Acórdão nº 0247/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional de despacho proferido no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 253/13.4BELRA 1. RELATÓRIO 1.1 A…………….. (a seguir Reclamante ou Recorrente) recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença da Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a reclamação por ela deduzida, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Benavente que ordenou a penhora de conta bancária.
1.2 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « a) Em resumo, a douta sentença em crise, ao julgar improcedente, por não provada, a reclamação apresentada pela Recorrente considerou que a penhora efectuada pelo Serviço de Finanças de Benavente respeita os requisitos legais, e implicitamente decidiu pela conformidade e regularidade do processo de execução fiscal entretanto instaurado; b) Mas, ao contrário do decidido na douta sentença, a Recorrente entende convictamente que o acto de penhora é manifestamente ilegal, como também o processo de execução fiscal entretanto instaurado não poderia ser instaurado da forma que o foi, nem as regras relativas à citação foram cumpridas, e também, por último, os montantes exigidos pelo IFADAP estarem prescritos; c) De facto, em virtude da Recorrente ter sido judicialmente declarada falida, e os contratos celebrados com o IFADAP terem sido resolvidos em momento anterior, levaria a que reclamasse o seu crédito no processo de falência e não ter extraído certidão de dívida e remetido o documento para o Serviço de Finanças de Benavente; d) Pois, ao proceder da forma como procedeu, o IFADAP tentou recuperar, de forma ilegítima e ilegal, o seu crédito, dado que o meio por excelência seria a reclamação de créditos ou a acção de verificação ulterior de créditos, nos termos previstos no CPEREF; e) Ao que acresce o facto, de conforme previa à data o artigo 238.º do CPEREF, os efeitos da falência só cessam após 5 anos sobre o trânsito em julgado da decisão que tiver apreciado as contas finais do liquidatário, o que implica, naturalmente, que, tendo a Recorrente sido declarada falida em Abril de 2002, e o processo de execução fiscal sido instaurado em 21 de Março de 2006, não foi cumprido o prazo de 5 anos para a instauração da execução fiscal; f) Para além deste facto, saliente-se ainda que, ainda que o processo de execução fiscal fosse instaurado, teria de ser imediatamente suspenso, como, de resto, assim o impõe o artigo 180.º n.º 1 do CPPT; g) Por outro lado, cumpre sublinhar que, pese embora tenham sido expedidas cartas registadas com aviso de recepção, estas foram devolvidas com a menção “não reclamadas” e o insucesso das demais tentativas levadas a cabo pelo Serviço de Finanças de Benavente para citar a Recorrente, não podem, e muito menos não devem branquear a ilegalidade do recurso à citação edital; h) Com efeito, o artigo 92.º do CPPT prevê que, caso se recorra à citação edital, deva ser afixado um édito no órgão de execução fiscal da área da última residência do citando ou na última residência do citando (na redacção prévia à alteração promovida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro), para além de ser exigida a publicação de anúncios em 2 números seguidos de um dos jornais mais lidos nesse local ou no da sede ou da localização dos bens; i) Porém, e conforme resulta do ponto 9.) do Probatório, o édito foi afixado exclusivamente na Junta de Freguesia de Benavente, portanto, em clara violação do disposto no artigo 192.º CPPT, não tendo sequer sido publicados os aludidos anúncios; j) O que implica que ocorreu uma falta de citação, em virtude de se ter empregado indevidamente a citação edital, conforme dispõe o artigo 188.º n.º 1 al. c) do CPC (ou artigo 195.º n.º 1 al. c) do CPC na versão pré-reforma introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho); k) Saliente-se ainda que, pelo facto de ter sido indevidamente empregue a citação edital, ao que corresponde a falta de citação, a prescrição não foi interrompida; l) Com efeito, e muito embora o prazo de prescrição aplicável aos montantes exigidos pelo IFADAP seja o prazo ordinário de 20 anos previsto no Código Civil, e por se ter verificado a falta de citação da Recorrente, a instauração do processo de execução fiscal não tem como efeito a interrupção da prescrição; m) Na verdade, esta só ocorre com a verificação de uma das situações elencadas no artigo 49.º da LGT; n) Pelo que, não tendo ocorrido a citação da Recorrente, nem a instauração do processo de execução fiscal tem como efeito a interrupção da prescrição, terá forçosamente de se concluir que os montantes exigidos pelo IFADAP estão prescritos; o) Por último, sublinhe-se ainda que, quanto aos juros de mora exigidos pelo IFADAP, estes também se encontram prescritos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 310.º alínea b) do Código Civil.
p) Com efeito, por ter decorrido o prazo de 5 anos previsto na aludida disposição legal os juros de mora exigidos já não são exigíveis; q) Pelo que, em suma, a douta sentença em crise, ao decidir pela legalidade do acto de penhora levado a cabo pelo Serviço de Finanças de Benavente, é ilegal, violando o disposto nos artigos 180.º n.º 1 e 192.º ambos do CPPT, o artigo 188.º n.º 1 al. c) do CPC (ou o artigo 195.º n.º 1 al. c) do CPC na versão pré-reforma introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), os artigos 306.º e 309.º ambos do Código Civil e o artigo 49.º da LGT, e, por último, o disposto no artigo 310.º alínea d) também do Código Civil.
Nestes termos e nos melhores de Direito, os quais V. Exas. suprirão, deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por uma outra que reconheça e declare (i) a ilegalidade da instauração do processo de execução fiscal instaurado contra a Recorrente, (ii) a falta de citação e (iii) a prescrição da quantia exequenda e juros, ordenando-se assim a sua anulação, fazendo-se assim a devida e costumada JUSTIÇA».
1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo.
1.4 O Recorrido apresentou contra alegações, sustentando a manutenção da sentença recorrida.
1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público, cujo Representante pronunciou-se no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a sentença, se bem que com fundamentação diversa. Isto nos termos do parecer de fls. 591 a 595, de que adiante citaremos vários excertos.
1.6 Dispensaram-se os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo.
1.7 As questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento i) quando considerou não se verificar a invocada ilegalidade da instauração da execução fiscal, que a Reclamante invocou com o fundamento de que o crédito exequendo devia ter sido reclamado no processo de falência da Executada e, não o tendo sido, não podia agora sê-lo em processo de execução fiscal [cfr. conclusões c) a f)] e ii) quando considerou não se verificar a invocada nulidade por falta de citação, que a Reclamante invocou com os fundamentos de que não estavam reunidas as condições para o recurso à citação edital e de que não foram observadas as formalidades dessa modalidade de citação [cfr. conclusões g) a j)]; iii) quando considerou não se verificar a prescrição da dívida exequenda e dos juros de mora respeitantes à dívida exequenda, prescrição que a Reclamante invocou com os fundamentos de que tinham já decorrido os prazos de prescrição daquelas obrigações, que são de 20 anos para a dívida e de 5 anos para os juros [cfr. conclusões k) a p)].
* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria procedeu ao julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «Consideram-se documentalmente provados os seguintes factos, relevantes para a decisão da causa: 1.
Em 21/5/1990 e 12/7/1990 foram celebrados entre a ora reclamante A……………… Câmara e o Instituto Financeiro de Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, os contratos de “Atribuição de Ajuda Ao Abrigo do Regulamento (CEE) 797/85 Do Conselho e Legislação Complementar” constantes a fls. 292 a 297 dos autos e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
2.
Em 12/3/1993 o IFADAP rescindiu unilateralmente o contrato de atribuição de ajudas descrito em 1 ao abrigo do Reg. (CEE) 797/85, respeitante à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas, “por alienação do património fundiário afecto à atribuição das ajudas” (cf. ofício constante a fls. 39 dos autos em suporte de papel).
[(Este “facto” não se encontra numerado.
)] Em 4/4/2002 foi declarada a falência de A…………….. por sentença do Tribunal de Comércio de Lisboa, no âmbito do processo de falência n. 53/99 constante a fls. 30 a 37 dos autos em suporte de papel.
3.
Em 30/12/2005 foi emitida a certidão de dívida constante a fls. 290 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e da qual consta o seguinte: “(…) B…………………., Directora-Coordenadora Jurídica do Instituto de...
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