Acórdão nº 0720/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelPAIS BORGES
Data da Resolução22 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: ( Relatório ) I. O MUNICÍPIO DO PORTO, representado pelo Presidente da C.M.Porto, interpôs recurso de revista, ao abrigo do art. 150º, nº 1 do CPTA, do acórdão do TCA Norte, de 12.06.2008 (fls. 376 e segs.), que, negando provimento ao recurso jurisdicional por si interposto, confirmou a sentença do TAF do Porto, de 27.09.2007, pela qual foi julgado parcialmente procedente o pedido de intimação intentado por "A...", e, em consequência, intimado o ora recorrente a, "à luz do referido instrumento urbanístico (regras estabelecidas no PDM, Porto, na versão anterior àquela que resultou do processo de revisão ratificado por Resolução do Conselho de Ministros nº 19/06) emitir, no prazo de 30 dias, o acto final no procedimento, sob pena de aplicação ao Presidente da Câmara Municipal e aos demais membros que integram o órgão executivo, de sanção pecuniária compulsória no montante diário de 5% do salário mínimo mais elevado em vigor por cada dia de atraso, para além do prazo fixado".

Na sua alegação formula as seguintes conclusões:

A) Vem o presente recurso interposto do douto acórdão de 12/6/2008 que negou provimento ao recurso jurisdicional apresentado pelo Recorrente.

B) A decisão recorrida implica um retrocesso em termos urbanísticos no que às opções de ordenamento do território municipal diz respeito, impondo ao Recorrente o recurso a um instrumento de gestão territorial publicado em 1993, cujas concepções/soluções há muito estão ultrapassados.

C) Além de ter implicações/consequências imponderáveis em centenas de outros processos que foram indeferidos à luz das regras do novo PDM e que foram iniciados, como é normal, ou na vigência das Normas Provisórias, ou na vigência das Medidas Preventivas.

D) E aos quais os órgãos e agentes do Recorrente aplicaram, como é de lei, as regras urbanísticas existentes no momento da prática do acto de licenciamento, ou seja, o PDM ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 19/06.

E) As implicações que a decisão sob recurso tem vão, portanto, muito para além do caso concreto, sendo susceptíveis de se fazerem repercutir em toda a política de uso e ocupação do solo que desde há anos tem vindo a ser implementada pelo Recorrente.

F) Colocando-a mesmo em cheque ao impor a aplicação de um Regulamento que, no momento da prática do acto de licenciamento, já não está em vigor há mais de 7 anos.

G) E cujas soluções são, ainda para mais, contrárias àquelas que resultam do instrumento de gestão territorial vigente.

H) É, por conseguinte, manifesto que estamos aqui perante uma questão que, pela sua relevância jurídica e social, se reveste de importância fundamental - é, no fundo, o conceito de cidade que se pretende, em concreto, desenvolver/implementar que está em causa, o que, por seu turno, está intimamente relacionado com competências que imperativamente estão reservadas à Administração e com direitos fundamentais dos cidadãos (à qualidade de vida e ao ambiente, por exemplo).

I) Mas não é só: o douto acórdão recorrido, ao confirmar a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, afronta regras e princípios fundamentais em matéria de direito processual e substantivo, alguns deles solidamente consolidados pela Jurisprudência deste Venerando Tribunal, como sucede, por exemplo, com o princípio tempus regit actum.

J) Do mesmo modo, a interpretação preconizada pelo Tribunal "a quo" em termos de legitimidade passiva, a própria configuração e alcance que faz do instituto da "intimação para a prática do acto devido", do art.º 13º do RJUE e dos arts. 112º e 117º do DL n.º 380/99, de 22/9, merecem, por parte do Recorrente, o mais completo desacordo.

K) E justificam, no seu entender, de forma clara, a admissão do presente recurso para que haja uma melhor aplicação do direito nos seguintes domínios: a) legitimidade passiva no âmbito de um processo judicial de intimação para a prática do acto devido; b) configuração/alcance do instituto da "intimação judicial para a prática de acto legalmente devido"; c) articulação da suspensão da concessão de licenças - prevista a partir da abertura da fase de discussão pública - com as medidas preventivas que o município adoptou (interpretação do art.º 13º do RJUE e dos arts. 112º e 117º do DL n.º 380/99, de 22/9); d) sentido, alcance e aplicação do princípio tempus regit actum.

Com efeito, L) O art.º 112°, n.º 1 do RJUE define a legitimidade passiva na intimação judicial para a prática do acto legalmente devido, atribuindo-a à autoridade competente para proceder à prática do acto que se mostre devido.

M) No caso sub judice, a entidade competente para proferir a decisão final sobre o pedido de licenciamento da operação de loteamento que a Recorrida pretende levar a cabo é a câmara municipal - art.º 5°, n.º 1 do RJUE.

N) Ao julgar o Recorrente parte legítima o Mmo Juiz "a quo" violou de forma clara o art.º 10º do CPTA e os arts. 5º e 112º, n.º 1 do RJUE.

O) O que está em causa e se pretende assegurar com a instituição da figura da intimação judicial à prática do acto devido em matéria urbanística é que, perante um comportamento silente da Administração, o particular tenha a possibilidade de obter uma decisão judicial que force essa mesma Administração a proferir a decisão que ao caso se revelar adequada, no sentido de obter daquela a prática do acto devido à luz do bloco legal aplicável à pretensão que requereu junto da Administração.

P) Aquando da apresentação da oposição por parte do Recorrente, já desaparecera o fundamento fáctico-jurídico em que se estribava o objecto dos autos.

Q) Ao desconsiderar esta realidade, o Mmo Juiz "a quo" violou ostensivamente o art.º 112º do RJUE e, bem assim, os arts. 100º e seguintes do CPA.

R) Antecipando a eventualidade de o novo PDM não vir a entrar em vigor antes da caducidade das Medidas Preventivas, a CMP adoptou os mecanismos legais que existiam ao seu alcance no sentido de evitar a reentrada em vigor do PDM de 1993.

S) Fê-lo, precisamente, lançando mão do regime instituído pelo art.º 117º do DL n.º 380/99, de 22/9.

T) A adopção de medidas preventivas antes da fase de discussão pública do plano torna a suspensão de procedimentos desnecessária, pois através da adopção daquelas fica já salvaguardado o efeito útil do futuro plano, devendo afastar-se a suspensão de procedimentos por configurar uma medida, na grande maioria das hipóteses, mais gravosa do que a adopção de medidas preventivas - princípio da necessidade na sua versão instrumental.

U) A única leitura que se poderá fazer do texto da lei é, portanto, a de que, ou a Administração adopta medidas preventivas, sendo estas que funcionam, ou não as adopta (porque facultativas), ou cessa a sua vigência, devendo, apenas nestes casos, funcionar a medida cautelar prevista no artigo 117.º que reveste, assim, a natureza de medida cautelar supletiva.

V) Ora, tendo em consideração que, no caso da revisão do PDM do Porto, foram adoptadas medidas preventivas tendentes a garantir o efeito útil do futuro plano, e que estas não caducaram (porque nada foi determinado a este respeito) aquando da abertura da fase da discussão pública do mesmo, então terá de se concluir que eram estas as medidas que se encontravam em vigor para acautelar o futuro plano, não funcionando, então, o disposto no artigo 117º do DL n.º 380/99, de 22/9.

W) Naquelas hipóteses em que, embora tendo sido adoptadas medidas preventivas, estas venham a caducar (cessação da respectiva vigência), recobra razão de ser a suspensão dos procedimentos, que se deverá manter, para a salvaguarda do plano em revisão e nos termos do artigo 117.°, n.º 1, até à entrada em vigor do PDM ou até ao limite máximo de 150 dias desde a caducidade das medidas preventivas.

X) Esta foi, precisamente, a solução encontrada pelo Recorrido para salvaguarda do futuro Plano, concretizada na aprovação da deliberação da CMP de 13/9/05.

Y) Ao ignorar esta realidade, o Tribunal "a quo" aplicou erradamente o disposto nos arts. 112º e 117º do DL n.º 380/99, de 22/9 e no art.º 13º do RJUE.

Z) A actual legislação urbanística consagrou expressamente o princípio geral que determina que a validade dos actos depende da sua conformidade com as normas em vigor à data da sua prática (tempus regit actum) - artigo 67.º RJUE.

A

A) Semelhante princípio foi também acolhido no art.º 117°, n.º 3 do DL n.º 380/99, de 22/9, que determina o prosseguimento do processo para apreciação do pedido até à decisão final, "de acordo com as regras urbanísticas em vigor à data da sua prática" (do acto administrativo, e não da apresentação do pedido).

BB) A pretensão da Recorrida tem, inevitavelmente, que ser apreciada à luz do actual PDM já que é este o instrumento de gestão territorial em vigor no momento da prática do acto.

CC) Sob pena de a Administração praticar um acto nulo por violação do PDM vigente no momento em que aprecia a legalidade da operação urbanística que a Recorrida pretende desencadear.

DD) Ao decidir que o Recorrente deve praticar procedimento de licenciamento à luz das regras estabelecidas no PDM do Porto na versão anterior àquela que resultou do processo de revisão ratificado pela Resolução do Concelho de Ministros n.º 19/06, o Tribunal "a quo" atentou de forma clara contra o princípio tempus regit actum, consagrado, entre outros, no art.º 67º do RJUE.

EE) Contrariando, para além do mais, a jurisprudência deste Supremo Tribunal que tem entendido, uniformemente, que o bloco de legalidade aplicável a um acto administrativo é o vigente na data em que for proferido, mesmo em casos onde tenha havido deferimento de actos intermédios do respectivo procedimento de licenciamento.

Termos em que..., deverá o presente recurso ser admitido e julgado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido em conformidade, como é de elementar Justiça II. O recorrido contra-alegou, nos termos do requerimento de fls. 474 e segs., sustentando, em suma, a...

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