criam um regime de proteção ambiental desnecessário em face dos valores ambientais realmente existentes e (iii) não ponderam - antes desconsiderando por completo - os direitos adquiridos da Autora.

13. Por fim, as referidas normas do POPNSC de 2004 são inválidas por violarem o princípio de participação dos interessados, consagrado no artigo 267.º, n.º 2, da Constituição, concretizado no artigo 7.º do Código do Procedimento Administrativo e, bem assim, nos artigo 5°, alínea f), e 21.° da Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, e nos artigos 6.° e 48.°, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de setembro, na medida em que (i) incorporaram uma decisão administrativa anterior - Resolução do Conselho de Ministros n.º 142/97, de 28 de Agosto - sobre a qual a Autora não teve oportunidade de se pronunciar e (ii) não ponderaram as reclamações, observações e pedidos de esclarecimento formulados pela Autora, sem que tenha sido apresentada qualquer fundamentação para a mencionada falta ponderação.

Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada procedente e provada: a) Declarando-se a nulidade das normas que determinam o uso do solo da propriedade da Autora, resultantes da conjugação dos artigos 11.º a 15. do Regulamento, com a Planta de Síntese 1D, do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra-Cascais de 2004, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de janeiro, e condenando-se o Réu a pagar à Autora a quantia que vier a apurar-se em liquidação de sentença, correspondente aos prejuízos que aquelas disposições lhe causaram e que não serão removidos com a respetiva declaração de nulidade; Não decidindo o Tribunal por esta declaração de nulidade, b) Condenando-se o Réu Estado a pagar à Autora uma quantia que nunca será inferior ao mais baixo dos seguintes valores, correspondente aos danos que o POPNSC de 2004, objetivamente lhe causou: i) 371.420.640,00 € (trezentos e setenta e um milhões, quatrocentos e vinte mil, seiscentos e quarenta euros); ii) 308.873.136,00 € (trezentos e oito milhões, oitocentos e setenta e três mil, cento e trinta e seis euros); iii) 349.004.640,00 € (trezentos e quarenta e nove milhões, quatro mil, seiscentos e quarenta euros); iv) 374.305.440,00 € (trezentos e setenta e quatro milhões, trezentos e cinco mil, quatrocentos e quarenta euros)».

1.7.

A Presidência do Conselho de Ministros, pelo Primeiro-Ministro, alegou em contrário, concluindo: «1. O que está em causa é na presente ação é um direito à edificação e não o direito à propriedade, que nunca foi posto em causa; 2. Não integrando o jus aedificandi o núcleo do direito de propriedade também se não integra na proteção que a Constituição concede a esse direito quando lhe manda aplicar o regime dos direitos, liberdades e garantias; 3. Em nenhum momento o Estado Português, quando aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 1-A/2004, de 8 de Janeiro, violou o princípio da confiança dos particulares e da boa-fé da Administração Pública, pois foi movido, tão-somente e como, de resto, lhe cumpre, pela mais alta perceção do interesse geral que lhe cabe prosseguir, traduzida no dever de efetivação do direito ao ambiente, merecedor de tutela constitucional; 4. As normas do Decreto-Lei n.º 351/93 não são materialmente inconstitucionais em virtude da sua alegada retroatividade por afetarem os princípios do Estado de Direito democrático, da tutela da confiança, da igualdade, da proporcionalidade e por afetarem um direito fundamental de natureza análoga aos Direitos, Liberdades...

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