Acórdão nº 0148/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Janeiro de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 15 de Janeiro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 864/11.2BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A………………, S.A.” (a seguir Impugnante ou Recorrente) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pela Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que interpôs da decisão da reclamação graciosa por ela deduzida contra a autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), referente ao exercício de 2003, do grupo de sociedades de que é sociedade dominante (Nos termos do regime especial de tributação dos grupos de sociedades.
), por a Administração tributária (AT) recusar a dedução, como custo fiscal do exercício desse ano, dos donativos efectuados para dotação inicial da “Fundação B…………….” (adiante Fundação), no montante de € 12.530.000,00, possibilidade que a Impugnante sustentou com base no benefício concedido pelo art. 1.º, n.º 1, alínea d), do Estatuto do Mecenato (O Estatuto do Mecenato foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, e revogado pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007).
) (EM).
A Juíza do Tribunal a quo subscreveu o entendimento da AT, de que esse benefício, com a consequente possibilidade de dedução como custo daquele donativo, estava dependente de reconhecimento, porquanto nesse ano de 2003 ainda não havia sido reconhecido à Fundação o estatuto de utilidade pública e isenção de IRC, condições de cuja verificação cumulativa dependia que o beneficio fiscal ficasse dispensado de reconhecimento nos termos do n.º 3 do art. 1.º do Decreto-Lei n.º 74/99, pois que, a seu ver, da interpretação conjugada da alínea d) do n.º 1 do art. 1.º do EM, com o disposto no referido n.º 3 do art. 1.º do referido decreto-lei, resulta que as doações para a dotação inicial de uma fundação de iniciativa exclusivamente privada, que seja dotada do estatuto de utilidade pública à qual tenha sido reconhecida isenção de IRC, permitem usufruir do benefício ali previsto apenas a partir do momento em que a entidade beneficiária cumpra aquelas duas condições.
1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e o Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A. A Administração Tributária não aceitou a dedutibilidade fiscal do donativo para a dotação inicial da Fundação B…………… em causa nos autos, argumentando que o mesmo não havia sido sujeito ao reconhecimento ministerial previsto no n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato.
B. O Tribunal a quo considerou — e bem — que aquele reconhecimento ministerial não é exigível quando estão em causa donativos efectuados a pessoas colectivas dotadas de utilidade pública às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 74/99, de 16 de Março, diploma que aprovou o Estatuto do Mecenato, na redacção conferida pela Lei n.º 160/99, de 14 de Setembro.
C. Esta conclusão resulta do confronto entre os mencionados n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato e o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei que aprovou este Estatuto.
D. Existe efectivamente um conflito entre estas duas normas, visto que o n.º 2 do artigo do Estatuto do Mecenato impõe o reconhecimento ministerial, enquanto o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei que aprovou este Estatuto expressamente prevê que os benefícios previstos no artigo 1.º desse mesmo Estatuto não dependem deste reconhecimento ministerial.
E. A solução para este conflito encontra-se no elemento histórico da interpretação, uma vez que o problema surge com as alterações introduzidas em ambas as normas pela Lei n.º 160/99, de 14 de Setembro, sendo que a análise à redacção anterior permite concluir que os donativos a pessoas colectivas dotadas de utilidade pública, às quais tenha sido reconhecida a isenção de IRC, estão dispensados do reconhecimento ministerial que está previsto no n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato.
F. Para além do elemento histórico, também o elemento literal e sistemático da interpretação permitem concluir no mesmo sentido, assim como a sua exegese teleológica.
G. A própria administração tributária acabou por concordar com a Recorrente, pois aceitou expressamente a aplicação do benefício previsto no n.º 1 da mesma norma as parcelas das doações para a dotação inicial efectuadas no exercício de 2005 e 2006, apesar de entender que os estatutos da Fundação B………… não cumpriam com o disposto na parte final do n.º 2 do artigo 1.º do Estatuto do Mecenato.
H. No entanto, quer a administração tributária, quer o Tribunal a quo, consideraram que, apesar de certo, este raciocínio não era aplicável à parcela das doações em causa nos autos, efectuadas no exercício de 2003, porque esta entidade não possuía ainda, nessa data, o estatuto de utilidade pública, que só obteve em 2005, e o consequente reconhecimento da isenção de IRC.
I. Embora o raciocínio do Tribunal a quo esteja formalmente correcto, entende a Recorrente que está materialmente errado.
J. Isto porque, antes de mais, não pode logicamente ser exigido um pedido de reconhecimento, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do EM, para um donativo concedido para a dotação inicial de uma fundação, donativo esse que antecede o próprio reconhecimento da fundação, nos termos do n.º 2 do artigo 188.º do Código Civil.
K. E não se argumente que a Recorrente poderia requerer o reconhecimento ministerial posteriormente à doação, uma vez que é este próprio reconhecimento que não tem, face à lei e à lógica, qualquer fundamento.
L. Com efeito, o Tribunal a quo está a exigir mais um “posto de controlo” ministerial, onde nenhum controlo é necessário, tendo em conta que, logo de seguida, a Fundação B……………. obteve todos os reconhecimentos necessários que tomam dispensável, nos termos do n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei que aprovou o Estatuto do Mecenato, o reconhecimento ministerial do donativo essencial (para a dotação inicial).
M. Acresce que a interpretação do Tribunal a quo admite a dedutibilidade fiscal das parcelas do donativo para a dotação inicial entregues em 2005 e 2006 (admissão essa que foi também, aliás, admitida pela Administração Tributária).
N. Ora, os donativos em causa, quer os efectuados em 2003, quer os efectuados em 2004, 2005 e 2006, dizem sempre respeito à mesmíssima realidade: donativos efectuados parcelarmente para a dotação inicial da Fundação B…………….
O. Sendo a dedutibilidade fiscal das parcelas...
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