Acórdão nº 0475/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução14 de Junho de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I-RELATÓRIO 1. BANCO A……, S.A., com a identificação constante dos autos, moveu uma acção administrativa especial, no Tribunal Tributário de Lisboa, contra o despacho proferido pelo SECRETÁRIO DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS, que indeferiu a concessão de benefícios fiscais (artigo 60.º, nº 1, alínea a), do EBF), respeitante à isenção de IMT relativamente a 452 imóveis, destinados a habitação.

2.

O M.mo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, no despacho saneador, conheceu oficiosamente da competência, em razão da hierarquia, concluindo pela incompetência absoluta do Tribunal, e, consequentemente pela competência do Tribunal Central Administrativo Sul.

3.

Remetidos os autos ao TCAS, foi proferido Acórdão em 29/11/2011, que decidiu “… julgar procedente a presente acção e, em consequência, em determinar a anulação do despacho do Sr. SEAFiscais, de 2008DEZ23, aqui em causa, nos termos peticionados pelo A.” 4.

Não se conformando com tal decisão, o SECRETÁRIO DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS veio interpor recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentou as respectivas Alegações, formulando as seguintes Conclusões: “

  1. O douto Acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em 29 de Novembro de 2011, em primeira instância, que julgou procedente a acção e, em consequência, determinou a anulação do despacho do SEAF, de 23/12/2008, “nos termos peticionados pelo A.”, enferma de erro na interpretação do direito, concretamente do n° 1, alínea a), do art. 60° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção então em vigor, introduzida pela Lei n° 53-A/2006, de 29 de Dezembro.

  2. Tal erro consiste em se ter considerado que “(...) atendendo a estes considerandos (...) o sentido da exclusão, nos benefícios aqui em causa, dos imóveis destinados à habitação não deverá ser o mero sentido literal e objectivo da finalidade a que os mesmos estão votados, mas essa finalidade se e na medida em que constitua um elemento integrante do objectivo visado de incremento ao investimento, pois, em caso contrário e nos casos das locadoras financeiras, atendendo ao regime antes delineado a lei estaria, em grande parte, a incrementar, por um lado, a concentração de empresas e, por outro, a obstaculizar essa mesma concentração.” C) Sendo certo que apenas a versão inicial do Decreto-Lei n° 404/90, de 21 de Dezembro, contém um preâmbulo - o mesmo não sucedendo com a Lei n° 55-B/2004, de 30/12 (OE de 2005) e a Lei n° 53-A/2006, de 29 de Dezembro (OE de 2007)- o Acórdão limita-se a atentar nos “pressupostos do direito aos benefícios”, afirmando que “De facto, enquanto o DL 404/90 fazia depender o benefício da transmissão de imóveis necessários à concentração da existência de estudo demonstrativo desse acto de concentração – cfr. seus art°s 1° e 3°, n° 1- o art. 60°, n° 1, alínea a) e n° 5 do EBF (...), determina, designadamente nesta matéria que;” passando a transcrever esses n° 1 e 5 do artigo 60°.

  3. De seguida, no Acórdão afirma-se “Decorre, pois, daqui, a necessidade de uma actividade interpretativa doutrinária, com o objectivo de retirar do texto da lei o sentido/pensamento do legislador (…).”.

  4. Assim, o douto Acórdão não refere o teor da versão inicial do art. 1° do Decreto-Lei n° 404/90, de 21 de Dezembro (diploma que estabeleceu, pela primeira vez, o benefício fiscal em questão), nem efectua o confronto do teor desse artigo - em que o legislador alude à “transmissão de imóveis necessários à concentração ou à cooperação” - com o teor da segunda versão do mesmo, a que corresponde o art. 60°, n° 1, alínea a) do EBF, confronto esse indispensável à tarefa interpretativa desta norma e que se efectuará nas alíneas R) a W) destas conclusões.

  5. O entendimento do Acórdão, que é referido na alínea B) destas conclusões, está, como é expressamente afirmado naquele, fundamentado em vários considerandos, designadamente os que se passarão a indicar e que, com o devido respeito, não podem merecer a concordância da ER.

  6. Desde logo, e com o devido respeito, não se vislumbra que haja “dois sentidos possíveis da lei actual, ao excluir do direito à isenção a transmissão de imóveis destinados à habitação, em termos pois, de uma interpretação declarativa”, sentidos esses que o douto acórdão não concretiza, considerando-se ali, depois, que “o que releva não é a finalidade objectiva imanente, ao imóvel, de destino à habitação, mas sim a finalidade económica a que está adstrito, na medida em que, só assim se logrará, a nosso ver, prosseguir aquele objectivo de incremento ao investimento pelo favorecimento de actos de concentração que (...), não deverá, por conseguinte, ser obstaculizado por uma interpretação restritiva e literal que a contrarie.” H) A interpretação do art. 60°, n° 1, alínea a) do EBF efectuada pelo despacho aqui posto em crise, sendo uma interpretação literal, não é, adiante-se, uma interpretação restritiva do espírito do legislador, pois o legislador expressou-se em termos adequados, sendo que a letra da lei traduz, de forma fiel, o espírito do legislador que não”quis dizer mais do que aquilo que escreveu.” L) A interpretação restritiva consiste, nas palavras de J. Batista Machado- in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina. Coimbra, 1987, pág. 186- em “(...) o intérprete chega à conclusão de que o legislador adoptou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que pretendia dizer”, o que, manifestamente, não se verificou no caso em apreço.

  7. Quanto à transcrição de parte do estudo da autoria do Prof. Leite de Campos, sobre o regime jurídico da locação financeira, sendo que o Acórdão considera a ponderação deste regime como “vector crucial de interpretação” da norma do EBF em questão, importa realçar que dos excertos transcritos resulta que o proprietário de imóvel destinado à habitação, em regime de locação financeira, é o locador e não o respectivo locatário, como resulta do art. 1° do Decreto-lei n° 149/95, de 24 de Junho.

  8. Depois, e sobretudo, o regime da locação financeira e as “diferenças” entre a locação e a locação financeira, assinaladas no referido estudo e que são transcritas nas antepenúltima e penúltima folhas do Acórdão, não permitem concluir, como faz o Acórdão na parte que é transcrita na alínea B) destas alegações.

  9. O conceito de “proprietário económico” que o A. invoca na petição inicial como sendo cada um dos locatários, de cada um dos imóveis destinados à habitação, e não ele próprio (anteriormente B …….), que é o real proprietário de cada um dos imóveis locados- para além de não existir no nosso ordenamento jurídico, não permite, com todo o respeito, como não permitem qualquer um dos traços do regime de locação financeira, ou as diferenças deste regime em relação ao regime de locação, concluir que o despacho fez uma interpretação restritiva do art. 60°, n° 1, alínea a) do EBF.

  10. Nenhuma das características do regime do contrato de locação financeira, ou qualquer uma das diferenças entre este e o regime da locação, permite afastar o sentido literal, e jurídico, “dos imóveis destinados à habitação”, na tarefa interpretativa da alínea a) do n° 1 do art. 60° do EBF.

  11. O fim, ou destino, de cada imóvel consta da respectiva licença, quando exista, assim Como do respectivo título translativo de propriedade (designadamente de escritura pública e do documento particular que titula o contrato de locação, a que alude o art. 2° da versão actual do D/L n° 149/095) e, tratando-se de imóvel constituído em regime de propriedade horizontal, também do próprio título constitutivo de propriedade horizontal (art. 1418°, n° 2, alínea a), do Código Civil).

  12. Por outro lado, o destino, ou fim do imóvel, espelhado na respectiva espécie de prédio urbano - art. 6° do CIMI- há-de constar da respectiva inscrição matricial- art. 12° do CIMI- e, sendo o caso, do registo predial (art. 83°, n° 1, alínea c), do Código do Registo Predial; para cada uma das fracções autónomas de prédio constituído em propriedade horizontal).

  13. O n°2 do art. 1° do Código do IMT estipula que, para efeitos deste imposto, o conceito de prédio é o definido no CIMI, sendo que no n° 1, do art. 6°, deste Código estão previstas as espécies de prédios urbanos, designadamente os “Habitacionais”- alínea a)- ou destinados à habitação que, nos termos do n° 2 deste artigo “(...) são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”, que, como tal, figurarão na respectiva matriz, a que alude o art. 12° do mesmo Código.

  14. O Código do IMT dispõe que este imposto incide sobre as transmissões, a titulo oneroso, do direito de propriedade, qualquer que seja o título porque se operem - art. 1° e 2°- estando previstas várias isenções - art. 6° a 11°-, todas inaplicáveis à situação dos presentes autos.

  15. Paralelamente, o legislador estabeleceu no art. 56°-B do EBF- aditado pelo n° 2 do art. 83° da Lei n° 53-A/2006, de 29 de Dezembro, OE para o ano de 2007- actual art. 60°, n° 1, alínea a), do EBF- um beneficio fiscal à reestruturação empresarial, tendo expressamente se referido a “imóveis não destinados a habitação”.

  16. Ora, do confronto do primeiro regime desse benefício, previsto no art. 1°, do D/L 404/90, de 21/12, com o regime constante do art. 1°, n° 1, alínea a), da segunda versão desse diploma -resultante da republicação efectuada pelo art. 39°, n° 11, da Lei n° 55-B/2004, que aprovou o OE de 2005- versão esta que se mantém, na íntegra, no art. 60°, n° 1, alínea a), do EBF, forçoso se torna concluir que o legislador expressou neste artigo a sua mens legislativa de forma correcta.

  17. Na verdade, o legislador estabeleceu na primeira versão do art. 1° do D/L n° 404/90 que “Às empresas que, até 31 de Dezembro de 1993, procedam a actos de cooperação ou de concentração pode ser concedida isenção...

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