Acórdão nº 01197/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução28 de Novembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 O Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante Recorrente), considerando existir uma desproporção não justificada superior a um terço entre os rendimentos declarados pelo agregado familiar de A……. (adiante Contribuinte ou Recorrida) para o ano de 2008 e o valor do aumento de capital por ela efectuado em dinheiro numa sociedade de que é a única sócia, procedeu à fixação do rendimento tributável dos Contribuinte para esse mesmo ano por métodos indirectos, nos termos da alínea f) do art. 87.º da Lei Geral Tributária (LGT), introduzida e na redacção da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro (Referimo-nos à 4.ª versão daquele artigo que, ulteriormente, também conheceu alterações, introduzidas, sucessivamente, pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2009) e pela Lei n.º 94/2009, de 1 de Setembro.) (Orçamento do Estado para 2005), e dos n.ºs 3 e 5 do art. 89.º-A da mesma Lei.

1.2 Os Contribuintes recorreram dessa decisão, ao abrigo do disposto nos n.ºs 7 e 8 do art. 89.º-A da LGT, conjugado com o art. 146.º-B, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que, julgando o recurso procedente, anulou a decisão administrativa de fixação da matéria tributável por métodos indirectos.

1.3 O Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo dessa sentença, apresentando com o requerimento de interposição do recurso a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A.

No ano de 2008, a contribuinte A…….. efectuou uma operação de aumento de capital no valor de € 125.000,00, tendo declarado para efeitos de tributação em IRS € 1.857,36 de rendimento líquido.

B.

Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, competia à contribuinte a prova de que os rendimentos por ela declarados correspondem à realidade ou que o acréscimo de património ou de consumo evidenciados provêm de fonte não sujeita a tributação em Portugal ou não sujeita a declaração.

C.

Nestes termos, cabia à contribuinte provar que os meios financeiros aplicados na operação de aumento de capital são provenientes de fonte ou fontes não sujeitas a declaração e/ou tributação em Portugal ou, em alternativa, de fonte ou fontes que, estando sujeitas a declaração e/ou tributação em Portugal, foram efectivamente declaradas.

D.

A ausência desta prova justifica a sujeição a tributação indirecta nos termos que constam do acto controvertido em primeira instância.

E.

A decisão a quo incorreu em erro de interpretação do artigo 87.º, alínea f) e 89.º-A, n.º 5, ambos da LGT e em erro de qualificação de jurídica dos factos controvertidos.

F.

Ao contrário do sustentado na decisão a quo uma operação de aumento de capital é reveladora de um acréscimo patrimonial ou de consumo evidenciados, não só na esfera da pessoa colectiva, mas também na esfera da pessoa singular, situação que em nada difere da ocorrida com a prestação de um suprimento ou com a aquisição de um carro, mota, barco, avião ou casa.

G.

Com o devido respeito, errou na qualificação jurídica dos factos a decisão a quo quando sustenta que no ano da operação de aumento de capital não se regista um acréscimo patrimonial na esfera da pessoa singular, mas apenas na pessoa colectiva.

H.

Ainda com o devido respeito, errou a decisão a quo ao interpretar o artigo 87.º, alínea f) e o artigo 89.º, n.º 5 da LGT, retirando destas normas que para efeitos da avaliação indirecta será necessário que a administração fiscal demonstre que o acréscimo patrimonial ou consumo tenha ocorrido no ano concreto a que se refere a tributação realizada (in casu, 2008).

I.

Aceitar como correcta esta interpretação a quo será desvirtuar todo mecanismo previsto nestes artigos assim como a sua ratio legis, pois bastaria a qualquer contribuinte concretizar o acréscimo de património ou despesa no dia 1 de Janeiro, demonstrando posteriormente em sede judicial que já possuíam esses meios financeiros no dia e ano anterior, afastando dessa forma a tributação.

J.

O mecanismo previsto no artigo 87.º, alínea f) e no artigo 89.º-A da LGT consiste numa avaliação indirecta de rendimentos aplicável a situações demonstrativas de uma capacidade contributiva inconsistentes com os rendimentos declarados.

K.

Porém, essas situações não configuram mais do que indícios de uma capacidade contributiva a que não foi possível aceder por via directa. Logo não constituem per si, factos tributários ou o próprio objecto da tributação. Se o fossem a tributação seria directa.

L.

O que é relevante neste mecanismo é identificar factos que revelam a disponibilidade de meios financeiros inconsistentes com os rendimentos declarados, e caso o contribuinte não justifique a fonte desses rendimentos, ocorre a tributação indirecta dessa capacidade contributiva, mesmo sem identificação do facto ou factos concretos geradores do rendimento.

M.

É a impossibilidade de acesso directo aos factos geradores da capacidade contributiva evidenciada que leva a lei a tributar indirectamente, in casu, a impossibilidade de aceder directamente à fonte da capacidade financeira evidenciada pela contribuinte ao realizar uma operação de aumento de capital, em 2008, no valor de € 125.000,00.

N.

Dos artigos 87.º, alínea f) e 89.º, n.º 5 da LGT decorre que o acréscimo patrimonial ou consumo devem ser tributados no ano em que são “evidenciados”: ou seja, no ano em que ocorre o facto que vai despoletar a aplicação do mecanismo de avaliação indirecta, e de onde resulta a evidência de capacidade financeira.

O.

Ou seja, será com referência a esse mesmo ano em que é evidenciada a capacidade financeira através do acréscimo de património ou consumo, que é necessário aferir da existência de divergência entre a capacidade financeira e os rendimentos declarados.

P.

Uma vez constatada a existência dessa divergência compete ao contribuinte provar de que correspondem à realidade os rendimentos declarados ou de que é outra a fonte da capacidade financeira evidenciada.

Q.

Para evitar a tributação compete aos contribuintes justificar a divergência entre a capacidade financeira evidenciada e os rendimentos declarados, o que poderá fazer através da demonstração de que estes correspondem à realidade ou que o acréscimo de património ou de consumo evidenciados provem de fonte não sujeita a tributação em Portugal ou não sujeita a declaração.

R.

Não sendo para tal relevante a mera demonstração de que a capacidade financeira teve origem noutro período de tributação que não aquele em que ocorreu a evidência da capacidade financeira e consequentemente em que ocorreu a tributação.

S.

Assim, a tributação indirecta que seja feita com base neste mecanismo respeita ao período tributário em que ocorreu o facto que determina a sua aplicação, sendo a declaração de rendimentos desse ano aquela que é considerada para efeitos do disposto na alínea f) do artigo 87.º e no n.º 5 do artigo 89.º-A, ambos da LGT.

T.

Resulta assim de forma evidente que a decisão a quo fez uma errada interpretação dos artigos 87.º, alínea f) e 89.º-A, n.º 5 da LGT, assim como uma errada qualificação dos factos jurídicos resultantes da operação de aumento de capital.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão do Tribunal a quo ser revogada, com todas as legais consequências, […]».

1.4 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.5 Os Contribuintes contra alegaram, pugnando pela manutenção da sentença recorrida. Resumiram a sua posição em conclusões do seguinte teor: « I - A Ré não se conformando com a decisão da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, apresentou recurso da mesma, alegando que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação dos artigos 87.º, al. f) e 89.º-A n.º 5 da LGT, bem como fez uma errada qualificação dos factos jurídicos resultantes da operação de aumento de capital; II - Contudo, tais alegações não têm qualquer fundamento.

III - Na verdade, o Tribunal a quo faz correctas interpretações das mencionadas normas, explicando ainda que estavam em discussão rendimentos respeitantes ao ano de 2008, pelo que será de aplicar o art. 87.º e 89.º-A da LGT, com a redacção em vigor àquela data, tendo transcrito os dois artigos.

IV - Seguidamente, o Tribunal conclui que assiste razão aos recorrentes na pretensão formulada de verem anulada a decisão de fixação dos rendimentos nos termos do art. 87.º al. f) da LGT, desde logo, porque a al. f) do art. 87.º da LGT diz expressamente que a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.

V - Significando isto que, a divergência tem de ocorrer entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património do mesmo sujeito passivo e no mesmo período de tributação.

VI - Ora, como bem fundamenta a sentença, a situação dos autos diz respeito ao aumento de capital de € 125.000,00 no período de 2008, realizado pela única sócia A……., na empresa B……..

VII - Contudo, apesar da empresa em causa ser uma unipessoal a mesma não se pode confundir com a sua sócia, pois são pessoas distintas, logo sujeitos passivos distintos, com patrimónios distintos e personalidades jurídicas distintas.

VIII - Pelo que, não se pode considerar que estar perante aquelas duas pessoas, uma singular a outra colectiva, é estarmos perante o mesmo sujeito passivo que é referido na al. f) do art. 87.º da LGT.

IX - Na verdade, o erro de interpretação ocorreu por parte da Administração Fiscal; X - Na alínea f), do artigo 87.º da Lei Geral Tributária (LGT), na redacção dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30.12, refere que a avaliação indirecta só pode efectuar-se caso exista divergência não justificada, de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o...

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