Acórdão nº 0294/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução16 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.1. A……, com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, na impugnação judicial da liquidação de IRS e respectivos juros, relativa ao ano de 2000, anulou todo o processado, por erro na forma do processo e, em consequência, absolveu da instância a Fazenda Pública.

1.2. O recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1. Discutindo-se na Impugnação Judicial o acto de liquidação propriamente dito, cuja importância é acrescida para o sujeito passivo, a lei prevê como fundamento de impugnação judicial “qualquer ilegalidade” (cfr. art. 99° do CPPT), não podendo deixar de se considerar que a liquidação que subjaz à cobrança coerciva de que o Recorrente é alvo está mortalmente ferida de uma ilegalidade que atinge todos os princípios a que está obrigada, sendo a impugnação judicial o meio próprio para aferir de tal ilegalidade.

  1. Na verdade, a Fazenda Pública bem sabia, por tal ter sido devidamente alegado em sede de reclamação graciosa, que o Recorrente não era o real sujeito passivo da relação tributária, persistindo, ainda assim, em prosseguir a execução fiscal em curso contra o Recorrente ao invés de averiguar devidamente os factos trazidos ao seu conhecimento e, por via destes, dirigir o processo executivo contra o real sujeito da relação tributária.

  2. Concretizando imperativos constitucionais estabelece logo o art. 4° da LGT que “os impostos assentam especialmente na capacidade contributiva” dos cidadãos, esclarecendo o n° 2 do art. 5° do mesmo diploma que a tributação terá que respeitar os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material.

  3. Sendo que a relação jurídica tributária se constitui com o facto tributário (art. 36°, n° l da LGT), é sujeito passivo, por regra, aquele que pratica o facto, na esfera do qual se vão manifestar os efeitos de tal acto, sejam os positivos (com o incremento do rendimento e da riqueza) sejam os negativos (como a obrigação de cumprir a prestação tributária).

  4. Não ter em consideração que o Recorrente, de facto, não tem a capacidade contributiva que os impostos em causa pressupõem, seria desvirtuar as finalidades do nosso sistema fiscal e deixar passar impunes aqueles que usam da boa fé de terceiro para não serem responsabilizados pelos seus actos.

  5. Quem, na verdade, praticou o facto constitutivo da relação jurídica tributária não foi o Recorrente, foi, antes, seu irmão, B……. Assim sendo, como é, foi com este que, efectivamente, se constituiu a relação jurídica tributária, devendo ser ele o responsável pelas dívidas daí emergentes.

  6. Na verdade, se a administração tributária pode e deve atender à situação efectivamente verificada, fazendo, por exemplo, impender a prestação tributária sobre o negócio real em detrimento do meramente aparente ou declarado (v.g. casos dos arts. 38° e 39° da LGT ou certos casos de tributação indirecta), deve também pautar-se por essa preocupação no caso inverso.

  7. Na verdade não pode deixar de se considerar que a liquidação que subjaz à cobrança coerciva de que o Recorrente é alvo está mortalmente ferida de uma ilegalidade (na medida em que abrange o sujeito passivo errado) que atinge todos os princípios a que está obrigada, sendo a impugnação judicial o meio próprio para aferir de tal ilegalidade.

  8. A acrescer a esta identifica-se uma outra ilegalidade não especificamente consubstanciada num qualquer vício particular, mas sim no desrespeito pelo “bloco de juridicidade” que constitui o nosso sistema jurídico e que vincula a administração tributária e pelo qual, naturalmente, tudo há-de aferir-se.

  9. Recusando-se a conhecer tal matéria que está suficientemente alegada e resulta, inclusivamente, da documentação junta aos autos e, consequentemente, decidindo de outro modo, violou a douta sentença recorrida o disposto no art. 99° do CPPT, pelo que deve, nessa medida, ser revogada.

  10. Decidindo do modo exposto, a douta sentença recorrida, apelando a um critério meramente formalista, escusou-se a apreciar todas as questões submetidas a juízo, violando, desde logo, o direito à tutela judicial efectiva. Na verdade, estabelece o n° 4 do art. 268° do nosso texto fundamental que é garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, o que inclui, obviamente, o direito de impugnar quaisquer actos lesivos dos mesmos (cfr. LGT, 95° e CPPT, 96°).

  11. Absteve-se, pois, a douta sentença recorrida de procurar a verdade material na relação tributária em análise, preferindo não conhecer de questões que afectam um devedor/Recorrente, cuja responsabilidade existe apenas e tão só porque a Administração Fiscal, erradamente, o considera o verdadeiro sujeito da relação jurídico-tributária.

  12. A fundamentação de qualquer acto tributário deve ser feita de forma expressa e contemporânea do mesmo - esta é uma exigência constitucional que não deve ser tomada de ânimo leve (CRP, art. 268°). Tal não aconteceu nos presentes autos, mas o Recorrente viu coarctada a possibilidade de o demonstrar tão só e apenas porque, pura e simplesmente, a impugnação deduzida não foi apreciada no seu todo, cerceando-se, desta forma direitos e garantias...

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