Acórdão nº 01260/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução21 de Novembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório A………… interpôs para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150º do CPTA, recurso de revista do acórdão do TCA Norte de 19.4.2013 que negou provimento ao recurso interposto e confirmou a sentença do TAF do Porto que julgou procedente a acção proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO e declarou a perda de mandato do ora Recorrente.

Para tanto alegou, vindo a concluir assim a sua alegação: I- Por acórdão proferido em 19 de Abril de 2013, decidiu o Tribunal «a quo» não conceder provimento ao recurso, aderindo à decisão da 1ª instância a qual declarou a perda de mandato do ora Recorrente.

II- Refere o douto acórdão em crise, que “(...) o disposto na alínea a) do n° 2 do artigo 6° impede a elegibilidade para os órgãos das autarquias locais dos falidos e insolventes, salvo se reabilitados. Não se configura a necessidade de realizar uma interpretação ab-rogante, uma vez que não se vislumbra nenhuma contradição entre o disposto na Lei Orgânica n° 1/2001 de 14 de Agosto e o CIRE. (...)” III- Baseando-se para tal em que “(...) mesmo eliminando a reabilitação, por, em abstracto, já não existir tal regime actualmente, sempre ficaria a parte restante da norma: são inelegíveis os insolventes.

IV- E ainda, que neste contexto, o sentido da decisão final da exoneração do passivo restante prevista no CIRE não pode deixar de ser o mesmo que o previsto no CPEREF quanto à reabilitação. (...)”; V- Referindo ainda, que “(...) a ideia do legislador é a mesma em ambos os diplomas, por referência à ratio legis do artigo 6° no 2, alínea a): os insolventes reintegrados plenamente na vida económica já são elegíveis, permitindo a lei que comecem de novo (...). E, na mesma lógica que estava subjacente à ratio legis da previsão da reabilitação, só a partir desse momento poderão (pessoas singulares declaradas insolventes) encontrar-se em situação de elegibilidade, porque “frescas”, “limpas”, em suma, reabilitadas. (...)”; VI- Porém, e salvo melhor opinião, tal interpretação não pode ser feita nesse sentido, isto porque, em primeiro lugar, o instituto da reabilitação previsto no Decreto-Lei n.° 132/93 deixou de ter paralelo em qualquer dos regimes revogatórios subsequentes.

VII- Nesse seguimento, não sendo possível ao Recorrente, ao abrigo do disposto no CIRE, lançar mão deste instituto, deve ser feita uma interpretação ab-rogante no sentido em que a declaração de insolvência deixou de constituir causa de inelegibilidade, conforme opinião doutrinária da Prof. Dra. Catarina Serra, professora de Direito da Universidade do Minho “Considero que este artigo da inelegibilidade esta revogado, porque o novo Código de Insolvência nem sequer prevê a reabilitação de que fala a lei eleitoral autárquica”.

VIII- Não podendo, de todo em todo, por força das regras e princípios constitucionais, aceitar-se o que se lê no acórdão “que, mesmo eliminada a reabilitação, por, em abstracto, já não existir tal regime actualmente, sempre ficaria a parte restante da norma: são inelegíveis os insolventes” - tal poderia correr o risco de ser interpretado - o que não se acredita - como admitindo uma capitis diminutio perpétua de quem alguma vez fosse declarado insolvente. Uma ilegalidade por omissão teria esse efeito. (neste sentido o Parecer do Prof. Dr. Jorge Miranda, que ora se junta) IX- Em segundo lugar, e sem prescindir, a entender-se o mesmo sentido do instituto da reabilitação ao instituto da exoneração do passivo restante, por também aqui se permitir a reabilitação económica do devedor insolvente, salvo o devido respeito por opinião contrária, entende o Recorrente nunca poder ser à decisão final da exoneração do passivo restante, mas sim ao despacho inicial; X- Uma vez que, não se pode deixar de atender, em primeiro lugar aos requisitos necessários para ser proferido o despacho inicial de exoneração, em segundo lugar aos efeitos de uma insolvência considerada culposa ou fortuita e, por último, à possibilidade de cessação antecipada do procedimento de exoneração (art. 243° CIRE) e da revogação da exoneração (art 246 CIRE); XI- Isto porque, se é no despacho inicial da concessão do benefício da exoneração do passivo restante em que há porventura os requisitos mais apertados a preencher e provar, logo, deve considerar-se que este pedido efectuado pelo devedor, corresponde ao pedido de reabilitação previsto no CPEREF; XII- Até porque, é desta ponderada análise de dados objectivos que se vai aferir se o devedor é merecedor de uma nova oportunidade e se está apto para observar a conduta que lhe será imposta; XIII- Salvo o devido respeito por diferente opinião, só nestes casos, ser indeferido o pedido de exoneração do passivo restante; a insolvência ser considerada culposa; a haver cessação antecipada do procedimento de exoneração (artº. 243° CIRE) ou ainda, revogação da exoneração (artº. 246° CIRE), se poderia, aí sim, considerar que o devedor não se encontra reabilitado e, como tal, inelegível; XIV- Na verdade, para ser reabilitado o insolvente, tinha que alegar e provar que agiu no exercício da sua actividade com lisura e com a diligência normal, isto é, de boa-fé, honradamente, de forma atenta e cuidada à sua actividade, com inteiro respeito pelos interesses dos seus contratantes, sempre procurando não lesá-los nem prejudicá-los; XV- O mesmo se aplica quanto ao pedido de exoneração do passivo restante, em que o insolvente tem que preencher determinados requisitos de ordem substantiva, desde logo, que tenha tido um comportamento anterior ou actual pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa fé no que respeita à sua situação económica e aos deveres associados ao processo de insolvência; XVI- Pelo que, ao ser proferido o despacho inicial de exoneração do passivo restante, nesta fase, é já possível concluir ter tido um comportamento anterior ou actual pautado pela licitude, honestidade, transparência e de boa fé, pois a atribuição deste benefício pressupõe uma rigorosa análise sobre o comportamento do devedor/insolvente; XVII- Mais, sendo as inelegibilidades ou incapacidades eleitorais passivas os factos, as circunstâncias ou os atributos que impedem alguém (um cidadão, estando em causa uma eleição política) de aceder à qualidade de destinatário de um acto electivo.

XVIII- O princípio é a capacidade; a inelegibilidade (art. 50º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa) é uma restrição, uma compressão do conteúdo de um direito para a salvaguarda de um bem ou um interesse constitucionalmente protegido (art. 18°, n° 2 CRP) ou, quando atinge certa pessoa em concreto uma intervenção restritiva. E restrição ou intervenção restritiva têm de ter sempre um fundamento material bastante.

XIX- Em suma, face a certas circunstâncias ou ocorrências, verificados os pressupostos constantes da Constituição e da lei, os cidadãos, individualmente considerados, podem sofrer restrição, suspensão ou mesmo privação de algum ou alguns dos seus direitos, liberdades e garantias.

XX- No entanto, tem de se estabelecer adequados meios de protecção não só para salvaguarda da constitucionalidade, mas, sobretudo, para protecção da verdade e das pessoas contra quaisquer formas de arbítrio de poder.

XXI- Pelo que, e a entender-se reabilitação prevista na parte final do art. 6°, n° 2, alínea a) da Lei Orgânica n° 1/2001, tendo em conta a modificação legislativa superveniente provocada pela entrada em vigor do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, esta só pode fazer-se corresponder à decisão inicial de exoneração do passivo restante. (neste sentido o Parecer do Prof. Dr. Jorge Miranda) XXII- Dado que traduz uma restrição ao Recorrente do direito, liberdade e garantia de participação política, previsto no art. 50° da CRP e como as restrições e as intervenções restritivas devem ser apreendidas sempre restritivamente e in dubio pro libertate, e atendendo a que a insolvência foi qualificada como fortuita. (também neste sentido o Parecer do Prof. Dr. Jorge Miranda) XXIII- Uma vez que, a entender-se que seria de se fazer corresponder à decisão final de exoneração ao fim de cinco anos pelejaria com o art. 18°, n°2 da CRP, sendo aquela norma (art. 6°, n° 2 a) da Lei Orgânica n° 1/2001) inconstitucional, o que aqui expressamente se invoca. (conforme Parecer do Prof. Dr. Jorge Miranda aqui junto) XXIV- Assim, mal andou o Tribunal «a quo», ao afirmar estar preenchido o tipo de ilícito previsto no artigo 8°, n° 1, alínea b) da Lei n° 27/96 de 01/08, uma vez que deve considerar-se que este artigo da inelegibilidade está revogado, porque o novo Código de Insolvência nem sequer prevê a reabilitação de que fala a lei eleitoral autárquica; XXV- Ou, caso assim não se entenda, deve considerar-se o devedor reabilitado uma vez proferido o despacho inicial da exoneração do passivo restante, quando a insolvência tenha sido considerada fortuita, como sucedeu no presente caso.

XXVI- Da insolvência qualificada como fortuita não resultam efeitos nas limitações da capacidade jurídica, havendo apenas efeitos na esfera jurídica do insolvente; XXVII- Apenas quando a mesma é qualificada como culposa, decreta a inibição de administrar património de terceiros, inibição para o exercício de comércio, ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação ou ainda empresas públicas ou cooperativas, etc., nos termos do art. 189° da Lei 16/2012 de 20 de Abril; XXVIII- Os efeitos da declaração de insolvência são aqueles que vêm previstos no seu regime especial, não lhe podendo ser aplicados quaisquer outros; XXIX- Entende o Recorrente que resulta evidente que o que subjaz ao impedimento previsto na Lei Orgânica é que exista ou tenha existido uma conduta culposa determinante da situação de falência ou insolvência, devendo ter-se em consideração a culpa do agente; XXX- Sendo que, apenas um grau de culpa relativamente elevado sustentarão a suspeição ou a...

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