Acórdão nº 01287/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução04 de Dezembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de impugnação judicial n.º 352/09.7BEVIS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………, Lda.” (a seguir Recorrente) veio recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra o indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação da taxa de promoção cobrada pelo “Instituto da Vinha e do Vinho, I.P.”, referente ao mês de Novembro de 2003.

1.2 O recurso foi admitido e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou improcedente a impugnação judicial do indeferimento do pedido de revisão oficiosa da autoliquidação da taxa de promoção alegadamente devida ao Instituto da Vinha e do Vinho (doravante, “IVV”) com referência ao mês de Novembro de 2003.

B. A A………… não se conforma com esta decisão e respectivos fundamentos, para mais quando os mesmos revelam a confusão que assoma o Tribunal a quo sobre a questão decidenda.

C. Ao contrário do que foi defendido nos autos pelo IVV e acolhido pelo Tribunal a quo na sentença ora posta em crise, o processo de investigação à taxa de promoção que foi iniciado pela Comissão (processo C43/2004) não é «totalmente irrelevante para os presentes autos e para a fundamentação da pretensão da Impugnante» – cf. página 32 da sentença proferida nos autos –, sendo que neste entendimento radica a confusão e erro de julgamento que ocorreu em 1.ª instância.

D. Independentemente da eventual compatibilidade com o mercado comunitário da totalidade ou da parte do auxílio em questão relacionada com os vinhos produzidos em Portugal, o que é facto é que se verifica, no caso da taxa de promoção, uma ilegalidade manifesta, decorrente da falta de notificação da medida à Comissão, ao arrepio do disposto no n.º 3 do artigo 88.º do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE).

E. É essa ilegalidade ou vício que é apontado pela A………… à aludida taxa de promoção nos presentes autos: a violação do disposto no artigo 88.º, n.º 3, do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE) e consequente proibição de execução da medida, prevista no mesmo artigo.

F. A norma violada, constante do n.º 3 do art. 88.º do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE), possui efeito directo, pelo que é invocável pela A………… perante os órgãos jurisdicionais nacionais – cf., neste mesmo sentido, Parecer Jurídico junto aos autos, pág. 37 e ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS, Auxílios de Estado e Fiscalidade, Almedina, pág. 300.

G. «[U]m particular pode ter interesse em invocar nos órgãos jurisdicionais nacionais o efeito directo da proibição de execução prevista no art. 93.º, n.º 3, último período, do Tratado CE (actual art. 88.º, n.º 3, último período) [...] para obter a restituição de uma taxa cobrada violando esta disposição.» – cf. Acórdão de 13.01.2005, STREEKGEWEST WESTELIJK NOORD – BRABANT, processo C-174/02 [sublinhado nosso], Acórdão de 11.12.1973, LORENZ, proferido no processo n.º 120/73, Acórdão de 21.11.1991, FNCE, proc. C-354/90 e Acórdão de 11.07.1996, SFEI, proc. C-39/94.

H. Nos presentes autos, não se trata de invocar a incompatibilidade com o mercado interno comunitário da medida em questão, ou invocar a eventual violação de qualquer outra disposição comunitária que determine a contrariedade substantiva da medida com o Direito Comunitário (nem a A………… teria legitimidade para o efeito, uma vez que a proibição de auxílios concedidos pelos Estados-membros que falseiem ou ameacem falsear a concorrência no mercado interno, constante do actual n.º 1 do artigo 107.º do TFUE, não é susceptível, de per se, de surtir efeito directo, porquanto esse juízo de compatibilidade ou incompatibilidade com o mercado interno está sempre dependente da intervenção da Comissão Europeia, órgão que, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 88.º do TCE (actual n.º 1 do artigo 108.º do TFUE), detém a competência – exclusiva – para proceder ao exame permanente da compatibilidade dos auxílios dos Estados-Membros com o mercado interno.

I. A confusão em que acabou por cair o Tribunal a quo radicará, porventura, no facto de se limitar a reproduzir os argumentos esgrimidos nos autos pelo IVV, argumentos que denotam, claramente, que o IVV não compreendeu – ou, desabafe-se, ter-lhe-á sido mais conveniente não compreender… – o teor da questão suscitada expressa e claramente pela Impugnante na sua petição inicial e tão escorreita e detalhadamente abordada no Parecer que então juntou aos autos.

J. Não se abrace o canto da sereia levado a cabo pelo IVV na sua contestação, tentando conduzir o raciocínio do julgador, ao referir amiúde que: «67. Uma vez que o único argumento em que a Impugnante se escuda para fundamentar a presente acção de impugnação judicial é o da pretensa incompatibilidade da taxa de promoção com o Direito Comunitário [...] 73. Deste modo, é patente a inadequação do uso da expressão «ilegalidade», que a Impugnante reiteradas vezes invoca para qualificar a taxa de promoção, com o propósito de fundamentar a contrariedade substantiva ao Direito Comunitário da quantia que auto liquidou».

K. Repita-se: nos presentes autos, e atenta a respectiva petição inicial, a A………… não alega a contrariedade substantiva ou a incompatibilidade da taxa de promoção com o Direito Comunitário; não procura sustentar por que a medida de auxílio em questão e o seu incindível modo de financiamento seriam incompatíveis com o mercado interno (como por exemplo sucederia caso se verificasse, por exemplo, a existência de uma discriminação dos produtos nacionais destinados ao mercado nacional e os destinados à exportação, mencionada na página 32 da sentença posta em crise).

L. A A………… sustenta, sim, a ilegalidade da taxa de promoção decorrente da respectiva não notificação prévia à Comissão Europeia e respectiva execução antes de decisão final da Comissão, ao arrepio do disposto no n.º 3 do artigo 88.º do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE) – cf. petição inicial que dá causa aos autos, em especial os capítulos III.B) e V respectivos.

M. Essa ilegalidade é manifesta e incontestável, encontrando-se plenamente provada nos autos – cf. alíneas F) e G) dos factos provados e teor da decisão da Comissão Europeia de iniciar o procedimento contraditório C43/2004, junto aos autos pela A………… com a sua petição inicial e dada por integralmente reproduzida pelo Tribunal a quo na alínea G) dos factos provados).

N. Foi dada execução pelo Estado Português à taxa de promoção do vinho cobrada pelo IVV e às medidas financiadas pelo produto dessa imposição parafiscal, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão – cf. parágrafos 1 e 3 da aludida Decisão da Comissão.

O. A Comissão Europeia inscreveu as medidas de auxílio e o respectivo modo de financiamento em causa nos presentes autos no conjunto de auxílios não notificados, originando o processo de averiguações contraditório C43/2004 – conforme melhor decorre do parágrafo 3 da mencionada decisão, que ora se transcreve: «(3) Resultando das informações prestadas ter sido dada execução ao dispositivo em causa, desde 1995, sem autorização prévia da Comissão, foi o mesmo inscrito no registo dos auxílios não notificados».

P. Nos presentes autos, não se curava de averiguar, em concreto, da compatibilidade da taxa de promoção com o mercado interno comunitário – juízo de compatibilidade que incumbe, nos termos do Tratado, à Comissão Europeia e que resultará do teor da decisão final do procedimento de averiguações contraditório C 43/2004 que vier a transitar.

Q. A Decisão da Comissão de iniciar o procedimento de exame contraditório C 43/2004, previsto no artigo 88.º do TCE (actual artigo 108.º do TFUE), junta aos presentes autos com a petição inicial, é, pois, a prova plena de que a medida em questão foi executada sem notificação e autorização prévia da Comissão, tendo sido inscrita no registo dos auxílios não notificados à Comissão.

R. Independentemente do juízo de compatibilidade ou incompatibilidade com o mercado comum proferido a final sobre a medida em causa nos autos, Estado Português não lhe podia ter dado execução, atenta a falta de notificação prévia e o efeito suspensivo previsto no n.º 3 do artigo 88.º do TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE), S. A proibição de execução ou efeito suspensivo previsto no n.º 3 do actual artigo 108.º TFUE foi, inclusivamente, recordada pela Comissão a Portugal no parágrafo 147 da Decisão da Comissão que se juntou com a petição inicial, muito se estranhando que a sentença do Tribunal a quo venha afirmar que «da decisão da comissão vinda de analisar, em lado nenhum é mencionada a proibição do Estado Português em executar o auxílio» (cf. página 33 da sentença recorrida); T. O Tribunal a quo olvidou-se do parágrafo 147 dessa mesma Decisão da Comissão e – pior – olvidou-se das regras básicas de Direito Comunitário em matéria de auxílios estatais, nomeadamente do disposto no n.º 3 do artigo 88.º TCE (actual n.º 3 do artigo 108.º do TFUE), que ora transcrevemos, para que não restem dúvidas: «Deve a Comissão ser informada atempadamente dos projectos relativos à instituição ou alteração de quaisquer auxílios […] O Estado-membro em causa não pode pôr em execução as medidas projectadas antes de tal procedimento haver sido objecto de uma decisão final».

U. É a expressa obrigatoriedade de notificação prévia e proibição de execução que se mostra violada no caso concreto e que serve de fundamento à presente impugnação judicial. Não é a imposição de uma qualquer injunção de recuperação ou juízo de incompatibilidade com o Direito Comunitário! V. Não se diga que as dúvidas expressas pela Comissão sobre o auxílio em questão se cingem “aos auxílios à promoção e à publicidade do vinho português nos mercados dos outros Estados-membros e países terceiros” para procurar justificar que...

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